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Artigo Original

Aumento do volume labial com o uso de toxina botulínica

Camila Araujo Scharf Pinto1; Priscila Regina Orso Rebellato2; Juliano Vilaverde Schmitt3; Deborah Skusa de Torre4

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.201791978

Data de recebimento: 14/02/2017
Data de aprovação: 12/03/2017
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

Introdução: A aplicação da toxina botulínica na região perioral é procedimento minimamente invasivo que permite melhora substancial nos sinais de envelhecimento e aumento do volume dos lábios, com pouca documentação ainda na literatura.
Objetivo: Avaliar alterações na forma e volume dos lábios com aplicações de toxina botulínica nas linhas periorais bem como a satisfação do paciente.
Métodos: 19 pacientes submeteram-se a análise, registro fotográfico e medições seguidos de aplicação de toxina botulínica na região perioral. Posteriormente, foram avaliados quanto a alterações labiais e satisfação.
Resultados: A maioria dos pacientes considerou os lábios moderada ou significativamente mais atraentes após a toxina (p = 0,039), e 15 mulheres notaram a mudança do lábio como um dos principais contribuintes para a melhoria global da face.
Conclusões: A aplicação de toxina botulínica na região perioral provoca elevação do lábio superior, levando ao encurtamento do filtro e extensão do vermelhão. Ao aplicar a toxina na borda do vermelhão, permitimos o relaxamento do músculo orbicular, favorecendo maior efeito do tônus muscular dos músculos de elevação do lábio superior. A satisfação das pacientes com a aparência dos lábios avaliada pelas quatro perguntas adicionais (forma, volume, atração e beleza) foi positiva, com efeitos colaterais mínimos.


Keywords: LÁBIO; TOXINAS BOTULÍNICAS TIPO A; TOXINAS BOTULÍNICAS


INTRODUÇÃO

A toxina botulínica é exotoxina produzida pelo Clostridium botulinum, uma bactéria gram-positiva e anaeróbica. Existem oito sorotipos de bactérias (A, B, C alpha, C beta, D, E, F e G), que produzem sete exotoxinas distintas; o tipo A, B e E são os mais comumente associados ao botulismo em humanos. A via final da ação da toxina é impedir a liberação da acetilcolina na junção neuromuscular dos músculos estriados produzindo, assim, denervação química e consequente paralisia muscular.1

Nas últimas três décadas, a toxina botulínica tem sido empregada para fins terapêuticos em inúmeras afecções. A toxina botulínica do tipo A foi aprovada inicialmente em 1989 para o uso em estrabismo, blefaroespasmo e espasmo hemifacial; em seguida, os tipos A e B foram aprovados para o tratamento de distonias cervicais; e, mais recentemente, o tipo A foi aprovado para fins estéticos, hiperidrose palmoplantar e tratamento de enxaqueca e cefaleia tensional crônica.2

A aplicação da toxina botulínica na região perioral é procedimento rápido e minimamente invasivo. Além disso, estudos recentes mostram melhora substancial nos sinais de envelhecimento, incluindo aumento do volume labial.3,4 Existem relatos de uso de toxina botulínica para outros fins, como correção de sorriso gengival ou sincinesias periorais, porém a literatura é escassa quanto à avaliação do ganho de volume labial com a aplicação da toxina nas rítides periorais.5,6

 

OBJETIVO

Avaliar as alterações de forma e volume labial com aplicação da toxina botulínica nas rítides periorais e a satisfação da paciente com a forma dos lábios.

 

MÉTODOS

Trata-se de estudo prospectivo, intervencionista, não controlado e não randomizado. Foi avaliada técnica já estabelecida na especialidade envolvida na execução deste estudo. Os pacientes foram selecionados no ambulatório de dermatologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, no período de julho de 2014 a agosto de 2015. Foram selecionados adultos que já desejassem realizar aplicação de toxina botulínica para fins estéticos. Não houve restrição de sexo ou fototipo, e foram incluídos somente pacientes maiores de 18 anos.

Foram excluídos pacientes que já tivessem realizado outro tipo de tratamento para implementação de volume labial; com histórico de intolerância ao medicamento; gestantes; com dificuldade de comunicação; em uso de anticoagulantes; que apresentassem cicatrizes, deformidades ou alterações anatômicas patológicas nos lábios, além de portadores de doenças autoimunes.

Após preenchimento do consentimento esclarecido, os pacientes foram avaliados por meio de questionário, com perguntas a respeito da satisfação quanto aos lábios, e foram tomadas as medidas e fotografias padronizadas dos lábios.

Foi, então, realizada a aplicação de toxina botulínica para fins estéticos, em locais definidos individualmente nos pacientes, totalizando quatro pontos no lábio superior.

