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Artigo Original

Mortalidade por melanoma nas capitais do Nordeste do Brasil, 2001-2017: análise pelo modelo de regressão por pontos de inflexão

Amanda Maria Sandes Lemos1; Beatriz Gomes de Castro1; André Luis Oliveira do Nascimento1; Carlos Alberto de Oliveira Rocha1; João Paulo Oliveira de Almeida1; Gustavo Nascimento Monteiro Siqueira1; Myllena Vitória Bispo Santana2; João Vitor Bispo Santana1; Tânia Rita Moreno de Oliveira Fernandes3; Maria Deysiane Porto Araújo1; Thaysa Kelly Barbosa Vieira Tomé1; José Roberto Amorim1; Rodrigo Feliciano do Carmo4,5; Carlos Dornels Freire de Souza1,6

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2022140145

Data de submissão: 18/04/2022
Decisão Final: 10/07/2022


Fonte de financiamento: Nenhuma
Conflito de interesses: Nenhum
Como citar este artigo: Lemos AMS, Castro BG, Nascimento ALO, Rocha CAO, Almeida JPO, Siqueira GNM, et al. Mortalidade por melanoma nas capitais do Nordeste do Brasil, 2001-2017: análise pelo modelo de regressão por pontos de inflexão.Surg Cosmet Dermatol. 2022;14:e20220145.


Abstract

INTRODUÇÃO: o melanoma compreende 3% dos tumores de pele e apresenta capacidade de produzir metástase e elevada mortalidade.
OBJETIVO: analisar o comportamento temporal da mortalidade por melanoma de pele nas capitais do Nordeste brasileiro, no período de 2001 a 2017.
MÉTODOS: realizou-se um estudo ecológico de séries temporais envolvendo todos os óbitos em decorrência de melanoma registrados nas capitais da região Nordeste no Brasil no período de 2001 a 2017. Analisaram-se as taxas brutas e padronizadas pelas populações mundial e brasileira. Obtiveram-se os indicadores do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Na análise estatística, utilizou-se o modelo de regressão por pontos de inflexão, com cálculo do percentual de variação anual e o percentual de variação anual médio.
RESULTADOS: registraram-se 954 óbitos por melanoma. As três taxas analisadas apresentaram tendência de crescimento linear ao longo da série temporal: a mortalidade proporcional passou de 2,1 para 8,28% (AAPC 6,0%; p<0,02); a mortalidade bruta passou de 0,22 para 0,64/100 mil (AAPC 5,0%; p<0,01); e a mortalidade ajustada pela população mundial nas capitais do Nordeste subiu de 0,28 para 0,61/100 mil (AAPC 2,7%; p<0,01).
CONCLUSÃO: a mortalidade por melanoma cresceu nas capitais do Nordeste, com desigualdades entre os sexos e de acordo com as capitais.


Keywords: Epidemiologia; Melanoma; Mortalidade; Neoplasias cutâneas.


INTRODUÇÃO

O aumento progressivo das doenças crônico-degenerativas, como o câncer, em detrimento das doenças infectoparasitárias, evidencia as mudanças no perfil da morbimortalidade brasileira.1 O câncer de pele é a neoplasia mais incidente no Brasil, com cerca de 190 mil registros anuais e quatro mil mortes.2

O câncer de pele é classificado em câncer de pele melanoma e não melanoma.3 O câncer de pele não melanoma é o mais frequente, correspondendo a 30% de todas as neoplasias no Brasil3, com estimativa de 176 mil casos em 2020.3,4 Já o câncer de pele melanoma é mais raro e compreende 3% de todos os tumores de pele, com estimativa de cerca de oito mil casos em 2020.2

O melanoma tem origem nas células responsáveis pela produção de melanina, os melanócitos, encontradas principalmente na pele, mas que também estão presentes em muitas outras regiões do corpo para onde estas células migram durante o desenvolvimento embrionário a partir das células-tronco pluripotentes da crista neural.5 Deste modo, embora o maior número de casos de melanoma seja cutâneo,2,6 pode também, eventualmente, surgir nos diversos locais em que os melanócitos estejam presentes, como mucosas7, meninges8,9 e olhos.10

