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Artigo Original

Efeito de um suplemento nutricional na proteção contra os danos decorrentes da poluição em queratinócitos: comprovação in vitro

Flávia Alvim Sant`Anna Addor

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20181041264

Data de recebimento: 01/10/2018
Data de aprovação: 08/12/18

Trabalho realizado na Instituição: MEDCIN Pesquisa - Osasco (SP), Brasil

Suporte financeiro: Estudo in vitro patrocinado pela Melora-FQM Rio de Janeiro (RJ), Brasil
Conflito de interesse: A metodologia, execução e análise dos resultados obtidos foram realizadas pela investigadora de pesquisa da instituição envolvida, sem qualquer interferência da indústria patrocinadora


Abstract

INTRODUÇÃO: A interação da pele com poluentes atmosféricos tem demonstrado efeitos na barreira cutânea, assim como o desencadeamento de processos oxidativos relacionados ao envelhecimento prematuro da pele. O receptor de aril hidrocarbonetos (ArH) é proteína de transcrição que interage com os xenobióticos, regulando a transcrição de genes envolvidos com estresse oxidativo, inflamação, imunossupressão e pigmentação, além de levar a processos relacionados ao envelhecimento e carcinogênese.
OBJETIVO: Avaliar a eficácia antipoluente de uma associação antioxidante na prevenção da translocação nuclear do receptor AhR
MÉTODOS: Um modelo in vitro (cultura de queratinócitos) foi exposto à fumaça de cigarro, e a presença de AhR foi medida por ensaio Elisa-sanduíche.
RESULTADOS: A cultura tratada demonstrou inibição da translocação nuclear do AhR em todas as concentrações avaliadas: aumentos de ArH de 75,38%; 59,88% e 117,79% são observados nas concentrações de 0,316; 0,100 e 0,0316mg/ml, respectivamente.
CONCLUSÃO: Os resultados sugerem a capacidade da formulação avaliada em prevenir a ativação de genes responsáveis pelos efeitos nocivos da fumaça de cigarro.


Keywords: Dano ao DNA; Poluição do Ar; Translocador Nuclear Receptor Aril Hidrocarboneto


INTRODUÇÃO

Há evidências consistentes de que a poluição atmosférica exerce efeitos deletérios à saúde humana, com repercussões respiratórias e cardiovasculares; mais recentemente, a interação desses poluentes com a pele tem demonstrado efeitos na barreira cutânea,1 além de desencadear processos oxidativos relacionados ao envelhecimento cutâneo prematuro, como ficou demonstrado em estudo de coorte em grandes centros urbanos na Alemanha.2

Os mecanismos desse dano envolvem expressão de mediadores pró-inflamatórios e da proteína de translocação AhR (aril hidrocarbon receptor), atuando tanto em queratinócitos como em melanócitos, levando a aumento da produção de espécies livres de oxigênio.3,4

O receptor do AhR é proteína de transcrição que interage com xenobióticos, compostos químicos estranhos ao organismo. Essa interação com os xenobióticos é similar à dos receptores hormonais. A ligação de um composto xenobiótico ativa o receptor, permitindo sua translocação para o núcleo, regulando a transcrição de genes envolvidos com estresse oxidativo, inflamação, imunossupressão, pigmentação, podendo, portanto, levar a processos de envelhecimento prematuro e carcinogênese. A inibição da ativação dos genes mediados por AhR poderia interferir significativamente nos sinais de envelhecimento e carcinogênese.4,5

A fumaça de cigarro contém mais de 4000 compostos tóxicos, incluindo muitos hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAP), dioxinas e furanos que exercem efeitos prejudiciais sobre a pele pela indução de genes que atuam na inflamação e oxidação,6,7 sendo capazes de ativar a translocação do AhR.8,9

A exposição aos agentes xenobióticos contidos nos poluentes, por exemplo a fumaça de cigarro, pode in vitro reduzir a presença do AhR citoplasmático, pois esse receptor, uma vez ativado pelo agente (ex: HAP), migraria para o núcleo visando à ativação dos genes relacionados à inflamação e oxidação.10

Em 2015 esse efeito de inibição da translocação foi investigado em cultura de queratinócitos por Vanzo e colaboradores.11

Uma estratégia para prevenir os danos causados pela exposição constante a agentes exógenos, em particular, a fumaça de cigarro, envolve a utilização de substâncias que inibem a translocação do AhR para o núcleo, evitando assim o desequilíbrio da homeostase celular cutânea e a progressão das reações em cadeia que oxidam substratos orgânicos.

 

OBJETIVO

Avaliar a eficácia antipoluente de uma associação de nutrientes na prevenção da translocação nuclear do receptor aril hidrohidrocarboneto (AhR), induzida em modelo in vitro (cultura de queratinócitos) pela exposição à fumaça de cigarro.

 

MATERIAL E MÉTODO

Este ensaio foi conduzido em cultura de queratinócitos humanos HaCat, adquirida no Banco de Células do Rio de Janeiro (RJ), Brasil.