A toxina utilizada foi Dysport® 500U (Ipsen), diluída em soro fisiológico 0,9% na proporção 1:1,7 e mantida sob refrigeração (2o a 8º). Foi aplicada 0,5UI em cada um dos quatro pontos nas rítides periorais do lábio superior, ao longo da borda do vermelhão.

Os pacientes selecionados retornaram para reavaliação após três semanas, quando foram repetidas as medições e realizadas fotografias padronizadas para fins comparativos.

Critérios de avaliação

A avaliação dos resultados foi feita através da análise das variáveis categóricas e contínuas. Foram analisadas as alterações na forma e tamanho dos lábios através de medidas tomadas com paquímetro, a satisfação da paciente com o tratamento através de questionários semiquantitativos e a impressão de especialistas cegados através da avaliação de fotografias padronizadas.

Avaliação estatística

Os dados foram comparados entre os diferentes momentos de avaliação e reavaliação clínica. Para as comparações de variáveis categóricas foram utilizados testes de qui-quadrado de tendência e aderência, e teste exato de Fisher, sendo os dados representados pelos valores absolutos e proporções, e as associações pela razão de chances (odds ratio). Para as comparações de variáveis contínuas foram utilizados testes t de Student pareados e teste de Wilcoxon. A normalidade das distribuições foi avaliada pelo teste de Shapiro-Wilk. As questões semiquantitativas (escala tipo Likert) relacionadas à satisfação com a anatomia dos lábios foram avaliadas quanto à consistência pelo alfa de Cronbach. Construímos um escore com as quatro questões relacionadas à satisfação com a forma dos lábios.

O tamanho amostral inicial foi baseado em um teste t de Student pareado com poder de 80% e erro alfa de 0,05 para detecção de uma diferença média semelhante ao desvio-padrão das medidas quantitativas.

Foram considerados significativos valores de p bicaudal < 0,05.

O projeto foi devidamente aprovado no comitê de ética sob registro número 34745714.9.0000.0100. As despesas da pesquisa correram por conta dos pesquisadores, sem conflitos de interesse.

 

RESULTADOS

Avaliaram-se 19 pacientes, todas do sexo feminino, com idade média de 47 anos (DP -12,1). A dose média total de unidades de toxina aplicadas foi de 43U (DP 3,4), sendo a quantidade colocada nos lábios sempre a mesma, de 0,5U por ponto, em quatro pontos.

As medidas dos lábios foram realizadas conforme a imagem (Figura 1).

Podemos notar aumento na medida três na avaliação pós-procedimento, estatisticamente significante (p = 0,002). Da mesma forma, a relação vermelhão/filtro também foi maior após o procedimento (p = 0,001). A maioria das pacientes (n = 10) se mostrava insatisfeita ou indiferente quanto ao volume labial apresentado antes do procedimento, sendo que 17 julgaram-se satisfeitas ou muito satisfeitas após a realização da toxina (p = 0,003) (Figura 2).

O mesmo valeu para a avaliação da forma labial, na qual 16 pacientes consideraram-se razoavelmente ou muito satisfeitas após o procedimento (p = 0,048), conforme demonstrado nos gráficos abaixo (Gráficos 1-4).

A maior parte das pacientes considerou os lábios moderada ou significativamente mais atraentes após a toxina (p = 0,039), e 15 mulheres notaram a alteração labial como de grande contribuição para melhora global da face. A percepção de aumento do tamanho existiu em todas as pacientes, exceto uma.

Em relação a efeitos colaterais, nenhuma paciente apresentou dificuldade para falar, duas apresentaram alguma dificuldade para comer nas primeiras duas semanas, e quatro apresentaram dificuldade para sorrir. As pacientes foram acompanhadas, e após 30 dias nenhuma mantinha as queixas.

Dessa forma, pode-se calcular o escore de satisfação global com a aparência do lábio, considerando volume, forma, atração e importância na melhora do aspecto do rosto, sendo essa positiva (p = 0,005).

Das 19 incluídas inicialmente 17 (89,5%) fariam a aplicação novamente.

 

DISCUSSÃO

O uso da toxina botulínica do tipo A é procedimento conhecido para melhora de rítides no terço superior da face. Com relação ao terço inferior, porém, apesar de ser frequentemente aplicada, não existem muitos estudos demostrando os efeitos na região labial. A técnica se tornou cada vez mais popular, em parte porque os médicos se sentem confiantes na excelente eficácia e no perfil de segurança demonstrado pela toxina desde 1987 para indicações na face superior, bem como porque eles puderam perceber que hiperatividade muscular e depleção de volume eram importantes determinantes estéticos coexistentes na face média e inferior.

