Dalv a Regina Neto Pimentel; Rafael Tomaz Gomes; Cleonic e Hirata
Data de recebimento: 07/08/2020
Data de aprovação: 02/11/2020
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum
Trabalho realizado no Ambulatório de Estomatologia - Departamento de Dermatologia da Escola Paulista de Medicina (UNIFESP)
INTRODUÇÃO: o lago venoso é uma ectasia venosa que ocorre geralmente nos lábios e na mucosa oral de idosos. Embora a escleroterapia seja um dos tratamentos mais indicados para esta condição, esta técnica é pouco utilizada entre os dermatologistas. Além disso, a concentração do agente esclerosante, a dose e o modo de aplicação não estão padronizados.
OBJETIVOS: relatar o uso do oleato de etanolamina a 5% (OE5%) como agente esclerosante para o tratamento do lago venoso oral e sugerir um protocolo de escleroterapia.
MÉTODOS: foi utilizado em dez pacientes consecutivos um protocolo padronizado para tratamento de lago venoso oral, baseado na experiência de um Ambulatório Universitário de Dermatologia, especializado em Estomatologia. Aplicou-se o OE5%, em injeções intralesionais profundas e centrais, com volume predeterminado, proporcional às dimensões da lesão.
RESULTADOS: seis pacientes tiveram regressão total da lesão com uma sessão. Outros três pacientes alcançaram regressão satisfatória com duas sessões mensais e uma paciente necessitou de três sessões mensais. Todos os participantes relataram edema ou queimação por um a três dias.
CONCLUSÃO: o tratamento do lago venoso oral com OE5% é uma técnica segura e eficaz que pode ser usada na prática clínica do dermatologista.
Keywords: Escleroterapia, Lago Venoso, Oleato de Etanolamina.
O lago venoso é uma ectasia venosa que aparece principalmente no lábio inferior, mas pode ocorrer também na mucosa oral, sendo mais frequente no idoso.1 É geralmente assintomático, de tamanho variável, e pode cursar com comprometimento estético ou sangramento após trauma local.1,2
A escleroterapia é uma técnica conservadora que consiste na injeção intralesional de agentes esclerosantes que levam à inflamação dos vasos seguida de oclusão e esclerose vascular, resultando em regressão da lesão.2, 3
Embora a escleroterapia seja um tratamento acessível, eficaz e com baixo risco de complicações, a concentração do agente esclerosante, a dose e o modo de aplicação não são completamente padronizados no tratamento do lago venoso.4,5
O objetivo do presente artigo é relatar o uso de oleato de etanolamina a 5% (OE5%) como agente esclerosante para o tratamento do lago venoso oral, tanto do lábio quanto da mucosa oral, e sugerir um protocolo de escleroterapia baseado na experiência do nosso serviço.
Descrevemos a seguir o protocolo de tratamento para lago venoso oral que utiliza OE5% como agente esclerosante (Ethamolin®, Farmoquímica - Brasil). A técnica foi utilizada em 10 pacientes consecutivos no atendimento do Ambulatório de Estomatologia do Departamento de Dermatologia da UNIFESP durante o ano de 2019 (Quadro 1).
O procedimento é contraindicado na gestação, em diabéticos não controlados e na vigência de infecção no sítio de aplicação.2-3
A maioria dos pacientes era do sexo feminino (7/10) e idade maior de 50 anos (9/10). O lago venoso foi observado no lábio inferior em 6/10 pacientes, no lábio superior em 1/10 paciente e em 3/10, na mucosa oral, com tamanho que variava entre 3 a 10mm de diâmetro. Os pacientes relataram serem lesões assintomáticas com tempo de aparecimento maior de cinco anos. Alguns indivíduos referiram trauma local acidental com sangramento discreto.
Para a maioria dos pacientes foi necessária apenas uma aplicação de OE5% (6/10) (Figura 1). Outros três pacientes alcançaram regressão satisfatória com duas sessões mensais e uma paciente necessitou de três sessões mensais (Tabela 1). A regressão completa das lesões foi observada na grande maioria dos casos (9/10), sendo que, em um caso, a paciente ficou satisfeita com a regressão apenas parcial.
Todos os pacientes relataram desconforto após a aplicação do agente esclerosante, como dor, edema, vermelhidão e/ou queimação, que duraram de um a três dias (Figura 2). Em um caso, ocorreu ulceração e necrose locais devido ao fato de a aplicação ter sido mais superficial, com resolução em sete a 10 dias sem deixar cicatrizes (Figura 3).
