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Artigo de revisão

Uso de tecnologias a laser e luz intensa pulsada no tratamento da ocronose exógena: uma revisão da literatura

Pedro de Freitas Silva Torraca; Estela Mari Sandini; Tania Christina Marchesi de Freitas

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2021130002

Data de Submissão: 24/03/2021
Decisão final: 22/06/2021


Fonte de financiamento: Nenhuma
Conflito de interesses: Nenhum
Como citar este artigo: Torraca PFS, Sandini EM, Freitas TCM. Uso de tecnologias a laser e luz intensa pulsada no tratamento da ocronose exógena: uma revisão da literatura. Surg Cosmet Dermatol. 2021;13:e20210002


Abstract

A ocronose exógena é um quadro de hiperpigmentação cutânea por acúmulo de substâncias derivadas de fenol na pele ou mucosas, sem acometimento de outros tecidos. Ocorre, principalmente, por uso de clareadores, sendo mais frequente a hidroquinona como despigmentante. As lesões apresentam difícil tratamento, sendo resistentes a diversas abordagens. Por vezes, é necessário utilizar tecnologias com laser ou luz intensa pulsada para atingir algum grau de melhora. O presente trabalho realizou revisão de literatura entre janeiro de 1990 e julho de 2020, organizando publicações acerca do uso destas tecnologias na ocronose exógena.


Keywords: Hiperpigmentação; Lasers; Ocronose; Terapia de luz pulsada intensa


INTRODUÇÃO

É descrita como ocronose exógena (OE) a condição de hiperpigmentação de pele e mucosas por depósitos de substâncias derivadas do fenol, mais comumente após uso de cremes clareadores contendo hidroquinona, resorcinol tópico ou uso intramuscular ou oral de antimaláricos.1,2,3,4 Em contraste com a ocronose endógena, oriunda da deposição de ácido homogentísico em partes moles e tecidos internos, a ocronose exógena não apresenta acometimento destes locais. Considerada incomum5, a OE apresenta incidência moderada na África do Sul6 , com relatos isolados na Ásia, África e América Latina em pacientes com ascendência hispânica e fototipos altos.7,8,9

A OE recebeu tal nomenclatura em 1865 por Rudolph Virchow.10,11 Foi relacionada ao uso de creme clareador com hidroquinona em 1975 por Findlay6 e ao uso de fenol para tratamento de úlcera de perna em 1912 por Beddard e Plumtre.12

Uma revisão recente de casos em literatura americana demonstrou um total de 39 relatos de ocronose exógena nos Estados Unidos, de janeiro de 1983 até junho de 2020, sendo 18 destes com a descrição do surgimento a partir do uso de cremes clareadores e, dentre esses, 14 com hidroquinona na composição em concentrações variando de 2 a 7,5%, com tempo de aplicação de dois meses até 30 anos para o surgimento das lesões.2,3,8

Clinicamente, a OE apresenta-se como máculas ou áreas de hiperpigmentação assintomáticas preto-azuladas ou amarelo-acastanhadas em regiões fotoexpostas, como face, pescoço, dorso, áreas extensoras de membros superiores, porções distais de antebraços, pernas, dorso das mãos ou pés.13 Em nível histológico, o quadro é similar ao de ocronose endógena, contudo sem acúmulo de pigmento em articulações, ossos, urina, demais secreções ou tecidos.14,15

Para alguns autores, ocorre por resistência de melanócitos ao efeito de clareadores, com consequente derrame pigmentar na derme papilar e acúmulo deste pigmento em fibroblastos, resultando em presença de fenóis em fibras elastóticas e hipercromia destas.6 Outros autores defendem que a hidroquinona oxida-se à quinona formando indóis hidroxilados similares a precursores de melanina que se depositam.16 Um terceiro grupo acredita que altas concentrações de hidroquinona estimulam melanócitos a produzir mais melanina.17 A teoria mais amplamente aceita, entretanto, é a de que a hiperpigmentação resulta da inibição da enzima ácido homogentísico oxidase pela hidroquinona, causando acúmulo local de ácido homogentísico, que se polimeriza, formando pigmento ocre na derme papilar, como ocorre em outros tecidos nos quadros de ocronose endógena por um defeito estrutural primário desta enzima.18

