Daniel Nunes e Silva1; Byanca Rossetti Moreira dos Santos2; Luciano Ipólito Branquinho2; Géssica Ellen Duarte Oguchi3; Marianna da Gama Machado3; Marco Aurélio Jajah4; Marcelo Rosseto1
Introdução: A cervicoplastia ampliada é utilizada para o tratamento dos estigmas do envelhecimento do terço inferior da face, especialmente para os casos de intensa flacidez tecidual. Porém, a manutenção de seus resultados em longo prazo foi pouco estudada na literatura. Objetivos: Avaliar a manutenção dos resultados da cervicoplastia ampliada a longo prazo. Métodos: Vinte e três pacientes com intensa flacidez tecidual foram submetidos à cervicoplasita ampliada e acompanhados durante cinco anos. Os resultados pós-operatórios no primeiro e no quinto ano foram avaliados por oito cirurgiões plásticos. A análise dos resultados foi realizada por meio dos testes McNemar e t-Student pareado. Resultados: No primeiro ano, 12 (52,2%) pacientes tiveram o resultado classificado como muito bom, nove (39,1%) como moderado, e dois (8,7%) como fraco. No quinto ano, nove (39,1%) tiveram o resultado classificado como muito bom, 11 (47,8%) como moderado, e três (13,1%) como fraco. Nenhum paciente teve o resultado classificado como excelente ou ruim em nenhum dos períodos analisados. Não houve diferença significativa em relação à classificação (p = 0,450); e entre a pontuação total (p = 0,373) no período avaliado. Conclusões: Mesmo em casos difíceis, a cervicoplastia ampliada proporcionou a obtenção de bons resultados mantidos em longo prazo.
Keywords: RITIDOPLASTIA; CERVICOPLASTIA; PESCOÇO
Recorrente crítica dos pacientes submetidos a cirurgias para o rejuvenescimento cervical se relaciona justamente à perda parcial do resultado com o passar do tempo, sobretudo quando existe pronunciada flacidez tecidual no pré-operatório.1,2 Além de frustrante e indesejável, a recidiva precoce das queixas que levaram o paciente à cirurgia acaba por dificultar a abordagem cervical em eventual segundo procedimento.1-3
A evolução da cirurgia plástica facial alcançada nos últimos anos ofereceu ao cirurgião diferentes técnicas, estratégias e possibilidades, mas infelizmente não determinou qual a opção de escolha para o lifting cervical, sendo que a procura do tratamento ideal ainda continua.1,3-5 Buscando a manutenção dos resultados da cervicoplastia a longo prazo, o foco atual de parte dos estudos parece estar na abordagem de múltiplas estruturas anatômicas e na utilização de diferentes estratégias cirúrgicas.1,2,4,6,7
Nesse sentido, os autores vêm utilizando, há mais de 10 anos, a chamada cervicoplastia ampliada para o rejuvenescimento cervical, com resultados seguros, confiáveis e reprodutíveis.8 A técnica nada mais é do que a reunião de preceitos clássicos, defendidos por cirurgiões como Millard et al.,9 que valorizaram o acesso cervical amplo e a lipectomia direta através da incisão no submento; Connell10 e Feldeman,11 que demonstraram a importância das abordagens mais agressivas e diretas no músculo platisma; e Pitanguy,12 que preconizou a devolução da anatomia natural dos tecidos abordados no Round Lifting.
Este estudo foi delineado com o intuito de apresentar a experiência dos autores com a cervicoplastia ampliada e avaliar a manutenção ou não de seus resultados a longo prazo.
Foram incluídos no estudo todos os pacientes submetidos à cervicoplastia ampliada, na clínica privada do autor, no período de janeiro de 2008 a agosto de 2010, classificados como grau IV de McKinney13 - presença de flacidez de pele pronunciada no terço inferior da face e de bandas platismais muito visíveis - o chamado pescoço difícil.8
No pré-operatório, os pacientes foram fotografados, por um mesmo fotógrafo, em posições preestabelecidas (frente, perfil direito e esquerdo), no mesmo local e com as mesmas características de imagem (Câmera Digital Nikon Inc, Melville, New York).
