Marina Soares Silverio; Daniel Simão de Andrade; Carolina Malavassi Murari; Rossana Cantanhede Farias de Vasconcelos; Fernanda Rytenband
Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Data de submissão: 27/11/2024
Decisão final: 10/04/2025
Como citar este artigo: Silverio MS, Andrade DS, Murari CM, Vasconcelos RCF, Rytenband F. Combinação de peelings químicos e isotretinoína oral no tratamento de cicatrizes de acne. Surg Cosmet Dermatol. 2025;17:e20250427.
INTRODUÇÃO: A acne é uma doença crônica prevalente que pode causar efeitos físicos, emocionais e sociais. A isotretinoína e os peelings químicos são tratamentos disponíveis, mas sua combinação foi historicamente evitada devido a relatos de cicatrização anormal. Estudos recentes sugerem que a combinação com peelings superficiais ou médios é segura, mas faltam estudos que levem em conta as características da população brasileira.
OBJETIVO: Avaliar a segurança e eficácia da combinação de isotretinoína e peelings químicos no tratamento de cicatrizes de acne.
MÉTODOS: Ensaio clínico com pacientes de 15 a 25 anos em tratamento de acne com isotretinoína. O grupo de intervenção realizou três peelings de Jessner durante o uso de isotretinoína, e o grupo controle, após o término do tratamento com isotretinoína. A avaliação foi feita com as escalas EQGACA e IGA por dois avaliadores cegos.
RESULTADOS: Os peelings concomitantes ao uso de isotretinoína não resultaram em piores desfechos nos escores
EQGACA e IGA em comparação com o grupo controle.
CONCLUSÃO: A combinação de isotretinoína e peelings químicos foi segura, mas estudos com amostras maiores são necessários para estabelecer recomendações.
Keywords: Acne Vulgar; Isotretinoína; Abrasão Química.
A acne é a oitava doença mais comum no mundo, afetando mais de meio bilhão de pessoas,1 e estima-se que 50 a 95% dos adolescentes tenham algum grau de acometimento. É classificada como um distúrbio inflamatório crônico da unidade pilo-sebácea, e tem como bases patogênicas os seguintes mecanismos: produção aumentada e anômala do sebo por influência androgênica; queratinização alterada, levando à formação de comedões; colonização folicular por Cutibacterium acnes (C. acnes); e liberação de mediadores inflamatórios na pele como interleucina-1 alfa e TNF-alfa.2 Além da acne vulgar, existe também a acne da mulher adulta, caracterizada pela acne que acomete mulheres acima de 25 anos, e que pode persistir desde a adolescência ou iniciar já na fase adulta.
Em relação à etiopatogenia, essa entidade difere da acne vulgar por ter forte influência hormonal, com alteração do metabolismo dos androgênios, agravamento no período pré-menstrual e maior associação com distúrbios endocrinológicos como a síndrome dos ovários policísticos, hiperplasia adrenal congênita tardia, hiperinsulinismo e resistência periférica à insulina. Além disso, há maior tendência a recidivar, devendo, portanto, receber uma abordagem terapêutica diferente da acne vulgar, com necessidade de tratamento de manutenção.3 A afecção causa lesões dolorosas e pode provocar cicatrizes em até 95% dos pacientes acometidos,4 o que leva a comprometimento físico, emocional e social. Apresenta alta carga global de doença e, entre os diagnósticos dermatológicos, tem o segundo maior DALY (disability-adjusted life years, ou quantidade de anos de vida perdidos por morte prematura e por incapacidade), atrás apenas do eczema, e superando doenças como urticária, psoríase e diversas infecções.5
Para prevenir desfechos desfavoráveis, é importante que tratamentos eficazes sejam instituídos rapidamente. Os principais tratamentos para a acne vulgar leve incluem retinoides tópicos, peróxido de benzoíla, antibióticos tópicos, ácido salicílico e ácido azelaico. Isotretinoína, antibióticos sistêmicos e agentes hormonais como os anticoncepcionais orais e espironolactona podem ser usados para o tratamento da acne moderada a severa. Quanto a outros tratamentos, como peelings químicos, terapia fotodinâmica, lasers e extração mecânica de lesões, mesmo diretrizes mais recentes como o "Guidelines of care for the management of acne vulgaris", da Academia Americana de Dermatologia,6 descrevem as evidências atuais como insuficientes para determinar uma recomendação.
