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Como eu faço ?

Criobiópsia na prática dermatológica

Rachel de Avila Coelho; Luiz Fernando de Oliveira Santana; Juliana Cristina Silva Fraga

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20191111217

Data de recebimento: 07/07/2018
Data de aprovação: 11/04/2019
Trabalho realizado na Instituição: Hospital da Polícia Militar de Minas Gerais – Belo Horizonte (MG), Brasil
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de interesse: Nenhum


Abstract

A biópsia de pele é ferramenta propedêutica importante e indispensável para o médico dermatologista. O método convencional de biópsia, com a utilização de anestésicos locais, campos estéreis, instrumental cirúrgico (punch, bisturi, pinças, tesoura) e fios de sutura, exige equipe, tempo e considerável investimento financeiro. A criobiópsia é método simples, que, por meio do criocautério, faz a extração de fragmentos de pele de boa qualidade para análise histopatológica, o que a torna excelente alternativa às biópsias convencionais.


Keywords: Biópsia; Criocirurgia; Dermatologia; Histologia; Procedimentos Cirúrgicos Ambulatoriais


INTRODUÇÃO

O estudo histopatológico de fragmentos de pele é método propedêutico indispensável no cotidiano do médico dermatologista. As biópsias de pele convencionais demandam instrumental cirúrgico esterilizado, sala de cirurgia, equipe de enfermagem e maior tempo cirúrgico, bem como anestesia local, que pode causar dor e angústia em pacientes que apresentam fobia de agulhas.1 Existe no Brasil fator complicador a esse respeito, desde a divulgação da Resolução CFM nº 2.056/2013 — exigindo que locais em que se realizam procedimentos com anestesia local tenham disponibilidade de equipamentos e medicamentos mínimos para o atendimento de intercorrências, como parada cardiorrespiratória e anafilaxia — o que torna itens como balão de oxigênio, desfibrilador, aspirador e drogas vasoativas, materiais obrigatórios no consultório dermatológico, espaço em que se realizam pequenas cirurgias. Tal medida desestimula a realização de biópsias convencionais em consultórios dermatológicos. A criobiópsia, portanto, é boa alternativa para obtenção do fragmento cutâneo a ser estudado.

Descrição da técnica

A técnica consiste em:

1) Antissepsia tópica do local onde se deseja realizar a criobiópsia.2

2) Pulverização de nitrogênio líquido sobre a lesão, à distância de 2,5 a 3,8cm, durante quatro a cinco segundos até o congelamento completo da lesão, visualizado pelo branqueamento (Figura 1).2

3) Shaving na base da lesão, com lâmina de bisturi nº 15, assim que se inicia o descongelamento, momento em que o tecido ainda oferece alguma resistência (Figuras 2 e 3).2

4) Retirado, o fragmento é transferido imediatamente para um frasco com solução de formaldeído.2

5) Antes do descongelamento completo da pele, um swab embebido em cloreto de alumínio a 20% é pressionado suavemente sobre o local, para hemostasia (Figura 4).2

 

DISCUSSÃO

A criobiópsia é método de obtenção de fragmento cutâneo para estudo histopatológico, que utiliza equipamento de uso rotineiro nos consultórios dermatológicos e que dispensa o uso de anestésicos locais e infraestrutura complexa para sua realização.

O procedimento é indicado para lesões benignas, pré-malignas e cânceres de pele não melanoma. Dessa forma, a técnica pode ser realizada na maioria do casos com indicação rotineira de biópsia, como: carcinomas basocelular e espinocelular, ceratoses actínicas, nevos e lesões inflamatórias ou infecciosas de diagnóstico às vezes dúbio (granuloma facial, granuloma anular, moluscos contagiosos, angiomas, fibromas moles, ceratoses seborreicas, verrugas virais, etc.).2,3

Poucas condições limitam o uso da criobiópsia, que, entretanto, não deve ser realizada em pacientes portadores de patologias que são induzidas ou exacerbadas pela exposição ao frio - como crioglobulinemia, doença de Raynaud, urticária induzida pelo frio e história prévia de injúria induzida pelo frio - nem em locais com circulação sanguínea deficitária.4

