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Relato de casos

O tratamento bem-sucedido com fototerapia UVB banda estreita em um caso raro de líquen escleroso extragenital generalizado

Fernanda Freitas de Brito1; Tatiana Cristina Pedro Cordeiro de Andrade2; Ana Paula Cota Pinto Coelho3; Ana Cecília Versiani Duarte Pinto1; Adauto José Ferreira Nunes4; Claudio Sampieri Tonello4

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2015731668

Data de recebimento: 18/07/2015
Data de aprovação: 14/09/2015
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

O líquen escleroso é patologia incomum acometendo tanto região genital quanto extragenital, constituindo apresentação atípica da doença. O uso de corticosteroides tópicos é considerado primeira linha para tratamento da doença genital. Lesões extragenitais são menos sensíveis a essa terapêutica. Relata-se caso de líquen escleroso em paciente do sexo feminino, de 82 anos, com envolvimento extragenital generalizado e tratamento bem-sucedido com fototerapia UVB de banda estreita. O líquen escleroso é dermatose inflamatória crônica, e as formas disseminadas da doença são raras e sem consenso em relação ao tratamento da forma extragenital. A opção pela terapia com UVB de banda estreita baseou-se nos relatos da literatura.


Keywords: LÍQUEN ESCLEROSO E ATRÓFICO; ATROFIA; FOTOTERAPIA


INTRODUÇÃO

O líquen escleroso (LS) é patologia incomum com prevalência de 0,1-0,3%, acometendo principalmente mulheres pré-púberes e pós-menopausadas.1-3 Atinge tanto a região genital quanto a extragenital, sendo esta última apresentação atípica da doença.3-6 No homem, acomete principalmente a glande e pode ser causa de fimose.1,3 Sua etiologia é desconhecida, embora evidências sugiram que mecanismos imunológicos estejam envolvidos em sua patogênese devido à associação com outras doenças autoimunes, como anemia perniciosa, vitiligo, morfeia e tireoidite autoimune. Fatores genéticos e alterações do metabolismo de androgênios também foram associados à patologia.1,2,5,6 Clinicamente, manifestam-se como placas hipocrômicas, atróficas e brilhantes, assintomáticas ou pruriginosas.1 A forma extra-genital do LS ocorre em 15 a 20% dos casos quando associada à forma genital,1,5,6 enquanto o acomentimento exlusivo extra-genital é muito raro, apresentando-se em apenas 2,5% de todos os casos.1 Incide geralmente na área superior do tronco, axilas, nádegas e região das coxas1-3,5. O diagnóstico é clínico confirmado por padrão histopatológico específico.2,3 No tratamento do LS o uso de corticosteroides tópicos potentes é considerado a primeira linha de tratamento para a doença genital.1-3,5 Lesões extragenitais são menos sensíveis à terapia convencional.1,3 Existem, entretanto, relatos do uso de tacrolimus,2,3,5 colchicina,2,3 ciclosporina,3 metotrexato, micofenolato de mofetila e várias formas de fototerapia (UVB banda estreita, UVA-psoraleno, UVA-1).4,5 Objetiva-se com o relato desse caso apresentar uma forma rara do LS, com envolvimento extragenital generalizado e tratamento bem-sucedido com fototerapia UVB banda estreita.

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo feminino, 82 anos, com história de aparecimento de placas hipocrômicas e atróficas disseminadas pelo corpo há oito meses. Negava quaisquer sintomas sistêmicos ou perda ponderal. Ao exame dermatológico, apresentava placas extensas, hipocrômicas com superfície brilhante e atrófica com acometimento de região cervical, tronco superior, abdômen, dorso, membros superiores e inferiores. Ausência de acometimento genital (Figura 1). Foram realizadas duas biópsias de lesões do dorso que evidenciaram hiperqueratose, hipogranulose, intensa atrofia da epiderme, hialinização do colágeno da derme com discreto infiltrado linfo-histiocitário, sendo compatíveis com LS (Figura 2). Iniciado tratamento sintomático com anti-histamínicos; devido à extensão das lesões, corticosteroides tópicos não foram prescritos. Optou-se então pela realização de fototerapia UVB banda estreita. A paciente foi submetida a 16 sessões, com dosagem de irradiação por sessão que variou de 580-1.840mJ/cm2, com dose total de 24.540mJ/cm2 e tempo de exposição de três a dez minutos por sessão. Após cinco meses de tratamento, apresentou importante melhora do prurido e do quadro clínico, com melhora da atrofia e da textura da superfície cutânea (Figura 3). Foi então suspensa a fototerapia, e a paciente mantém acompanhamento regular no serviço.