Apesar da baixa incidência, o melanoma cutâneo apresenta maior malignidade e capacidade de produzir metástase, isto é, proliferação desordenada de células anormais com tendência a autonomia e durabilidade. Essas células são capazes de invadir outras estruturas orgânicas por via hematogênica ou linfática, produzindo efeitos deletérios em outros órgãos.2,4

Entretanto, quando o câncer de pele do tipo melanoma é detectado em seu estágio inicial, sem metástase, o prognóstico é bom. A taxa de sobrevida em cinco anos após o diagnóstico para melanoma cutâneo sem metástase é de 99%, enquanto para o melanoma cutâneo com metástase para linfonodos regionais é de 65%. E para melanoma cutâneo com metástase a distância é de 25%.11

Em um país de dimensões continentais, como é o caso do Brasil, no qual imperam desigualdades (econômica, ambiental e de acesso aos Serviços de Saúde), nota-se também que os dados epidemiológicos divergem entre as regiões. Em 2020, foram estimados 8.450 registros de câncer de pele melanoma, dos quais somente 1.000 casos (12,8%) são esperados para o Nordeste2, mesmo sendo esta região responsável por 26,7% da população brasileira. Diferente das regiões Sul e Sudeste, que concentram polos científicos e de saúde, no Nordeste as investigações sobre prevalência e tendência temporal são escassas.12

Com base no exposto, este trabalho tem como objetivo analisar o comportamento temporal da mortalidade por melanoma nas capitais do Nordeste brasileiro no período de 2001 a 2017.

 

MÉTODOS

Desenho do estudo, população e período

Estudo ecológico de séries temporais, envolvendo todos os óbitos em decorrência de melanoma registrados nas capitais da região Nordeste do Brasil no período de 2001 a 2017.

Cenário do estudo

O estudo foi realizado em todas as nove capitais da região Nordeste do Brasil: São Luís (Maranhão), Teresina (Piauí), Fortaleza (Ceará), Natal (Rio Grande do Norte), João Pessoa (Paraíba), Recife (Pernambuco), Maceió (Alagoas), Aracaju (Sergipe) e Salvador (Bahia).

A região Nordeste possui clima predominantemente tropical e semiárido.13,14 Além disso, apresenta o maior índice de irradiação solar do Brasil, com valor médio total diário de irradiação global horizontal de 5,49kWh/m2.15 Com destaque para as capitais, a temperatura anual média é de 27,1ºC.14

Neste estudo, foram incluídas somente as capitais, tendo em vista: i. a homogeneidade dos cenários de saúde; ii. o fato de as capitais concentrarem centros de diagnóstico e tratamento das doenças mais complexas; e iii. as condições ambientais e climáticas serem semelhantes.14

Variáveis do estudo e coleta dos dados

Foram analisados os seguintes indicadores:

• Mortalidade proporcional por melanoma;
• Taxa bruta de mortalidade por melanoma; e
• Taxa de mortalidade por melanoma ajustada pela população mundial.

As taxas foram estratificadas segundo sexo. Os dados foram obtidos do Atlas de Mortalidade on-line do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA).16 O acesso foi realizado em 30 de março de 2020. Ressalta-se que as taxas foram obtidas já calculadas pela plataforma do INCA.

Tratamento estatístico

Após a coleta dos dados, procedeu-se ao tratamento estatístico com a utilização do modelo de regressão por pontos de inflexão (joinpoint regression model). O modelo testa se uma linha com múltiplos segmentos é estatisticamente mais adequada para descrever a evolução temporal de um conjunto quando comparada a uma linha reta ou com menos segmentos.17 Com base na inclinação da reta, as tendências foram classificadas como crescente, decrescente ou estacionária. Além disso, foram obtidos o percentual de variação anual (APC, Annual Percent Change) e o percentual de variação anual médio (AAPC, Average Annual Percent Change), considerando-se intervalo de confiança de 95% (IC 95%) e significância de 5%. A análise foi realizada utilizando-se o joinpoint regression software (version 4.5.0.1, National Center Institute, Bethesda, MD, USA).

