Bianca La tance da Cruz; Arthur Cesar dos Santos Minato; Maria Vitória Yuka Messias Nakata; Vítor Cercal de Oliveira; Juliano Vilaverde Schmitt
Data de recebimento: 24/09/2020
Data de aprovação: 26/11/2020
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum
Trabalho realizado na Universidade Estadual "Júlio de Mesquita Filho"- Faculdade de Medicina de Botucatu, Distrito de Botucatu (SP), Brasil
Agradecimentos: Agradecemos ao nosso professor orientador por todos os ensinamentos
INTRODUÇÃO E OBJETIVO: a Campanha Nacional de Prevenção ao Câncer de Pele, promovida pela SBD, é um evento anual de conscientização da população sobre diagnóstico precoce e prevenção dessa doença. Considerando o perfil dos participantes, em grande parte idosos, e seu caráter educativo, é válido identificar a proporção de pessoas com possível prejuízo cognitivo, de modo a aprimorar as informações transmitidas.
MÉTODOS: neste estudo, realizamos triagem cognitiva em participantes da Campanha de 2018 usando escore 10-point cognitive screener, incluindo indivíduos ≥ 60 anos. Foram excluídos pacientes com dificuldades comunicativas e não anuentes.
RESULTADOS: foram entrevistados 66 participantes com idade mediana de 68 anos (p25-p75:63-73), sendo 42 (64%) do sexo feminino. Desses, 24 (36%) possuíam ensino fundamental incompleto e 13 (20%) apresentavam doença neurológica ou psiquiátrica. O escore cognitivo 10-CS bruto e corrigido pela escolaridade apresentou mediana de 8 (6-9). Apresentavam escores ajustados menores que oito 25 entrevistados (38%), indicando déficit cognitivo possível, e seis (9%) apresentaram déficit cognitivo provável. Tal prejuízo cognitivo associou-se a antecedentes neurológicos e baixa escolaridade.
CONCLUSÕES: apesar de abranger todas as idades, a Campanha prioriza populações de risco, incluindo idosos. Assim, as informações e a didática dessas campanhas devem adequar-se ao perfil dos ouvintes.
Keywords: Dermatologia; Neoplasias Cutâneas; Prevenção de Doenças; Epidemiologia; Detecção Precoce de Câncer; Comprometimento Cognitivo Leve
A Sociedade Brasileira de Dermatologia vem promovendo há aproximadamente 20 anos a Campanha Nacional de Prevenção ao Câncer de Pele. É um evento anual direcionado à conscientização da população a respeito do diagnóstico precoce e da prevenção ao câncer de pele. Além da divulgação em mídias de massa e de longo alcance, é oferecido um exame dermatológico focado na identificação de lesões suspeitas de câncer de pele, além de uma apresentação visual padronizada orientando a população em geral quanto à prevenção e ao diagnóstico precoce.1
A maioria dos tumores identificados nas campanhas de prevenção ocorre em pacientes idosos, com um média de 68,5 anos para o diagnóstico de carcinoma basocelular (CBC)2, e idade média dos participantes de 40 a 50 anos, segundo estudo da Sociedade Brasileira de Dermatologia (2006)3, sugerindo que proporção significativa dos participantes das campanhas de prevenção seja idosa.
Considerando-se o perfil dos participantes das campanhas e o caráter educativo da mesma, é válido identificar a proporção de pessoas com possível prejuízo cognitivo, de modo a aprimorar as informações passadas na campanha com foco no potencial de aquisição do conhecimento desejado para a prevenção primária e secundária do câncer de pele.
No presente estudo, realizamos uma avaliação de triagem cognitiva em 66 idosos participantes da Campanha Nacional de Prevenção ao Câncer de Pele no ano de 2018, por meio do escore 10-CS (“10-point cognitive screener”), incluindo indivíduos com 60 anos ou mais. Foram excluídos pacientes com dificuldade de comunicação ou que não consentiram em participar do estudo. Os participantes da pesquisa assinaram termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) no momento da entrevista.
O estudo foi aprovado pelo comitê de ética da instituição (Parecer: 3.748.844).
Foram entrevistados 66 participantes com idade mediana de 68 anos (p25-p75: 63-73), sendo 42 (64%) do sexo feminino e 24 (36%) apresentando apenas ensino fundamental incompleto.
