Bruna Mendes Almeida; Ana Claudia Rolim Branco; Célia Antônia Xavier de Moraes Alves; Nayara Pelizaro Di-Rito; Gabriela Fagan Belini
Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Data de Submissão: 24/07/2023
Decisão final: 16/08/2023
Como citar este artigo: Almeida BM, Branco ACR, Alves CAXM et al. Tratamento de raro caso de amiloidose cutânea nodular no nariz: um relato de caso. Surg Cosmet Dermatol. 2023;15:0281.
A amiloidose cutânea primária (ACP) tem prevalência mundial, entretanto é subdiagnosticada. Dentre os subtipos, a amiloidose nodular (AN) é o mais raro. Seu tratamento é desafiador, não há consenso na literatura e nenhuma terapêutica mostrou-se efetiva. Os autores relatam o caso de um paciente com nodulação no nariz, apresentando exame anatomopatológico compatível com amiloidose, sem evidências de doença sistêmica, classificado, então, como ACP nodular. Foi realizada excisão da lesão, com resultado satisfatório. Concluiu-se que a remoção cirúrgica é uma terapêutica eficaz para o tratamento de AN.
Keywords: Amiloidose; Amiloide; Vermelho Congo
As amiloidoses são um grupo heterogêneo de doenças caracterizadas pelo depósito extracelular de material amiloide.1 Na forma cutânea primária, o depósito é restrito à pele, sem repercussões sistêmicas.2 A amiloidose cutânea primária nodular ou amiloidose nodular (AN) é a forma mais rara, com poucos casos descritos nos últimos anos, e apresenta particularidades, com até 7% dos casos podendo evoluir para amiloidose sistêmica.1 Ainda não há tratamento efetivo para a remoção dos depósitos amiloides, mas o leque terapêutico para melhora estética é grande. Nem todos os tratamentos, entretanto, são eficazes.1
Paciente do sexo masculino, 32 anos, compareceu ao Serviço de Dermatologia queixando-se de surgimento de lesão única no nariz há oito meses, inicialmente como uma pápula, apresentando crescimento lento e progressivo. Negava sintomatologia local, referindo apenas incômodo estético.
De antecedentes pessoais referia tabagismo e etilismo esporádicos, além de cefaleia tensional, e fazia uso de sertralina 50mg/dia. Negava antecedentes familiares.
Ao exame dermatológico, visualizou-se nódulo eritematoso de aproximadamente 3 x 2cm, de consistência fibroelástica, na transição entre dorso nasal e parede nasal direita (Figura 1).
Aventadas, inicialmente, hipóteses diagnósticas de linfocitoma cútis, dermatofibrossarcoma protuberans, amiloidose cutânea nodular, além de granuloma facial. Foi solicitada biópsia da lesão para análise anatomopatológica.
À histopatologia, verificou-se depósito de material amorfo e hialino na derme reticular, perivascular e perianexial, que adquiriu coloração avermelhada, ao ser corado pelo vermelho Congo, e coloração esverdeada, à luz polarizada, caracterizando assim material amiloide (Figuras 2 e 3).
Realizada triagem para doença sistêmica com exames de imagem (tomografia computadorizada de crânio, tórax e abdômen) e exames laboratoriais (hemograma, sistema complemento, eletroforese de proteínas séricas e urinárias), sem alterações, podendo-se, então, confirmar o diagnóstico de amiloidose cutânea primária nodular.
Diante do desejo do paciente, foram explicitadas opções terapêuticas disponíveis e possíveis. Optou-se em conjunto por realizar a excisão cirúrgica da lesão, com posterior enxertia de pele, com enxerto proveniente de região supraescapular. Obteve-se resultado estético satisfatório e apresenta-se há um ano sem sinais de recidiva (Figura 4).
As amiloidoses podem ser divididas entre primária e secundária, sistêmica ou localizada, com base na classificação histórica.7 A amiloidose cutânea é uma afecção de prevalência mundial, porém ainda subdiagnosticada. Não apresenta associação com doenças sistêmicas. Ocorre devido ao depósito proteico extracelular anormal na derme por agregação, polimerização e formação de fibrilas. Estas se depositam, tornando-se insolúveis e resistentes à proteólise.5 A patogenia ainda é desconhecida, mas atribui-se a patologia à morte de queratinócitos em decorrência de uma dermatose preexistente.5
A ACP subdivide-se em macular, líquen amiloide, nodular e bifásica. A forma nodular é a mais rara e sua apresentação difere-se das demais, pois o material amiloide decorre do depósito de imunoglobulina de cadeia leve produzida localmente por células plasmáticas monoclonais, e não de queratinócitos degenerados.4,5 Tais depósitos não se restringem à derme, abrangendo também vasos e anexos.8 No histopatológico, observam-se depósitos de material amorfo e eosinofílico na derme superficial e ao redor de vasos e anexos, corando-se pelo vermelho Congo. À luz polarizada, tais depósitos apresentam coloração verde birrefringente.2
Clinicamente, a AN apresenta-se como nodulação única ou múltipla, com predileção por face, extremidades e couro cabeludo.7 Apresenta crescimento insidioso e, por vezes, assintomático, o que pode levar a um diagnóstico tardio ou ser subdiagnosticado. Entretanto, há extrema importância em manter um seguimento regular dado o risco de 7% de evolução para amiloidose sistêmica.5,7,8 Ademais, é bem estabelecida na literatura a possível associação com esclerose sistêmica e síndrome de Sjogren.8
Diversas opções terapêuticas são descritas na literatura, entretanto nenhuma se mostrou eficaz em remover completamente o material amiloide ou impedir a progressão dos depósitos, o que leva a uma comum recorrência local.1, 9, 3 Algumas terapias foram responsáveis por acelerar ou aprofundar tais depósitos.3 Como opções bem estabelecidas, têm-se o uso de corticoide tópico oclusivo ou intralesional, apesar de alguns estudos terem associado esse medicamento à aceleração dos depósitos; dermoabrasão; excisão cirúrgica e tecnologias, como laser de CO2.3,7,9
O presente relato teve como objetivo retratar um caso de AN tratada efetivamente com excisão cirúrgica, corroborando-a como boa opção para o tratamento, tanto pelo resultado estético quanto pela facilidade de acesso. Entretanto, tornam-se necessários mais estudos com evidências robustas para estabelecimento de terapêuticas e protocolos.
Devido à possibilidade de se apresentar como uma lesão insidiosa e assintomática, o diagnóstico da AN pode ser retardado ou mesmo não realizado, tornando-a uma lesão subdiagnosticada. Entretanto, pela importância de sua associação com doenças sistêmicas e com a possibilidade de evolução para amiloidose sistêmica, a AN deve fazer parte do escopo diagnóstico do dermatologista para lesões nodulares. Uma vez estabelecido o diagnóstico, o paciente deve realizar seguimento regularmente. O tratamento vai depender da queixa ou do desejo do paciente, sempre alinhado com o seu médico sobre as terapêuticas acessíveis e disponíveis, sabendo-se da possibilidade de recorrência.
Bruna Mendes Almeida
ORCID: 0000-0002-0804-5401
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Ana Claudia Rolim Branco 0009-0006-9564-1813
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
Célia Antônia Xavier de Moraes Alves
ORCID: 0000-0002-8421-8837
Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.
Nayara Pelizaro Di-Rito 0009-0002-1972-6453
Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
Gabriela Fagan Belini
ORCID: 0000-0003-4492-2392
Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.
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