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Artigo Original

Avaliação comparativa do tratamento de melasma com microagulhamento associado ou não ao drug delivery

Giovana Larissa Prado Leite Agostinho1; Renan Tironi Giglio de Oliveira1; Ana Paula da Silva Urzedo2; Marisa Gonzaga da Cunha2; Carlos D'Apparecida Santos Machado Filho3

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20191131395

Data de recebimento: 30/04/2019
Data de aprovação: 14/07/2019


Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia da Faculdade de Medicina do ABC - Santo André (SP), Brasil.
Suporte Financeiro: O ativo Md: complex melanoceuticals® foi doado pela empresa Importderm Ltda. (Rio de Janeiro, Brasil) e A empresa LMG Ltda. (Minas Gerais, Brasil) forneceu sem custo a plataforma Solon® e as ponteiras descartáveis
Conflito de interesse: As empresas Importderm LTDA. e LMG LTDA. forneceram insumos para a pesquisa, porém, a metodologia, execução e análise dos resultados obtidos foram realizados pelos investigadores sem quaisquer interferências das empresas no estudo


Abstract

INTRODUÇÃO: O melasma é patologia adquirida, secundária à hipermelanose, com caráter recidivante e, muitas vezes, refratária à terapêutica, apesar das diversas opções para tratamento. O microagulhamento é principalmente indicado para os casos recalcitrantes, visto que é um método invasivo com mecanismo de ação ainda não totalmente esclarecido para essa indicação.
OBJETIVO: Comparar a resposta do tratamento do melasma entre um grupo que recebeu somente microagulhamento e outro no qual foi feita associação entre microagulhamento e drug delivery.
MÉTODOS: Participaram do estudo 20 pacientes: sete receberam apenas microagulhamento e 13, microagulhamento seguido de drug delivery de sérum clareador em três sessões, com intervalos mensais. Os resultados entre os grupos foram comparados em relação a: melhora do Melasma Area and Severity Index (MASI), da textura e da diminuição do diâmetro dos poros da pele; presença de eritema, crostas e descamação; melhora da extensão e tonalidade do melasma.
RESULTADOS: O grupo no qual foi feito microagulhamento com drug delivery apresentou resultado mais favorável na melhora da textura, diminuição do diâmetro dos poros da pele e melhora da extensão e tonalidade do melasma. A melhora do MASI ocorreu em ambos os grupos, em porcentagens semelhantes.
CONCLUSÕES: De acordo com o presente estudo, ambas as terapêuticas são promissoras para tratamento do melasma.


Keywords: Estudo comparativo; Condutas terapêuticas; Resultado do tratamento; Avaliação de resultado de intervenções terapêuticas


INTRODUÇÃO

O melasma é uma patologia crônica adquirida, secundária à hipermelanose. É caracterizada por máculas acastanhadas, com bordas irregulares e limites precisos em áreas fotoexpostas da pele, tais como as regiões malar e frontal. Afeta ambos os sexos, com predomínio em mulheres na idade fértil. Acomete todas as raças, mais frequentemente orientais e hispânicos, e apresenta maior prevalência em fototipos intermediários.1 Estudos comprovam que sua fisiopatologia tem envolvimento com exposição solar, alteração genética, distúrbios hormonais e vasculares, gestação, uso de medicações orais e cosméticos tópicos. No entanto, sabe-se que ainda há necessidade de novas pesquisas para elucidar sua etiopatogenia por completo.1 A radiação ultravioleta é o principal fator na gênese e manutenção do melasma. Ela causa peroxidação dos lipídios da membrana basal celular, acarretando a liberação de radicais livres, com consequente estimulação dos melanócitos.2 Pode ser tratado apenas clinicamente e/ou com associação de procedimentos cosmiátricos. Devido à sua característica recidivante e refratária, muitas vezes a associação é necessária para obtenção de resposta satisfatória. Os medicamentos tópicos frequentemente utilizados são os clareadores à base de hidroquinona, como a fórmula tríplice composta pela associação dessa substância a tretinoína e corticosteroide. É a opção terapêutica consagrada, geralmente indicada logo no início do tratamento, associada à fotoproteção intensiva. Outras substâncias clareadoras também possuem eficácia, como os ácidos azelaico, retinoico, ascórbico, tranexâmico e kójico, corticosteroides, resorcinol, arbutin e belides, os quais atuam direta e indiretamente nas etapas da melanogênese. Em relação às opções de procedimentos, podem ser citados: peelings químicos e físicos e aplicações de lasers (QSwitched, Nd:Yag 1064, CO2, Erbium Yag 2940), luz intensa pulsada e microagulhamento.3 O microagulhamento consiste em perfurações múltiplas da epiderme e derme com auxílio de dispositivos dotados de microagulhas. Seu uso é estabelecido para tratamento da flacidez cutânea, pois estimula a neocolagênese ao ativar os fibroblastos. No entanto, recentemente tem sido atribuída a esta técnica também uma ação clareadora. É geralmente indicada em casos recalcitrantes do melasma, embora o seu mecanismo de ação nesta patologia ainda não esteja totalmente esclarecido. Entretanto, estudos mostram que sua utilização isolada ou em associação com drug delivery de substâncias clareadoras têm apresentado resultados satisfatórios.4 Como o microagulhamento foi introduzido recentemente na prática médica, há escassez de trabalhos científicos sobre o tema, principalmente no âmbito de avaliar sua eficácia como método clareador. Desta forma, o objetivo desse estudo foi comparar a resposta do tratamento do melasma entre o grupo que recebeu microagulhamento isolado com o grupo no qual foi feito o mesmo procedimento associado ao drug delivery com sérum composto principalmente de substâncias clareadoras.