Lesões de ocronose exógena observadas ao dermatoscópio foram descritas inicialmente em 200819,20 como áreas de glóbulos azul-acinzentados ou castanhos a negros, amorfos, com pontos de obliteração folicular, diferentemente de quadros de melasma em que a dermatoscopia demonstra padrão de pigmentação reticular, acentuação de pseudorrede, grânulos e glóbulos acastanhados, poupando folículos.21

Em nível histológico, as lesões apresentam fibras colágenas com coloração amarelo-acastanhada em formato de banana, quadros de degradação dessas fibras e formação de milium coloide em meio a infiltrado inflamatório com plasmócitos, histiócitos e células gigantes multinucleadas no desenvolvimento das lesões.16,22

Em 1979, Dogliotti e Leibowitz classificaram estágios clínicos da ocronose exógena em: estágio I (lesões com eritema e alguma pigmentação); estágio II (hiperpigmentação, milium coloide hiperpigmentado, atrofia); e estágio III (presença de elementos eruptivos papulonodulares em uma lesão com características de estágio II e características inflamatórias em lesões mais recentes, sendo menos pronunciadas em lesões mais tardias).23 Em 1986, Phillips et al. classificaram em leve, moderada e severa a ocronose em uma série de 395 casos descritos em pacientes avaliados por serviço de Dermatologia de hospital em Joanesburgo, na África do Sul, por período de um ano. Foram consideradas como grau leve lesões apenas com alteração de hiperpigmentação e hipertrofia da pele; como grau moderado, quando na presença de pápulas hipercrômicas; e grau grave as lesões com pápulas hipercrômicas caviar-like, coalescentes em placas.8 Em uma terceira classificação, em 1989, Hardwick et al. consideraram cinco graus de apresentações, sendo grau 1 com máculas hipercrômicas, grau 2 com máculas e micropápulas, grau 3 com depósitos escurecidos e pápulas maiores, grau 4 com milium coloide de 1mm ou mais e grau 5 com nódulos queloideanos e cistos hipercrômicos.24

Segundo a Sociedade Europeia de Laser em Dermatologia (ESLD), o tratamento de ocronose exógena é desafiador, com resultados imprevisíveis, muitas vezes abaixo das expectativas. O uso de fotoproteção torna-se elemento relevante na abordagem inicial ao retardar a progressão das lesões e impedir o surgimento de novas áreas hiperpigmentadas.15 Em alguns casos, houve resposta parcial com uso tópico de ácido retinoico e glicólico em baixas concentrações bem como uso oral de tetraciclina em apresentações papulares ou com lesões sarcoidose-like.25 Em revisão recente do uso destas tecnologias, a ESLD recomenda tais terapêuticas associadas a múltiplas sessões de tecnologias a laser, combinando modalidades ablativas fracionadas, como CO2 ou Erbium 2940nm, com Q-Switched 1064nm para resultados melhores e mais rápidos.26,15

O presente trabalho realiza revisão de publicações contendo abordagem terapêutica de quadros de ocronose exógena com uso de tecnologias a laser ou luz intensa pulsada, demonstrando os protocolos descritos e resultados obtidos a partir de 1990 até julho de 2020.

 

METODOLOGIA

Quatro bases de dados foram acessadas no período de 15 de junho até 5 de agosto de 2020 para a busca: Embase, MEDLINE/Pubmed, LILACS e Biblioteca Cochrane. Os idiomas selecionados foram Inglês, Espanhol e Português. Em primeira etapa, as palavras-chave utilizadas foram ochronosis, exogenous ochronosis, ocronose, ocronosis e geraram um total de 1.377 resultados na plataforma Embase, 978 resultados na MEDLINE/Pubmed, 32 resultados na plataforma LILACS e 16 resultados na Biblioteca Cochrane.

Após esta etapa, inseriram-se os termos treatment, therapy, tratamento, tratamiento, efficacy, upade laser e intense pulsed light na busca, para resultados com cruzamento entre tais palavras-chave e obtiveram-se: 79 resultados na plataforma Embase, 19 resultados na plataforma MEDLINE/Pubmed, dois resultados na plataforma LILACS e um resultado na Biblioteca Cochrane. Considerando-se os objetivos da revisão, foram selecionados trabalhos citando o uso de tecnologias a laser e luz intensa pulsada para tratamento de quadros de ocronose exógena publicados nestas bases de dados a partir de janeiro de 1990 até julho de 2020.