Entre os principais tratamentos, destaca-se a isotretinoína (ácido 13-cis-retinoico), um derivado da vitamina A, que foi aprovado nos Estados Unidos em 1982 e no Brasil em 1990. Desde então tem sido amplamente utilizado, e atualmente é indicado para as formas de acne nódulo-cística, papulopustulosa moderada resistente aos outros tratamentos, ou com tendência a cicatrizes, e na presença de prejuízo emocional e das funções sociais. Em monoterapia é capaz de induzir a remissão da acne em cerca de 80% dos pacientes.7 Alguns dos mecanismos de atuação contra a acne são a involução da unidade pilossebácea,8 normalização da hiperqueratinização infundibular,7 imunomodulação, com redução de TNF-alfa, interleucina-4, interleucina-17 e interferon-gama,9 e diminuição da população de C. acnes.7 Dessa forma, a isotretinoína é considerada tratamento de primeira linha por ser capaz de tratar a acne efetivamente, prevenir cicatrizes e promover uma melhora rápida na qualidade de vida do paciente.
Entre os efeitos adversos mais comuns da isotretinoína estão a queilite, em 94 a 100% dos usuários, e a xerodermia, ou ressecamento de membranas mucosas, em 47% dos casos. Em geral, nenhum dos dois provoca a suspensão do medicamento e ambos podem facilmente ser controlados com hidratantes tópicos e lubrificantes oculares e nasais. Outras ocorrências menos comuns são conjuntivite, queda de cabelo, fragilidade das unhas, granulomas piogênicos, cefaleia e mialgia.10 Alterações laboratoriais foram induzidas em 2% dos pacientes, principalmente hipertrigliceridemia, elevação do colesterol, e elevação de transaminases.11
Contudo, todos esses efeitos colaterais são dose-dependentes, e tendem à normalização após a suspensão do tratamento. Como risco mais grave, e que tem ocorrência dose-independente, há a teratogenicidade, sendo que as gestações podem evoluir com abortamento em até 20% dos casos e embriopatias em até 28%.7 Assim, o tratamento é contraindicado para gestantes, com necessidade de contracepção eficaz e realização de testes para descartar gravidez nas mulheres em idade fértil. Outro efeito adverso referido é a possibilidade de aumento do risco de depressão e suicídio. Porém, uma revisão sistemática de 2007 não constatou evidências para apoiar esta teoria,12 e alguns dos estudos inclusive observaram uma tendência à redução de sintomas depressivos em vigência do tratamento com a isotretinoína.2 Por fim, também é citada na literatura a possibilidade de cicatrização anormal após procedimentos cirúrgicos ou estéticos.
Atualmente, a bula da isotretinoína contém a contraindicação de realização de dermoabrasão agressiva, química e tratamentos cutâneos com laser por 5 a 6 meses após o término do tratamento. Essa recomendação se deve ao risco de ocorrência de cicatrização hipertrófica em áreas atípicas, e hiper ou hipopigmentação nas áreas tratadas.13 Essa inserção na bula se deveu à publicação de três pequenas séries de casos nos anos 1980, nas quais foi relatada a formação de queloides e cicatrização lentificada em um total de 11 pacientes após realização de dermoabrasão e aplicação de laser argônio.14 As hipóteses que explicavam esta alteração na cicatrização eram de que a estimulação de angiogênese ou a produção de inibidores da colagenase resultariam no acúmulo de colágeno.15 Porém, desde então, diversos estudos realizados em animais mostraram taxa de cicatrização de feridas semelhantes nos grupos de intervenção e controle.8
Corroborando a hipótese de que a cicatrização ocorre normalmente nos pacientes em uso de isotretinoína, um estudo observacional retrospectivo brasileiro concluiu que: (1) não foi observada diferença significativa na prevalência de queloides e cicatrizes hipertróficas entre os grupos que utilizaram ou deixaram de utilizar isotretinoína; (2) não houve piora dos queloides preexistentes nos pacientes em uso da medicação; e (3) uma análise retrospectiva de pacientes com queloides constatou prevalência baixa de uso de isotretinoína previamente.16 Tal contraindicação de realizar determinados procedimentos adjuvantes no tratamento da acne concomitantes ao uso da isotretinoína vai em contraponto a uma assistência de excelência, uma vez que os pacientes com acne grave a ponto de necessitar da isotretinoína são justamente os que mais têm chance de se beneficiar dos tratamentos estéticos.8
