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Diagnóstico por Imagem

Ultrassom de alta frequência (22mhz) na diferenciação entre hidrocistoma e carcinoma basocelular

Elisa de Oliveira Barcaui1; Antonio Carlos Pires Carvalho2; Paulo Marcos Valiante3; Juan Piñeiro-Maceira4; Carlos Baptista Barcaui5

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2015723

Data de recebimento: 07/03/2015
Data de aprovação: 23/05/2015
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

A ultrassonografia é método de diagnóstico por imagem, indolor e não radioativo, que se baseia na reflexão de ondas sonoras através do tecido. O recente desenvolvimento de equipamentos de alta frequência e melhor resolução possibilitou a observação de estruturas superficiais e a identificação das diferentes camadas e estruturas da pele e anexos, ampliando, consideravelmente, seu uso nas diferentes condições dermatológicas, em particular, nas neoplasias cutâneas.
Neste trabalho, apresentamos dois casos em que a associação dos exames dermatoscópico e ultrassonográfico possibilitou criteriosa análise in vivo de morfologia, conteúdo, tamanho, espessura e vascularização tumoral, permitindo a diferenciação entre o carcinoma basocelular e o hidrocistoma, e assim contribuindo para melhor avaliação pré-operatória.

Keywords: CARCINOMA BASOCELULAR; HIDROCISTOMA; NEOPLASIAS; ULTRASSOM


INTRODUÇÃO

Para aprimorar o diagnóstico clínico-dermatológico, novos métodos de imagem estão sendo desenvolvidos. Técnicas como a dermatoscopia, a microscopia confocal, a tomografia óptica e o Usaf possibilitam o estudo, em tempo real, da superfície cutânea, auxiliando o diagnóstico, orientando procedimentos cirúrgicos, permitindo o acompanhamento de lesões e o seguimento de tratamentos.1,2 Esses métodos, contudo, variam consideravelmente, quando avaliamos sua penetração, resolução e aplicabilidade.3

Lesões clinicamente semelhantes, porém com comportamento distinto, podem, com o auxílio desses exames, ser mais bem avaliadas na fase pré-operatória, indicando a conduta terapêutica mais adequada.

A dermatoscopia ou microscopia confocal de superfície é método de diagnóstico que permite, através do auxílio de um aparelho manual que associa lente de aumento e luz de polarização cruzada, o reconhecimento de estruturas morfológicas não observáveis a olho nu. Tem grande impacto na prática dermatológica e possibilita, na maioria das vezes, diferenciar lesões cutâneas malignas e benignas, assim como delimitar sua extensão nos eixos longitudinal e horizontal. É incapaz, porém, de avaliar a consistência tumoral (cística ou sólida) e a profundidade de lesões hipopigmentadas.4

Utilizada na dermatologia desde a década de 1970, a ultrassonografia se baseia na reflexão de ondas sonoras através do tecido. De acordo com a estrutura anatômica, vascularização e densidade, as ondas ultrassônicas são refletidas de volta ao transdutor, que as transforma em uma escala cinza, observável no monitor.5,6 As imagens são obtidas por secções verticais, e tanto a penetração quanto a resolução variam de acordo com a frequência.3 O recente desenvolvimento de aparelhos com frequência superior a 15 MHz originou o ultrassom de alta frequência (Usaf)e tornou possível a identificação das diferentes camadas e estruturas da pele e anexos, ampliando, consideravelmente, seu uso nas diferentes condições dermatológicas. Esses equipamentos têm baixa penetração e, consequentemente, excelente resolução para visualização de estruturas superficiais.6

Na pele normal, a ecogenicidade de cada camada depende de seu principal componente que, na epiderme, é a queratina; na derme, o colágeno; e, no subcutâneo, os lóbulos de gordura. Na imagem ultrassonográfica, a epiderme apresenta-se como linha hiperecoica, a derme como banda hiperecoica menos ecogênica do que a epiderme, e o subcutâneo como camada hipoecoica com a presença de septos fibrosos hiperecoicos em seu interior.7