Desta forma, os critérios de seleção foram de publicações na forma de artigos científicos sobre ocronose exógena independentemente de sua causa, com uso de laser ou luz intensa pulsada para sua abordagem em algum momento da terapêutica descrita. Foram excluídos trabalhos sobre outras doenças, outras formas de ocronose ou demais terapêuticas que não abordassem o uso de lasers ou luz intensa pulsada. Todo o método de pesquisa e seleção dos artigos contendo os termos descritos foi repetido por pesquisador secundário, seguindo a mesma metodologia, gerando os mesmos dados e artigos.

 

RESULTADOS

Entre diversas modalidades terapêuticas, os lasers são considerados excelentes opções para tratamento de lesões hiperpigmentadas, promovendo fototermólise seletiva do pigmento.27 Os lasers mais utilizados para este fim são Q-Switched Ruby (QSRL), Q-Switched Alexandrite 755nm, Q-Switched Nd:YAG 1064nm, Q-Switched Nd:YAG 532nm, lasers de picossegundos28,29 e luz intensa pulsada com filtros específicos.30 Tecnologias como laser Erbium-Glass não ablativo 1550nm, Erbium:YAG ablativo 2940nm,31 laser de CO2 10600nm32 e laser de Thulium 1927nm33 têm a água como cromóforo e podem ser alternativas tanto na vaporização de pigmentos quanto na possibilidade de facilitar a penetração de agentes despigmentantes. Em 2015, foi publicada revisão sobre modalidades terapêuticas nos quadros de ocronose exógena sendo as principais tecnologias utilizadas para este fim os lasers Q-Switched Ruby (694nm), Q-Switched Alexandrite (755nm), Q-Switched Nd:YAG (1064nm), CO2 e luz intensa pulsada.1 Apenas recentemente, laser de picossegundos foi também relatado como opção para tratamento de lesões hiperpigmentadas (Tabelas 1) .34,35,36

Em 1990, um caso de ocronose exógena relatado por Diven et al. em face de paciente feminina, de 53 anos, afro-americana, foi tratado com dermoabrasão e laser de CO2. Este resultou na primeira descrição de uso de tecnologias a laser para abordagem de ocronose. Após uso de creme de hidroquinona 2% por dois a três meses, a paciente apresentou escurecimento progressivo da área. Tentativas de abordagem com tretinoína gel tópico 0,025%, crioterapia, peeling com ATA 50% não resultaram em melhora. Optou-se, portanto, pela dermoabrasão de toda a face, seguida de aplicação de CO2 3-6W em modo desfocado nas regiões perioculares, nariz e fronte, com resultado satisfatório.32

Apenas dez anos depois, Kramer et al. relataram quadro de ocronose exógena tratado com tecnologia a laser em arco zigomático bilateral de mulher de 50 anos, de origem hispânica. Na ocasião, a paciente citou uso de creme de hidroquinona 2% na área por 30 anos para tratamento de melasma. A ocronose exógena foi diagnosticada histologicamente com depósitos de pigmento amarelo a marrom e degeneração de fibras colágenas na derme, além de infiltrado linfocítico esparso. Optou-se por uso de Q-Switched Ruby laser 694nm (7J/cm2) 5mm spot size, com descrição de melhora do quadro após sessão.37