Dado que hoje estão disponíveis procedimentos minimamente invasivos como a microdermoabrasão, microagulhamento, lasers fracionados e peelings superficiais, é necessário revisar as recomendações antigas. Entre as terapias adjuvantes para acne, destacam-se os peelings químicos, com as vantagens de serem financeiramente acessíveis em comparação às novas tecnologias, poderem ser realizados em consultório e terem mínimo downtime, ou seja, tempo mínimo de afastamento para recuperação.17
Diversas formulações podem ser usadas como peelings, e o intuito desses procedimentos é promover a descamação terapêutica e controlada da pele. Dessa forma, há uma renovação parcial ou completa da epiderme, podendo atingir ou não a derme, e assim sendo indicados para tratamento de manchas e irregularidades da pele. Nos quadros de pele acneica, pode-se utilizar os peelings tanto para a fase ativa da doença, tendo como alvo o tratamento de comedões e lesões inflamatórias, quanto para a fase de cura, objetivando redução de hipercromias e cicatrizes.
Por atuar em ambas as fases da doença, o peeling de Jessner é amplamente utilizado, e consiste em uma solução de ácido salicílico 14%, resorcina 14%, e ácido lático 14% em álcool 95º. O ácido salicílico tem efeito de sebossupressão, queratolítico e anti-inflamatório18; a resorcina é queratolítica; e o ácido lático reduz as hipercromias, sendo seguro mesmo na pele escura.19 Pode ter efeito de peeling superficial a médio, a depender da quantidade de camadas aplicadas, e os principais efeitos adversos envolvidos são o risco de dermatite de contato ao resorcinol, com consequente hiperpigmentação pós-inflamatória. Assim, é preciso ter cautela ao utilizar em pacientes com fototipos de Fitzpatrick altos.17
Alguns estudos tiveram como objetivo analisar a segurança da realização de peelings químicos durante o uso da isotretinoína por via oral e constataram resultados estéticos semelhantes ou até melhores quando ambos os tratamentos foram combinados.8,18,20-22 Isso levou à inclusão dos peelings químicos superficiais no rol de opções terapêuticas para pacientes em uso de isotretinoína em importantes diretrizes como o Consenso de 2017 da Sociedade Americana de Cirurgia Dermatológica (American Society for Dermatologic Surgery - ASDS)8, e no Consenso Brasileiro sobre o uso da isotretinoína de 2019.7 Porém, ainda se observa uma carência de estudos na população brasileira, que tem uma característica de pele específica. Além disso, algumas diretrizes recentes, como "Guidelines of care for the management of acne vulgaris", da American Academy of Dermatology6 afirmam que, apesar de não haver evidências na literatura para contraindicar os peelings químicos em pacientes com acne, tampouco há evidências para recomendar sua realização. Logo, estudos complementares sobre o assunto são necessários.
Portanto, a acne é uma doença crônica e desfigurante, com grande impacto na vida de seus portadores. Por isso, é crucial iniciar tratamentos efetivos com agilidade e não postergar procedimentos adjuvantes que podem prevenir a formação de cicatrizes, e nesse contexto os peelings configuram-se como arsenal terapêutico junto da isotretinoína. Porém, devido às recomendações prévias de não utilizar esses dois tratamentos concomitantemente, muitos médicos ainda postergam a realização de peelings para a fase pós-cura da doença. Dessa forma, dada a escassez de literatura sobre o assunto, este estudo visa reunir evidências para apoiar a realização de peelings associados à isotretinoína, levando em consideração as especificidades da pele da população brasileira.