A cirurgia foi realizada seguindo a metodologia descrita a seguir: com o paciente sedado, iniciou-se a infiltração anestésica tumescente da região com cerca de 150ml de solução contendo lidocaína 0,125% com adrenalina 1:200.000. Foi realizada então a lipoaspiração da região cervical. Em seguida, incisou-se o sulco submentoneano (variando de quatro a 6cm) e dissecou-se a região anterior do pescoço com tesoura de Metzembaum - evidenciando-se os músculos platisma. Por meio de divulsão romba, o músculo platisma foi então parcialmente liberado das estruturas profundas na região médio-cervical, confeccionando-se dois retalhos musculares com cerca de 4cm de extensão. A gordura subplatismal ficou claramente exposta e teve a parte central do seu conteúdo excisado. Em seguida, aproximaram-se os retalhos musculares do platisma, na linha média, com sutura contínua com fio mononáilon 4.0, em camada única, com comprimento entre cinco e 9cm - da incisão submentoneana até a cartilagem tireoide. Realizou-se então a sequência clássica do Round Lifting12 de Pitanguy, iniciando-se pela incisão retroauricular, com ampla dissecção do retalho cutâneo cervicofacial. Com o sistema músculo-aponeurótico superficial exposto, foi realizada plicatura em "L" invertido, iniciada na região zigomático-facial e estendida à região cervical lateral, próximo ao músculo esternocleidomastoideo. A tração de pele, ao final da cirurgia, contribuiu para a maior definição da região cervical.8 (Figuras 1 e 2).
Após a cirurgia, os pacientes foram acompanhados semanalmente no primeiro mês e bimestralmente até o 12º mês, quando foram capturadas novas imagens fotográficas (idênticas às do pré-operatório). No quinto ano de pós-operatório, os pacientes foram contatados, e lhes foi agendada uma reavaliação. Os pacientes que não seguiram o acompanhamento foram automaticamente excluídos do estudo.
Na consulta de revisão de cinco anos de pós-operatório foram capturadas novas imagens fotográficas (em condições idênticas às do pré-operatório). Nessa avaliação, foi perguntado aos pacientes se eles haviam realizado outro procedimento no terço médio ou inferior da face nesse intervalo. Os que responderam positivamente foram excluídos do estudo.
Os pacientes tiveram suas fotos (pré-operatório, um ano e cinco anos de pós-operatório) submetidas à avaliação de oito cirurgiões plásticos membros da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP).
O resultado da cervicoplastia ampliada foi avaliado pelo método modificado de Antell & Orsesk,14 segundo o qual, utilizando critérios subjetivos, oito cirurgiões plásticos fizeram duas avaliações de cada paciente: pré-operatório X pós-operatório de um ano; pré-operatório X pós-operatório de cinco anos.
Os avaliadores forneceram as seguintes pontuações para cada período analisado: 0 = piora; 1 = sem alteração; 2 = melhora leve; 3 = melhora moderada; 4 = melhora importante; e 5 = melhora máxima possível.
As pontuações de cada paciente foram somadas, e o resultado final classificou o desfecho da cirurgia como: ruim (0-9); fraco (10-19); moderado (20-28); muito bom (29-36); e excelente (37-40).
A avaliação da associação entre a classificação do resultado da cirurgia e o momento em relação ao pré-operatório foi realizada por meio do teste de McNemar. A comparação entre os momentos um ano e cinco anos, em relação à pontuação média total do resultado da cirurgia foi realizada por meio do teste t-Student pareado. A análise estatística foi realizada por meio do programa estatístico SigmaPlot, versão 12.5, considerando um nível de significância de 5%.
