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Artigo de revisão

Lesões em dedos na prática dermatológica

Ludmilla Cardoso Gomes; Luisa Preisler; José Roberto Pereira Pegas

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20181031183

Data de recebimento: 07/04/2018

Data de aprovação: 27/09/2018


Trabalho realizado no Complexo Hospitalar Padre Bento de Guarulhos – Guarulhos (SP), Brasil.

Suporte Financeiro: Nenhum

Conflito de Interesses: Nenhum


Abstract

As lesões localizadas em quirodáctilos e pododáctilos, incluindo o acometimento do aparato ungueal, não raramente são observadas na prática dermatológica. Muitas delas podem ser tratadas por dermatologistas com capacitação em cirurgia dermatológica e cirurgia ungueal, com base no conhecimento da origem dessas lesões, sua fisiopatologia, formas de apresentação e opções terapêuticas disponíveis. Este trabalho tem como objetivo apresentar uma revisão bibliográfica sobre as diversas lesões que assumem essa topografia.


Keywords: Dedos; Doenças da unha; Procedimentos cirúrgicos dermatológicos


INTRODUÇÃO

As lesões localizadas em quirodáctilos e pododáctilos merecem atenção especial no exame dermatológico, pois pés e mãos são de grande funcionalidade para os pacientes.1 Muitas delas podem ser tratadas por dermatologistas com capacitação em cirurgia dermatológica.2,3

Os tumores de tecido mole de mãos e pés originam-se da pele, tecido subcutâneo, tendões, nervos e vasos sanguíneos. Suas características e a gravidade dos sintomas variam de acordo com localização, tamanho e tipo de tumor, e muitos deles podem ter diversas formas de apresentação.1,2 O aparelho ungueal pode ser acometido por tumores benignos e malignos, que podem ser comuns ou raros.3

Verrugas virais, infecções fúngicas ou bacterianas, exostose subungueal, tumor glômico, tumor de Koenen, fibroqueratoma, onicomatricoma são exemplos de lesões benignas.3 Apenas pequena parte dos tumores ungueais é maligna, e os mais diagnosticados são o carcinoma escamocelular1,2,3 e o melanoma subungueal, sendo este último mais temido, por apresentar comportamento agressivo quando diagnosticado tardiamente.3

A proposta deste trabalho é fazer um levantamento bibliográfico sobre lesões localizadas em quirodáctilos e pododáctilos frequentemente observadas nos atendimentos dermatológicos, abrangendo aquelas localizadas no aparelho ungueal e as opções terapêuticas disponíveis para cada uma delas. Entre diversas classificações existentes, essas lesões foram agrupadas pelos autores em: tumorais, inflamatórias, traumáticas e infecciosas (Quadro 1).

 

CLASSIFICAÇÃO DAS LESÕES

Lesões tumorais

Vasculares

Tumor glômico

Trata-se de neoplasia vascular benigna de células glômicas que compõem uma estrutura neuromioarterial, com função de regular a circulação sanguínea e a temperatura corpórea. Apresenta-se como um tumor subcutâneo intensamente doloroso de crescimento lento.1,3-5 Frequentemente, é observado como lesão única na falange distal dos dedos, representando de um a 4,5% das neoplasias das mãos e mais localizada na região subungueal (Figura 1). Ocorre nas extremidades em 80% dos casos, sendo mais frequente nos quirodáctilos.2,5

O tratamento dessa neoplasia consiste na excisão cirúrgica da lesão, realizada via transungueal, incisão lateral, cirurgia micrográfica de Mohs, sendo sugeridas novas técnicas, como a abordagem subperiosteal lateral modificada que visa à preservação ungueal.3-7