Estavam acompanhados de outro adulto 37 (56%) idosos entrevistados. Os acompanhantes eram mais jovens que os acompanhados (63 [50-68] x 68 [63-73] anos; p<0,01 – Mann-Whitney), porém parte significativa ainda era idosa. Além disto, 13 (20%) entrevistados apresentavam alguma doença neurológica ou psiquiátrica.
O escore cognitivo 10-CS bruto e corrigido pela escolaridade apresentou uma mediana de 8 (6-9). A tabela 1 ilustra as variáveis estudadas quanto à associação com o escore cognitivo, de modo que a escolaridade baixa e a presença de doenças neurológicas ou psiquiátricas associaram-se a valores mais baixos.
Vinte e cinco entrevistados (38%) apresentavam escores ajustados pela escolaridade menores que oito, indicando déficit cognitivo possível e seis (9%) apresentaram déficit cognitivo provável.
Acredita-se que a demência é uma situação clínica pobremente reconhecida, de modo que até 67% dos portadores não são corretamente identificados, e até 91% dos pacientes com demência leve não são reconhecidos.4 O teste 10-CS realiza uma avaliação padronizada e de aplicação rápida (até cinco minutos) para triagem cognitiva em idosos, apresentando uma performance melhor que o exame de estado Mini-Mental e a triagem de 6-itens na identificação de prejuízo cognitivo.5 No estudo acima, 58,3% dos pacientes com escore 10-CS abaixo de oito apresentavam déficit cognitivo, enquanto 96,5% dos pacientes com escore abaixo de seis apresentavam este déficit.5
No nosso estudo, mais de um terço dos entrevistados com mais de 60 anos de idade apresentava escores baixos e 10% apresentavam grande chance de demência. Como esperado, tal prejuízo cognitivo esteve associado a antecedentes neurológicos e à baixa escolaridade, porém os escores foram ajustados pela última característica.
Curiosamente, os participantes com escores indicando risco de déficit não estavam mais frequentemente acompanhados de adultos, enquanto aqueles acompanhados o estavam com pessoas na sua maioria idosas, porém alguns anos mais jovens.
O presente estudo apresenta limitações relacionadas à realização em um único centro, e não apresenta um grupo-controle. Por outro lado, o estudo não tinha por objetivo verificar riscos relativos a outros grupos, porém descrever uma característica cognitiva da população estudada e possíveis implicações na montagem de estratégias educativas.
A Campanha de Prevenção ao Câncer de Pele destina-se a todas as faixas etárias, no entanto há um foco especial nas populações de risco, que incluem os indivíduos idosos. Sendo assim, é relevante que as informações e a estrutura didática destas campanhas estejam adequadas ao perfil dos ouvintes, focando-se nos aspectos mais relevantes e objetivos da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de pele.
Bianca Latance da Cruz | 0000-0003-0412-3844
Contribuição no artigo: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Arthur Cesar dos Santos Minato | 0000-0003-2484-8631
Contribuição no artigo: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Maria Vitória Yuka Messias Nakata | 0000-0003-4068-9714
Contribuição no artigo: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Vítor Cercal de Oliveira | 0000-0001-6823-491x
Contribuição no artigo: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Juliano Vilaverde Schmitt | 0000-0002-7975-2429
Contribuição no artigo: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
1. Couto L, Pessanha AC, Saito DT, da Mota IC, Steiner D. Índice diagnóstico de neoplasia cutânea em campanha de combate ao câncer da pele em serviço dermatológico no interior do estado de São Paulo. Surg Cosmet Dermatol. 2017;9(4):314-5.
2. Wakiyama TP, França ML, Carvalho LP, Marques ME, Miot HA, Schmitt JV. Initial basal cell carcinomas diagnosed in the National Campaign for Skin Cancer Prevention are smaller than those identified by the conventional medical referral system. An Bras Dermatol. 2017;92(1):26-9.
3. Sociedade Brasileira de Dermatologia. Análise de dados das campanhas de prevenção ao câncer da pele promovidas pela Sociedade Brasileira de Dermatologia de 1999 a 2005. An Bras Dermatol. 2006;81:533-9.
4. Valcour VG, Masaki KH, Curb JD, Blanchette PL. The detection of dementia in the primary care setting. Arch Intern Med. 2000;160(19):2964-8.
5. Apolinario D, Lichtenthaler DG, Magaldi RM, Soares AT, Busse AL, Amaral JR, et al. Using temporal orientation, category fluency, and word recall for detecting cognitive impairment: the 10-point cognitive screener (10-CS). Int J Geriatr Psychiatry. 2016;31(1):4-12.