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Baixa eficácia do uso de solução de hidróxido de potássio a 5% por 28 dias no tratamento de molusco contagioso

Juliano Vilaverde Schmitt1, Helena Zenedin Marchioro1

Recebido em: 10/09/2011
Aprovado em: 22/11/2011

Trabalho realizado no Hospital Universitário
Evangélico de Curitiba – Curitiba (PR), Brasil.

Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

O uso da solução de hidróxido de potássio a 5% para tratar molusco contagioso é comum, embora existam estudos discordantes sobre sua eficácia. Avaliamos 10 pacientes entre quatro e 13 anos. O número de lesões iniciais totalizava 141. Após 28 dias de tratamento havia 105 lesões (75% da carga inicial), e nenhuma obteve clareamento total. As lesões persistentes foram curetadas em até duas sessões. De 105 lesões restaram 28. A porcentagem de redução das lesões e a proporção de resolução completa foram superiores para a curetagem (71% x 9%; p = 0,01 / 80% x 0%; p = 0,02).

Keywords: MOLUSCO CONTAGIOSO, TERAPÊUTICA, CURETAGEM


Molusco contagioso (MC) é patologia infecciosa comum e que atinge preferencialmente crianças em idade escolar. Manifesta-se clinicamente como pápulas semiesféricas, sésseis e umbilicadas, localizando-se quase sempre no tronco, nos mem- bros e na genitália.¹ As lesões tendem a ser autolimitadas, com regressão espontânea no intervalo de seis a 18 meses. 2 Trata-se, porém, de doença contagiosa sujeita a complicações locais como prurido, inflamação e superinfecção bacteriana, causando trans- torno no cotidiano dos indivíduos afetados e seus cuidadores. 3

Existem numerosos tratamentos para essa patologia, desde tópicos como a aplicação de solução de hidróxido de potássio (SHP), imiquimod, cantaridina, tretinoína, ácido salicílico e ácido lático, procedimentos como curetagem e aplicação de nitrogênio líquido, até tratamentos sistêmicos como o uso de cimetidina. 4,5

A SHP é medicação de baixo custo e amplamente disponí- vel através de farmácias magistrais que atua por seu poder cáus- tico e proteolítico sobre a lesão. Estudos mostraram que a aplicaão tópica de SHP em concentrações que variam de 10 a 20% é eficaz no tratamento dessa patologia, porém podem causar dor significativa e até cicatrizes persistentes. 2,6 O uso da SHP em con- centrações menores (5%) é relativamente difundido no Brasil, embora ainda faltem estudos que comprovem sua eficácia. 7

Para avaliar o uso da SHP nessas concentrações realizamos breve estudo com pacientes não imunossuprimidos portadores de MC que se apresentaram em nossa instituição em 2009. Os pacientes e familiares foram orientados a aplicar a solução com um pequeno bastão de madeira com ponta de algodão duas vezes por dia sobre as lesões, até que elas apresentassem eritema, exulceração ou crostas. Igual procedimento deveria ser aplicado a lesões que surgissem durante o tratamento. Após 28 dias os pacientes foram reavaliados e, se apresentassem lesões residuais, tratados através de curetagem.

Dez pacientes terminaram o estudo, sendo cinco do sexo feminino. As idades variaram entre quatro e 13 anos, com três a 12 meses de doença. O número de lesões iniciais variou de três a 30, totalizando 141 lesões. Após 28 dias de tratamento com SHP, entre lesões novas, persistentes e recidivadas havia 105, sig- nificando redução de apenas 25% da carga inicial. Além disso, dois pacientes apresentaram aumento no número de lesões e nenhum obteve clareamento total.

As lesões que persistiram foram tratadas por curetagem em até duas sessões a cada 14 dias. Inicialmente eram 105 lesões, res- tando apenas 28 (em dois pacientes), havendo, portanto, redução de 73%. Apesar da amostra reduzida, tanto a porcentagem de redução das lesões quanto a proporção de resolução completa foram signi- ficativamente superiores para a curetagem (71% x 9%; p = 0,01 – Mann-Whitney / 80% x 0%; p = 0,02 – exato de Fisher).