Hemangiomas

Caracterizam-se como neoplasias benignas de células endoteliais vasculares, frequentemente encontradas em crianças, que surgem nas primeiras semanas de vida, passam por aumento rápido em seu tamanho seguido por involução e regridem tipicamente até os sete anos de vida.8,9 Raramente situam-se nos dedos. Os hemangiomas superficiais apresentam-se como placas avermelhadas bem delimitadas, enquanto o envolvimento de tecidos mais profundos apresenta-se como massa dolorosa, podendo confundir-se com tumores malignos. As complicações incluem ulceração, sangramento e infecção. A conduta pode ser expectante, em caso de lesões pequenas e assintomáticas. Lesões sintomáticas e em progressão podem ser tratadas com corticosteroides, betabloqueadores, como propranolol, e ablação a laser. A excisão cirúrgica deve ser considerada quando a lesão evoluir com comprometimento funcional, dor ou crescimento acelerado.9

Granuloma piogênico

É tumor benigno adquirido de origem vascular. (Figura 2) Relativamente comum, com frequência envolve o leito ungueal e tecidos periungueais, como lesões que sangram facilmente.4,10 Sua etiologia é incerta, mas fatores como traumas,4,10 infecções, drogas, hormônios sexuais associados à gravidez, bem como a produção de fatores de crescimento nagiogênicos e superexpressão de fatores de transcrição fosforilados - ATF2 e STAT3 - estão relacionados a seu aparecimento. O exame histológico é essencial para excluir o melanoma amelanótico.4 O tratamento do granuloma piogênico pode ser realizado com corticosteroides tópicos de alta potência ou curetagem cirúrgica sob anestesia local. Quando leva à retroníquia, a cirurgia é o tratamento de escolha, com remoção da lesão nas dobras ungueais e avulsão da placa ungueal. A lesão pode, ainda, estar associada a doenças inflamatórias sistêmicas, incluindo sarcoido-se cutânea, psoríase e espondiloartrite seronegativa, sendo mais difícil o tratamento nesses casos.10

Císticas

Cisto mucinoso/mixoide

O cisto mixoide é neoplasia benigna de etiologia incerta, de pequeno tamanho, que contém mucina em seu interior. Localiza-se geralmente na região interfalangiana e pode acometer a região da matriz ungueal, causando alterações na superfície da unha e deixando-a sulcada.11 Alguns autores consideram que seja idêntico ao cisto sinovial, mas a maioria acredita que resulta de uma alteração degenerativa do tecido conjuntivo com consequente aumento na síntese de ácido hialurônico. Atinge pessoas de meia idade e idosos, acometendo duas vezes mais mulheres do que homens.4,11 Na dermatoscopia compressiva, aparece como lesão translucente,11 o que confirma sua natureza cística.4 Existem diversos tratamentos propostos, como drenagem com destruição do seu leito, transfixação do cisto, aspiração e injeção, crioterapia e retirada cirúrgica.12

Fibroepiteliais

Fibroqueratoma digital adquirido

É tumor benigno adquirido, de tecido fibroso, que geralmente se localiza na área periungueal ou em outras partes dos dedos.4,12,13 Sua primeira descrição data de 1968, por Bart et al.12 O trauma é considerado o maior fator predisponente, embora sua etiologia ainda não seja elucidada. Apresenta-se como nódulo normocrômico, único, liso, assintomático, em forma de dedo (fingerlike), podendo ser séssil ou pedunculado (Figura 3). Importante sinal clínico diferencial é a presença de colarete na base da lesão. Não sofre regressão espontânea, sendo mais frequente em adultos.13 O diagnóstico é histopatológico em todos os casos, sendo caracterizado por acantose e hiperqueratose. O tratamento de eleição é a excisão cirúrgica.4,13

Tumor de Koenen

São fibromas benignos periungueais que se desenvolvem em 50% dos casos de esclerose tuberosa (epiloia ou doença de Bourneville-Pringle).3,4 Geralmente, aparecem entre os 12 e os 14 anos de idade e aumentam progressivamente de tamanho e número com o passar dos anos. Podem ser assintomáticos ou dolorosos, quando maiores.3 São geralmente múltiplos, com morfologia globoide. O fibroqueratoma ungueal é seu principal diagnóstico diferencial.3 Os tumores crescem a partir da dobra ungueal, podendo destruir o leito ungueal ao crescimento exagerado. Quando dolorosos, requerem excisão cirúrgica. As alterações histológicas consistem em tecido angiofibrótico denso, às vezes com tecido neuroglial no centro e hiperqueratose na extremidade.4