Aspectos éticos

O estudo não necessitou de aprovação do comitê de ética, uma vez que utilizou dados secundários de domínio público e não houve identificação individual de nenhum paciente.

 

RESULTADOS

Mortalidade proporcional

No período de 2001 a 2017, foram registrados 954 óbitos por melanoma nas capitais do Nordeste brasileiro, sendo 57,02% (n=544) do sexo masculino. Fortaleza (CE) e Salvador (BA) concentraram 23,48% (n=224) e 19,81% (n=189) dos registros, respectivamente. Considerando-se ambos os sexos, as três taxas analisadas (mortalidade proporcional, taxa bruta e taxa ajustada) apresentaram tendência de crescimento linear ao longo da série temporal: a mortalidade proporcional passou de 4,9% para 7,2% (AAPC 6,0%; p<0,01); a mortalidade bruta passou de 3,9% para 6,1% (AAPC 5,0%; p<0,01); e a mortalidade ajustada pela população mundial nas capitais do Nordeste subiu de 1,6% para 3,9% (AAPC 2,7%; p<0,01) (Figura 1).

No sexo masculino, esse mesmo comportamento temporal de crescimento foi observado: a mortalidade proporcional passou de 3,8% para 8,2% (AAPC 6,0%; p<0,01); a taxa bruta passou de 2,8% para 7,2% (AAPC 5,0%; p<0,01); e a taxa ajustada pela população mundial passou de 1,0% para 5,2% (AAPC 3,1%; p<0,01). Já no sexo feminino, a mortalidade proporcional apresentou crescimento linear passando de 4,4% para 7,8% (AAPC 6,1%; p<0,01); a taxa bruta, também com tendência linear de crescimento, passou de 3,3% para 6,6% (AAPC 5,0; p<0,01); e padrão estacionário na taxa ajustada pela população mundial ao considerar o período total (2001-2017). Nessa taxa, foram observadas duas inflexões e três tendências, sendo a última de crescimento significativo a partir de 2010 (AAPC 4,6%; p<0,01) (Figura 1).

Das capitais do Nordeste, considerando-se ambos os sexos, cinco cidades apresentaram tendência temporal crescente da taxa de mortalidade proporcional: Aracaju (APC 16,7; p<0,01), Fortaleza (APC 7,1; p<0,01), Natal (APC 8,8; p<0,01), São Luís (APC 24,9; p<0,01) e Teresina (APC 25,3; p<0,01). João Pessoa (APC 3,1; p=0,1) e Maceió (APC 11,0; p=0,2) apresentaram tendências estacionárias. Recife e Salvador apresentaram diferentes tendências ao longo dos anos, havendo um comportamento estacionário predominante (Tabela 1).

No sexo masculino, três capitais apresentaram tendência temporal da taxa de mortalidade proporcional por câncer de pele melanoma crescente: Fortaleza (APC 7,7; p<0,01), Natal (APC 16,0; p<0,01) e Teresina (APC 39,1; p<0,01). Apresentaram tendências estacionárias as cidades de Aracaju (APC 7,4; p=0,4), João Pessoa (APC 24,3; p=0,1), Maceió (APC 24,5; p=0,1) e Salvador (APC 4,5; p=0,1). Recife e São Luís apresentam diferenças entre as tendências ao longo dos anos, com predomínio de tendência estacionária (Tabela 1).

No sexo feminino, cinco capitais apresentaram tendência temporal crescente da taxa de mortalidade proporcional por melanoma: Fortaleza (APC 7,3; p<0,01), Maceió (APC 16,4; p=0,1), Natal (APC 41,1; p<0,01), São Luís (APC 30,4; p<0,01) e Salvador (APC 36,2; p<0,01). Esta última, entretanto, apresentou tendência crescente durante o período de 2001 a 2003 (APC 1013,9; p<0,01) e estacionária de 2003 a 2017 (APC 0,9; p=0,7). As cidades de Aracaju (APC 16,9; p=0,1), João Pessoa (APC -3,2; p=0,7), Recife (APC 3,2; p=0,1) e Teresina (APC 28,3; p=0,1) mostraram tendência estacionária (Tabela 1).

