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Relato de caso

Retalho bilobado para reconstrução de defeito em pálpebra inferior: relato de caso

Rogerio Nabor Kondo; Nathalia Elisa Rosolen e Silva; Nicole Camila D’Aquila Gonçalves; Cássio Rafael Moreira

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2022150237

Data de submissão: 14/03/2023
Decisão Final: 01/06/2023
Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Como citar este artigo: Kondo RN, Silva NER, Gonçalves NCD, Moreira CR. Retalho bilobado para reconstrução de defeito em pálpebra inferior: relato de caso. Surg Cosmet Dermatol. 2023;15:e20230237.


Abstract

O carcinoma de células de Merkel é um câncer neuroendócrino cutâneo raro e agressivo, que ocorre em pele fotodanificada de pacientes brancos e idosos, apresentando-se geralmente como uma placa ou um nódulo solitário, na região da cabeça e do pescoço. Quando localizado na região palpebral inferior, a reconstrução do defeito resultante de sua exérese pode se tornar muito desafiadora para o cirurgião dermatológico devido à peculiaridade cosmética e funcional local. Relatamos a utilização de retalho bilobado para reconstrução palpebral inferior, com resultado satisfatório tanto pela estética quanto pela funcionalidade resultantes.


Keywords: Retalhos cirúrgicos; Pálpebras; Carcinoma de célula de Merkel; Relatos de casos


INTRODUÇÃO

O carcinoma de células de Merkel (CCM) é um raro e agressivo câncer neuroendócrino, que ocorre em pele fotoexposta de pacientes brancos e idosos, sendo raro em negros, apresentando-se geralmente como uma placa ou nódulo solitário, de 2 a 4cm, na região da cabeça e do pescoço.1,2 Representa menos de 1% dos tumores malignos cutâneos, mas é a terceira causa de morte por câncer de pele.2 Reconstruções na região palpebral inferior tornam-se mais desafiadoras para o cirurgião dermatológico devido às características locais, como aspectos estéticos e funcionais.3

O retalho bilobado (RBL) é uma das possibilidades para fechamento de lesões cutâneas maiores, no qual se empresta parte de peles adjacentes para preencher um defeito próximo com pouca frouxidão, e sua estruturação geométrica (duas abas) permite melhor distribuição das forças de tensão ao longo de seu eixo de rotação, prevenindo distorções e excessos cutâneos ocasionados por outros retalhos ou fechamento primário.4,5

Reportamos um caso de paciente em que foi utilizado para reconstrução o RBL, após exérese de CCM em região palpebral inferior, com resultado estético satisfatório. O objetivo do relato de caso é exemplificar e demonstrar uma opção da técnica para corrigir defeitos na pálpebra ínfero-lateral, com fácil execução, em único tempo cirúrgico e com bom nível de satisfação do paciente.

 

MÉTODO

Foi tratado um paciente com CCM em região palpebral inferior-lateral à direita.

Paciente masculino, 75 anos, branco, com placa de 55mm, em região infraocular direita/canto externo (palpebral ínfero-lateral à direita), compatível pelo exame histopatológico com CCM e confirmado pelo exame imuno-histoquímico. Foi realizada a exérese da lesão com margens de segurança de 4mm. O defeito resultante foi de 63mm no seu maior eixo. A programação inicial era uma rotação simples, mas, no intraoperatório, optou-se por RBL para reconstrução (Figuras 1 e 2).

Descrição da Técnica:

a) Anestesia infiltrativa com lidocaína 2% com vasoconstritor;

b) Incisão com lâmina 15 e exérese em bloco da peça até o subcutâneo;

c) Hemostasia;

d) Incisão do retalho, iniciando a primeira aba no canto externo do defeito, com área 10% menor que o defeito primário. A segunda aba, 10% menor que a primeira (Figuras 2A e 2B);

e) Descolamento das abas do retalho em nível de subcutâneo;

f) Movimento de transposição do retalho, no qual a primeira aba se movimenta para a posição do defeito primário. A segunda aba movimenta-se para o local da primeira aba (Figura 2B);

g) Suturas das abas do RBL mononylon 5.0, pontos simples. O defeito da segunda aba é fechado primariamente com mononylon 5.0, pontos simples (Figura 3A);

h) Limpeza local com soro fisiológico;

i) Curativo oclusivo.

 

RESULTADOS

Paciente evoluiu sem intercorrências nos primeiros dias de pós-operatório (Figura 3B). Houve uma boa cicatrização e acomodação, com resultado estético satisfatório no pós-operatório tardio (Figura 4).