Dermatofibroma

Representa o segundo tumor fibro-histiocitário mais frequente da pele. É benigno e aparece como lesão isolada em extremidades e tronco.14 Dermatofibromas no aparelho ungueal são raros e podem se assemelhar a fibroqueratomas ou dedos supranumerários.4 Na histopatologia, observa-se hiperplasia da epiderme e hiperpigmentação da camada basal. Na derme, vê-se tumor de células fusiformes.14,15 O tratamento dessa lesão muitas vezes é desnecessário, mas pode ser realizada exérese cirúrgica.14

Fibrolipoma

É variante benigna de lipoma (Figura 4). Ocorre usualmente como lesão circunscrita solitária subcutânea, composta de tecido gorduroso maduro, células fusiformes com CD34 positivo, cordões de colágeno denso, matriz mixoide e vasos sanguíneos.14 O tratamento consiste na remoção cirúrgica e o mais importante aspecto do diagnóstico diferencial histológico desse lipoma é a exclusão de lipossarcoma.14

Fibromixoma acral superficial

Trata-se de neoplasia benigna e rara, descrita em 2001 por Fetsch et al. ,16 que acomete preferencialmente a região sub ou periungueal.16,17 Manifesta-se em geral como massa indolor de crescimento lento que acomete principalmente extremidades dos dedos dos pés e das mãos de adultos do sexo masculino.17 A análise histológica mostra lesão mal circunscrita composta por células neoplásicas fusiformes ou estreladas com grau variado de pleomorfismo, dispostas em estroma mixoide e colagenoso.16 Essas células apresentam imunorreatividade para CD34, CD99, vimentina e focalmente para antígeno de membrana epitelial (EMA).16 Na maioria dos casos, o prognóstico é benigno, embora haja relatos de recorrência local em 22% dos casos.17 Como sua histologia pode variar de tumor com leve atipia celular até atipia nuclear acentuada, com várias figuras de mitoses em raros casos,16 o tratamento de escolha é a ressecção cirúrgica completa com margens livres, devido ao possível risco de transformação maligna.16,17

Melanocíticas

Nevos melanocíticos

São compostos por ninhos de células névicas que derivam de células-tronco do dorso da crista neural, migram para a epiderme e/ou derme no desenvolvimento embrionário e podem estar presentes em qualquer região do corpo (Figura 5). Podem ser congênitos ou adquiridos, e sua remoção cirúrgica deve ser feita quando houver suspeita de malignidade, por razões estéticas ou psicológicas.14

Melanoma

Representa 4% dos tumores cutâneos malignos, sendo o câncer de pele de maior morbidade e mortalidade, embora a prevenção e o diagnóstico precoce tenham auxiliado no controle da doença.14 Cerca de 10% dos casos de melanoma têm história familiar, o que sugere predisposição hereditária, geralmente associada à síndrome dos nevos atípicos.14 São classificados clínica e histopatologicamente em melanoma extensivo superficial, nodular, acrolentiginoso (que engloba o melanoma subungueal), lentigo maligno melanoma e outros tipos menos frequentes, como o melanoma spitzoide, melanoma desmoplásico e neurotrópico, e o nevo azul maligno.14,15 A biópsia excisional é a melhor forma de fazer o diagnóstico do melanoma.14 A conduta cirúrgica é o tratamento de escolha para a lesão primária, dependendo do estadiamento.14