Taxa de mortalidade bruta

Na análise da tendência temporal da taxa de mortalidade bruta por câncer de pele melanoma, levando-se em consideração ambos os sexos, cinco capitais do Nordeste apresentaram tendência crescente: Aracaju (APC 10,4; p<0,01), Fortaleza (APC 6,0; p<0,01), Natal (APC 7,7; p<0,01), São Luís (APC 14,9; p<0,01) e Teresina (APC 17,0; p<0,01). Apresentaram tendência estacionária as cidades de João Pessoa (APC 1,4; p=0,5) e Maceió (APC 8,2; p=0,1). Recife manifestou tendências diferentes durante o período, com prevalência do padrão estacionário (APC 0,7; p=0,9), bem como Salvador (APC 11,6; p=0,2) (Tabela 2).

Ao considerar o sexo masculino, Fortaleza (APC 6,6; p<0,01), Natal (APC 10,8; p<0,01) e Teresina (APC 26,7; p<0,01) apresentaram tendência crescente. As cidades de Aracaju (APC 4,8; p=0,5), João Pessoa (APC 14,2; p=0,1), Maceió (APC 14,4; p=0,1) e Salvador (APC 3,9; p=0,2) apresentaram tendência estacionária. Houve diferentes tendências para Recife (APC -3,5; p=0,8) e São Luís (APC -1,7; p=0,9), mas ambas com predomínio de tendência estacionária (Tabela 2).

Nos casos do sexo feminino, apresentaram tendência crescente Aracaju (APC 10,7; p<0,01), Fortaleza (APC 6,2; p<0,01), Natal (APC 22,1; p<0,01) e São Luís (APC 14,7; p<0,01). João Pessoa (APC -3,4; p=0,6), Maceió (APC 10,0; p=0,1), Recife (APC 2,5; p=0,1) e Teresina (APC 14,5; p=0,1) apresentaram tendência estacionária. Salvador apresentou variação durante o período, com predomínio da estacionária (APC 19,5; p=0,1) (Tabela 2).

Taxa de mortalidade ajustada pela população mundial

A tendência temporal da taxa de mortalidade por câncer de pele melanoma ajustada pela população mundial nas capitais do Nordeste, considerando-se ambos os sexos, foi crescente para cinco cidades: Aracaju (APC 8,6; p<0,01), Fortaleza (APC 3,7; p<0,01), Natal (APC 6,0; p<0,01), São Luís (APC 14,0; p<0,01) e Teresina (APC 16,4; p<0,01). Houve diferença entre as tendências no período de 2001 a 2017 nas capitais Recife (APC -1,3; p=0,9) e Salvador (APC 9,5; p=0,3), ambas com predomínio estacionário. Também houve tendência estacionária nas cidades de João Pessoa (APC -0,6; p=0,8) e Maceió (APC 5,7; p=0,2) (Tabela 3).

No sexo masculino, a tendência temporal da taxa de mortalidade ajustada foi crescente em três capitais do Nordeste: Fortaleza (APC 4,6; p<0,01), Natal (APC 9,9; p<0,01) e Teresina (APC 27,8; p<0,01). A tendência foi predominantemente estacionária nas cidades de Aracaju (APC 2,7; p=0,7), João Pessoa (APC 14,6; p=0,1), Maceió (APC 13,4; p=0,1), Recife (APC -1,8; p=0,9), Salvador (APC 0,7; p=0,8) e São Luís (APC -2,8; p=0,9) (Tabela 3).

Em relação ao sexo feminino, a tendência temporal da taxa de mortalidade ajustada foi crescente em duas cidades: Natal (APC 19,5; p<0,01) e São Luís (APC 15,0; p<0,01). A tendência foi estacionária nas cidades de Aracaju (APC 7,7; p=0,2), Fortaleza (APC 4,2; p=0,1), João Pessoa (APC -5,0; p=0,4), Maceió (APC 7,9; p=0,1), Recife (APC -0,7; p=0,6), Teresina (APC 12,7; p=0,2) e Salvador (APC 18,1; p=0,2) (Tabela 3).