Como o tratamento por curetagem foi subsequente à apli- cação de SHP, a comparação direta dos respectivos resultados pode ficar prejudicada. Por um lado, poder-se-ia argumentar que o pré-tratamento com SHP teria efeito imunomodulador inten- sificando a resposta do hospedeiro ao tratamento seguinte. Por outro lado, poderíamos considerar que as lesões submetidas a curetagem formaram um grupo "selecionado", mais resistente ao tratamento que o grupo inicial de lesões.

De qualquer forma, a eficácia de 25% após quatro semanas de tratamento regular pode ser considerada pobre para patolo- gia geralmente autolimitada e para a qual existem outros trata- mentos efetivos e seguros.

Romiti e cols., avaliando 35 crianças com MC tratadas com SHP a 10%, obtiveram eficácia total em 32, após período médio de 30 dias de tratamento, porém três crianças abandona- ram o estudo por efeitos como dor intensa e superinfecção bac- teriana.8 Outros autores obtiveram achados semelhantes, porém a avaliação de soluções menos concentradas, possivelmente mais bem toleradas, ainda não foi amplamente realizada. 2, 6

A aplicação da SHP a 5% dividiu a preferência dos pacien- tes e cuidadores com a curetagem. Apesar de a última poder ser mais dolorosa durante a realização, a primeira causou incômodo mais persistente, além da demanda de tempo maior por parte dos cuidadores devido à exigência de duas aplicações diárias, durante vários dias.

De acordo com nossos resultados, a SHP a 5% utilizada por 28 dias para o tratamento de MC não se mostrou eficaz, o que não descarta maior eficácia em longo prazo. Além disso, não houve mais tolerância para com o tratamento estudado, se com- parado com a curetagem.

Sugerimos que estudos mais amplos avaliem o uso de SHP em diferentes concentrações, comparando-o com tratamentos consagrados como a curetagem, tanto sob o aspecto de efetivi- dade quanto os de segurança e tolerância, procurando definir seu papel no tratamento dessa frequente patologia.

Referências

1 . Sampaio SAP, Rivitti EA . Dermatologia. 3ª Ed. São Paulo: Artes Médicas, 2007. p.573.

2 . Short KA, Fuller LC, Higgins EM. Double-blind, randomized, placebo-controlled trial of the use of topical 10% potassium hydroxide solution in the treatment of molluscum contagiosum. Pediatr Dermatol. 2006;23(3):279-81.

3 . Hanna D, Hatami A, Powell J, Marcoux D, Maari C, Savard P, et al. A prospective randomized trial comparing the efficacy and adverse effects of four recognized treatments of molluscum contagiosum in children. Pediatr Dermatol. 2006;23(6):574-9.

4 . Simonart T, De Maertelaer V. Curettage treatment for molluscum contagiosum: a follow-up survey study. Br J Dermatol. 2008;159(5):1144-7.

5 . van der Wouden JC, van der Sande R, van Suijlekom-Smit LW, Berger M, Butler C, Koning S. Interventions for cutaneous molluscum contagiosum. Cochrane Database Syst Rev. 2009;(4):CD004767.

6 . Mahajan BB, Pall A, Gupta RR. Topical 20% KOH--an effective therapeutic modality for moluscum contagiosum in children. Indian J Dermatol Venereol Leprol. 2003;69(2):175-7.

7 . Romiti R, Ribeiro AP, Romiti N. Evaluation of the effectiveness of 5% potassium hydroxide for the treatment of molluscum contagiosum. Pediatr Dermatol. 2000;17(6):495.

8 . Romiti R, Ribeiro AP, Grinblat BM, Rivitti EA, Romiti N. Treatment of molluscum contagiosum with potassium hydroxide: a clinical approach in 35 children. Pediatr Dermatol. 1999;16(3):228-31.


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