 

MÉTODO

Foi realizado ensaio clínico randomizado com pacientes do Ambulatório de Dermatologia da Faculdade de Medicina do ABC, após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa dessa instituição (CAAE: 93551518.7.0000.0082). Para seleção inicial dos participantes, os seguintes critérios de inclusão foram considerados: quadro clínico característico de melasma facial; homens e mulheres acima dos 18 anos; estar sem os seguintes tratamentos específicos para melasma por, no mínimo, seis meses: uso tópico de clareadores à base de hidroquinona e seus derivados, realização de procedimentos como peeling químico, lasers (QSwitched, Nd:Yag 1064, CO2, Erbium Yag 2940) e luz intensa pulsada. Os critérios de exclusão adotados foram: gravidez em curso; hipersensibilidade a qualquer componente da fórmula clareadora aplicada; presença de cicatrizes na face ou de dermatoses faciais em atividade no momento em que foram feitas as sessões de microagulhamento. Os pacientes assinaram um termo de consentimento, no qual constaram detalhadamente os riscos e as consequências dos procedimentos, como: dor, infecção cutânea, formação de bolhas, eritema facial e piora paradoxal da pigmentação. Também assinaram um documento que contemplava a autorização para realização de registros fotográficos ao longo do estudo. Dividiram-se os participantes, ao acaso, nos grupos A e B. O grupo denominado A recebeu microagulhamento em toda a face com o dispositivo de microagulhas, banhadas a ouro, de tamanho de 7x7mm, da plataforma Solon® (LMG - Laser Medical Group Ltda; Guaxupé, MG - Brasil), com a seguinte programação: radiofrequência zero W, duração de pulso: 80ms, profundidade da agulha: 1,5mm. As ponteiras foram descartadas a cada sessão. Foram realizadas três sessões, com intervalo de 30 dias entre elas. Uma hora antes de cada procedimento, aplicou-se anestésico tópico (lidocaína 7% associada à tetracaína 7% em creme não iônico) em toda a face. No grupo B, foi realizado microagulhamento idêntico ao do grupo A, tanto em relação ao dispositivo usado e sua programação quanto ao número de sessões feitas, intervalo entre elas e tempo de uso do anestésico tópico antes do procedimento. Entretanto, nos participantes do grupo B, foi associado o método drug delivery em toda a face, imediatamente após o microagulhamento, que consistiu na aplicação tópica de 0,8ml de produto clareador industrializado Md: complex melanoceuticals®, que associa ácido kójico, ácido tranexâmico, azeloglicina, arbutina, ácido glicólico, ácido ascórbico, ácido cítrico e glutationa em concentrações não divulgadas (Md: ceuticals, importado pela Importderm Ltda; Rio de Janeiro, RJ - Brasil). Os pacientes receberam a orientação de aplicar diariamente um protetor solar de alta potência (FPS 60) com cor, com início 24h após o procedimento, e de evitar a exposição solar ao longo do período de todo o tratamento. Os resultados foram obtidos pela análise conjunta dos dados do questionário de autoavaliação (Quadro 1) formulado pelos organizadores do projeto e aplicado aos pacientes após três meses da última sessão do procedimento. Além dessas avaliações, calculou-se o Melasma Area and Severity Index (MASI) para cada paciente, antes dos procedimentos e três meses após a finalização do tratamento. Esse escore foi feito por três examinadores dermatologistas utilizando-se as análises fotográficas dos pacientes. Todos os registros fotográficos foram padronizados, feitos por técnico capacitado com máquina profissional e sob luz convencional. As informações coletadas a partir de todos os questionários foram comparadas entre os grupos A e B. Para análise estatística, utilizou-se Teste Qui-quadrado, programa Stata 11.0, com nível de significância de 5%.