A incidência do melanoma subungueal é de aproximadamente 1% a 4% de todos os melanomas. Em negros, a incidência é maior do que em brancos, representando de 15% a 20% de todos os melanomas nesse grupo. É mais comum nas mãos do que nos pés, e o hálux e o polegar são os dedos mais acometidos. Melanoníquia estriada, sinal de Hutchinson e deformidade da lâmina ungueal são sinais precoces para a suspeita do diagnóstico do melanoma subungueal, cujo diagnóstico será confirmado pelo exame histopatológico. Ulceração, sangramento e perda da lâmina ungueal são sinais tardios. Clinicamente, o diagnóstico diferencial do melanoma subungueal é feito com nevos, hematoma, paroníquia, tumor glômico e granuloma piogênico. O exame anatomopatológico é essencial para o diagnóstico.3

No aparelho ungueal, as lesões melanocíticas manifestam-se clinicamente como melanoníquia, podendo ser devidas à ativação focal dos melanócitos; hiperplasia dos melanócitos; presença de nevo melanocítico ou melanoma na matriz ungueal.4

Epiteliais

Carcinoma espinocelular (CEC)

É o segundo tumor maligno mais frequente na pele (21,7%).14 A doença de Bowen é um carcinoma in situ que pode evoluir para carcinoma espinocelular invasivo.3 O carcinoma de células escamosas do aparelho ungueal (também conhecido como carcinoma epidermoide) é doença maligna de baixo grau.4 Sua incidência é maior em homens entre 60 e 70 anos. O polegar e o hálux são os dedos mais envolvidos. Na maioria dos casos, esse carcinoma começa na região lateral da unha como placa circunscrita, de superfície verrucosa, podendo levar à distrofia ungueal. Trauma, infecção crônica e exposição à radiação crônica são possíveis fatores etiológicos,4 bem como a infecção pelo papiloma vírus humano (HPV).3,4 O diagnóstico é confirmado pelo exame anatomo-patológico, e o tratamento na maioria das vezes é cirúrgico.3

Neurais

Neuroma encapsulado em paliçada

Também conhecido como neuroma solitário circunscrito, consiste em tumor neural da pele, sem associação com outros estigmas da neurofibromatose.18 Em 1972, teve sua primeira descrição em um relato de 44 casos por Reed et al., que o denominaram neuroma encapsulado em paliçada da pele.18,19 Caracteriza-se, clinicamente, por crescer lentamente e localizar-se sobretudo em face de homens e mulheres de 30 a 60 anos de idade.18 A lesão típica é pápula ou papulonódulo séssil, solitária, indolor, não pigmentada, de consistência rígida e firme. Quando pressionada, não sofre herniação para a derme, como se observa nos neurofibromas.18 Histologicamente, a neoplasia apresenta-se circunscrita à derme e parcial ou completamente circundada por denso tecido fibroso que forma uma cápsula.15,18 A lesão é constituída por inúmeros fascículos fusiformes de células de Schwann com citoplasma eosinofílico e que se coram intensamente para a proteína S100.18 Seus principais diagnósticos diferenciais são: carcinoma basocelular, condrodermatite nodular da hélice, granuloma piogênico, leiomioma, calázio, neurofibroma, querato-se seborreica, queratose actínica, cistos, adenoma sebáceo, tricofoliculoma, espiradenoma écrino, pápula fibrosa da face, nevos e verruga vulgar.18 O tratamento é cirúrgico, com remoção da lesão.20

Neurotequeoma

O neurotequeoma ou mixoma de bainha nervosa é um tumor neuromesenquimatoso caracterizado pela proliferação de células da bainha do nervo em um estroma variavelmente mixomatoso.15,20 Constitui-se em geral de lesões assintomáticas que se confundem clinicamente com cistos mixoides ou ganglionares, nevos melanocíticos dérmicos, fibrolipomas e neoplasias de anexos. O tratamento é realizado por excisão da lesão e, caso a remoção seja incompleta, o mixoma da bainha do nervo pode recorrer.20

