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Relato de caso

Sarcoma de Ewing extraesquelético: relato de um caso raro e exuberante simulando lipoma

Melissa de Almeida Corrêa Alfredo1; Priscila Neri Lacerda1; Ana Flávia Teixeira Abreu1; Alexandre Morais Carneiro2; Eloisa Bueno Pires Campos1; Helio Amante Miot1

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2023150183

Fonte de financiamento: Nenhuma.
Conflito de interesses: Nenhum.
Como citar este artigo: Alfredo MAC, Lacerda PN, Abreu AFT, Carneiro AM, Campos EBP, Miot HA. Sarcoma de Ewing extraesquelético: relato de um caso raro e exuberante simulando lipoma. Surg Cosmet Dermatol. 2023;15:e20230183.


Abstract

Sarcoma de Ewing extraesquelético (EES) é tumor raro e agressivo, acomete mais homens entre 10-20 anos e representa 25% dos sarcomas de Ewing. Caso relatado pelo diagnóstico prévio de lipoma de crescimento acelerado, destacando a importância do diagnóstico histopatológico. Masculino, 14 anos, apresentando tumoração de 10x10cm no ombro direito há um ano, com ultrassonografia sugestiva de lipoma. Realizada exérese da lesão, sendo confirmado EES pela imuno-histoquímica. O diagnóstico de EES em jovens é desafiador frente a outras tumorações subcutâneas, sendo a histopatologia imprescindível. A rápida progressão do tumor e os elevados índices metastáticos evidenciam a importância da terapêutica precoce.


Keywords: Sarcoma de Ewing; Tumores neuroectodérmicos primitivos; Sarcoma


INTRODUÇÃO

O sarcoma de Ewing é a segunda neoplasia óssea maligna mais comum na população pediátrica, atrás do osteossarcoma. Ocorre, principalmente, em adolescentes na segunda década de vida e apresenta altos índices de metástase.1 Descrito em 1921 por James Ewing, constitui 10-15% de todos os sarcomas ósseos e abrange: o sarcoma de Ewing clássico, sarcoma de Ewing extraesquelético (EES), tumor maligno de pequenas células da parede torácica e tumores neuroectodérmicos primitivos baseados em tecidos moles – PNET, todos com diferenciação a partir de células-tronco mesenquimais.2 Sua origem histológica não é bem elucidada e, até o momento, não existem associações bem estabelecidas com história familiar, exposição ambiental ou histórico de radiação.1,2 Geneticamente, são caracterizados por translocações cromossômicas espontâneas, sendo as mais específicas para EES: t(11;22)(q24;q12) e t(21;22)(q24;q12).1,2,3

O EES apresenta-se como tumor raro, primário de tecidos moles, caracterizando cerca de 25% dos casos relatados de Sarcoma de Ewing.3 Apresenta prognóstico reservado a depender do estadiamento, sendo prevalente em homens na segunda e terceira décadas de vida.4 Relatamos o caso de EES em um paciente de 14 anos, com diagnóstico prévio de lipoma de evolução acelerada, para destacar a importância da investigação precoce, dos diagnósticos diferenciais e do estudo histopatológico a fim de se alcançarem possibilidades terapêuticas curativas e melhor prognóstico.

 

RELATO DO CASO

Sexo masculino, 14 anos, eutrófico e sem comorbidades, foi encaminhado ao serviço terciário de Dermatologia devido ao surgimento de tumoração no ombro direito há um ano, com crescimento progressivo, apresentando dor e limitação à movimentação. Ultrassonografia prévia evidenciava formação nodular hipoecoica de 4,5 x 1,4cm, com finas traves fibrosas de permeio, sem fluxo vascular significativo, localizada na região subcutânea do ombro direito com características sugestivas de lipoma. Devido à pandemia da Covid-19, paciente foi atendido nove meses após o exame de imagem, apresentando aumento exuberante da tumoração, medindo 10 x 10cm na região posterior do ombro direito (Figura 1). Realizada exérese imediata da lesão que, durante o intraoperatório, apresentou-se como tumoração violácea, algo friável e aderida a planos profundos (Figura 2).

A análise histopatológica revelou padrão de crescimento multinodular composto por células pequenas, monótonas, redondas a ovoides, contendo escasso citoplasma e núcleos hipercromáticos, organizados em ninhos delimitados por finos septos fibrosos. Tumor marcadamente hipercelular, possuindo exuberante padrão pseudoangiomatoide. Abundantes figuras de mitose foram identificadas, além de múltiplos focos de necrose (Figura 3). O estudo imuno-histoquímico revelou imunoexpressão para CD99 e FLI1, expressão focal de citoqueratina (AE1/AE3) e S100, além de negatividade para CD34, actina de músculo liso, desmina, miofenina, sinaptofisina, EMA e TLE1 (Figura 4). O conjunto de achados confirmou o diagnóstico de EES.

