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Relato de caso

Pênfigo vegetante: abordagem cirúrgica como tratamento complementar

João Felipe Rossival-Preto1; Ingrid Stresser-Gioppo2; Flávia Fajardo1; Marina Carrara-Camilo-Barbosa1; Ivander Bastazini-Junior1

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2022140058

Data de submissão: 30/05/2021
Decisão final: 18/08/2021


Fonte de financiamento: Nenhuma
Conflito de interesses: Nenhum
Como citar este artigo: Rossival-Preto JF, Stresser-Gioppo I, Fajardo F, Carrara-Camilo-Barbosa M, Bastazini-Junior I. Pênfigo vegetante: abordagem cirúrgica como tratamento complementar. Surg Cosmet Dermatol. 022;14:e20220058


Abstract

O pênfigo vegetante é considerado uma rara variante clínica do pênfigo vulgar e cursa com lesões recorrentes que podem evoluir para placas vegetantes extensas de difícil resolução. A cirurgia pode ser uma alternativa no tratamento complementar de lesões resistentes à terapêutica clássica. Há escassez de literatura que evidencie a técnica cirúrgica e os resultados pós-operatórios da abordagem do pênfigo vegetante, tornando relevante a comunicação deste caso. Apresentamos o caso de um paciente com pênfigo vegetante de Hallopeau, tratado com sucesso por meio da exérese tangencial seguida da cicatrização por segunda intenção de grandes projeções retroauriculares.


Keywords: Pênfigo; Procedimentos cirúrgicos operatórios; Resultado do tratamento


INTRODUÇÃO

Os pênfigos constituem um grupo de doenças que se manifestam com lesões bolhosas na pele e/ou nas mucosas, que diferem entre si de acordo com suas características clínicas, histopatológicas e etiológicas.1 Dentre os diversos tipos, o pênfigo vegetante, considerado uma variante clínica do pênfigo vulgar, é o mais raro, representando cerca de 1 a 2% entre todos os casos de pênfigo.2

São reconhecidos dois subtipos de pênfigo vegetante: o de Hallopeau, uma forma mais branda que, a princípio, se caracteriza por lesões pustulosas que se rompem, se fundem e, gradualmente, evoluem para erosões vegetantes que se expandem centrifugamente; e o de Neumann, mais recalcitrante, que, usualmente, começa com vesículas e bolhas semelhantes ao pênfigo vulgar, que se rompem e formam massas exsudativas vegetantes e erosões hipertróficas.1,3

O tratamento do pênfigo vegetante é similar ao do pênfigo vulgar e inclui a fase de indução de remissão das lesões e a fase de manutenção, sendo muitas vezes prolongado, durando, em média, de 5 a 10 anos. Algumas lesões, entretanto, podem ser refratárias ao tratamento inicial, demandando outro tipo de abordagem para sua resolução1,4, como, por exemplo, a abordagem cirúrgica.

 

RELATO DO CASO

Comunicamos o caso de um paciente de 62 anos, sexo masculino, que iniciou acompanhamento em Serviço de Dermatologia com diagnóstico de pênfigo vulgar e que, posteriormente, evoluiu com pústulas retroauriculares e na fronte, que culminaram com o aparecimento local de placas vegetantes, papilomatosas, bem definidas e irregulares, além de lesões erosivas nas áreas seborreicas do dorso e do tórax. Considerando-se a clínica, o resultado das biópsias para estudo anatomopatológico e o exame de imunofluorescência direta com depósito de IgG intercelular na epiderme, definiu-se o diagnóstico de pênfigo vegetante de Hallopeau. A remissão da atividade das lesões foi alcançada com o uso de dexametasona e dapsona (mantendo-se estável com dose reduzida e contínua de 0,75mg de dexametasona em dias alternados e 100mg diários de dapsona). Todavia, houve permanência de placas vegetantes residuais. Tentou-se tratamento adjuvante com infiltrações seriadas de triancinolona acetonida, ocorrendo alguma melhora das lesões da fronte, porém nenhuma regressão das placas retroauriculares. Constatando-se a refratariedade das placas vegetantes frente à terapêutica realizada, a estabilidade das lesões e a frustração do paciente ante o aspecto desfigurante na região retroauricular, optou-se por abordagem cirúrgica (Figura 1).

