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Relato de caso

Utilidade do curativo compressivo elástico no enxerto de pele total nos membros inferiores: uma série de dois casos

Rogerio Nabor Kondo; Suellen Tormina da Silva; Gabriela Bernardi Maia; Leticia Amstalde Bertoncini

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2022140095

Data de submissão: 23/09/2021
Decisão Final: 27/10/2021


Fonte de financiamento: Nenhuma
Conflito de interesses: Nenhum
Como citar este artigo: Kondo RN, Silva ST, Maia GB, Bertoncini LA. Utilidade do curativo compressivo elástico no enxerto de pele total nos membros inferiores: uma série de dois casos. Surg Cosmet Dermatol. 2022;14:e20220095


Abstract

A reconstrução com enxertia para defeitos resultantes de exérese de carcinoma espinocelular nos membros inferiores é um grande desafio para o cirurgião dermatológico, tendo em vista que uma pele muito fina para a área receptora, a não homogeneidade da vascularização local e a insuficiência venosa transitória dificultam a integração da pele enxertada nessas regiões. Para o sucesso desse tipo de procedimento, podem ser usadas algumas técnicas para reparar essas dificuldades, como um curativo compressivo elástico que utilizamos nos primeiros dias de pós-operatório de enxerto de pele total no pé e na perna, com bons resultados.


Keywords: Carcinoma de células escamosas; Pé; Perna (Membro); Sobrevivência de enxerto


INTRODUÇÃO

O carcinoma espinocelular (CEC) é o segundo tipo mais comum de câncer da pele.1 Quando localizado nos membros inferiores, ao realizarmos a excisão completa, o defeito resultante pode requerer a confecção de retalho ou enxerto para o fechamento. Há maior preferência de reconstruções nessa região por retalho em vez de enxertia, em virtude da manutenção de uma vascularização local.2

Além de a pele enxertada ser muito fina para área do defeito dos membros inferiores, a não homogeneidade da vascularização da região receptora2 e a insuficiência venosa e arterial superficial transitória ocasionada pela própria excisão cirúrgica do local dificultam a integração do enxerto.3

Para melhorar as chances da integração do enxerto nos membros inferiores, algumas opções técnicas, como a terapia de pressão negativa (TPN), que consiste em fornecer pressão subatmosférica no leito da ferida, têm sido usadas.4 A TPN melhora o exsudato da insuficiência venosa transitória superficial e promove a angiogênese local.

O objetivo do presente relato é demonstrar o uso da atadura elástica (AE) sobre o curativo de Brown, com a finalidade de melhorar o conforto e a proteção para o paciente. Reportamos dois pacientes nos quais utilizou-se a técnica de autoenxerto (no pé e na perna), com boa integração e com bom resultado estético e funcional.

 

MÉTODOS

Foram tratados dois pacientes com CEC no pé esquerdo e perna direita:

Paciente 1: Paciente feminino, 78 anos, fototipo III, procedente de Londrina (PR), com placa eritematosa, 18mm x 19mm, no pé esquerdo, compatível com CEC pelo histopatológico. Foi realizada a exérese da lesão com margens de segurança de 5mm, com margens livres pelo exame anatomopatológico. O defeito resultante foi de 2,9mm no maior eixo e optou-se pelo enxerto (Figuras 1, 2, 3 e 4).

Paciente 2: Paciente masculino, 76 anos, fototipo III, procedente de Londrina (PR), com placa eritematosa, 29mm x 15mm, em perna direita, compatível com CEC in situ pelo histopatológico. Foi realizada a exérese da lesão com margens de segurança de 5mm, com margens livres pelo exame anatomopatológico. O defeito resultante foi de 39mm no maior eixo e optou-se por enxerto (Figuras 5, 6,7 e 8).

Descrição da técnica utilizada nos pacientes 1 e 2 (Figuras 1 a 8):

a) Paciente em decúbito dorsal horizontal;

b) Marcação com azul de metileno ou caneta cirúrgica da lesão com margem de 5mm (Figuras 1 e 5);

c) Antissepsia com polivinil-iodina 10% tópico;

d) Colocação de campos cirúrgicos;

e) Anestesia infiltrativa com lidocaína 2% com vasoconstritor;

f) Incisão com lâmina 15 da lesão e exérese em bloco da peça;

g) Hemostasia;

h) Retirada de área doadora (enxerto de espessura total). Paciente 1, área doadora da região de fossa ilíaca esquerda. Paciente 2, área doadora de face interna de braço;

i) Posicionamento do enxerto na área receptora com mononylon 4.0, pontos cardinais com uma das pontas mais longas para fixação do curativo de Brown. Entre os pontos cardinais, pontos simples com mononylon 4.0 (Figuras 2, 3, 6 e 7A);

j) Fixação do curativo de Brown (Figuras 3A e 7A);

k) Envolvimento com atadura elástica, duas camadas Coban® 3M, 35-40mmHg (Figuras 3B, 7B e 8A).