No caso dos tumores cutâneos, o Usaf permite delimitar a lesão pela diferença de refração entre a área tumoral e a região perilesional, permitindo, dessa forma, as medidas das dimensões nos eixos lateral e profundo. Possibilita, também, o estudo da consistência tumoral através de sua ecogenicidade. Lesões sólidas apresentam-se frequentemente hipoecoicas, enquanto a ecogenicidade é variável nas lesões císticas, dependendo da densidade de seu conteúdo.5,6

De todos os tipos de câncer, o carcinoma basocelular (CBC) é o mais frequente e representa 75-80% de todas as neoplasias cutâneas. Geralmente encontrado em pessoas acima de 60 anos, sua incidência vem aumentando em indivíduos jovens. Diferem quanto ao tipo clínico e histológico. Apesar de seu baixo poder metastático, invasões locais são comuns. Estudos apontam alto índice de recorrência das lesões localizadas na face (principalmente pálpebra, nariz e orelha) e previamente excisadas de forma incompleta. Por isso, muitas vezes são adotadas medidas terapêuticas como ampla ressecção cirúrgica, o que pode levar a problemas funcionais e estéticos. Fazer sua diferenciação de outras doenças que permitem uma conduta conservadora é de fundamental importância.

O hidrocistoma é neoplasia benigna cística originada do ducto da glândula sudorípara. Histologicamente, é classificado como écrino ou apócrino. Tipicamente, apresenta-se como pápulas translúcidas localizadas preferencialmente na face que, apesar de sua origem cística, muitas vezes são confundidas, clinicamente, com massas sólidas, principalmente o CBC. Tratamentos conservadores como laser de CO2, aplicação tópica de atropina a 1% ou injeção de toxina botulínica do tipo A apresentam sucesso terapêutico.8,9

 

MÉTODO

Foram analisadas duas pacientes do sexo feminino, uma com 74 e a outra com 72 anos, ambas apresentando lesão única localizada na lateral esquerda do nariz, com evolução média de um ano. Na história patológica pregressa, a primeira havia sido submetida à exérese de lesão no dorso nasal com fechamento por rotação de retalho, há três anos com laudo histopatológico evidenciando carcinoma basocelular, tipo nodular, completamente excisado. Nos dois casos foram realizados os exames clínico, dermatoscópico e Usaf com 22MHz.

Após a realização dos exames pré-operatórios, as pacientes foram submetidas a biópsia excisional, e o material foi encaminhado em solução de formol para exame histopatológico. Foi utilizada coloração de rotina para lesões cutâneas com hematoxilina-eosina (HE) e posterior análise microscópica com aumento de 40X e 100X.

O critério de seleção dos pacientes foi a igualdade na localização das lesões, em indivíduos de igual fototipo, quadro clínico semelhante e idade aproximada.

 

RESULTADOS

Clinicamente os pacientes apresentavam na lateral esquerda do nariz, lesões papulosas, normocrômicas, sem aspecto translúcido, o que sugeria tratar-se de massa tumoral sólida (Figura 1 A e B).

O exame dermatoscópico evidenciou nos dois casos, achados semelhantes, com a presença de telangiectasias arboriformes (Figura 2 A e B).

Ao Usaf observou-se, na primeira paciente, lesão ovalada, hipoecoica, com limites imprecisos, localizada na derme. No segundo caso, foi visualizada lesão anecoica bem delimitada localizada na derme com a presença de reforço acústico posterior, indicando conteúdo líquido e aspecto cístico (Figura 3 A e B).

O exame histopatológico evidenciou, no primeiro caso, ninhos de células basaloides localizados na derme. No segundo, lesão cística com localização dérmica, revestida por epitélio colunar. Os respectivos laudos conclusivos foram: carcinoma basocelular tipo nodular e hidrocistoma écrino (Figura 4 A e B).

 

DISCUSSÃO

Até o presente momento, o exame histopatológico é o padrão ouro para diagnóstico e avaliações morfológica e estrutural das neoplasias cutâneas. Contudo, novas técnicas para diagnóstico in vivo vêm sendo utilizadas para agilizar o diagnóstico e otimizar a avaliação pré-operatória.