Neurofibroma

O neurofibroma é tumor benigno de origem neural, derivado das células de Schwann, que pode ocorrer em qualquer região do corpo, incluindo a pele, sendo raro nas mãos.14,21 Clinicamente, os neurofibromas, solitários ou múltiplos, são tumores de consistência macia, semiglobosos ou pedunculados, normocrômicos ou violáceos. Podem apresentar-se isolados ou acompanhando síndromes, como a neurofibromatose. Em geral, são assintomáticos, mas podem cursar com prurido, dor e alteração da sensibilidade ao tato.14 Alguns autores relataram incidência de 0,8% para neurofibromas nas mãos.21 A exérese de tumores cutâneos e o tratamento clínico ou cirúrgico das lesões de outros órgãos acometidos pela enfermidade podem ser realizados.14 A cirurgia está indicada nos casos de crescimento tumoral exagerado, de dor e quando há suspeita de degeneração maligna.21

Outras lesões tumorais

Onicomatricoma

É tumor benigno e raro da matriz ungueal.3,22 É assintomático,3 de coloração amarelada e caracteriza-se por espessamento da lâmina ungueal, deformação tubular e múltiplas hemorragias em estilhaço.3,22-24 Pode acometer tanto unhas das mãos como dos pés, sem prevalência sexual.22 A avulsão das unhas expõe um tumor e múltiplas digitações filamentosas projetadas a partir da matriz ungueal.3,23 A ressonância magnética é útil para diagnóstico do onicomatricoma,3 e seu tratamento é a excisão completa do tumor.3,24

Osteocondroma

São neoplasias benignas e representam o tumor ósseo mais comum do pé (Figura 6), sendo encontrados nas falanges distais dos pododáctilos,25 mais comumente do hálux.4 As lesões iniciam-se como pequenas elevações na região dorsal da falange distal, podendo emergir na borda ungueal e destruir seu leito.26 Sua prevalência é maior em homens e muitas vezes há história de trauma local associado. A tríade de dor, deformidade da lâmina ungueal e características radiográficas geralmente é diagnóstica. Há controvérsias quanto ao fato de a exostose subungueal e o osteocondroma serem entidades diferentes.4 Seu tratamento é cirúrgico,4,26,27 a fim de resolver a dor ou incapacidade funcional, ocasionadas seja por compressão neurovascular ou por limitação do movimento articular.26

Lesões traumáticas

Alterações da lâmina ungueal

Existem três tipos principais de hipercurvatura transversa da lâmina ungueal: a unha em pinça; a unha em telha; e a unha em plicatura.4 As causas podem ser hereditárias ou adquiridas. Os dedos dos pés são acometidos com maior frequência. Os tratamentos conservadores são os preferidos pelos pacientes, porém os tratamentos cirúrgicos produzem os melhores resultados e devem ser realizados quando a lesão provocar dor, inflamação, impedimento do uso de calçados fechados ou constrangimento estético.28

• Unha em pinça

Caracteriza-se por hipercurvatura transversa que aumenta ao longo do eixo, no sentido proximal para o distal.4,28 A dor geralmente não é muito grave, mas às vezes pode ser intensa.4 O procedimento definitivo é o tratamento cirúrgico pela técnica de Haneke.4,27

• Unha em telha

A unha em forma de telha apresenta aumento na curvatura transversa, porém as margens laterais permanecem paralelas.4,28

• Unha em plicatura

Apresenta convexidade moderada de um ou de ambos os lados das margens laterais, que alteram abruptamente a angulação e penetram, de forma cortante, as laterais do leito ungueal.4,28

• Coiloníquia

Refere-se à concavidade da unha, que assume aspecto “em colher”. A lâmina está firmemente presa ao osso por feixes verticais de tecido conjuntivo da região subungueal, ligando-se diretamente ao periósteo.4