Este projeto de pesquisa envolvendo seres humanos foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Santo Amaro e aprovado com o parecer nº 7.004.647. Trata-se de um ensaio clínico controlado, aberto e com avaliadores cegos, a ser realizado durante o ano de 2024 no Complexo de Saúde Dr. Wladimir de Arruda, localizado na Rua Cássio de Campos Nogueira, 2031, São Paulo (SP), Brasil. Os pacientes participantes foram divididos aleatoriamente em dois grupos: os participantes de um dos grupos foram submetidos a três peelings de Jessner concomitantes ao uso da isotretinoína, sendo um peeling ao mês por três meses (4º, 5º e 6º meses do tratamento); os do outro foram submetidos a três peelings de Jessner ao final do tratamento com isotretinoína, no 3º, 4º e 5º meses após o término da medicação. Durante todo o período de uso da isotretinoína e realização dos peelings, foi solicitado que os pacientes utilizassem regularmente de protetor solar FPS 50 ou superior todos os dias, o qual poderia ser fornecido pela pesquisa caso o paciente ainda não usasse um produto de sua preferência. Os peelings foram realizados conforme as seguintes etapas:
Registro fotográfico;
Desengorduramento da pele com álcool;
Aplicação de três camadas de solução de Jessner usando gaze, com intervalo de três minutos entre cada aplicação;
Remoção com água após três minutos.
Durante toda a realização da pesquisa, os pacientes podiam entrar em contato com as pesquisadoras em caso de qualquer intercorrência. Todos os pacientes do serviço eram fotografados antes do início de qualquer tratamento, sendo as fotos arquivadas em prontuário eletrônico e cedidas à pesquisa mediante autorização dos pacientes. Ao final dos tratamentos, também foram realizadas fotografias conforme a seguinte padronização: frontal da face, perfil completo à direita e à esquerda, semiperfil à direita e à esquerda. Ao final das intervenções, os pacientes tiveram suas fotografias de antes e depois avaliadas por dois avaliadores cegos conforme a Escala Quantitativa Global de Avaliação de Cicatrizes de Acne (EQGACA) e a escala Investigator Global Assessment (IGA).23 Ambos os avaliadores são médicos dermatologistas que não tiveram acesso a informações de identificação dos pacientes ou a qual grupo cada um pertencia. Por fim, os escores foram analisados estatisticamente a fim de determinar qual grupo obteve resultados melhores no tratamento das cicatrizes de acne na face.
O produto utilizado no procedimento foi:
Peeling de Jessner: ácido salicílico 14%, resorcina 14%, ácido lático 14%, álcool 95%. Fórmula magistral - farmácia Drogaderma (CNPJ 43.342.542/0002-36); Requerimento: 546095; Registro: 1656844. Farmacêutico responsável: Dr. Marcio Nogueira Garcia (CRF- SP: 39016). Médico prescritor: Marina Soares Silvério (CRM-SP: 231.782).
Foram convidados a participar desta pesquisa todos os pacientes com idade entre 15 e 24 anos atendidos no serviço de Dermatologia da Universidade Santo Amaro diagnosticados com acne de grau 2 ou 3 e que já estivessem em tratamento com isotretinoína por via oral por indicação independente à participação na pesquisa. Além disso, os participantes precisariam ler e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e o Termo de Autorização de Uso de Imagem.
Foram excluídas deste estudo as pacientes gestantes ou com desejo de engravidar durante a condução da pesquisa ou nos 6 meses subsequentes, os menores de 15 anos e os de idade igual ou superior a 25 anos e aqueles que não concordaram com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ou com o Termo de Autorização de Uso de Imagem. Durante a pesquisa, também foram excluídos pacientes que não compareceram às consultas agendadas e aqueles que não utilizaram o tratamento com isotretinoína conforme prescrito.
Foram aplicadas as escalas EQGACA e IGA para as fotos de início e final de tratamento de cada paciente. As avaliações foram realizadas por avaliadores cegos, ou seja, dois médicos dermatologistas que não participaram das etapas de intervenção e não foram informados sobre a qual grupo cada paciente pertencia. Em seguida, os escores foram analisados estatisticamente para comparação entre os pacientes do grupo de intervenção e grupo controle. Foram aplicados o teste de Mann-Whitney24 para comparar as variáveis entre os grupos de intervenção e controle e o teste de Wilcoxon24 para comparar os períodos antes e depois do tratamento.