No período estudado, 39 pacientes classificados como grau IV de McKinney13 foram submetidos à cervicoplastia ampliada. Desses, 16 (41,02%) foram excluídos da análise: 12 por não ter retornado às consultas de pós-operatório de acompanhamento tardio e quatro porque se submeteram a preenchimentos definitivos no terço inferior da face nesse período. As 23 pacientes que concluíram o estudo eram do sexo feminino, brancas, sendo a idade média de 58±13 anos.
O procedimento cirúrgico teve duração média de 205±34 minutos. Não foi encontrada dificuldade na confecção dos retalhos musculares de platisma nem na ressecção da gordura subplatismal. Todos os pacientes receberam alta com cerca de 24 horas de internação. A recuperação pós-operatória foi considerada satisfatória, tendo três pacientes evoluído com hematoma, duas com necrose parcial do retalho cutâneo retroauricular, uma com paralisia temporária do ramo submandibular do nervo facial. As demais pacientes evoluíram sem intercorrências.
A síntese da avaliação é representada na tabela 1, com a reunião da classificação dos resultados após um e cinco anos de pós-operatório.
Nenhum paciente teve seu resultado classificado como excelente ou ruim, em nenhum dos períodos avaliados. O percentual de pacientes, de acordo com a classificação dos resultados da cirurgia, após um ano e após cinco anos, em relação ao pré-operatório, está apresentado na tabela 2.
Os resultados estão apresentados em frequência relativa (frequência absoluta). Não houve distribuição significativamente diferente em relação à classificação da cirurgia, como avaliado após um ano e após anos anos da cirurgia (teste de McNemar, p = 0,450).
Um ano depois do procedimento, 12 pacientes apresentaram o resultado da cirurgia classificado como muito bom - e, desses, 58,3% (n = 7) mantiveram essa classificação no quinto ano de pós-operatório; 11 pacientes tiveram o resultado classificado como moderado ou fraco - e, desses, 81,8% (n = 9) mantiveram o resultado no quinto ano de pós-operatório. Não houve distribuição significativamente diferente em relação à classificação do resultado e o período avaliado (teste de McNemar: p = 0,450). De forma geral, houve concordância na classificação do resultado da cirurgia no primeiro e no quinto ano de pós-operatório, de 69,6% (n = 16) dos casos.
A pontuação média total do resultado da cirurgia, na avaliação do primeiro ano um ano foi de 27,74±0,99 pontos (média±erro-padrão da média), enquanto no quinto ano foi de 27,30±1,19 pontos. Não houve, da mesma forma, diferença estatística entre os momentos e a pontuação total na avaliação do resultado da cirurgia (teste t-Student pareado, p = 0,373) (Gráfico 1).
Nas figuras 3 e 4 são apresentadas pacientes operadas, em visão frontal, perfil direito e esquerdo; fotos de pré-operatório (linha superior), pós-operatório de um ano (linha média) e pós-operatório de cinco anos (linha inferior).
Várias opções cirúrgicas estão disponíveis para o tratamento dos sinais de envelhecimento no terço inferior da face.5,6 A evolução das técnicas passou por diversos momentos interessantes, desde a inicial simples tração cutânea até os mais complexos retalhos musculares cervicais.3,4 A efemeridade dos resultados obrigou os cirurgiões a buscar alternativas que estabilizassem os tecidos da região, mantendo, pelo maior tempo possível, o agradável ângulo cérvico-facial obtido no pós-operatório imediato.2,5 Parece claro que o sucesso da cirurgia passa pela obtenção de um resultado natural, livre de estigmas e que, acima de tudo, seja mantido com o tempo.1
A cervicoplastia ampliada tenta justamente oferecer melhores resultados a longo prazo na cirurgia do rejuvenescimento cervical. Ela reúne o tripé básico para a obtenção de resultado mais duradouro na cirurgia facial: aborda a estrutura a ser tratada de forma ampla e direta; atenua as forças musculares opositoras de forma precisa e efetiva; e reposiciona e fixa os tecidos descolados em estruturas rígidas e firmes.2 A técnica consegue tratar diretamente os principais fatores envolvidos no envelhecimento cervical: a lipodistrofia submentoneana (supra e infraplatismal); a flacidez do músculo platisma; e a ptose cutânea proveniente do terço médio da face.1,15 Deformidades menos comuns como as glândulas submandibulares proeminentes e a aparência dos músculos digástricos são também bem tratadas indiretamente com a técnica, reduzindo a necessidade de procedimentos ainda mais agressivos, com complicações potencialmente mais graves.1,2,15,16