 

RESULTADOS

Dos 55 pacientes selecionados, 35 perderam seguimento. Portanto, o número total de participantes que completou o estudo foi de 20. O grupo A (microagulhamento apenas) foi composto por sete pacientes e o grupo B (microagulhamento com drug delivery), por 13. As análises comparativas estão descritas na Tabela 1. Dentre os participantes do grupo A, apenas um citou formação de crosta, nenhum referiu descamação ou aparecimento de cicatriz e houve menor número de casos de eritema após o procedimento em relação ao outro grupo. Já o grupo B apresentou maior número de relatos de melhora da extensão e tonalidade do melasma, da diminuição do diâmetro dos poros - canais abertos durante o microagulhamento- e melhora da textura da pele, além de nenhuma citação de formação de crosta. Apenas um paciente referiu aparecimento de cicatriz na face com o tratamento. Quanto à avaliação comparativa do MASI, houve redução da pontuação para ambos os grupos numa porcentagem semelhante entre eles, com discreta vantagem para o que recebeu apenas microagulhamento. As análises não apresentaram diferenças estatísticas significativas entre os dois grupos.

 

DISCUSSÃO

O melasma é afecção crônica, muitas vezes resistente ao tratamento e frequentemente estigmatizante. Apesar das várias opções terapêuticas, ainda é um desafio obter controle total da patologia e mantê-la por longos períodos em remissão. Em relação às modalidades tópicas para tratamento, existem diversas substâncias clareadoras, conforme demonstrado no Quadro 2. Sabe-se que o uso combinado dessas substâncias aumenta a chance de sucesso do tratamento.3,5 Há também diferentes procedimentos cosmiátricos que podem auxiliar na terapêutica, a exemplo de peelings, dermoabrasão, lasers, luz intensa pulsada e mesoterapia. O microagulhamento foi relatado como técnica promissora para melasma recalcitrante, mas seu mecanismo de ação como clareador ainda não está totalmente elucidado.6,7 Frabbocini et al5 fizeram estudo com 20 pacientes portadores de melasma, no qual todos receberam microagulhamento em uma hemiface, seguido de drug delivery com sérum clareador (rucinol com Sophora-alpha), e na outra hemiface, apenas aplicação desse mesmo sérum. Foram feitas duas sessões, com intervalos mensais entre elas. Nas hemifaces em que foi realizado microagulhamento seguido de drug delivery, houve redução média do MASI de 19,1 para 9,2, enquanto a redução média do MASI das hemifaces que receberam apenas o sérum clareador tópico foi de 20,4 para 13,3. Budamaklunda et al6 realizaram estudo comparativo com pacientes diagnosticadas com melasma facial, divididas em dois grupos com 30 participantes em cada um. Um grupo recebeu tratamento com mesoterapia de ácido tranexâmico e o outro, microagulhamento com drug delivery de ácido tranexâmico. Foram feitas três sessões mensais. No grupo da mesoterapia, houve melhora de 35,72% no MASI comparado com melhora de 44,41% no grupo de microagulhamento associado ao drug delivery. Lima8 fez um estudo com 22 pacientes que apresentavam melasma recalcitrante, sendo que todos receberam uma sessão de microagulhamento e foram orientados a usar a fórmula Kligman (ácido retinoico 0,05% + hidroquinona 4% + fluocinolona acetonida 1%) todas as noites, por um mês, associada ao FPS 60 com cor durante o dia. O autor relatou melhora do MASI em todos os pacientes e follow-up de 24 meses sem piora do melasma em metade do grupo. Saraiva et al9 selecionaram 17 mulheres para tratamento do melasma com microagulhamento robótico associado ao drug delivery de ácido tranexâmico. Foram quatro sessões quinzenais. Em relação ao MASI, houve redução média de 21,33% para 11,19%. No presente estudo, a redução do MASI ocorreu numa porcentagem alta e praticamente semelhante entre os dois grupos. Houve maior benefício da associação com drug delivery em relação a: ausência de formação de crostas, melhora da textura e diminuição do diâmetro dos poros da pele, extensão e tonalidade do melasma. Em contrapartida, houve maior número de casos de descamação e eritema após o procedimento, provavelmente devido à presença dos ácidos da fórmula do sérum clareador. Embora os resultados desse trabalho sejam promissores, o mesmo possui algumas limitações, como a desistência de parte dos pacientes ao longo do estudo por motivos não esclarecidos e pelo fato de ter sido realizado no verão em um país tropical (maior índice de radiação ultravioleta). Deve-se também questionar a concentração dos compostos presentes no produto do drug delivery, a qual não é divulgada pelo fabricante. No entanto, os achados desse estudo são semelhantes aos das literaturas citadas, mostrando que o microagulhamento, associado ou não ao drug delivery, promove clareamento do melasma. Há necessidade de melhor elucidação da fisiopatologia dessa doença e de estudos prospectivos randomizados que avaliem comparativamente a eficácia das terapêuticas convencionais em relação às atualmente promissoras.