Durante a fase de recrutamento, um total de 46 pacientes aceitou participar do estudo. Destes, 21 pacientes concluíram todas as etapas propostas, sendo 12 do grupo de intervenção (4 do sexo masculino e 8 do sexo feminino, 9 de idade entre 15 e 19 anos, 3 de idade entre 20 e 25 anos) e 9 do grupo controle (7 do sexo masculino e 2 do sexo feminino, 6 de idade entre 15 e 19 anos, 3 de idade entre 20 e 25 anos). Não foi preciso suspender o tratamento para nenhum paciente devido a efeitos adversos graves relacionados aos peelings ou ao uso da isotretinoína. Os principais motivos para exclusão dos pacientes do projeto foram: abandono do tratamento com isotretinoína (8 pacientes de ambos os grupos); falta às consultas planejadas (9 pacientes de ambos os grupos); conclusão do tratamento com isotretinoína, mas sem desejo de realizar peeling posteriormente (3 pacientes do grupo controle); realização de outro tratamento facial estético em concomitante à pesquisa (3 pacientes de ambos os grupos); continuação do uso de isotretinoína na data da conclusão do projeto (2 pacientes do grupo controle). Além da avaliação estatística, foram incluídas imagens ilustrativas de pacientes representativos de cada grupo, com registos padronizados antes e após o tratamento, a fim de demonstrar visualmente a evolução clínica observada (Figuras 1 e 2).
Os escores das fotografias de antes e depois dos tratamentos de ambos os grupos conforme as escalas IGA e EQGACA foram determinados pelos avaliadores (Avaliador 1 e Avaliador 2) e resultaram na Tabela 1 e Tabela 2.
Em relação às características dos grupos estudados, destaca-se a diferença no tamanho da amostra (n) entre os grupos, assim como a heterogeneidade de sua composição no que se refere ao sexo dos indivíduos: o grupo de intervenção contava com 4 pacientes do sexo masculino e 8 do feminino, enquanto o grupo controle contava com 7 do sexo masculino e 2 do feminino. Essa discrepância entre os grupos resultou de uma randomização simples e, principalmente, da necessidade de excluir da pesquisa os indivíduos que desejaram sair do estudo ou que não cumpriram os requisitos do projeto (falta às consultas, não realização dos exames necessários para manter o uso da isotretinoína, realização de outros tratamentos que pudessem interferir nos resultados, entre outros). Assim, a composição da amostra pode ser considerada como um possível viés. Com base nesses escores, foi calculada também a variação dos escores IGA e EQCACA entre o antes e depois para cada paciente, resultando nos valores de ∆IGA e ∆EQGACA, para quantificar quanto cada paciente apresentou melhora ou piora nas lesões e cicatrizes. A partir desses dados, também foi calculada a média da variação (μ) considerando as notas de ambos os avaliadores, resultando em μ∆IGA e μ∆EQGACA, conforme mostrado na Tabela 3 e Tabela 4.
Uma análise preliminar indica que a maioria dos escores apresentava resultado neutro ou negativo. Isso significa que houve redução da quantidade de lesões (medida pelo IGA) e redução de cicatrizes (medida pela EQGACA), tanto para os pacientes do grupo de intervenção quanto para os do grupo controle. Excepcionalmente, o paciente E apresentou aumento de EQGACA atribuído pelo Avaliador 1 e o paciente B apresentou aumento de EQGACA atribuído pelo Avaliador 2. Uma hipótese aventada para esse aumento de EQGACA em casos específicos é que a presença de lesões ativas de acne pode prejudicar a análise da quantidade de cicatrizes já presentes num primeiro momento, acarretando um EQGACA falsamente baixo na avaliação inicial. A mediana e a média aritmética dos escores se encontram na Tabela 5 e Tabela 6.
Inicialmente, foi aplicado o teste de Wilcoxon para comparar o conjunto de dados de "antes" com o de "depois" dos tratamentos, conforme mostrado na Tabela 7 e Tabela 8.