O diagnóstico do lago venoso oral é baseado nas características clínicas e na história da lesão. Vitropressão, dermatoscopia com luz polarizada, aspiração e exames de imagem também podem constituir recursos acessórios para o diagnóstico e o planejamento do tratamento em alguns casos.3,6,8
Histologicamente, podem ser observadas vênulas irregulares dilatadas de paredes finas localizadas próximas ao tecido epitelial. O diagnóstico diferencial inclui nevo melanocítico, mácula melanótica, melanoma maligno, granuloma piogênico e sarcoma de Kaposi.2,4,6
As modalidades de tratamento do lago venoso incluem eletrocoagulação, excisão cirúrgica, laserterapia, coagulação por infravermelho, crioterapia e escleroterapia.5-8 O OE5% é um dos agentes esclerosantes mais utilizados no tratamento das lesões vasculares e o mesmo é descrito na literatura como um método seguro e eficaz em lesões situadas em diversas regiões do corpo.7-10
Em nosso Serviço, utilizamos a escleroterapia para o tratamento do lago venoso oral há mais de 10 anos com bons resultados. Apresentamos 10 pacientes atendidos consecutivamente e que alcançaram resolução completa em 90% dos casos. Sugerimos este protocolo que pode orientar na definição da quantidade necessária do medicamento em relação ao tamanho da lesão. A aplicação é feita no ambulatório, não sendo necessário o uso do centro cirúrgico. A técnica é rápida e não necessita de bloqueio anestésico. O evento adverso mais incômodo foi o edema temporário após aplicação que costuma ocorrer em todos os casos, o que é facilmente explicado considerando-se o processo inflamatório causado pelo agente esclerosante.
A complicação mais observada foi o surgimento de ulceração devido à aplicação muito superficial, que ocorreu também em alguns casos ao longo da nossa experiência. A resolução ocorreu em 15 dias sem deixar cicatriz. A técnica de injeção deve ser profunda, no centro da lesão vascular para evitar esta complicação. Além disso, o uso de volume do agente esclerosante maior do que o preconizado ou o extravasamento deste pode causar ulceração.
A dose do OE5% limite recomendada para a escleroterapia é de até 2ml por aplicação.
Outras complicações relatadas na literatura incluem casos de hemoglobinúria e insuficiência renal hemolítica, mas tal ocorrência limitou-se ao uso de doses superiores a 9,6ml de OE5%.8,10
A descrição deste protocolo visa a compartilhar a experiência dos autores e as melhores práticas acumuladas nos últimos 10 anos em um Serviço especializado de Estomatologia. O protocolo poderá ajudar os profissionais a maximizar as chances de sucesso e minimizar o surgimento de eventos adversos no tratamento do lago venoso oral.
O tratamento do lago venoso oral com OE5% é uma técnica segura e eficaz que pode ser usada na prática clínica do dermatologista.
Dalva Regina Neto Pimentel | 0000-0001-7783-4810
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Rafael Tomaz Gomes | 0000-0001-8775-2173
Elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Cleonice Hirata | 0000-0002-6336-961X
Concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito.
REFERÊNCIAS
1. Hyodoh H, Hori M, Akiba H, Tamakawa M, Hyodoh K, Hareyama M. Peripheral vascular malformations: imaging, treatment approaches, and therapeutic issues. Radiographics. 2005;25:S159–S171.
2. Ribeiro MC, de Mattos Camargo Grossmann S, do Amaral MBF, de Castro WH, Navarro TP. Effectiveness and safety of foam sclerotherapy with 5% ethanolamine oleate in the treatment of low-flow venous malformations in the head and neck region: a case series. Int J Oral Maxillofac Surg. 2018;47:900-7.
3. Manzano BR, Premoli AM, Santaella NG, Ikuta CRS, Rubira CMF, Santos PSDS. Sclerotherapy as an esthetic indication in oral vascular malformations: a case series. An Bras Dermatol. 2019;94:521-6.
4. Gomes CC, Gomez RS, do Carmo MA, Castro WH, Gala-García A, Mesquita RA. Mucosal varicosities: case report treated with monoethanolamine oleate. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2006;11:E44-6.
5. Johann AC, Aguiar MC, do Carmo MA, Gomez RS, Castro WH, Mesquita RA. Sclerotherapy of benign oral vascular lesion with ethanolamine oleate: an open clinical trial with 30 lesions. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2005;100:579-84.
6. Lee JS, Mun JH. Dermoscopy of venous lake on the lips: a comparative study with labial melanotic macule. PLoS One. 2018;13:e0206768.
7. Costa JR, Torriani MA, Hosni ES, D'Avila OP, de Figueiredo PJ. Sclerotherapy for vascular malformations in the oral and maxillofacial region: treatment and follow-up of 66 lesions. J Oral Maxillofac Surg. 2011;69:e88-e92.
8. Fernandes DT, Elias RA, Santos-Silva AR, Vargas PA, Lopes MA. Benign oral vascular lesions treated by sclerotherapy with ethanolamine oleate: a retrospective study of 43 patients. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2018;23:e180-7.
9. Fernandes DT, Hebling E, Santos-Silva AR, Lopes MA. A series of 33 older patients with lip venous lake treated by sclerotherapy. Int J Dermatol. 2019;59:42-6.
10. Nishikawa M, Sakamoto K, Hidaka M, Yamashita A, Yamamoto G. Venous malformation of the tongue in a child treated by sclerotherapy with ethanolamine oleate: a case report. J Pediatr Surg. 2006;41:599–600.