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Artigo Original

Ácido chiquímico para esfoliação cutânea

Wanessa Almeida Ciancaglio Garbossa1; Daiane Garcia Mercurio2; Patricia Maria Berardo Gonçalves Maia Campos3

Data de recebimento: 13/08/2014
Data de aprovação: 21/09/2014
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

Introdução: Ácidos orgânicos são amplamente utilizados na área dermocosmética, pois apresentam efeitos relacionados à esfoliação e à renovação celular. Deles, pode-se citar o derivado do anis-estrelado, conhecido como ácido chiquímico. Objetivos: Avaliar a atividade antioxidante do ácido chiquímico e a eficácia clínica de preparações dermocosméticas acrescidas de 3% desse ativo. Métodos: A atividade antioxidante foi avaliada por um método in vitro. Sequencialmente, foram elaboradas preparações de gel, gel creme e solução a 3% do ácido, as quais foram submetidas a estudos preliminares de estabilidade e análise sensorial. O estudo clínico foi realizado por técnicas não invasivas de biofísica e imagem da pele. Resultados: O ácido chiquímico apresentou potencial antioxidante. Todas as preparações foram consideradas estáveis, e a adição do ácido chiquímico melhorou o sensorial do gel e do gel creme. No estudo clínico, o gel e a solução mostraram alterações significativas no microrrelevo e nos parâmetros relacionados à esfoliação da pele. Entretanto, a formulação gel creme não proporcionou tal efeito, mostrando a importância do veículo para a eficácia de cosméticos. Conclusões: O ácido chiquímico pode ser considerado potencial ativo para aplicação em formulações dermocosméticas para esfoliação e melhora do microrrelevo da pele.

Keywords: ABRASÃO QUÍMICA; ANTIOXIDANTES; COSMÉTICOS; EFICÁCIA; ÁCIDO CHIQUÍMICO.


INTRODUÇÃO

A área dermocosmética tem-se atido ao uso de compostos de origem vegetal, e como resultado visualiza-se relevante aceitação por parte dos consumidores, que levam em consideração as fragrâncias agradáveis, as propriedades benéficas, e a compreensão de que essas formulações à base de produtos vegetais são mais seguras do que as correspondentes contendo derivados sintéticos.1,2

Dentre esses compostos naturais destacam-se os ácidos orgânicos, que são comumente encontrados em diversos tipos de frutos e amplamente utilizados há muitas décadas. Seus efeitos sobre a pele estão relacionados, principalmente, com a esfoliação e a renovação celular, sendo, então, indicados para tratamento de fotoenvelhecimento, acne e hiperpigmentação cutânea.3,4

Como agentes esfoliantes químicos, os ácidos orgânicos são empregados, ao longo do tempo, para tratamento de diversas doenças de pele, como também para fins estéticos. A profundidade da ação do ácido nas camadas da pele pode resultar, entre outros efeitos, em renovação celular, clareamento da pele, síntese de colágeno e espessamento da epiderme. A escolha do ácido depende dos resultados desejados, ou seja, depende da profundidade da ação.5,6

O processo de esfoliação química pelo uso de um ácido orgânico pode ser resultante da redução da coesão entre as células do estrato córneo, promovendo a descamação e, por fim, um estrato córneo mais flexível e compacto.7 Adicionalmente a esses benefícios, as ações desodorante, antimicrobiana e antioxidante também estão inseridas entre as propriedades de um ácido orgânico obtido a partir do anis-estrelado (Illicium verum), o ácido chiquímico. Esse ativo é um componente multifuncional capaz de proteger a pele, mantendo-a adequada a suas funções. Estudos recentes referem que o ácido chiquímico consegue inibir a atividade da enzima lipase, bloqueando a produção de ácidos graxos e agindo, assim, como agente controlador de odor. Além disso, tem ação inibitória sobre o crescimento microbiano de um dos agentes causadores da dermatite seborreica do couro cabeludo.8,9

No desenvolvimento de formulações cosméticas acrescidas de ácidos orgânicos deve-se levar em consideração, entre outros fatores, a concentração do ácido, o pH da formulação, a quantidade de ácido livre presente, o tipo de ácido, o veículo, a duração da exposição e o tipo de pele do consumidor.4 Interferências nessas condições podem culminar com a ineficácia do produto final.