Elizabeth Arnold Spenceri, em publicação sobre Desordens de Pigmentação em 2003, sumariza como principal tratamento da ocronose exógena a descontinuação do fator desencadeante e aplicação de laser Q-Switched em casos refratários.38 No ano seguinte, em 2004, Bellew e Alster trataram dois casos de ocronose exógena com laser Q-Switched 755nm Alexandrite. O primeiro foi de paciente feminina de 47 anos, afro-americana, com história de lesões hipercrômicas em face há oito anos, com piora após uso de cremes clareadores na área por vários meses, sem especificar o período de tempo. O segundo, de paciente masculino de 46 anos, ascendência indígena, com máculas hipercrômicas em face há sete anos, com piora após um ano de uso de creme clareador contendo hidroquinona. No primeiro caso, as lesões foram inicialmente abordadas com Q-Switched 755nm Alexandrite em fluência de 7J/cm2 e spots de 3mm a cada 15 dias, com aumento da fluência até 8J/cm2 (média de 7,8J/cm2), apresentando clareamento após seis sessões. Já no segundo caso, a fluência inicial foi de 6J/cm2 e final de 7J/cm2 (média de 6,9J/cm2) em um total de quatro sessões, com quatro meses de intervalo para resolução de hiperpigmentação pós-inflamatória, considerando a alta exposição solar do paciente descrito. Ambos apresentaram melhora expressiva das lesões, com clareamento significativo, como relatam os autores.39

Em 2006, Huerta Brogeras e Sanchés-Vieira apresentaram paciente feminina de 70 anos, com história de melasma em face e uso de creme clareador de hidroquinona 2% por seis meses, apresentando quadro de hiperpigmentação em região malar bilateral e pálpebras. Exame anatomopatológico de área hiperpigmentada demonstrou deposição de glóbulos amarelo-acastanhados na derme, sendo confirmado diagnóstico de ocronose exógena. Para o tratamento optou-se por laser Q-Switched Nd:YAG 1064nm com sessões ainda em andamento na data da publicação do relato.40

Dois anos depois, Charlín et al. publicaram quatro casos de ocronose exógena, desencadeados por uso tópico de hidroquinona para melasma. Em um dos casos, paciente era feminina, de 56 anos de idade, com fototipo V e quadro de melasma há 25 anos, tratado com hidroquinona 6% sem precisar o tempo de uso. Neste caso, outras medicações tópicas não foram relatadas, e a paciente apresentava escurecimento de quase toda a face, exceto região superior dos lábios e fronte. Foi realizado teste terapêutico com laser Q-Switched Nd:YAG 1046nm, sem melhora. Os autores não descrevem parâmetros utilizados nem protocolo de aplicação.19

Gil et al., em 2010, relataram caso de ocronose exógena em paciente feminina de 63 anos, com fototipo V, desenvolvido após uso de creme clareador com hidroquinona 2 a 3% e oxibenzona 2% por vários anos, sem precisar o período de uso. O diagnóstico foi confirmado histologicamente por presença de depósitos de material amarelo-acastanhado em derme papilar e média. O tratamento escolhido foi com luz intensa pulsada 645nm, seis milissegundos, 20-22J/cm2, associado a creme despigmentante com ácido kójico 4% e ácido salicílico 0,2%, com clareamento médio das lesões após dois meses de uso tópico e seis sessões de luz intensa pulsada.41

Também em 2010, França et al. descreveram quadro de ocronose exógena em paciente feminina de 40 anos de idade, com máculas e pápulas hipercrômicas em região malar e histórico de uso de hidroquinona tópica por oito anos, sem detalhar a concentração. Um exame histopatológico revelou filamentos amarelo-acastanhados em derme papilar, e investigação de depósitos em outros tecidos resultou negativa, afastando quadro endógeno. Neste relato, a abordagem foi iniciada com quatro sessões de laser Q-Switched Nd:YAG 1064nm, spot de 4mm e fluência variando entre 2,9-3,05J/cm2, sem resposta satisfatória. Após, optou-se por seis sessões de laser de CO2 ultrapulsado, com intervalo de um mês entre cada sessão, em fluência de cinco watts com alguma resposta nas lesões. Por fim, associou-se luz intensa pulsada (LIP) 36J — 10ms em área malar, seguida de microdermoabrasão e peeling químico com hidroquinona 5%, ácido retinoico 5% e ácido salicílico 14%. As lesões apresentaram resolução apenas após mais três sessões, com intervalos de 30 dias de luz intensa pulsada (LIP) 36J — 10ms e peeling de ácido tricloroacético (ATA) 20%.13