É importante lembrar que a anatomia muscular e as relações teciduais são muito diferentes das encontradas na face superior, fazendo com que as doses utilizadas sejam menores, bem como os pontos de aplicação selecionados com mais cuidado para evitar efeitos indesejados.

Em relação à região perioral, pudemos notar que os lábios são pontos-chave para a aparência estética da face. Com o processo de envelhecimento, as porções laterais dos lábios tendem a ficar menos visíveis e a distância entre a columela e o vermelhão do lábio superior aumenta produzindo lábios finos. Esse processo se torna ainda mais visível em pacientes tabagistas, porém muitas vezes o próprio fator hereditário já pode ser relevante.

Assim como discutido por Carruthers & Carruthers,7 pequenas doses de toxina botulínica podem produzir microparesia localizada do músculo orbicular da boca, reduzindo drasticamente a aparência das linhas periorais.

Para manter a competência da boca, no entanto, é importante realizar uma abordagem conservadora, com dosagem e injeções superficiais. Os autores em questão obtiveram resultados satisfatórios com doses de 2 a 4U de toxina botulínica por lábio (sem utilizar mais de 2U por quadrante labial). Por utilizar toxina de maior dispersão (Dysport), optamos por doses ainda mais conservadoras, e obtivemos resultados também muito satisfatórios.

A literatura ainda ressalta que os cantos dos lábios devem ser evitados porque a injeção nestes locais causa fraqueza indesejável dos elevadores dos lábios, resultando em dificuldade para se alimentar, assobiar e até mesmo propensão a babar. A linha média também é preservada para evitar um achatamento do arco do cupido, razão pela qual optamos pela aplicação somente em quatro pontos.

Foster e Wulc8 também descreveram uma técnica de utilização da toxina botulínica para linhas periorais, muito semelhante à que utilizamos para escolher o sítio de aplicação em nossos pacientes. O paciente é solicitado a franzir o lábio, em movimento de beijo, para que as áreas de contração muscular adjacentes às linhas possam ser marcadas, facilitando a visualização e a técnica.

 

CONCLUSÕES

Houve uma alteração nas medidas verticais do vermelhão superior e do filtro, com aumento do primeiro e redução do segundo. Em nossos pacientes, houve uma elevação do lábio superior levando a um encurtamento do filtro e alongamento do vermelhão. Acreditamos que ao aplicar a toxina na borda do vermelhão, obtém-se relaxamento do músculo orbicular permitindo maior efeito do tônus muscular dos músculos elevadores do lábio superior.

A satisfação das pacientes com a aparência dos lábios conforme avaliada pelas quatro questões somadas (forma, volume, atração e contribuição para a beleza) foi positiva, principalmente quanto ao volume e a considerar atraente.

Os efeitos colaterais foram raros e leves, ocorrendo principalmente para se expressar / sorrir, sendo que 89% delas fariam novamente a aplicação da toxina.

Assim, temos a toxina botulínica como importante aliado no tratamento da região labial, devendo ser lembrada como método promissor na melhora do aspecto geral da face, combinada com outros tratamentos já bem estabelecidos para esse fim.

 

Referências

1. Carruthers A, Carruthers J. History of the cosmetic use of botulinum A exotoxin. Dermatol Surg. 1998;24(11):1168-70.

2. Carruthers A, Carruthers J. Clinical indications and injection technique for the cosmetic use of botulinum A exotoxin. Dermatol Surg. 1998;24(11):1189-94.

3. Loyo M, Kontis TC. Cosmetic botulinum toxin: has it replaced more invasive facial procedures. Facial Plast Surg Clin North Am. 2013;21(2):285-98.

4. Cavallini M, Cirillo P, Fundarò SP, Quartucci S, Sciuto C, Sito G, Tonini D, Trocchi G, Signorini M. Safety of botulinum toxin A in aesthetic treatments: a systematic review of clinical studies. Dermatol Surg. 2014;40(5):525-36.

5. Carruthers A, Carruthers J, Monheit GD, Davis PG, Tardie G. Multicenter, randomized, parallel-group study of the safety and effectiveness of onabotulinumtoxin A and hyaluronic acid dermal fillers (24-mg/ml smooth, cohesive gel) alone and in combination for lower facial rejuvenation. Dermatol Surg. 2010;36 Suppl 4:2121-34.

6. Gordon RW. BOTOX cosmetic for lip and perioral enhancement. Dent Today 2009 May;28(5):94-7.

7. Carruthers J, Carruthers A. Aesthetic botulinum A toxin in the mid and lower face and neck. Dermatol Surg. 2003;29(5):468-476.

8. Foster JA, Wulc AE. Cosmetic use of botulinum toxin. Facial Plast Surg Clin North Am. 1998;6:79-85.

 

Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba – Curitiba (PR), Brasil.


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