O teste demonstrou que os valores de IGA e EQGACA foram maiores antes do tratamento do que depois para ambos os grupos e ambos os avaliadores, com significância estatística, exceto para o EQGACA do grupo controle segundo o Avaliador 1. Os dados confirmam a hipótese esperada de que ambos os tratamentos promovem melhorias na qualidade de pele dos pacientes, resultando em menor quantidade de lesões (medido pela IGA) e menor quantidade de cicatrizes (medido pela EQGACA). Apesar de essa informação ser esperada, é importante salientar a conclusão de que o uso dos peelings não foi prejudicial aos pacientes, podendo ter tido efeito neutro ou benéfico. Também foi aplicado o teste de Mann-Whitney, resultando na análise comparativa que se encontra na Tabela 9.
O primeiro dado demonstrado na Tabela 9 é que os participantes de ambos os grupos tinham idades semelhantes. Observa-se também que quando comparados os escores do grupo de intervenção e do grupo controle, não houve diferença estatisticamente significativa para os seguintes parâmetros: IGA antes pelo Avaliador 1, IGA depois pelo Avaliador 1, EQGACA depois pelo Avaliador 1, IGA antes pelo Avaliador 2, EQGACA antes pelo Avaliador 2, IGA depois pelo Avaliador 2, EQGACA depois pelo Avaliador 2. Isso permite inferir que é provável que a realização dos peelings de Jessner durante o tratamento com isotretinoína não influenciou de forma importante a variação de IGA e EQGACA dos pacientes. Foi observada apenas uma diferença estatisticamente significativa quando comparados os valores de "EQGACA antes" segundo o Avaliador 1, pois o grupo de intervenção apresentou valores maiores. Isso pode indicar um viés de seleção, em que os pacientes randomizados para o grupo de intervenção apresentavam um maior acometimento por cicatrizes antes de começarem o tratamento. Porém, a análise dos escores atribuídos pelo Avaliador 2 não corrobora esses dados.
Observa-se também que o número de participantes neste projeto era pequeno. É possível que, com grupos maiores, os resultados pudessem ser estatisticamente significativos. Quando aplicado o teste de Mann-Whitney para a média das variações de escore entre as fotos de antes e depois, também não houve diferença significativa entre os grupos, conforme mostra a Tabela 10.
Este estudo nos permite concluir que o uso do peeling químico de Jessner como adjunto ao tratamento da acne com isotretinoína em diferentes tempos (durante ou após o término da isotretinoína) não apresentou efeitos prejudiciais. Tanto o grupo de intervenção quanto o grupo controle tiveram resultados estatisticamente significativos de melhora da acne e redução de cicatrizes ao fim do estudo. Os peelings realizados podem ter tido efeitos neutros ou benéficos. Portanto, conclui-se que não há motivo para contraindicar o peeling de Jessner durante o tratamento com isotretinoína. Porém, não foi possível concluir em qual tempo de tratamento devem ser realizados os peelings, pois não houve diferença estatisticamente significativa entre os resultados dos grupos estudados. Mais estudos são necessários para estabelecer uma base sólida o suficiente para recomendar o uso de peelings como parte do tratamento padrão.
Marina Soares Silverio
ORCID: 0009-0005-0039-1667
Análise estatística, Aprovação da versão final do manuscrito, Concepção e planejamento do estudo, Elaboração e redação do manuscrito,
Obtenção, análise e interpretação dos dados, Participação efetiva na orientação da pesquisa, Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados, Revisão crítica da literatura, Revisão crítica do manuscrito.
Daniel Simão de Andrade
ORCID: 0009-0003-4002-5288
Aprovação da versão final do manuscrito, Obtenção, análise e interpretação dos dados, Revisão crítica do manuscrito.
Carolina Malavassi Murari
ORCID: 0000-0001-6688-5145
Aprovação da versão final do manuscrito, Obtenção, análise e interpretação dos dados, Revisão crítica do manuscrito.
Rossana Cantanhede Farias de Vasconcelos
ORCID: 0000-0002-6185-1840
Aprovação da versão final do manuscrito, Revisão crítica do manuscrito.
Fernanda Rytenband
ORCID: 0000-0002-2882-1658
Análise estatística, Aprovação da versão final do manuscrito, Concepção e planejamento do estudo, Elaboração e redação do manuscrito,
Obtenção, análise e interpretação dos dados, Participação efetiva na orientação da pesquisa, Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados, Revisão crítica da literatura, Revisão crítica do manuscrito.
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