Sequencialmente ao desenvolvimento, a avaliação da estabilidade preliminar é de fundamental importância para predizer o comportamento do ativo, bem como da formulação, frente às condições reais de uso e armazenamento. Para tal, verificam-se as características organolépticas, o comportamento do pH e a separação de fases.

Além disso, os métodos in vitro para a avaliação da atividade antioxidante vêm sendo bastante utilizados, uma vez que fornecem informações valiosas do potencial da substância a ser empregada em produto cosmético. Entre eles, o método da quimioluminescência dependente de HRP-luminol-H2O2 tem sido um dos mais utilizados na atualidade por ser rápido, confiável e eficaz na determinação da capacidade de alguns antioxidantes em neutralizar radicais livres.10

Considerando os efeitos antioxidantes de polifenóis, a caracterização da atividade antioxidante do ácido chiquímico é muito relevante, uma vez que possui estrutura química capaz de neutralizar radicais livres e se estabilizar, evitando a reação descontrolada com biomoléculas da pele.

Antes de verificar sua eficácia clínica, o produto cosmético finalizado deve ser submetido à avaliação de suas características sensoriais, as quais podem influenciar de modo decisivo na escolha do produto pelo consumidor, além de fazer com que o usuário altere a forma de aplicação, a freqüência de uso e a quantidade de produto aplicado, dependendo da maior ou menor aceitação de suas características sensoriais, o que influencia sua eficácia.11

Considerando que a avaliação sensorial é apenas de caráter qualitativo, assim como as observações clínicas, é também imprescindível a avaliação quantitativa da eficácia da formulação nas reais condições de uso, ou seja, na pele humana, por técnicas biofísicas e de análise de imagem, que têm sido as de escolha em estudos de segurança e eficácia e recomendados por agências regulatórias, tais como Anvisa, FDA e Colipa.

As técnicas biofísicas e de análise de imagem da pele consistem no estudo das características de algumas variáveis, que incluem, entre outras, a determinação do conteúdo aquoso do estrato córneo, a perda transepidérmica de água, o microrrelevo da pele.12

Para a medida do conteúdo aquoso do estrato córneo, o método da capacitância, com o uso do equipamento Corneometerâ tem sido bastante empregado para tal finalidade.12

O Tewameterâ mede essa perda de água transepidérmica por gradiente de pressão da água adjacente à superfície da pele. Assim, quanto menor for o valor obtido, melhor será a função barreira da pele.12

Para a averiguação da superfície da pele pode-se utilizar o equipamento Visioscan® VC 98 (Courage & Kazaka Electronic GmbH, Köln, Alemanha), que permite avaliação qualitativa e quantitativa da superfície da pele nas condições fisiológicas, por meio da técnica de profilometria óptica.13

Por fim, em função das propriedades acima descritas do ácido chiquímico, esse composto foi introduzido como ingrediente ativo para aplicação em formulações cosméticas sendo, portanto, de grande importância na realização de estudos para a comprovação dos benefícios propostos.

Objetivos

O presente trabalho teve por objetivo a avaliação da atividade antioxidante in vitro do ácido chiquímico, derivado do anis-estrelado, bem como o desenvolvimento e a eficácia clínica de preparações dermocosméticas contendo esse componente de origem natural.

 

MÉTODOS

Pesquisa e desenvolvimento das preparações cosméticas

Para elaboração das formulações foram considerados o pH de estabilidade, a concentração de uso, as características sensoriais e a interação entre as matérias-primas empregadas.

Foram desenvolvidos três veículos: um gel creme, um gel e uma solução aquosa, aos quais foi adicionado o ácido chiquímico (Tabela 1).

As preparações gel, gel creme e solução desenvolvidas foram submetidas, 24 horas depois do preparo, a estudos de estabilidade preliminar por centrifugação, determinação de pH e a avaliações semanais das características organolépticas durante 30 dias, sendo mantidas no ambiente e submetidas ao estresse térmico de 37°C e 45ºC, em estufas termostatizadas, com controle de umidade e fotoperíodo, modelo 111FC (Eletrolab).

Estudos de estabilidade preliminar

Para o teste de centrifugação, três gramas de cada amostra foram centrifugadas em tubos Falcon plásticos por três ciclos de 30 minutos, a 3000rpm, em centrífuga Excelsa Baby II, modelo 206-R, potência 0,0440, Fanem. A medida de pH foi feita em um peagômetro DM 20, Digimed, utilizando para isso soluções aquosas das formulações, com concentração de 10%.14

Na avaliação organoléptica foram consideradas as seguintes alterações: cor, separação de fases, homogeneidade.

