Priscila Daiane Pavezzi; Rogério Nabor Kondo; Rubens Pontello Júnior; Clarissa Patias Lena; Júlia Pagung Kippert
A ressecção oncológica auricular pode criar defeitos parciais da pele e/ou da cartilagem que tornam difícil e desafiadora a reconstrução desse local. Várias técnicas têm sido descritas, porém poucos casos de cirurgias para defeitos na cauda da hélice têm sido relatados. Os autores descrevem um retalho de interpolação nessa localização anatômica para correção de defeito secundário à excisão de carcinoma basocelular.
Keywords: retalhos cirúrgicos; orelha; carcinoma basocelular
Entre os tumores cutâneos, o carcinoma basocelular (CBC) é o tipo mais frequente, correspondendo a cerca de 70% de todos os cânceres da pele. A exérese cirúrgica é o tratamento preconizado, porém, podem ocorrer situações não passíveis de fechamento direto, havendo necessidade da confecção de retalho ou enxerto.1
O retalho de interpolação consiste em um segmento de pele e tecido celular subcutâneo que roda sob um pivô, descrevendo um arco até um defeito próximo, mas não imediatamente adjacente. O pedículo desse retalho passa sobre a pele normal sob a qual se trabalha.2-6
Descrevemos a aplicação de um retalho de interpolação para resolução de ferida secundária à exérese de CBC na cauda da hélice da orelha direita, na qual o lóbulo se manteve íntegro.
Paciente do sexo feminino, 70 anos, branca, com lesão na cauda da hélice direita, compatível clínica e histopatologicamente com CBC (Figura 1A). Com a demarcação das lesões e margens de 0,5cm, resultou um amplo defeito após excisão do tumor (Figura 1B). Optou-se por um retalho de interpolação para o fechamento da ferida (Figura 2). O retalho foi suturado na posição correta com fios mononáilon 5.0 e 6.0, permanecendo um pequeno pedículo vascular, e a área doadora com mononáilon 5.0 (Figura 3). Após uma semana, foram retirados os pontos (Figura 4). Três semanas após a intervenção, realizamos a ressecção do pedículo (Figura 5). A paciente evoluiu com bom resultado estético (Figura 6). A figura 7 esquematiza os passos da cirurgia.
Os retalhos cutâneos podem ser necessários para o fechamento de excisões de tumores da pele.1-5 A maioria dos retalhos na cirurgia dermatológica utiliza pele das proximidades da ferida cirúrgica, visando melhor integração e similaridade com a área receptora, proporcionando melhor resultado estético.5,6
Grandes feridas cirúrgicas resultantes de excisões de neoplasias cutâneas da região auricular podem ser um desafio para o cirurgião. Resultados satisfatórios dependem da técnica utilizada e do treinamento para executá-la, além das condições de saúde do paciente.5,6
Técnicas para fechamento de defeito ou correção do lóbulo da orelha têm sido citadas na literatura.5-10 Ainda há, porém, poucos casos descritos para correção apenas da cauda da hélice, com preservação do lóbulo.
O retalho de interpolação é um excelente método para solucionar um defeito amplo e profundo no qual o tecido adjacente não permite um fechamento direto. Utiliza-se tecido de uma área não adjacente com um pedículo vascular para suprir o retalho até que uma neovascularização tenha sido estabelecida entre o retalho e o leito receptor. A principal desvantagem desse tipo de retalho é que requer dois estágios para ser finalizado. A secção do pedículo é realizada após a neovascularização completa da área receptora, o que ocorre em torno de três semanas.6
Alguns cirurgiões, para casos oncológicos na cauda da hélice, preferem amputar o restante do lóbulo auricular (terço inferior da orelha) e, posteriormente, realizam a reconstrução local, tendo em vista evitar riscos de necrose distal.7-10 No presente caso, parte do pedículo do retalho de interpolação (área doadora cervical) encobriu o lóbulo que se manteve o tempo todo preservado, garantindo sua vascularização, bem como a do próprio retalho (Figuras 2, 3 e 4). Houve boa integração do retalho com a área receptora. A segunda etapa ocorreu após três semanas com a ressecção do pedículo vascular, com ótimo resultado estético (Figura 6).
No caso apresentado, o fechamento primário da lesão não resultaria em boa estética, ocasionando a tração do lóbulo em direção à hélice. Um enxerto provavelmente evoluiria para uma necrose local. Optou-se pela execução de retalho e preservação do lóbulo da orelha, visando a melhor resultado estético e funcional.
O retalho de interpolação pode ser uma excelente opção para solucionar defeitos na cauda da hélice da orelha, na qual se pode manter preservado o lóbulo, como demonstrado no presente caso.
Priscila Daiane Pavezzi:
Finalização da escrita
Revisão bibliográfica
Submissão
Rogério Nabor Kondo:
Orientação quanto à reconstrução cirúrgica (idealização do procedimento)
Supervisão cirúrgica
Orientação quanto à escrita
Aprovação final do artigo
Rubens Pontello Junior:
Revisão bibliográfica
Correção ortográfica
Clarissa Patias Lena:
Desenho do passo-a passo da cirurgia
Revisão bibliográfica
Júlia Pagung Kippert:
Enquadramento das figuras
Legendas
Revisão bibliográfica
1. Amaral ACN, Azulay DR, Azulay RD. Neoplasias malignas da epiderme e anexos. In: Azulay RD, Azulay DR, Azulay-Abulafia L. Dermatologia. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011.p.605.
2. Mellette JR, Ho DQ. Interpolation flaps. Dermatol Clin.2005; 23(1):87-112.
3. Barlow RJ, Swanson NA. The nasofacial interpolated flap in reconstruction of the nasal ala. J Am Acad Dermatol. 1997; 36(6 Pt 1): 965-9.
4. Johnson MT, Fader DJ. The staged retroauricular to auricular direct pedicle (interpolation) flap for helical ear reconstruction. J Am Acad Dermatol. 1997; 37(6):975-8.
5. Di Mascio D, Castagnetti F. Tubed flap interpolation in reconstruction of helical and ear lobe defects. Dermatol Surg. 2004; 30(4 Pt 1): 572-8.
6. Kondo RN, Pontello Júnior R, Lopes VCH, Bittar RA, Pereira AM. Interpolation flap for closing a surgical defect in the ear lobe. Surg Cosmet Dermatol. 2012; 4(2):192-94.
7. Cabral AR, Alonso N, Brinca A, Vieira R, Figueiredo A. Earlobe reconstruction by the Gavello technique and bilobed flap. An Bras Dermatol. 2013; 88(2):272-5.
8. Reddy LV, Zide MF. Reconstruction of skin cancer defects of the auricle. J Oral Maxillofac Surg. 2004; 62(12):1457-71.
9. Fidalgo Rodríguez F, Navarro Cecilia J, Rioja Torrejón L. Earlobe reconstruction with a modified bilobed flap. Plast Reconstr Surg. 2010; 126(1):23e-4.
10. Hessam S, Georgas D, Bruns N, Sand M. Kassa T, Bechara FG. A retroauricular flap for earlobe construction. J Am Acad Dermatol. 2014; 71(4):e129-30.
Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia do Hospital Universitário do Norte do Paraná - Universidade Estadual de Londrina (PR), Brasil.