Kanechorn-Na-Ayuthaya et al., em 2013, avaliaram a combinação entre o uso de Q-Switched Nd:YAG e laser de CO2 fracionado no tratamento de ocronose exógena. Estas modalidades foram aplicadas em três casos. No primeiro, em paciente feminina de 67 anos, fototipo V, com histórico de melasma de face há 28 anos e uso de creme clareador por longos períodos sem especificar o tempo, com escurecimento de áreas malares e zigomáticas. Recebeu três sessões de Q-Switched Nd:YAG 1064nm em fluência variando de 1,9—2,2J/cm2 e uma sessão de laser de CO2 fracionado totalizando quatro meses de aplicações. No segundo caso, paciente feminina de 58 anos, foto-tipo III, com histórico de melasma recalcitrante por 28 anos e uso de creme clareador de hidroquinona por longo período, apresentava hipercromia em região temporal, malar, palpebral e perilabial. Para o tratamento, recebeu também três aplicações de laser Q-Switched Nd:YAG 1064nm, sendo uma a cada 30 dias, com fluência inicial de 1,9J/cm2 e aumento progressivo desta em múltiplas passadas até surgimento de petéquias ou púrpuras. Após a terceira aplicação, foi realizado laser de CO2 uma única vez ao final de quatro meses de tratamento. Três meses após, realizou-se, ainda, aplicação de pulse-dye laser para telangiectasias nas áreas. No terceiro caso descrito, em paciente feminina de 66 anos, fototipo IV e histórico de 20 anos de melasma com uso de cremes clareadores e queixa de escurecimento de região malar bilateralmente. Neste caso, optou-se por laser Q-Switched Nd:YAG 1064nm em duas sessões com intervalo de 30 dias, resultando em púrpura após cada aplicação. Laser de CO2 fracionado foi realizado após a segunda sessão de Q-Switched. Todos os casos apresentaram melhora significativa da pele, com clareamento das lesões hipercrômicas e rejuvenescimento da pele com melhora das telangiectasias.26

No mesmo ano, Tan descreveu seis casos de ocronose exógena tratados com sucesso após sessões de Q-Switched Nd:YAG 1064nm. Seis mulheres com idades entre 37 e 69 anos, histórico de melasma e uso de cremes clareadores, sendo hidroquinona em dois destes, apresentavam hipercromia em áreas de aplicação. O diagnóstico foi confirmado com exame histopatológico, e os quadros foram classificados de acordo com método de estadiamento da ocronose descrito por Dogliotti e Leibowitz, sendo estágio I lesões com eritema e alguma pigmentação; estágio II hiperpigmentação, milium coloide hiperpigmentado, atrofia; estágio III elementos eruptivos papulonodulares em uma lesão com características de estágio II.23 Das pacientes descritas, quatro apresentavam estágio I; uma, estágio II; e uma, estágio III. Os quadros foram tratados com laser Q-Switched Nd:YAG 1064nm em fluência de 1,2J/cm2 8mm spot size, em quatro passadas nas áreas hiperpigmentadas, que incluíam lesões de ocronose exógena e melasma. Posteriormente, apenas as áreas consideradas como de ocronose exógena receberam novas aplicações em fluência de 4-6J/cm2 em 4mm spot size, sendo duas ou três aplicações em stacks em cada mácula até surgimento de eritema ou petéquias. As pacientes em estágios II e III demonstraram importante melhora das áreas de ocronose exógena após oito e 16 sessões, respectivamente. Já as pacientes em estágio I não apresentaram resolução das lesões, mas leve melhora na cor após o tratamento.42

Em 2014, Liu et al. relataram caso de ocronose exógena em paciente feminina de 50 anos, fototipo IV e histórico de máculas hipercrômicas em áreas malares tratadas com cremes clareadores por longos períodos, muitas vezes com hidroquinona, em diversas concentrações, que apresentavam escurecimento há um ano da descrição, mesmo com fotoproteção adequada. À dermatoscopia, as áreas apresentavam pontos azul-acinzentados esparsos, glóbulos de mesma coloração e obliteração de óstios foliculares de forma homogênea. Exame histológico demonstrou fibras colágenas dilatadas e basofílicas, fragmentadas e com pigmentação ocre. O quadro de ocronose exógena foi classificado em estágio II de Dogliotti, e a paciente recebeu seis sessões de laser Q-Switched Nd:YAG 1064nm com fluência entre 6-9J/cm2, sem melhora.43