Avaliação sensorial

Essa avaliação foi efetuada como uma das etapas do desenvolvimento das formulações gel e gel creme em estudo; 12 voluntários do sexo feminino aplicaram uma quantidade padronizada (50ml) das formulações em regiões distintas na porção inferior média dos antebraços.

Este estudo foi realizado pela comparação das formulações dos veículos com as respectivas formulações acrescidas do ativo objeto de estudo.

Por fim, as voluntárias receberam uma ficha de avaliação sensorial, na qual atribuíram notas de acordo com os parâmetros de qualidade fornecidos,15 como apresentado no quadro 1.

A avaliação sensorial foi realizada em duas etapas, as quais tiveram seus resultados apresentados em gráfico tipo box plot.

Esse gráfico utilizado possui uma caixa central que representa 50% dos valores centrais das notas atribuídas pelas voluntárias; uma reta horizontal no interior da caixa corresponde à mediana das notas, e as notas máxima e mínima são representadas pelas retas que partem da extremidade superior e inferior da caixa central, respectivamente.

Avaliação da atividade antioxidante

Para avaliar o potencial antioxidante do composto em estudo foi escolhido o método de quimioluminescência dependente de luminol, cujo princípio se baseia na detecção de fótons emitidos pelo luminol quando esse é oxidado pelo peróxido de hidrogênio em presença de um catalisador, a enzima HRP (horseadish peroxidase). Assim, forma-se um intermediário reativo (radical livre), e quando esse produto excitado retorna ao estado fundamental emite fótons, os quais são captados pelo equipamento.16

Portanto, quanto maior o sinal captado pelo equipamento, maior a produção de radicais livres. Quando há adição de uma substância antioxidante, ocorre neutralização de parte dos radicais livres, o que leva a menor emissão de fótons e, consequentemente, um sinal menor é detectado pelo equipamento.10

Foram feitas várias diluições do ativo em tampão fosfato 0,1M (pH 7,4). Sequencialmente, alíquotas de 10 µl dessas soluções e de uma solução-controle contendo apenas o tampão, foram acrescidas de 400µl de tampão fosfato 0,1M (pH 7,4), 100µl H2O2 e 10µl de solução de luminol (5mg/ml). A reação foi, então, iniciada pela adição de 500µl de solução (0,2UI/ml) de HRP e a quimioluminescência foi quantificada utilizando-se o luminômetro Autolumat LB953 EG&G Berthold.10,17,18

As medidas foram feitas em triplicata para cada amostra, e os resultados foram expressos em área sob a curva (AUC), representando, assim, o total de radicais livres produzidos em 10 minutos a 30ºC. Dessa forma, pôde-se calcular a porcentagem de inibição para cada concentração do composto de acordo com a equação Taxa de Inibição (%) = 100 - (100 x AUCamostra / AUCcontrole), sendo AUCamostra a área sob a curva da amostra e AUCcontrole a área sob a curva do controle.19

 

AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA CLÍNICA CASUÍSTICA

Essa etapa foi realizada após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto - USP - Protocolo nº 143 - CEP/FCFRP.

Os voluntários foram, então, esclarecidos e orientados sobre os objetivos e métodos da pesquisa e, concordando em participar, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, elaborado segundo a declaração de Helsinque e também aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa.

Foram selecionadas 10 voluntárias com peles de fototipo II e III, e idades entre 20 e 35 anos. Para essa seleção foram considerados os seguintes critérios de exclusão: gravidez ou aleitamento; história anterior de reações adversas com o uso de produtos cosméticos; uso de medicamentos passíveis de produzir resposta cutânea anormal; doenças dermatológicas localizadas ou generalizadas e excesso de pêlos nas regiões de estudo.

Análise da eficácia clínica por técnicas de biofísica e análise de imagem da pele

Antes da realização das medidas as voluntárias foram aclimatados por 10 minutos em ambiente com temperatura (20°C a 22°C) e umidade relativa do ar (45% a 55%) controladas.

As preparações cosméticas foram submetidas ao estudo clínico para comparação dos veículos empregados sobre a eficácia do ácido chiquímico.

As soluções, juntamente com as demais formulações consideradas estáveis frente aos estudos de estabilidade preliminar, foram submetidas ao estudo clínico para determinação de sua eficácia.

