Taciana Dal´Forno; Martina Souilljee Birck
Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflitos de interesse: Nenhum.
Data de submissão: 16/04/2024
Decisão final: 01/08/2024
Como citar este artigo: Dal'Forno, Birck MS. Escrotodinia tratada com toxina botulínica: relato de sucesso terapêutico. Surg Cosmet Dermatol. 2025;17:e20250376.
A escrotodinia ou disestesia genital é caracterizada por dor escrotal crônica (superior a 3 meses de duração) sem etiologia definida mesmo após investigação criteriosa. Embora seja considerada uma condição relativamente comum, a ausência de opções terapêuticas eficazes compromete significativamente a qualidade de vida dos pacientes acometidos. Relatamos um caso de sucesso terapêutico e resposta sustentada com uso de toxina botulínica no tratamento da escrotodinia em um paciente de 69 anos, refratária ao uso de medicações orais em doses adequadas para dor crônica.
Keywords: Genitália Masculina; Escroto; Toxinas Botulínicas Tipo A.
A dor escrotal crônica, denominada escrotodinia ou disestesia genital quando não há etiologia definida após investigação criteriosa, é uma condição relativamente comum. Embora ainda pouco compreendida, tem impacto significativo na qualidade vida dos pacientes e gera frustração diante das limitações das opções terapêuticas atualmente disponíveis. Essa condição caracteriza-se por dor ou desconforto escrotal, uni ou bilateral, constante ou intermitente, com duração superior a 3 meses.1 O presente relato tem como objetivo descrever o sucesso terapêutico no manejo da escrotodinia em um paciente de 69 anos, utilizando toxina botulínica injetável.
Paciente do sexo masculino, 69 anos, apresenta quadro de desconforto, ardência e prurido superficial na bolsa escrotal e região inguinal direita, com evolução há aproximadamente 6 anos. Negava história de herpes genital ou outras afecções na região. Após investigação extensiva conduzida por médico urologista, não foi identificada etiologia específica. O paciente não apresentou melhora com o uso de medicações orais para dor crônica, incluindo anticonvulsivantes, prescritas por médico clínico. Ao exame físico, não foram observadas lesões cutâneas na região acometida, tampouco outras alterações, exceto pela presença de dois acrocórdons. Diante da refratariedade ao medicamento medicamentoso convencional, optou-se pela realização de tratamento com toxina botulínica (Dysport®), na dose total de 90 unidades (U). A aplicação foi realizada por via intradérmica, na proporção de 2 U por ponto, distribuídas em 45 pontos, com espaçamento de 0,5 cm entre eles, cobrindo toda a área sintomática, previamente demarcada com o auxílio do paciente, que indicou as regiões de maior desconforto, abrangendo a bolsa escrotal e a parte da região inguinal direita (Figura 1). Duas semanas após o procedimento, paciente relatou melhora significativa dos sintomas e expressou satisfação com a abordagem terapêutica, passando a não necessitar mais do uso de medicações orais para o alívio da dor. Além disso, não foram observados efeitos adversos relacionados à aplicação da toxina. O paciente manteve controle satisfatório dos sintomas por um período de 10 meses, utilizando exclusivamente essa intervenção, sem necessidade de terapias complementares durante o seguimento.
O manejo da escrotodinia representa um desafio clínico, uma vez que, além da necessidade de excluir causas agudas e crônicas associadas à síndrome de dor escrotal, não há, até o momento, consenso quanto à abordagem terapêutica mais eficaz.2 A literatura disponível aborda, principalmente, o uso de medicamentos empregados no controle da dor neuropática, mecanismo fisiopatológico potencialmente envolvido na disestesia genital, incluindo antibióticos, antidepressivos tricíclicos e anticonvulsivantes.3
Como opções de segunda linha, procedimentos cirúrgicos, tais como epididimectomia, vasovasostomia, vasectomia, orquiectomia e denervação testicular, têm sido descritos, embora estejam associados a riscos significativos, como infertilidade, e a resultados muitas vezes imprevisíveis.2 Diante dessas limitações, medidas minimamente invasivas e com melhor perfil de segurança a longo prazo têm vêm sendo progressivamente exploradas. Há relatos, ainda que baseados em pequenas sérias de casos, sobre a utilização da ablação do cordão espermático por radiofrequência, com alívio sintomático por períodos que variam entre 6 e 9 meses.1
Por outro lado, a toxina botulínica tem se consolidado como uma ferramenta terapêutica no manejo de diversas síndromes dolorosas de origem neuropática, incluindo dores localizadas na região genital, como fissuras anais, vulvodínia e vaginismo. Nessas condições, observa-se melhora clínica significativa poucos dias após a aplicação, com resposta sustentada por períodos que variam entre 12 e 24 semanas.3 Na literatura, também há descrição do uso de toxina botulínica na dose de 100 U para o manejo de disestesia genital.4
Diante desse contexto, optou-se, no presente caso, pela aplicação de 90 U de toxina botulínica, distribuídas na área delimitada de disestesia, conforme indicado pelo paciente. Observou-se melhora clínica expressiva já nas 2 semanas subsequentes ao procedimento, com manutenção da resposta até o momento da elaboração deste relato. A ausência de efeitos adversos, associada à possibilidade de suspensão das medicações orais anteriormente utilizadas, reforça o potencial benéfico dessa intervenção no manejo da escrotodinia.
O presente relato demonstra que a aplicação injetável de toxina botulínica pode representar uma opção terapêutica eficaz e segura no manejo de escrotodinia, especialmente em casos refratários às terapias medicamentosas convencionais. A participação ativa do paciente na delimitação da área acometida, bem como a definição adequada da dose, parecem ser fatores determinantes para o sucesso do tratamento. Apesar, dos resultados favoráveis observados, são necessários estudos com maior número de pacientes e seguimento prolongado para validar a eficácia, a segurança e a durabilidade da toxina botulínica no tratamento da escrotodinia.
Taciana Dal'Forno
ORCID: 0000-0003-0848-9042
Análise estatística, Aprovação da versão final do manuscrito, Concepção e planejamento do estudo, Elaboração e redação do manuscrito, Obtenção, análise e interpretação dos dados, Participação efetiva na orientação da pesquisa, Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados, Revisão crítica da literatura, Revisão crítica do manuscrito.
Martina Souilljee Birck
ORCID: 0000-0001-9281-7744
Concepção e planejamento do estudo, Elaboração e redação do manuscrito, Obtenção, análise e interpretação dos dados, Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados, Revisão crítica da literatura.
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