 

RESULTADOS

Paciente 1: Paciente evoluiu sem intercorrências nos primeiros dias de pós-operatório. Houve uma evolução com boa cicatrização e pega, com resultado estético satisfatório no pós-operatório tardio (Figuras 4A e 4B).

Paciente 2: Paciente evoluiu sem intercorrências no pós-operatório. Houve uma boa cicatrização e pega, sem epidermólise e sem necrose no pós-operatório (Figura 8B).

 

DISCUSSÃO

Meias elásticas e curativos compressivos são terapias descritas nos tratamentos de úlceras por insuficiências venosas ou mistas, pois, além de diminuírem o edema, melhoram a perfusão local.5 Uma excisão cirúrgica de membros inferiores ocasiona uma temporária insuficiência venosa superficial e arterial3 que, por si só, leva ao insucesso do enxerto.

Dispositivos que promovem terapia de pressão negativa (TPN) também podem facilitar a pega do enxerto. A pressão subatmosférica aplicada reduz o edema e promove a angiogênese local.4 O problema da TPN é seu alto custo, o que inviabiliza sua utilização, pelo menos no Serviço ao qual pertencemos.

Os presentes autores utilizaram uma bandagem com atadura elástica (AE), que é de baixo custo (Figura 7B). Mantivemos a bandagem por cinco dias sobre o curativo de Brown e por mais dois dias após a retirada do mesmo (Brown), no total de sete dias de pós-operatório (tempo de instalação local de uma circulação verdadeira). A compressão adequada do membro

(segundo informações do fabricante, duas camadas Coban® 3M, fornece compressão de 35-40mmHg por até sete dias) melhorou o bombeamento venoso com redução do edema local, sem prejudicar a neoformação vascular (Figuras 4A e 8B).

Um sinal de que houve melhora na insuficiência venosa é observado na paciente 1. Houve a diminuição das varicosidades do pé ao redor do enxerto enquanto a mesma usou a AE (Figura 4A). Além disso, a bandagem ajudou a proteger o curativo de Brown contra traumas externos (Figuras 3A e 3B).

Antes de a técnica da AE ser implementada pelos presentes autores, o sucesso da sobrevida do enxerto nos membros inferiores era baixo. Em casos nos quais o retalho não era possível devido à falta de mobilidade do tecido, confeccionávamos o enxerto na intenção de deixá-lo como curativo biológico. A epidermólise e a necrose eram visualizadas na retirada do curativo de Brown.

Os pacientes reportados no presente estudo que utilizaram AE sobre o curativo de Brown tiveram maior estabilidade da área enxertada, com conforto e proteção local. Houve uma boa integração e bom resultado estético e funcional.

 

CONCLUSÃO

A utilização da AE pode ser boa opção para o sucesso de enxerto nos membros inferiores.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Rogerio Nabor Kondo 0000-0003-1848-3314
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Suellen Tormina da Silva 0000-0002-4687-8332
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Gabriela Bernardi Maia 0000-0002-3730-8207
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito.

Leticia Amstalde Bertoncini 0000-0002-4687-8332
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS

1. Gheno V, Kondo RN, Lena CP. Squamous cell carcinoma of the lower lip: two cases of bilateral reconstruction with Gilles fan flap associated with zetaplasty. Surg Cosmet Dermatol. 2020;12(2):182-6.

2. Haddad Filho D, Siervo JV, Brunhara JN, Silva EL, Vieites L. Alternativas de retalhos cutâneos para lesões dermatológicas na perna. Surg Cosmet Dermatol. 2017;9(2):247-55.

3. Fonseca FP. Doppler ultra-som nas doenças venosas. In: Maffei FHA, Lastória S, Yoshida WB, Rollo HA, editores. Doenças vasculares periféricas. Rio de Janeiro: Medsi; 2002. p. 471-7.

4. Landau AG, Hudson DA, Adams K, Geldenhuys S, Pienaar C. Full- thickness skin grafts: maximizing graft take using negative pressure dressings to prepare the graft bed. Ann Plast Surg. 2008;60(6):661-6.

5. Mosti G, Iabichella ML, Partsch H. Compression therapy in mixed ulcers increases venous output and arterial perfusion. J Vasc Surg. 2012;55(1):122-8.


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