O estudo clínico foi realizado em duas etapas: primeiro avaliou-se a preparação F1 e, posteriormente, as preparações F2 e F3. Foram selecionadas 10 voluntárias, que, no primeiro momento tiveram a região inferior média dos antebraços dividida em dois quadrados, tendo cada um 25cm2. Essas regiões foram randomizadas, considerando uma região-controle. No segundo momento, a região inferior média dos antebraços foi dividida em três quadrados, tendo cada um 25cm2. Essas regiões foram randomizadas, considerando uma região-controle.

Aclimatadas, as voluntárias foram submetidas às medidas basais para avaliação do microrrelevo da pele, do conteúdo aquoso do estrato córneo e da perda transepidérmica de água.

A aplicação do gel creme (F1) e do gel (F2) foi feita com o auxílio de uma pipeta automática para amostras viscosas e a aplicação da solução (F3), com pipeta automática para amostras fluidas. Volumes iguais, de 50ml (2ml/cm2), de cada formulação foram aplicados nas regiões demarcadas.

Duas horas após a aplicação das preparações cosméticas, as voluntárias retornaram e, após aclimatação, procedeu-se à segunda série de medidas para avaliação, assim, dos efeitos imediatos.

Determinação do conteúdo aquoso do estrato córneo

Para a determinação do conteúdo aquoso do estrato córneo foram realizadas medidas utilizando o equipamento Corneometerâ CM 825 (Courage & Kazaka Electronic GmbH, Köln, Alemanha), que, através da medida da capacitância elétrica, mede o nível de hidratação do estrato córneo.

Os resultados foram dados em unidades arbitrárias (UA), e o equipamento determina que 1UA corresponde ao intervalo de 0,2 a 0,9mg de água por grama de estrato córneo.12,20

Determinação da perda transepidérmica de água

Para avaliação da função barreira da pele, foi utilizado o equipamento Tewameterâ TM 210 (Courage & Kazaka Electronic GmbH, Köln, Alemanha), cuja função é medir a evaporação de água da superfície da pele, com base na difusão de Fick.20,21

Determinação do microrrelevo da pele

Para a avaliação da superfície da pele foi utilizado o equipamento Visioscan® VC 98, que permite avaliação qualitativa e quantitativa da superfície da pele nas condições fisiológicas, por meio da técnica de profilometria óptica.

O programa fornece histograma que apresenta distribuição de diferentes níveis de cinza, quantificando os pontos escuros, que correspondem à rugosidade, e os pontos claros, correspondentes aos platôs do microrrelevo da pele.

Com esse método são avaliados parâmetros relacionados à superfície da pele (Quadro 2).13

Os dados experimentais obtidos na avaliação da eficácia clínica foram submetidos à análise estatística, na qual foram realizados testes preliminares de normalidade da distribuição e de homogeneidade das variâncias envolvidas no experimento.

Análise estatística

Os testes estatísticos acima referidos foram realizados por meio dos softwares estatísticos GMC, elaborado por Maia Campos (1999),22 e Minitab®. 16

 

RESULTADOS

Desenvolvimento das formulações

Estudos de estabilidade preliminar

As preparações cosméticas permaneceram estáveis durante os 30 dias de estudo.

Avaliação sensorial

Os resultados da avaliação sensorial da formulação F1 em comparação a seu veículo estão no gráfico 1, e os resultados da avaliação da formulação do tipo gel, F2, e de seu respectivo veículo estão no gráfico 2.

Avaliação da atividade antioxidante

O gráfico 3 apresenta os resultados da avaliação da atividade antioxidante pelo percentual de inibição dos radicais livres formados em função da concentração do ácido chiquímico.

Avaliação da eficácia clínica

Neste estudo clínico foram realizadas medidas do conteúdo aquoso do estrato córneo (Gráfico 4), da perda transepidérmica de água (Gráfico 5), e do microrrelevo da pele (Gráfico 6) no início do experimento (valores basais) e duas horas depois de aplicação única das formulações estudadas nos antebraços das voluntárias. Os valores obtidos foram submetidos à análise estatística.