As complicações do procedimento são normalmente leves e dependentes da familiaridade do médico com a técnica. A mais frequente é a discromia, em especial a hipopigmentação, que é o tipo mais comum, devido à destruição dos melanócitos provocada pelo frio.4 Em indivíduos com fototipo alto, a hiperpigmentação pós-inflamatória também pode ocorrer. O surgimento de cicatrizes deprimidas é resultante de criobiópsia realizada de forma profunda, mas normalmente se resolve espontaneamente.4 Nas áreas pilosas, pode ocorrer alopecia cicatricial permanente, resultante da destruição do folículo piloso pelo congelamento.4 Por fim, se a criobiópsia for realizada na matriz ungueal ou nas cartilagens (nasal ou auricular), pode acontecer distorção tecidual, secundária à formação de entalhes ou retrações.4

Com relação à qualidade do fragmento de pele obtido pela criobiópsia, a análise histopatológica das peças não evidencia nenhuma formação de dano tecidual ou artefatos nos espécimes avaliados depois de submetidos a baixas temperaturas (Figura 5).1,2 Para evitar a autólise das células, a peça histológica é colocada em formol para preservar a morfologia e a composição química dos componentes teciduais, o que contribui para uma análise histolopatológica fidedigna.5-7

 

CONCLUSÃO

Os autores descrevem nova técnica com o objetivo de divulgar procedimento seguro, praticamente indolor, de baixo custo, eficaz e que pode ser de grande valia na prática diária dermatológica.

Diante da nova legislação vigente, a técnica é alternativa viável à maioria dos dermatologistas e permite mais agilidade na realização de biópsias cutâneas.

A experiência promissora das criobiópsias em outros campos da medicina, como na pneumologia, que pratica biópsias traqueobrônquicas desde a década de 1980, nos mostra o quanto a cirurgia dermatológica ainda pode evoluir e se beneficiar com a utilização mais frequente dessa técnica.5,6,8-10

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Rachel de Avila Coelho | ORCID 0000-0002-7947-7754
Aprovação da versão final do original, concepção e planejamento do estudo, elaboração e redação do original, revisão crítica da literatura, revisão crítica do original

Luiz Fernando de Oliveira Santana | ORCID 0000-0002-7793-5360
Aprovação da versão final do original, concepção e planejamento do estudo, elaboração e redação do original, revisão crítica da literatura, revisão crítica do original

Juliana Cristina Silva Fraga | ORCID 0000-0002-1593-8742
Aprovação da versão final do original, concepção e planejamento do estudo, participação efetiva na orientação da pesquisa, participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados, revisão crítica da literatura, revisão crítica do original

 

REFERÊNCIAS

1. Pasquali P, Freites-Martinez A, Fortuño-Mar A. Cryobiopsy: Analternative technique to conventional shavebiopsy. J Am Acad Dermatol. 2015;73(5):867-8.

2. Pasquali P, Freites-Martinez A, Fortuño-Mar A. Use of cryobiopsy in dermatological practice. J Am Acad Dermatol. 2015;72(2):e63-4.

3. Pasquali P. The cryosurgery alternative. Int J Dermatol. 2007;46(5):511-3.

4. Prohaska J, Badri T. Cryotherapy. [Updated 2019 Apr 4]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2019 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK482319/.

5. Casoni GL, Tomassetti S, Cavazza A, Colby TV, Dubini A, Ryu JH, et al. Transbronchial lung cryobiopsy in the diagnosis of fibrotic interstitial lung diseases. PLOS ONE. 2014;9(2):e86716.

6. Ohno N, Terada N, Saitoh S, ZhouH,Fujii Y, Ohno S. Recent development of in vivo cryotechnique to cryobiopsy for living animals.. Histol Histopathol. 2007;22(11):1281-90.

7. Junqueira LCU, Carneiro J. Histologia Básica: texto e atlas. 4 ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan; 1979. p. 1.

8. Ohno N, Terada N, Bai Y, Saitoh S, Nakazawa T, Nakamura N, et al. Application of cryobiopsy to morphological and immune histochemical analyses of xenografted human lung can cert issues and functional blood vessels. Cancer. 2008;113(5):1068-79.

9. Olariu B. Endoscopic cryobiopsy in tracheobronchial pathology. Rev Chir Oncol Radiol O R L Oftalmol Stomatol Otorinolaringol. 1983;28(3):225-7.

10. Hetzel J, Hetzel M, Hasel C, Moeller P, Babiak A. Oldmeetsmodern: the use of traditional cryoprobes in the age of molecular biology. Respiration. 2008;76(2):193-7.


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