O estadiamento oncológico revelou metástase para medula óssea. Procedeu-se à ampliação cirúrgica extensa e à quimioterapia, com estabilidade do quadro. Paciente segue com 12 meses de seguimento, no 13º ciclo de quimioterapia e ausência de outros focos neoplásicos/metástases.

 

DISCUSSÃO

O EES é neoplasia maligna rara que se apresenta como nodosidade dolorosa de crescimento rápido, com localização frequente nas regiões paravertebrais e membros inferiores.5 Histologicamente, apresenta células compactas, homogêneas, pequenas, redondas a ovais, dispostas em folhas, expressando na imuno-histoquímica marcada expressão de CD99 em sua superfície.2,5 Apresenta tendência à disseminação local e elevados índices de metástase, com prognóstico dependente da extensão tumoral e presença de metástases ao diagnóstico.6 Dessa forma, o diagnóstico precoce por meio da histopatologia torna-se essencial para a abordagem agressiva do tumor e melhora da sobrevida.6

O tratamento adequado envolve cirurgia e/ou radioterapia local, associados à quimioterapia.6,7 Embora o EES seja considerado como radiossensível, atualmente a exérese cirúrgica ampla constitui método terapêutico local de escolha devido aos efeitos colaterais associados à radioterapia.6,7 A ressecção completa do tumor associada à idade precoce no diagnóstico são consideradas preditores de melhor prognóstico e maior sobrevida.6,7 Por outro lado, a idade superior a 14 anos no diagnóstico, o volume do tumor primário acima de 200mL e a presença de metástases (principalmente na medula óssea e pulmão) constituem os principais fatores associados ao pior prognóstico.6,7 A quimioterapia com antraciclinas pode ser usada como terapia adjuvante, e o papel da radioterapia local adjuvante após a ressecção completa ainda é inconclusivo, embora tenha demonstrado melhorar a sobrevida. A quimioterapia neoadjuvante parece alcançar resultados mais promissores, mas depende de ensaios clínicos prospectivos.8

O diagnóstico de EES em paciente jovem é desafiador, quer pela raridade, quer pela plêiade de doenças que podem manifestar-se como nódulos subcutâneos. Os diagnósticos diferenciais na adolescência tornam o estudo histopatológico imprescindível, e a rápida progressão do tumor associada a altos índices metastáticos evidenciam a importância da terapêutica multimodal precoce. Apesar das melhorias marcantes na sobrevida, uma melhor compreensão da complexa biologia do sarcoma extraesquelético de Ewing pode fornecer um roteiro para o desenvolvimento bem-sucedido de terapias biologicamente direcionadas.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Melissa de Almeida Corrêa Alfredo 0000-0001-7423-4190
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Priscila Neri Lacerda 0000-0001-8100-5978
Elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Ana Flávia Teixeira Abreu 0000-0003-4169-9068
Elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Alexandre Morais Carneiro 0000-0002-8947-8611
Obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Eloisa Bueno Pires Campos 0000-0001-7185-4650
Obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Helio Amante Miot 0000-0002-2596-9294
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. Durer S, Shaikh H. Ewing Sarcoma. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2022.

2. Ludwig JA. Ewing sarcoma: historical perspectives, current state-of-the-art, and opportunities for targeted therapy in the future. Curr Opin Oncol. 2008;20(4):412–8.

3. Abboud A, Masrouha K, Saliba M, Haidar R, Saab R, Khoury N, et al. Extraskeletal Ewing sarcoma: diagnosis, management and prognosis. Oncol Lett. 2021;21(5):354.

4. Eloqayli H. Adult primary cervical extra-osseous Ewing's sarcoma: a case report and short literature review. Int J Surg Case Rep. 2017;41:83-5.

5. Kennedy JG, Eustace S, Caulfield R, Fennelly DJ, Hurson B, O'Rourke KS. Extraskeletal Ewing's sarcoma: a case report and review of the literature. Spine (Phila Pa 1976). 2000;25(15):1996-9.

6. Ladenstein R, Pötschger U, Le Deley MC, Whelan J, Paulussen M, Oberlin O, et al. Primary disseminated multifocal Ewing sarcoma: results of the Euro-EWING 99 trial. J Clin Oncol. 2010;28(20):3284-91.

7. Dunst J, Schuck A. Role of radiotherapy in Ewing tumors. Pediatr Blood Cancer. 2004;42(5):465-70.

8. Dirksen U, Ranft A, Baumhoer D, Berg H van den, Brichard B, Eich H-T, et al. Association of treatment delays with an unfavorable outcome in patients with localized Ewing sarcoma: a retrospective analysis of data from the GPOH Euro - E.W.I.N.G. 99 trial. 2021;39:11502.


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