Estudo estatístico dos resultados obtidos

Os resultados experimentais da avaliação dos efeitos imediatos da preparação F1 após aplicação única nos antebraços consistiram em 40 valores numéricos, correspondentes aos fatores de variação, tempo e formulações estudadas. Esses valores são resultantes do cruzamento de duas áreas de aplicação da formulação objeto de estudo (F1) e o controle, em dois tempos diferentes (antes e duas horas depois da aplicação das formulações) x 10 repetições, dando o produto fatorial 2 x 2 x 10 = 40.

Os resultados experimentais da avaliação dos efeitos imediatos das preparações F2 e F3 após aplicação única nos antebraços consistiram em 60 valores numéricos, correspondentes aos fatores de variação, tempo e formulações estudadas. Esses valores são resultantes do cruzamento de três áreas de aplicação das preparações objeto de estudo (F2 e F3) e o controle, em dois tempos diferentes (antes e duas horas depois da aplicação das formulações) x 10 repetições, dando o produto fatorial 3 x 2 x 10 = 60.

Os testes preliminares foram realizados com a finalidade de verificar a normalidade e homogeneidade da distribuição amostral e assim decidir quais testes deveriam ser empregados (paramétricos ou não paramétricos).

Os resultados desses testes preliminares indicaram que as amostras testadas se apresentaram homogêneas, e a distribuição de frequências se aproximava da distribuição de frequências da curval normal matemática.

Assim, o teste paramétrico que melhor se adaptou ao modelo experimental foi a análise de variância, seguida pelo teste de Tukey para comparação de médias.

 

DISCUSSÃO

Através dos estudos de estabilidade preliminar, as preparações cosméticas foram avaliadas e constatou-se que, durante o armazenamento de 30 dias, permaneceram estáveis. Com relação à análise visual, pôde-se verificar a ausência de separação de fases e de alterações de cor e homogeneidade.

Todas as formulações se mantiveram na faixa de pH inicial e, quando submetidas ao estresse físico da centrifugação, permaneceram homogêneas, ou seja, sem separação de fases.

Dessa forma, as formulações F1 e F2 foram submetidas à avaliação sensorial. Inicialmente, a formulação gel creme F1 foi avaliada em comparação a seu veículo. Como resultado, ambas as formulações apresentaram características sensoriais adequadas, sendo que a formulação acrescida do ativo foi considerada melhor nos parâmetros sensação ao toque, com notas variando de 3 a 4; espalhabilidade, com notas variando de 2 a 4; e sensação da pele cinco minutos depois da aplicação da formulação, com notas variando de 3 a 4.

As duas formulações foram consideradas iguais frente à avaliação da hidratação, com notas concentradas entre 3 e 4. No parâmetro suavidade, o veículo obteve notas mais homogêneas, concentradas entre 3 e 4, com mediana 3.

A segunda etapa se deu com a avaliação da formulação do tipo gel, F2, e de seu respectivo veículo. Como resultado, as formulações foram consideradas iguais, frente aos parâmetros espalhabilidade e sensação da pele cinco minutos depois da aplicação, com notas variando de 2 a 4, com mediana 3.

A adição do ativo fez a formulação F2 ser considerada melhor do que seu veículo, frente aos demais parâmetros: sensação ao toque, hidratação e suavidade, com notas concentradas entre 3 e 4.

Analisando os resultados em conjunto, pode-se dizer que a formulação do tipo gel creme acrescida de ativo (F1) foi considerada a melhor frente aos parâmetros sensoriais escolhidos neste estudo.

Terminados os estudos de avaliação sensorial, o ativo foi submetido aos estudos de avaliação da atividade antioxidante. Com os resultados deste estudo pôde-se construir o gráfico de porcentagem de inibição dos radicais livres formados em função da concentração do ácido chiquímico.

O controle foi preparado na ausência de ativo; dessa forma representa 100% de produção de radicais livres. Pôde-se observar que aumento da concentração do ativo implicou redução da produção de fótons, ou seja, aumento da neutralização dos radicais livres produzidos.

Essa inibição dos radicais formados acontece em virtude da estrutura química do ácido chiquímico, que apresenta anel polifenólico, (Figura 1) e, de acordo com estudos realizados, os principais componentes responsáveis pela atividade antioxidante são os polifenóis.18,22 Esse ácido, portanto, consegue estabilizar os radicais livres pela doação de elétrons e, assim, se estabiliza por rearranjo interno. O radical livre estabilizado torna-se menos reativo frente às biomoléculas. A reação desses radicais livres com as biomoléculas da pele (estresse oxidativo) contribui para o envelhecimento.