 

DISCUSSÃO

O LS é dermatose inflamatória crônica, pouco frequente,1 descrita pela primeira vez em 1887 por Hallopeau.1 Caracteriza-se por placas branco-nacaradas, que podem agrupar-se e assumir progressivamente aspecto apergaminhado na pele. Formas disseminadas da doença são extremamente raras.5 No caso relatado, a paciente apresenta forma incomum do LS, com presença de placas hipocrômicas e atróficas generalizadas acometendo quase todo o tegumento, poupando a face, regiões palmoplantares, couro cabeludo, mucosas oral e genital. O tratamento de primeira linha quando o acometimento é genital são os corticoides tópicos.3,5 Contudo, em relação ao tratamento da forma extragenital não existe consenso na literatura.3 São geralmente relatos baseados em casos individuais e pequenas séries de casos. Nas diretrizes da Associação Britânica de Dermatologia, mencionam-se diversos tratamentos, todos com baixo nível de evidência científica.3 Tratamentos tópicos com corticosteroides de alta potência não foram considerados no caso em questão devido à extensão da área acometida. Diversas formas de fototerapia já foram usadas com sucesso. A opção pela terapia com UVB banda estreita baseou-se nos relatos da literatura,4,5 assim como na disponibilidade do equipamento em nossa instituição. Cinco meses depois de terminado o tratamento com 16 sessões, a paciente apresentou melhora significativa do prurido, principal queixa e também do aspecto clínico das lesões. Um relato de caso publicado em 2007 por Colbert et al.5 apresentou resultado semelhante. A fototerapia promove a liberação de citocinas, que induzem a formação da colagenase e inibem a síntese de colágeno, além de seu efeito imunossupressor.4,5,7 Outras terapias a considerar em formas extensas, de acordo com a literatura, incluem metotrexato, hidroxicloroquina, ciclosporina e micofenolato de mofetila.3 Devido à disponibilidade limitada de ensaios clínicos randomizados e grandes estudos de coorte, é difícil tirar conclusões definitivas sobre a eficácia a longo prazo da fototerapia UVB banda estreita,5,7 dose ótima e melhores regimes de tratamento. No entanto, as evidências baseadas em relatos de casos mostraram bons resultados, e esse tratamento parece promissor no manejo do LS extragenital.

 

Referências

1. Trinh TVT, Parr K, DF. Disseminated extragenital bullous lichen sclerosus. Indian Dermatol Online J. 2014;5(1):66-68.

2. Fonseca JSBM, Silva AGF, Guimarães MG, Faria PA, Filho FB. Líquen escleroso extragenital com resposta à colchicina. Revista SPDV. 2013;71(2):273-6.

3. Neill SM, Lewis FM, Tatnall FM, Cox NH, Dermatologists BAo. British Association of Dermatologists' guidelines for the management of lichen sclerosus. Br J Dermatol. 2010;163(4):672-82

4. Kreuter A, Gambichler T. Narrowband UV-B phototherapy for extragenital lichen sclerosus. Arch Dermatol. 2007;143(9):1213.

5. Colbert RL, Chiang MP, Carlin CS, Fleming M. Progressive extragenital lichen sclerosus successfully treated with narrowband UV-B phototherapy. Arch Dermatol. 2007;143(1):19-20.

6. Coelho WS, Diniz LM, Souza Filho JB. Líquen escleroso e atrófico - relato de dois casos de apresentação atípica. An Bras Dermatol. 2006;81(5):297-300.

7. Duarte I; Buense R; Kobata C. Fototerapia. An Bras Dermatol. 2006;81(1):74-82.

 

Trabalho realizado no Instituto Lauro de Souza Lima (ILSL) - Bauru (SP), Brasil.


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