A exérese tangencial seguida de eletrocoagulação da base das lesões foi realizada sob anestesia local, seguindo-se cicatrização por segunda intenção (Figuras 2, 3 e 4). O paciente apresentou boa evolução, sem recidiva das lesões (Figura 5).

 

DISCUSSÃO

Classicamente, preconiza-se o uso de corticosteroide sistêmico para o tratamento do pênfigo vulgar e, por conseguinte, do pênfigo vegetante. A fim de mitigar os efeitos adversos da corticoterapia e contribuir para o controle de lesões recalcitrantes, medicamentos imunomoduladores, imunossupressores ou imunobiológicos podem ser usados. Após o controle da atividade do quadro, mantêm-se a reavaliação periódica e a terapêutica com a mínima dosagem necessária das medicações para manutenção do quadro inativo até que, se possível, haja o desmame das mesmas.

As vegetações hipertróficas do pênfigo vegetante, no entanto, podem persistir, sendo proposto o uso de fotoférese extracorpórea e laser de dióxido de carbono como alternativas efetivas. Mais recentemente, é descrito o enxerto cutâneo como opção. Infiltração intralesional de corticosteroide também é citada, contudo sugerida para formas mais localizadas.2

A abordagem cirúrgica das lesões é pouco explorada na literatura: em pesquisa sem adição de filtros na base de dados PubMed pelos termos “Pemphigus Vegetans Surgery”, encontram-se 35 resultados, havendo escassez de trabalhos com imagens perioperatórias da abordagem cirúrgica das lesões vegetantes. São necessários mais trabalhos com foco na técnica cirúrgica e nos resultados pós-operatórios para que essa modalidade de tratamento ganhe mais espaço na prática clínica dos dermatologistas que tratam de pênfigo vegetante.

A operação desse tipo de lesão envolve a consideração de complicações devido à própria doença e ao uso prolongado de corticosteroides, tais como cicatrização retardada de feridas e risco de infecção.5 Propõe-se que seja atendido o critério de doença estável com lesões vegetantes que não tenham regredido com outros tratamentos. Além disso, faz-se necessário um bom seguimento pós-operatório.

Os autores advogam que a cirurgia seja mais amplamente utilizada como forma de tratamento para casos com comprometimento estético e funcional, visto o impacto que pode gerar na qualidade de vida e bem-estar dos pacientes. O procedimento pode ser feito sob anestesia local, seguido de cicatrização por segunda intenção da ferida, com resultado estético satisfatório. Comparando-se a outras modalidades descritas para lesões inestéticas, como o laser de CO2 e a enxertia, trata-se de terapêutica de custo mais baixo, mais amplamente disponível e com pós-operatório bem tolerado pelo paciente.

 

CONCLUSÃO

Conclui-se que a cirurgia mostrou-se uma opção segura e viável para abordagem de lesões refratárias desfigurantes, estendendo-se àquelas que possam gerar comprometimento funcional.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

João Felipe Rossival-Preto 0000-0002-7883-1555
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Ingrid Stresser-Gioppo 0000-0001-9520-7888
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Flávia Fajardo 0000-0002-8239-8440
Obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Marina Carrara-Camilo-Barbosa 0000-0001-8906-0242
Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Ivander Bastazini-Junior 0000-0003-0300-1263
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. Porro AM, Seque CA, Ferreira MCC, Enokihara MMSS. Pemphigus vulgaris. An Bras Dermatol. 2019;94(3):264–78.

2. Zaraa I, Sellami A, Bouguerra C, Sellami MK, Chelly I, Zitouna M, et al. Pemphigus vegetans: a clinical, histological, immunopathological and prognostic study. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2011;25(10):1160-7.

3. Ruocco V, Ruocco E, Caccavale S, Gambardella A, Lo Schiavo A. Pemphigus vegetans of the folds (intertriginous areas). Clin Dermatol. 2015;33(4):471-6.

4. Son YM, Kang HK, Yun JH, Roh JY, Lee JR. The neumann type of pemphigus vegetans treated with combination of dapsone and steroid. Ann Dermatol. 2011;23(Suppl 3):S310-3.

5. Motomura H, Tsuruta D, Yamanaka K, Imanishi H, Harada T, Ishii M. The use of test skin grafting in pemphigus vegetans. J Plast Reconstr Aesthet Surg. 2009;62(11):e506-8.


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