Apesar de os critérios dermatoscópicos definidores para o diagnóstico do CBC (ausência de rede pigmentar associada à presença de ninhos ovoides, ulceração, múltiplos glóbulos cinza-azulados, estruturas em folha de bordo, áreas radiadas e/ou telangiectasias arboriformes) serem bem estabelecidos, o hidrocistoma pode apresentar estruturas dermatoscópicas que simulam esses achados, o que torna difícil o diagnóstico dermatoscópico dessas duas entidades.4

Por meio da ecogenicidade observada ao Usaf é possível fazer a distinção desses dois tipos de tumores cutâneos. No CBC, são observadas lesões hipoecogênicas, bem delimitadas, com contorno irregular. Frequentemente, observa-se a presença de pontos hiperecoicos em seu interior. Essas imagens são atribuídas à presença de cistos córneos, microcalcificações ou aglomerados de células apoptóticas no interior da massa tumoral.7 Estudo realizado por Chin e cols. utilizando Usaf indica que os hidrocistomas geralmente apresentam superfície hiperecoica com conteúdo anecoico (fluido claro) ou centro hipoecoico.10 Em nosso caso, observamos lesão delimitada, com superfície hiperecoica, contorno bem definido e conteúdo anecoico sugerindo conteúdo cístico.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Usaf pode ser considerado um excelente método na avaliação dos tumores cutâneos. Incapaz de avaliar a celularidade tumoral, não pode ser utilizado para confirmação diagnóstica, mas possibilita realizar detalhado estudo pré-operatório, analisando as diferentes camadas da pele e suas respectivas espessuras, indicando a natureza tumoral (cística ou sólida), fornecendo sua dimensão, exata localização e acometimento de estruturas adjacentes, parâmetros importantes para a orientação da conduta terapêutica.

 

Referências

1. Mogensen M, Morsy Ha, Thrane L, Jemec GBE. Morphology and epidermal thickness of normal skin imaged by optical coherence tomography. Dermatology. 2008;217(1):14-20.

2. Psaty EL, Halpern AC. Current and emerging technologies in melanoma diagnosis: the state of the art. Clin Dermatol. 2009;27(1):35-45.

3. Ulrich M, Stockfleth E, Roewrt-Huber J, Astner S. Noninvasive diagnostic tools for nonmelanoma skin cancer. Br J Dermatol. 2007;157 Suppl2:56-8.

4. Ferreira CMM, Barcaui C, Piñeiro-Maceira J. Atlas de dermatoscopia aplicação clínica e correlação histopatológica. 2 ed. Rio de Janeiro: Di Livros; 2011.

5. Wortsman X, Wortsman J. Clinical usefulness of variable-frequency ultrasound in localized lesions of the skin. J Am Acad Dermatol. 2010;62(2):247-56.

6. Kleinerman R, Whang TB, Bard RL, Marmur ES. Ultrasound in dermatology: principles and applications. J Am Acad Dermatol. 2012;67(3):478-87.

7. Worstman X. Sonography of facial cutaneous basal cell carcinoma. A first line imaging technique. J Ultrasound Med. 2013;32(4):567-72.

8. Sanz-Sanchez T, Dauden E, Perez-Casas A, Ortiz-del Portillo A, Jones M, García-Díez A. Efficacy and safety of topical atropine in treatment of multiple eccrine hidrocystomas. Arch Dermatol. 2001;137(5);670-1.

9. Woolery-lloyd H, Rajpara V, Nijhawan RI. Treatment for multiple periorbital eccrine hidrocystoma: botulinumtoxin A. J Drugs Dermatol. 2009;8(1):71-3.

10. Furuta M, Shields CL, Danzing CL, Eagle RC Jr, Shields JA. Ultrasound biomicroscopy of eyelid eccrine hidrocystoma. Can J Ophthalmol. 2007;42(5):750-51.

 

Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Serviço de Dermatologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.


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