O ensaio in vitro escolhido, quimioluminescência dependente de HRP-luminol-H2O2, vem sendo amplamente utilizado por ser método bastante sensível, prático e reprodutível, permitindo a análise de várias amostras em curto período de tempo.23

Por fim, as preparações cosméticas foram submetidas à avaliação da eficácia clínica. Pela análise dos gráficos deste estudo, pôde-se verificar que as preparações cosméticas gel creme (F1), gel (F2) e solução (F3), acrescidas do composto em estudo, não resultaram em diferenças estatisticamente significativas (p>0,05) para o conteúdo aquoso do estrato córneo (Gráfico 4) e perda transepidérmica de água (Gráfico 5), quando comparadas com os valores basais e com o controle. Esse resultado obtido é muito importante em produtos esfoliantes, pois pode demonstrar que seu mecanismo de ação esfoliante não apresenta efeito negativo sobre a hidratação e função barreira da pele, ou seja, não interfere na barreira cutânea, como alguns agentes de peeling.7,24

A não desestruturação da barreira cutânea é característica importante, por exemplo, para aplicação terapêutica em alterações cutâneas, como a dermatite atópica, nas quais a estrutura da barreira cutânea está cronicamente afetada.7,24-26

Em relação ao microrrelevo da pele, a formulação F1 não proporcionou variações estatisticamente significativas (p>0,05). Por outro lado, as preparações F2 e F3 proporcionaram aumento do parâmetro SER, duas horas depois da aplicação da formulação, de forma estatisticamente significativa (p<0,05). No entanto, para a formulação F2 o referido efeito foi mais pronunciado. Também ocorreu aumento de SESC duas horas depois da aplicação dessas duas formulações, de forma estatisticamente significativa (p<0,05). O aumento dos valores do parâmetro relacionado à rugosidade (SEr) e à descamação da pele (SEsc) é resultado condizente com as propriedades do ácido chiquímico, uma vez que pode estar relacionado com o início do processo de esfoliação. Em longo prazo, o tratamento contínuo com o ácido chiquímico poderia resultar no processo de renovação celular, o que o torna interessante para aplicação em preparações dermocosméticas com propriedade antienvelhecimento.

De acordo com os resultados obtidos, o veículo é de fundamental importância no desenvolvimento de um produto dermocosmético,27 uma vez que a escolha inadequada dos componentes da formulação pode estar relacionada com a ausência de resultados significativos da eficácia esperada do produto final e não do ingrediente ativo utilizado. O veículo deve permitir a incorporação do ativo sem que ocorra a desestabilização da fórmula e, simultaneamente, deve ser capaz de liberá-lo quando aplicado sobre a pele para que exerça seu potencial efeito. Sendo assim, para o composto em estudo, os melhores veículos empregados nesta pesquisa foram o gel e a solução, os quais, provavelmente, permitiram a liberação do ativo e potencializaram os efeitos na melhora do microrrelevo da pele.

 

CONCLUSÃO

Nas condições experimentais deste estudo, pôde-se concluir que:

- as formulações estudadas, gel e gel creme, bem como a solução, foram compatíveis com o ativo ácido chiquímico, ou seja, mostraram-se estáveis frente aos estudos preliminares de estabilidade;

- a adição de ácido chiquímico ao gel creme e ao gel resultou em melhoria dos parâmetros sensoriais;

- o ácido chiquímico é um composto com atividade antioxidante e, portanto, sugerido para o uso em preparações cosméticas com propriedade protetora e antienvelhecimento da pele;

- os efeitos imediatos, duas horas depois da aplicação das preparações objeto de estudo, foram relacionados com a alteração dos parâmetros do microrrelevo da pele relativos à rugosidade e descamação da pele, que, em conjunto, sugerem o início do processo de esfoliação;

- o gel e a solução foram as melhores preparações cosméticas das empregadas neste estudo para a obtenção dos efeitos esfoliantes atribuídos ao ácido chiquímico;

- com relação à avaliação sensorial e à eficácia clínica por métodos objetivos, a formulação gel foi a que apresentou resultados mais satisfatórios nos parâmetros estudados;

- de acordo com os resultados do estudo clínico de eficácia, o ácido chiquímico pode ser considerado potencial ativo para utilização em cosméticos para esfoliação e melhora do microrrelevo da pele.

 

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Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (UCFRP/USP) - Ribeirão Preto (SP), Brasil.


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