 

DISCUSSÃO

As pálpebras superiores e inferiores são tecidos complexos e têm funções específicas como anteparos do globo ocular contra o trauma, proteção para luz excessiva e movimentação de lágrimas em direção ao sistema de drenagem lacrimal, além de estabelecer a beleza e a expressão dos olhos. Por isso, reconstruções nesses locais são desafiadoras para os cirurgiões dermatológicos, principalmente quando o fechamento primário não é possível.3

Retalhos podem ser utilizados na reconstrução palpebral inferior. O RBL é um retalho de dupla transposição em que o primeiro retalho é transposto em um defeito e o segundo e menor retalho é transposto para preencher o defeito secundário causado pela transposição do retalho maior. Há uma distribuição das forças de tensão em várias direções, o que reduz as distorções e os excessos cutâneos gerados por um retalho de transposição simples ou por um fechamento primário.5

Zitelli (1989) foi quem descreveu o retalho bilobado para as reconstruções de defeitos na ponta e na asa nasais. Mas outros autores foram modificando a sua técnica, ajustando as angulações e os tamanhos dos lobos (abas), reduzindo, assim, a distorção da ponta e retração das asas nasais.6

Atualmente, o RBL tem sido aplicado, também, para áreas extranasais, como uma opção versátil de reconstruções em diversas localizações.7 Os presentes autores utilizaram o retalho, no caso em questão, para um grande defeito infrapalpebral, visando evitar o ectrópio, por meio da distribuição de vetores de forças proporcionada pela técnica (Figuras 3 e 4).

Quanto à angulação entre os lóbulos, ângulos de 45 a 50º entre o defeito e o lobo maior e entre os lóbulos são os que têm melhores resultados, embora não haja um consenso exato. Recomenda-se que o tamanho do primeiro lobo deva ser aproximadamente 10% menor que o do defeito, assim como o segundo lobo em relação ao primeiro. O fechamento do defeito do segundo lobo deve ser primário (Figura 5). Dependendo da localização, inelasticidade da pele e tamanho do defeito, proporções e angulações podem ser ajustadas para melhor adaptação do retalho e para evitar distorções anatômicas.7

Apesar do conhecimento e da utilização do RBL para defeito palpebral inferior por muitos cirurgiões dermatológicos, ainda há poucos casos reportados na literatura. Os presentes autores consideram esse tipo de procedimento uma boa opção cirúrgica, como no paciente relatado.

 

CONCLUSÃO

A utilização do RBL pode ser boa opção para resolução de defeitos nas regiões da pálpebra inferior-lateral tendo em vista a versatilidade e resolução em único tempo cirúrgico, com boa cosmética e funcionalidade.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Rogerio Nabor Kondo
ORCID:
00-0003-1848-3314
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Nathalia Elisa Rosolen e Silva
ORCID:
00-0002-2104-231X
Elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Nicole Camila D’Aquila Gonçalves
ORCID:
00-0002-0314-0821
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Cássio Rafael Moreira
ORCID:
00-0002-8781-1505
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. Coggshall K, Tello TL, North JP, Yu SS. Merkel cell carcinoma: an update and review: pathogenesis, diagnosis, and staging. J Am Acad Dermatol. 2018;78(3):433-42.

2. Llombart B, Requena C, Cruz J. Update on Merkel Cell carcinoma: epidemiology, etiopathogenesis, clinical features, diagnosis, and staging. Actas Dermosifiliogr. 2017;108(2):108-19.

3. Kondo RN, Singh BS, Ferreira VP, Araújo MCP. Upper eyelid transposition flap for the reconstruction of a lower eyelid defect: a case report. Surg Cosmet Dermatol. 2022;14:e20220156.

4. Subramanian N. Reconstructions of eyelid defects. Indian J Plast Surg. 2011;44(1):5-13.

5. Brodland DG. Flaps. In: Bolognia JL, Jorizzo JL, Rapini RP, editors. Dermatology. 4th ed. New York: Elsevier; 2018. p. 2496-516.

6. Zoumalan RA, Hazan C, Levine VJ, Shah AR. Analysis of vector alignment with the Zitelli bilobed flap for nasal defect repair: a comparison of flap dynamics in human cadavers. Arch Facial Plast Surg. 2008;10(3):181-5.

7. Ricks M, Cook J. Extranasal applications of the bilobed flap. Dermatol Surg. 2005;31(8):941-8.


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