Luciana Imaculada de Faria Melo1; Myrian de Faria Melo2; Maria Christina Marques Nogueira Castañon3
O carcinoma basocelular é o mais comum dos cânceres, e seu tratamento não cirúrgico tem sido alvo de muitos estudos. Grandes lesões desse tumor são desafios terapêuticos, e o tratamento tópico efetivo tem boa aplicabilidade. Apresentamos o caso de paciente diagnosticada com CBC superficial multicêntrico em região lombar há mais de 20 anos que recusou tratamento cirúrgico. O tumor atingiu dimensões de 12cmx10cm. Optamos pelo Imiquimod, no esquema de cinco aplicações semanais durante dois meses, como terapêutica não cirúrgica. Obtivemos cura clínica e histológica sem recidivas até a presente data - 36 meses -, com ótimo resultado estético e poucos efeitos adversos.
Keywords: CARCINOMA BASOCELULAR; TERAPÊUTICA; NEOPLASIAS
O carcinoma basocelular (CBC) é o tipo de neoplasia maligna mais frequente em todo o mundo1 e representa ¾ de todos os cânceres de pele.2 Trata-se de tumor de crescimento lento, com raras chances de metástase, possibilitando terapêuticas não cirúrgicas em casos de baixa agressividade, o que é determinado por características clínicas e histológicas. O tratamento objetiva a completa erradicação do tumor com bons resultados estéticos, evitando recidivas e melhorando a qualidade de vida de milhões de pacientes que anualmente recebem esse diagnóstico. Os tratamentos reconhecidos como alternativos à cirurgia são: radioterapia, terapia fotodinâmica, crioterapia e os tópicos 5-fluoracil 5%, diclofenaco 3%, ingenol mebutato 0,015% - 0,05% e imiquimod 5%.
O imiquimod atua modificando a resposta biológica por indução de citocinas, fazendo com que o sistema imune reconheça as células tumorais como antígenos, erradicando-as. É medicamento aprovado para tratamento de CBC superficial pelo órgão regulamentador norte-americano Food and Drug Administration (FDA). O esquema terapêutico mais utilizado é o de cinco aplicações semanais durante seis semanas. Estudos duplo-cegos randomizados multicêntricos com o objetivo de comparar esquemas de cinco versus sete aplicações semanais mostraram resultados conflitantes. Dessa forma, a posologia escolhida pode basear-se na tolerância aos efeitos adversos, sendo vantajoso o esquema com menos aplicações semanais.2,3
Paciente do sexo feminino, branca, 69 anos, veio à consulta no serviço de Dermatologia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Minas Gerais, Brasil, apresentando, em 2011, lesão em placa eritêmato-escamo-crostosa com bordas bem definidas, assintomática, localizada em região lombar à direita, com dimensões de 12cm x10cm e cerca de 20 anos de evolução (Figura 1). Em 1989, recebeu o diagnóstico de câncer de pele (não especificado pela paciente), porém não tivemos acesso a esse exame histopatológico. Nessa ocasião, a paciente recusou a cirurgia proposta para a lesão ainda numular. Em dezembro de 2011, procurou nosso serviço, queixando-se do crescimento da lesão e de pequenos sangramentos eventuais. Assim, com as hipóteses diagnósticas de doença de Bowen e CBC, indicou-se biopsia incisional que definiu o diagnóstico de CBC superficial multicêntrico (Figura 2). Diante disso e levando-se em consideração o tamanho da lesão e a resistência da paciente à cirurgia, optou-se pelo tratamento com imiquimod (Intendis do Brasil Farmacêutica Ltda, Itapevi,SP, BR), instituindo-se o esquema de cinco aplicações semanais. Após cinco semanas de uso, foi realizada a primeira revisão, quando se observou ulceração na borda medial mais proximal, porém, a maior parte da lesão se encontrava apenas com moderada irritação (Figura 3). Indicamos a continuação do tratamento, prolongando o uso para oito semanas, e não as seis preconizadas na literatura, com base na boa tolerância e objetivando aumentar a eficácia, já que o tamanho da lesão excedia os relatos pesquisados na época. O tratamento foi suspenso após dois meses, e posteriormente foram feitas biopsias de vários fragmentos de pele, com resultados negativos para neoplasia (Figura 4 ). Vem sendo mantido o seguimento trimestral já por 36 meses, sem lesões clínicas suspeitas, além da melhora crescente do aspecto cicatricial inicial (Figura 5).
O tratamento do CBC busca a erradicação completa do tumor de forma a prevenir recorrências e obtém bom resultado estético, melhorando a qualidade de vida dos pacientes. Sabe-se que tumores recidivados podem ser mais agressivos do que a lesão primária. Os fatores relacionados a maior recorrência são: tipo histológico (esclerodermiforme, infiltrativo, micronodular, basoescamoso), grandes dimensões, acometimento de níveis profundos, localização (centrofacial, nariz, orelhas e couro cabeludo), bordas mal definidas e envolvimento perineural e/ou perivascular.3 A cirurgia é o padrão ouro no tratamento, com as menores chances de recidiva. Tratamentos não cirúrgicos são indicados quando há condições clínicas desfavoráveis à cirurgia ou quando esse método pode resultar em grandes cicatrizes inestéticas e/ou prejuízo funcional ou, ainda, quando há recusa do paciente. Desde 2004, o tratamento com imiquimod, alternativo à cirurgia, está bem indicado para pacientes imunocompetentes com lesões superficiais no tronco, pescoço ou extremidades (exceto pés e mãos) e quando o seguimento periódico está assegurado.4,5 A completa regressão é relatada em 83% dos pacientes tratados com imiquimod em lesões com mais de 2cm de diâmetro.3
A paciente aqui referida recusou-se a qualquer cirurgia do extenso CBC com características clínicas e histológicas de baixa agressividade do qual era portadora, e portanto com boa indicação para o tratamento alternativo à cirurgia. Iniciou-se o uso do imiquimod em janeiro de 2012 com cinco aplicações semanais, e, devido à boa tolerabilidade, seu uso foi prolongado para oito semanas, já que se tratava de lesão de dimensões maiores do que as daquelas até então descritas na literatura. Os resultados clínicos e histológicos foram excelentes, com regressão total da lesão e ótimos resultados estéticos. A paciente vem sendo acompanhada trimestralmente sem recidivas, completando três anos sem lesão (Figuras 4 e 5).
1. Gaitanis G, Bassukas ID. Immunocryosurgery for Non-superficial Basal Cell Carcinoma: A Prospective, Open-label Phase III Study for Tumors < 2 cm in Diameter. Acta Derm Venereol. 2014;94(1):38-44.
2. Enokihara MY, Simões MM, Enokihara S. Carcinoma Basocelular e Carcinoma Espinocelular. Rotinas de Diagnóstico e Tratamento da Sociedade Brasileira de Dermatologia. 2010. p. 29-34.
3. Goldenberg G, Hamid O. Nonsurgical Treatment Options for Basal Cell Carcinoma - Focus on Advanced Disease. J Drugs Dermatol. 2013;12(12):1371-8.
4. Botto N, Rogers G. Nontradicional management of basal cell carcinoma. J Drugs Dermatol. 2013;12(5): 525-32.
5. Aldara Cream [package insert]; Bristol, TN: Graceway Pharmaceuticals, LLC; 2010. Acessado em: 15 abril 2015. Disponível em: www.accessdata.fda.gov/drugsatfda_docs/label/2010/020723s022lbl.pdf.
Trabalho realizado na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) - Juiz de Fora (MG), Brasil.