Onicocriptose

Ocorre devido à penetração da lâmina ungueal, em graus variados, nos tecidos moles periungueais.4,27 Pode acontecer por hipertrofia das dobras ungueais, alteração da curvatura ou inserção distal da lâmina ungueal.4 O uso de calçados apertados que causam excessiva pressão externa, cortes de unha inadequados e traumas são fatores que levam à onicocriptose. Infecções locais não são raras e devem ser tratadas apropriadamente.4 Diversas técnicas de tratamento são citadas, com evidências de que a técnica de fenolização da matriz ungueal é eficiente em diversos graus da onicocriptose, promovendo pós-operatório pouco doloroso e rápido retorno às atividades diárias, muitas vezes dispensando a associação da curetagem da matriz.29 A hipertrofia das dobras laterais geralmente acompanha as deformidades crônicas ungueais nos pododáctilos. A unha parece normal ou ligeiramente involuída, mas há aumento de tecido mole que se sobrepõe à lâmina ungueal. Deformidades ósseas, como hálux valgo e hálux rígido favorecem a hipertrofia das dobras ungueais nos primeiros pododáctilos.4 Nas regiões de impacto, podem-se utilizar protetores de silicone no espaço interdigital. O tratamento consiste em reduzir o excesso de tecido mole periungueal, sendo descritas várias técnicas cirúrgicas.4,14,27

Knuckle pads

Coxins interfalangianos ou knuckle pads são nodulações hiperceratósicas, de superfície áspera, discretamente acastanhadas ou acinzentadas, com cerca de um centímetro de diâmetro, geralmente arredondadas, endurecidas, de limites precisos e contornos regulares. São lesões assintomáticas, de evolução crônica, mais frequentemente localizadas nas articulações interfalangianas proximais e metacarpofalangianas. A histopatologia evidencia hiperceratose, acantose e prolongamento das cristas papilares. O tratamento consiste na redução do atrito nas articulações e citam-se a remoção cirúrgica e a infiltração intralesional de corticosteroides para reduzir a lesão.30

Lesões inflamatórias

Psoríase ungueal

A psoríase é doença inflamatória crônica da pele de caráter recidivante.31 O acometimento ungueal da psoríase é aspecto da doença pouco abordado, apesar de sua implicação estética e funcional, o que se reflete no pequeno número de estudos sobre epidemiologia e características clínicas da doença.31 Alterações compatíveis com psoríase ungueal também podem ser vistas na ausência de doença cutânea, o que ocorre em apenas um a 5% dos pacientes.31,32

O efeito da psoríase na matriz resulta em alterações da placa ungueal, tais como depressões cupuliformes (pittings), leuconíquia, manchas avermelhadas na lúnula e fragmentação da placa ungueal (crumbling). Já o acometimento do leito ocasiona onicólise, manchas de óleo ou manchas salmão, discromias, hemorragias em estilhas e hiperqueratose do leito ungueal.4,31,32 A psoríase dos tecidos periungueais é similar à psoríase do dorso dos dedos e é considerada como uma extensão cutânea do acometimento dos dedos.32

Paroníquia crônica

É considerada doença inflamatória com duração superior a seis semanas e envolve uma ou mais pregas ungueais (laterais e proximal). Representa 18% das distrofias ungueais, com maior prevalência no sexo feminino. A paroníquia crônica tem como base o processo inflamatório e as possíveis infecções são consideradas secundárias. Clinicamente, observa-se inflamação da prega ungueal proximal (PUP), ausência de cutícula e distrofia de placa ungueal.33 A inflamação das pregas ungueais em pododáctilos é comum em atletas e é caracterizada por edema, eritema, dor e secreção purulenta. Muitas vezes, é causada pela pressão do sapato, sendo o hálux mais frequentemente afetado.4 O tratamento clínico consiste em evitar fatores predisponentes e uso de medicações tópicas e/ou sistêmicas, mas os resultados são frequentemente insatisfatórios.4,33 A cirurgia é indicada nos casos resistentes ao tratamento clínico e tem como objetivo a retirada da prega ungueal proximal. Baran e Burean descreveram, em 1981, a técnica da excisão em bloco da prega ungueal proximal, ou técnica com incisão perpendicular. A segunda técnica, descrita em 1976 por Keyser e Eaton, consiste na remoção da superfície dorsal da prega ungueal proximal mantendo a porção ventral da dobra, sem a remoção da placa ungueal, ou exérese oblíqua da prega ungueal proximal (Eopup).33