As culturas foram incubadas em três concentrações não citotóxicas previamente determinadas da formulação avaliada de Exímia Temporize® (Melora-FQM Rio de Janeiro (RJ) Brasil), constituída por vitaminas E, C, betacaroteno,luteína, licopeno, óleo de linhaça, zinco e selênio, de 0,316, 0,100 e 0,0316mg/ml respectivamente. As células foram mantidas em contato com a formulação durante 48 horas.

Após 48 horas de tratamento, as culturas foram submetidas à fumaça de cigarro utilizando uma câmara apropriada que permitiu a combustão completa de dois cigarros. As células foram incubadas por adicionais 24 horas com a formulação avaliada. Após esse período, as células foram submetidas à obtenção do lisado citoplasmático (três ciclos de congelamento a -20°C, com intervalo de 20 minutos entre cada ciclo, e posterior centrifugação a 10.000rpm durante 10 minutos) em que foi realizada a quantificação do mediador AhR.

Medida de AhR

A presença de AhR foi mensurada por meio de Elisa-sanduíche (Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay), utilizando kits adquiridos comercialmente (Uscn Life Science Inc., Houston, TX, USA). A leitura da absorbância foi realizada em monocromador Multiskan GO. Os valores de AhR foram normalizados pelo total de proteínas da amostra mensurado pela técnica de Bradford.12

Para análise dos resultados, a avaliação estatística utilizou o teste Anova, que permitiu mensurar a variação dos dados, comparando-os entre os grupos, seguido do pós-teste Bonferroni. Foi utilizado o nível de significância de 5% (GraphPad Prism v6).

 

RESULTADOS

Exposição à fumaça de cigarro X controle não exposto

A exposição das células à fumaça de cigarro promoveu redução de 42% na disponibilidade de AhR no citoplasma da célula quando comparado ao controle basal não exposto (P < 0,001). Esse resultado indica possível migração do AhR para o núcleo celular acoplado ao agente xenobiótico.

Culturas previamente tratadas com a formulação avaliada X controle não tratado, expostos à fumaça de cigarro

O pré-tratamento das culturas com a formulação avaliada demonstrou inibir a translocação nuclear de AhR em todas as concentrações avaliadas, sendo que o valor de inibição atingido foi superior a 100% em relação as células expostas à fumaça de cigarro. Observou-se aumento de 7,38%; 59,88% e 117,79% nas concentrações de 0,316; 0,100 e 0,0316mg/ml, respectivamente. Os resultados sugerem a capacidade da formulação avaliada de impedir a ativação de genes responsáveis pelos efeitos danosos da fumaça de cigarro (Gráfico 1).

 

DISCUSSÃO

A fumaça de cigarro exerce efeitos danosos à pele, mediados pelo receptor AhR, que é um fator de transcrição citosólico encontrado em forma inativa, que se liga ao agente tóxico e o transloca ao núcleo celular. No núcleo, o AhR regula a transcrição de genes envolvidos em estresse oxidativo, inflamação, imunossupressão, pigmentação, envelhecimento prematuro e carcinogênese.13

O AhR pode ser regulado também por mecanismos oxidativos além de mediar esses mecanismos em nível nuclear. Portanto, inibir a translocação do AhR impediria os danos dos xenobióticos junto ao núcleo celular.14

Para analisar o envolvimento do AhR no envelhecimento cutâneo decorrente da fumaça de cigarro, Ono e colaboradores em 200810 expuseram fibroblastos humanos primários a um extrato da fumaça de tabaco, observando aumento da indução do RNAm para metaloproteinase 1, associado a maior expressão do citocromo P1B1 (CYP P1B1).

O presente estudo demonstrou que o tratamento de queratinócitos com a associação de nutrientes evitou a translocação nuclear, mantendo os receptores AhR no citoplasma. Essa prevenção da translocação, caracterizada pelo aumento da concentração desses receptores, chegou a 117, 79% em relação à área exposta à fumaça de cigarro sem nenhum tratamento.

 

CONCLUSÃO

A associação de nutrientes contida na formulação avaliada exerceu efeito protetor celular contra o dano dos poluentes xenobióticos aos queratinócitos, uma vez que protegeu a translocação nuclear do receptor AhR, atingindo valor superior a 100% em relação ao controle. Esses achados demonstram que o tratamento avaliado possui ação coadjuvante na prevenção e no tratamento do processo de envelhecimento cutâneo por fatores extrínsecos, representados neste estudo pela fumaça de cigarro.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Flávia Alvim Sant`Anna Addor | ORCID 0000-0003-1851-7342
Execução do estudo, compilação e revisão dos dados, supervisão da avaliação estatística e confecção do relatório.

 

REFERÊNCIAS

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5. Morita A, Torii K, Maeda A, Yamaguchi Y. Molecular basis of tobacco smoke-induced premature skin aging. J Invest Dermatol Symp Proc. 2009;14(1):53-5.

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9. Ono Y, Torii K, Fritsche E, Shintani Y, Nishida E, Nakamura M, et al. Role of the aryl hydrocarbon receptor in tobacco smoke extract-induced matrix metalloproteinase-1 expression. Exp Dermatol. 2013;22(5):349-53.

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