 

DISCUSSÃO

O objetivo deste trabalho foi analisar a tendência da mortalidade por melanoma, o que permitiu constatar predomínio de tendência crescente nas taxas de mortalidade proporcional, bruta e ajustada nas capitais do Nordeste do Brasil entre 2001 e 2017, especialmente em Natal e Fortaleza, com desigualdades quando se analisa segundo sexo e capital.

Dados epidemiológicos internacionais indicam crescimento contínuo da incidência de melanoma na Europa, no Canadá e nos Estados Unidos nas últimas décadas, e a maior taxa de incidência está na Nova Zelândia, com 50 casos por 100 mil habitantes.18 Nos Estados Unidos, Reino Unido, Suécia e Noruega, as taxas elevam-se em mais de 3% ao ano, e as projeções estimam que esse aumento continuará até pelo menos 2022.19 Nos Estados Unidos, são quase sete mil óbitos anuais em decorrência de melanoma.11 Esse crescimento está em consonância com o observado em nosso estudo no que se refere à taxa ajustada pela população mundial, cujo percentual de crescimento anual foi de 2,7%. Por outro lado, o incremento anual da mortalidade proporcional alcançou 6,0%.

O melanoma é uma doença de etiologia multifatorial, entretanto estima-se que pelo menos 80% dos casos sejam decorrentes da exposição ao sol, sendo essa o principal fator de risco para o desenvolvimento da doença.20 Nesse contexto, a intensidade de radiação solar sobre a região Nordeste pode representar um fator de risco para a doença.

A exposição solar excessiva e cumulativa nos primeiros 20 anos de idade e o número de queimaduras solares durante toda a vida elevam as chances de surgimento de câncer de pele melanoma na idade adulta.20 A infância, em especial, é uma fase mais vulnerável aos efeitos nocivos do sol devido ao fato de as crianças passarem mais tempo em ambientes externos e expostos ao sol. Além disso, sabe-se que aproximadamente 25 a 50% de toda a exposição solar durante a vida acontece até os 21 anos de idade.20

Ainda, os indivíduos que exercem atividades laborais sujeitas a essa exposição têm maior chance de desenvolver reações cutâneas fotobiológicas que propiciam o surgimento do câncer de pele. Apesar de haver legislações incisivas acerca do uso de equipamentos de proteção individual (EPIs), não há nenhuma que obrigue o uso de protetor solar, o que seria vantajoso para áreas específicas da pele para as quais o EPI não confere em absoluto a proteção desejada.21

Estudos internacionais apontam que outro fator importante para um futuro acréscimo nos casos de câncer de pele é o aumento da expectativa de vida. Até 2050 é esperado que até 32% da população mundial esteja com idade acima de 60 anos, o que contribui para a elevação dos números, dado o aumento de casos de câncer de pele de acordo com o aumento da idade.18 Esse aumento é decorrente do fato de que maior tempo de vida significa maior tempo de fotodano às células da pele e, principalmente, mais tempo para que os danos possam se manifestar em forma de neoplasias.22

Um estudo realizado em Teresina, capital do estado do Piauí, evidenciou que a maior parte dos diagnósticos de melanoma cutâneo realizados no Serviço de referência da capital foi em pacientes maiores de 50 anos. E a lesão foi predominantemente encontrada em áreas cronicamente fotoexpostas, como cabeça e pescoço, tronco – sobretudo em homens - e extremidade de membros.12

O melanoma demonstra ainda grande variação de sua incidência em diferentes grupos étnicos, sobretudo em razão da propriedade de fotoproteção da melanina, reduzida em determinadas etnias.23 Estudos norte-americanos indicam que o risco de desenvolver melanoma durante a vida é de 2,6% para brancos, 0,6% para hispânicos e 0,1% para negros.24 Os estados das capitais com tendência crescente expressiva nas taxas analisadas, Natal e Fortaleza, possuíam, de acordo com o último Censo Demográfico do IBGE, 41,2 e 32% de autodeclarados brancos, respectivamente.25