Lesões infecciosas

Verrugas virais

São tumores benignos fracamente infecciosos,1 causados pelo papiloma vírus humano (HPV), que se caracterizam por superfície hiperceratótica de cor amarelo-opaca.1,14 A verruga vulgar representa cerca de 70% das verrugas cutâneas, manifestando-se como pápulas de superfície dura e rugosa, queratóticas, às vezes com pontos enegrecidos em sua superfície, representando capilares trombosados. Situam-se em geral no dorso das mãos e dos pés, nas dobras periungueais, cotovelos e joelhos.14 As verrugas subungueais afetam inicialmente o hiponíquio, crescendo lentamente em direção ao leito e finalmente elevando a lâmina ungueal. A erosão óssea da verruga vulgar ocorre ocasionalmente.1 Existe grande diversidade para tratamento das verrugas virais, podendo-se utilizar desde o tratamento químico com uso de ácidos locais, até os cirúrgicos (criocirurgia, eletrocoagulação com ou sem curetagem, laser de CO2, terapia fotodinâmica).14

Outras lesões

Existem diversas outras lesões não incluídas na revisão aqui proposta e que podem aparecer em quirodáctilos e pododáctilos, entre as quais citam-se a queratose actínica, o tofo gotoso e os dedos extranumerários/rudimentares.

Queratose actínica é uma neoplasia cutânea causada por proliferação de queratinócitos epidérmicos citologicamente aberrantes em resposta à exposição prolongada à radiação ultravioleta.14 São lesões eritêmato-escamosas de textura áspera e aparecimento em locais fotoexpostos da pele.1,14 Pode ocorrer sua transformação maligna para carcinoma escamocelular (CEC), manifestando-se com infiltração, hiperqueratose, inflamação, ulcerações, recorrência ou mudança repentina no crescimento.1 A histologia a diferencia do CEC.14

O tofo gotoso é lesão característica da gota, doença inflamatória crônica na qual ocorre depósito de monourato de sódio.14 Os tofos gotosos podem apresentar-se em diversas localizações, algumas vezes mimetizando patologias infecciosas ou mesmo neoplásicas. A remoção cirúrgica de tofos gotosos associa-se à possibilidade de complicações decorrentes da dificuldade de exérese de tofos firmemente aderidos. No entanto, a cirurgia deve ser considerada em situações de infecção, ulceração ou dor local intensa, bem como por motivos estéticos.34

Dedos rudimentares ou extranumerários são geralmente deformidades congênitas isoladas, mais comumente observadas na região ulnar (pós-axial), implantando-se na região medial dos quintos dedos das mãos. O dedo extranumerário corresponde à duplicação verdadeira, ao passo que o broto rudimentar é uma formação incompleta, que pode necrosar e soltar-se sem dor após o nascimento. Na maioria dos casos, a simples ressecção do dedo extranumerário é suficiente como tratamento.35

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O conhecimento das lesões que se manifestam nos dedos assume, sem dúvida, grande importância na rotina do dermatologista. É fundamental, portanto, que se considerem na avaliação dermatológica as diversas possibilidades diagnósticas dessas lesões, sejam elas de apresentação isolada ou manifestação de uma doença sistêmica. Assim, o médico dermatologista adotará uma melhor abordagem para oferecer o tratamento mais adequado e que resulte em melhor impacto estético e funcional para o paciente.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Ludmilla Cardoso Gomes | ORCID 0000-0002-8165-5345
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; aprovação da versão final do manuscrito.

Luisa Preisler | ORCID 0000-0002-1600-9953
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; aprovação da versão final do manuscrito.

José Roberto Pereira Pegas | ORCID 0000-0002-2541-6008
Concepção e planejamento do estudo; revisão e aprovação da versão final do manuscrito.

 

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