 

CONCLUSÃO

Não houve diferença estatística na melhora do MASI entre o grupo que recebeu tratamento do melasma com microagulhamento isolado em relação ao grupo que realizou o mesmo procedimento associado ao drug delivery. Portanto, de acordo com o presente estudo, ambas as terapêuticas são promissoras para o tratamento dessa patologia.

 

AGRADECIMENTOS

Agradecemos à Dra. Daphine Tironi Giglio de Oliveira pelo apoio e incentivo à realização desse estudo.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Giovana Larissa Prado Leite Agostinho | 0000-0002-9973-4930
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Renan Tironi Giglio de Oliveira | 0000-001-5013-7660
Obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Ana Paula da Silva Urzedo | 0000-0002-7322-3278
Concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Marisa Gonzaga da Cunha | 0000-0002-4186-0643
Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Carlos D'Apparecida Santos Machado Filho | 0000-0003-4362-1563
Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS

1. Miot LDB, Miot HA, Silva MG, Marques MEA. Physiopathology of melasma. An Bras Dermatol. 2009; 84(6):623-35.

2. Handel AC. Fatores de risco para melasma em mulheres: um estudo caso- controle (Dissertação). Faculdade de Medicina de Botucatu - Universidade Estadual Paulista (UNESP); 2013.

3. Steiner D, Feola C, Bialesk N, Silva FAM. Treatment of Melasma: systematic review. Surg Cosmet Dermatol. 2009; 1(2):87-94.

4. Kalil C, Campos V, Reinehr CPH, Chaves CRP. Microneedling: a case series associated with drug delivery. Surg Cosmet Dermatol. 2017; 9(1): 96-9. 5.

5. Fabbrocini G, De Vita V, Fardella N, Pastore F, Annunziata MC, Mauriello MC, et al. Skin needling to enhance depigmenting serum penetration in the treatment of melasma. Plast Surg Int. 2011; 2011:158241.

6. Budamakuntla L, Loganthan E, Suresh DH, Shanmugams S, Suryanarayan S, Dongare A, et al. A randomised, open-label, comparative study of tranexamic acid microinjections and tranexamic acid with microneedling in patients with melasma. J Cutan Aesthet Surg. 2013; 6(3): 139-43.

7. Lima EVA, Lima MMDA, Paixão MP, Miot HA. Assessment of the effects of skin microneedling as adjuvant therapy for facial melasma: a pilot study. BMC Dermatol. 2017.17 (1):14.

8. Lima EA. Microneedling in facial recalcitrant melasma: report of a series of 22 cases. An Bras Dermatol. 2015; 90(6): 919-21.

9. Saraiva LPPG, Nascimento MB, Filippo AA, Gusmão PR. Treatment of facial melasma with robotic microneedling associated to drug delivery of tranexamic acid. Surg Cosmet Dermatol. 2018; 10(4):333-9.


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