De modo geral, a técnica é empregada pelos autores em todos os pacientes candidatos ao rejuvenescimento cervical. A variação está na intensidade de sua execução: nos casos mais pronunciados, como os McKinney IV aqui descritos, a abordagem e os descolamentos são maiores, as marcações são mais amplas e as plicaturas mais vigorosas.8 Acreditamos que a técnica é especialmente recomendada para esses casos, nos quais um tratamento mais conservador provocaria resultados menores e efêmeros para a maior parte dos pacientes.2,4,17 Nos casos menos exuberantes, como McKinney III por exemplo, a técnica também é empregada pelos autores, sendo os descolamentos, as trações e as plicaturas menos agressivas.8
A maioria dos autores relata poucas complicações na cirurgia do rejuvenescimento cervical, mesmo nas maiores abordagens, como na confecção dos retalhos platismais e nas amplas dissecções na região.16 As complicações aqui descritas assemelharam-se muito às publicadas por Montedonio et al.5 Felizmente não enfrentamos sangramentos importantes como os relatados por Righesso et al.17 e Mendelson & Tutino.16 Acreditamos que a excelente qualidade final da cicatriz submentoneana não justifica a preocupação relatada por alguns autores em reduzi-la;16 o que contribui para uma ampla visão da região operada, facilitando a cauterização dos vasos e minimizando as chances dos hematomas e das temidas lesões nervosas.
A avaliação no longo prazo dos resultados obtidos com a cervicoplastia ampliada é fundamental para definirmos o real papel da técnica no arsenal dos cirurgiões plásticos, especialmente quando comparamos seu desfecho com as estratégias muito menos invasivas preconizadas por alguns autores atualmente.4
Infelizmente, análises de cirurgias faciais no longo prazo são escassas na literatura. De modo geral, os resultados tardios apresentados pela maioria dos autores são, até certo ponto, precoces.4,7,17 Assim como Crassas3 e Pitta et al.,2 acreditamos que análises tardias, como a que apresentamos aqui - com 5 anos de pós-operatório - são importantes quando questionamos o valor tardio da técnica empregada. Avaliações mais precoces podem nos conduzir a conclusões equivocadas quanto à durabilidade do procedimento.6
Os métodos descritos na literatura para a avaliação dos resultados no longo prazo também variam muito e não há consenso quanto à melhor forma de realizá-la.4 Buscando uma avaliação precisa e reprodutível, utilizamos o método modificado de Antell & Orsesk.14 Utilizando critérios subjetivos, oito cirurgiões plásticos fizeram avaliações dos resultados, indicando ou não a existência e o grau de melhora no pós-operatório, no primeiro e no quinto ano. Autores como Rima et al.4 utilizaram método muito semelhante, confirmando sua efetividade.
Os resultados aqui apresentados demonstraram que a cervicoplastia ampliada foi capaz de oferecer, mesmo em casos difíceis, resultados agradáveis e que se mantiveram estáveis em acompanhamento no longo prazo. Esses resultados qualificam a técnica como uma alternativa para o tratamento do envelhecimento facial, especialmente quando almejamos a manutenção de resultado.
O equilíbrio entre o resultado imediato alcançado na cirurgia do rejuvenescimento cervical e sua durabilidade são aspectos importantes a avaliar na indicação das técnicas e táticas utilizadas na cervicoplastia. Nesse sentido, a cervicoplastia ampliada consolida-se como componente importante do arsenal do cirurgião, apresentando resultados agradáveis e que se mantêm no longo prazo, mesmo em casos difíceis.
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Trabalho realizado na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMGS) - Campo Grande (MS), Brasil.