Também em 2014, Lee e Weiss apresentaram caso de ocronose exógena em mulher de 48 anos, após anos de uso de creme clareador para discromia em face. Para o tratamento, optou-se por luz intensa pulsada em ondas de 570nm, com fluência de 12J/cm2 e pulso de 15 milissegundos, sendo sessões a cada seis semanas, sem descrição do total de sessões, com observação de clareamento das máculas desde a primeira aplicação.44 No ano seguinte, Ko e Wang relataram ocronose exógena em paciente feminina de 50 anos, após uso de creme clareador contendo hidroquinona 4%. Foi realizado teste de resposta terapêutica com aplicação de laser Q-Switched Nd:YAG 1064nm em fluência de 5,3J/cm2 e spot size de 3mm na região zigomática esquerda e laser Q-Switched Alexandrite 755nm em fluência de 8,5J/cm2 e spot size de 3mm em região zigomática direita. Após duas aplicações com intervalo de cinco semanas, ambas as áreas apresentaram escurecimento indicando falha terapêutica.45

Em 2016, Carvalho et al. descreveram lesões de ocronose tipo pápulas e máculas hipercrômicas em fronte, dorso nasal e regiões malares de paciente feminina de 46 anos, fototipo V, em uso de hidroquinona tópica 4% há cinco anos para tratamento de melasma em face. Após afastar ocronose endógena por ausência de depósitos pigmentares em outros tecidos, dores articulares e alterações urinárias, foi iniciada aplicação de laser CO2 fracionado em toda a face, com tip de 120mm, energia de 120mJ e densidade de 150 pontos por cm2, em sessões mensais por um ano, totalizando 12 aplicações e melhora significativa do quadro.46

Méndez Baca et al., em 2018, detalharam caso de mulher de 55 anos, fototipo IV, com lesões de ocronose exógena em região malar bilateral ao relatar surgimento de máculas azul-acinzentadas na área após aplicação de creme clareador contendo hidroquinona, por cinco anos, para tratamento de lesões hiperpigmentadas. O quadro fora abordado previamente com luz intensa pulsada associada a despigmentantes com hidroquinona 4%, ácido kójico, ácido fítico, ácido ferúlico, ácido cítrico, assim como pimecrolimus tópico e fotoprotetores, sem melhora. Optou-se, então, por uso de laser de picossegundo fracionado não ablativo 1064nm e 532nm, em fluência inicial de 1,30 e 0,18J/cm2, com aumento desta em 0,20/0,02J/cm2 a cada sessão, até fluência máxima de 2,9/0,30J/cm2. As sessões ocorreram a cada dois meses, com aplicações até obtenção de eritema facial uniforme. Após nove sessões, houve melhora da coloração e da textura da pele.47

Em 2019, Lee et al. relataram caso de ocronose exógena em mulher de 66 anos com lesões hiperpigmentadas perilabiais e em escleras há um ano. Para as lesões de pele, optou-se por tratar com laser de CO2 e Q-Switched Nd:YAG na mesma sessão, sem descrição dos parâmetros utilizados. Após três aplicações, a paciente perdeu seguimento por ausência de resposta.48

 

CONCLUSÃO

Apesar do extenso uso de clareadores com hidroquinona na Dermatologia, os relatos de ocronose exógena não são frequentes. A dificuldade de tratamento das lesões hipercrômicas reforça o conceito da necessidade de múltiplas abordagens terapêuticas para resultados satisfatórios. Neste contexto, o uso de lasers ou terapias com luz podem ser uma alternativa promissora, contudo são diversas as modalidades de tecnologias usadas sem um protocolo específico.

A grande maioria dos trabalhos na literatura sobre o tópico refere-se a casos isolados de uso de lasers ou tecnologias de luz diferentes, sem respeitar uma padronização tanto na avaliação clínica da resposta quanto nas modalidades selecionadas. A necessidade de estudos populacionais, considerando número maior de casos, de padronização na avaliação, classificação de lesões de ocronose exógena e tratamento, torna-se, portanto, necessária para maior esclarecimento.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Pedro de Freitas Silva Torraca 0000-0002-8417-0685
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

Estela Mari Sandini 0000-0002-2362-396X
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Tania Christina Marchesi de Freitas 0000-0002-5609-5884
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

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