Renan Minotto1; Liliam Dalla Corte2; Ana Letícia Boff3; Mariana Vale Scribel da Silva2; Marina Resener de Morais4
Keywords: UNHAS; CERATOACANTOMA; FALANGES DOS DEDOS DA MÃO.
O queratoacantoma localizado na unidade ungueal é variante incomum e destrutiva dessa neoplasia, que pode desenvolver-se no leito ungueal ou na dobra ungueal proximal. Em contraste com outros queratoacantomas, a regressão espontânea é incomum. A presença desse tipo de tumor na região do aparato ungueal é problemática, em função da localização, da escolha terapêutica e pela possibilidade de recorrências após excisão local.1 Nessa topografia, esse tumor pode apresentar variações quando comparado aos de outras localizações, classicamente representados por lesão nodular, dolorosa, endoexofítica, com área crateriforme preenchida por queratina, sendo, necessária a confirmação histopatológica do caso. A terapêutica deve basearse na correlação clínica, radiológica e histopatológica.2
Trata-se de paciente do sexo masculino, branco, 60 anos. Referia que há dois anos iniciou alteração ungueal do primeiro quirodáctilo da mão direita, tratado como onicomicose sem resultado e crescimento da lesão. Ao exame clínico, apresentava distrofia ungueal, com destruição da placa e exposição de lesão do leito (Figura 1), com áreas de textura cérea à palpação, circundadas por tecidos queratinizados endurecidos e edema do quirodáctilo. As impressões diagnósticas iniciais incluíram carcinoma epidermoide, queratoacantoma, e melanoma amelanótico. O raio-X do dedo afetado mostrou tumefação de partes moles, porém não revelou alterações osteoarticulares, o que sugeriu tratar-se de provável lesão superficial não compressiva (Figura 2). Exames micológicos direto e cultural foram negativos. Optou-se então pela biópsia em cunha para remoção de um espécime representativo da lesão. O exame anatomopatológico confirmou o diagnóstico de queratoacantoma (Figura 3). Diante desse resultado, decidiu-se pela excisão cirúrgica com avulsão total da placa ungueal e remoção do tumor que englobava o leito e dobra ungueal proximal, até o plano justaósseo e cicatrização por segunda intenção. O anatomopatológico desse espécime confirmou tratar-se de queratoacantoma, com margens livres, recomendando a retirada total do tumor. Durante acompanhamento após extirpação da lesão, não se evidenciou recrudescência no pós-operatório tardio.
O queratoacantoma envolvendo o tecido ungueal e periungueal é neoplasia de queratinócitos raramente encontrada nesses sítios, apresentando evolução destrutiva e, às vezes, afetando estruturas ósseas subjacentes por compressão tumoral. É variante rara e agressiva do queratoacantoma clássico, com tendência a aparecer nos primeiros três dedos das mãos, particularmente no primeiro quirodáctilo, podendo também ocorrer nos pododáctilos. O tumor geralmente ocorre em homens caucasianos de meia-idade. Pode ser solitário, múltiplo, eruptivo ou familiar.1,2,3 O quadro clínico difere do queratoacantoma tradicional, pois na forma subungueal geralmente há dor, crescimento rápido e precoce compressão óssea subjacente. Ao exame apresenta-se como um nódulo verrucoso ou hiperceratótico no leito ungueal, junto da borda distal da unha, frequentemente em associação com onicólise parcial. Na porção do tecido subungueal proximal, o tumor pode manifestar-se como lesão similar à paroníquia. Em contraste com o queratoacantoma de outras localizações, a regressão espontânea é incomum. O diagnóstico diferencial de lesão dolorosa e nodular da falange distal inclui cisto dermoide, verruga comum, exostose subungueal, melanoma amelanótico, carcinoma espinocelular e queratoacantoma subungueal.1,2 Devido a seu rápido crescimento, o queratoacantoma digital frequentemente causa erosão ou compressão óssea. O achado radiológico é o defeito em forma de taça da falange terminal. O dano ósseo usualmente se resolve após a excisão tumoral.1,2 Queratoacantomas subungueais tendem a ter menos inflamação e maior invasão na profundidade, e podem estar presentes em casos de incontinência pigmentar, como na síndrome de Bloch-Sulzberger.3,4 A histopatologia é similar à do queratoacantoma de outras áreas, revelando, tipicamente, paraqueratose e hiperqueratose epidérmica com centro preenchido por queratina.1 Entretanto, características distintas do queratoacantoma digital incluem orientação vertical, presença de muitas células disceratóticas, escassos neutrófilos e eosinófilos no epitélio, e fibrose reduzida na base. É importante diferenciar o queratoacantoma do carcinoma espinocelular para melhor escolha terapêutica e para avaliação do prognóstico. Ambos podem apresentar-se clinicamente com dor, inflamação ou destruição da falange distal.1,2,4,5 Radiologicamente, o queratoacantoma subungueal é quase indistinguível do carcinoma espinocelular subungueal. Entretanto, o queratoacantoma causa lesão na falange distal com borda bem definida, que se expande, mas não infiltra o osso; além disso, o queratoacantoma usualmente ocorre na quinta década de vida, enquanto o carcinoma espinocelular geralmente ocorre na sétima década de vida e tem crescimento mais lento.1-3,5 Curetagem e excisão local são indicadas por muitos autores como tratamento inicial de escolha para queratoacantoma digita.6 As recorrências, porém, são frequentes, provavelmente relacionadas a uma tendência do tumor à invasão profunda e conexão íntima com estruturas ósseas subjacentes. Pela habilidade em definir corretamente as margens tumorais, a cirurgia de Mohs pode ajudar na redução das recorrências e, consequentemente, preservar o envolvimento da ponta do dedo. Amputações têm sido relatadas nos casos de múltiplas recorrências, destruição óssea extensa ou quando a diferenciação do carcinoma espinocelular é difícil. Outros tratamentos com modalidades não cirúrgicas têm sido utilizados em casos peculiares com resultados variáveis.1,2 Nosso relato apresentou aspectos que chamam atenção, como a falta de diagnóstico inicial e do tratamento como onicomicose, e a necessidade de biópsia frente a casos como esse de lesões tumorais do complexo ungueal.
1. Cecchi R, Troiano M, Buralli L, Innocenti, S. Recurrent distal digital keratoacanthoma of the periungual region treated with Mohs micrographic surgery. Australas J Dermatol. 2012;53(1):e5-7.
2. González-Rodríguez AJ, Gutiérrez-Paredes EM, Montesinos-Villaescusa E, Burgués Gasión O, Jordá-Cuevas E. Queratoacantoma digital distal: importancia del diagnóstico diferencial con el carcinoma escamoso subungueal. Actas Dermosifiliogr. 2012;103(6):549-51.
3. Underhill T. Subungual keratoacanthoma: the importance of accurate diagnosis. J Hand Surg Eur Vol. 2010;35(7):599-600.
4. Connolly M, Narayan S, Oxley J, Berker DAR. Immunohistochemical staining for the differentiation of subungual keratoacanthoma from subungual squamous cell carcinoma. Clin Exp Dermatol. 2008;33(5):625-8.
5. André J, Richard B. Subungueal keratoacanthoma. Ann Dermatolol Venereol. 2012;139(1):68-72.
6. Pellegrini VD Jr, Tompkins A. Management of subungueal keratoacanthoma. J Hand Surg Am. 1986;11(5):718-24.
Trabalho realizado na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre - Porto Alegre (RS), Brasil.