A análise das taxas de mortalidade ajustadas demonstra predominância estacionária para ambos os sexos. No entanto, as taxas de mortalidade proporcional e bruta apresentaram predomínio de tendências crescentes para o sexo feminino e estacionárias para o masculino, enquanto na mortalidade ajustada observou-se o contrário – mais tendências crescentes para o sexo masculino (três capitais - Fortaleza, Natal e Teresina) do que para o feminino (duas capitais - Natal e Teresina). De modo geral, os homens utilizam menos os Serviços de Saúde do que as mulheres. Os motivos giram em torno da diferença no perfil de necessidades de saúde, da busca por esses serviços entre os gêneros bem como da existência de mais políticas públicas de saúde voltadas para a população feminina.26,27

O diagnóstico precoce ainda se mostra a forma mais eficaz de diminuir a mortalidade por melanoma.12 A descoberta precoce de lesões cutâneas por melanócitos neoplásicos ainda restritas à epiderme ou à derme superficial propicia maior possibilidade de cura por meio do tratamento adequado.27 Nas últimas décadas, observou-se melhora da sobrevida em cinco anos com diminuição da taxa de mortalidade geral entre 70 a 80% devido ao diagnóstico e ao tratamento precoces.28

A Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) iniciou, em 2014, a campanha nacional de prevenção do câncer de pele denominada “Dezembro Laranja” que, dentre outras ações educativas, alerta para os perigos da exposição solar sem proteção. Além disso, a SBD também realizou 26.161 atendimentos no ano de 2018, sendo 3.852 casos de câncer da pele identificados, dentre eles 363 melanomas, em campanha de detecção precoce que foi implementada desde 1999.29

O presente estudo, ainda que considerados todos os cuidados metodológicos necessários, possui limitações. A primeira diz respeito ao uso de dados secundários, que recebe influência do contexto operacional dos serviços de vigilância nos estados da região, com consequente subdiagnóstico da doença e sub-registro de óbitos, a exemplo das capitais que apresentaram zero caso em determinados anos, como Maceió e Teresina no ano de 2001. A segunda refere-se à ausência de padronização na centralização e na coleta dos dados, o que dificulta a execução de investigações e comparativos entre as regiões. A terceira compreende a própria escassez de estudos epidemiológicos a respeito do tema.

 

CONCLUSÃO

A análise das séries temporais da mortalidade por melanoma nas capitais da região Nordeste do Brasil entre os anos de 2001 e 2017 mostrou tendência crescente para as taxas de mortalidade bruta, mortalidade proporcional e mortalidade ajustada considerando-se ambos os sexos em cinco capitais: Aracaju, Fortaleza, Natal, São Luís e Teresina. Para o sexo masculino, Fortaleza, Natal e Teresina mostraram tendência crescente nas três taxas. No sexo feminino, observou-se variação de acordo com a taxa: cinco capitais na mortalidade proporcional, quatro na taxa bruta e duas na padronizada.

Os resultados encontrados podem ser de grande valia para a compreensão da situação de saúde da região, podendo subsidiar a elaboração de estratégias de prevenção e diagnóstico precoce voltadas para a realidade regional do Nordeste brasileiro e, em especial, de suas capitais. l

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Amanda Maria Sandes Lemos 0000-0002-0655-4093
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Beatriz Gomes de Castro 0000-0002-7547-1240
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

André Luis Oliveira do Nascimento 0000-0001-5274-3277
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Carlos Alberto de Oliveira Rocha 0000-0003-2927-5043
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

João Paulo Oliveira de Almeida 0000-0002-0414-4744
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Gustavo Nascimento Monteiro Siqueira 0000-0002-3966-2488
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Myllena Vitória Bispo Santana 0000-0001-8090-0911
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

João Vitor Bispo Santana 0000-0002-5642-1643
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Tânia Rita Moreno de Oliveira Fernandes 0000-0002-7061-2825
Aprovação da versão final do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Maria Deysiane Porto Araújo 0000-0002-1258-0845
Aprovação da versão final do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Thaysa Kelly Barbosa Vieira Tomé 0000-0001-5538-3772
Aprovação da versão final do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

José Roberto Amorim 0000-0001-5884-639X
Aprovação da versão final do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Rodrigo Feliciano do Carmo 0000-0001-9601-6995
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Carlos Dornels Freire de Souza 0000-0001-7995-1893
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

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