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Relato de caso

Linfoma de células NK/T tipo nasal (neoplasia linfoide rara, de rápida evolução, mutilante e de alta letalidade): relato de caso

Laura Nunes Lopes; Roberta Akeme de Oliveira Sato; Clóvis Antônio Lopes Pinto; Juliana Arêas de Souza Lima Beltrame Ferreira; Célia Antônia Xavier de Moraes Alves

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20221400126

Data de submissão: 24/01/2022
Decisão Final: 05/08/2022


Fonte de financiamento: Nenhuma
Conflito de interesses: Nenhum
Como citar este artigo: Lopes LN, Sato RAO, Pinto CAL, Ferreira JASLB, Alves CAXM. Linfoma de células NK/T tipo nasal (neoplasia linfoide rara, de rápida evolução, mutilante e de alta letalidade): relato de caso. Surg Cosmet Dermatol. 2022;14:e20220126


Abstract

O linfoma de células NK/T é um tumor não Hodgkin, raro, muito agressivo e intimamente relacionado ao vírus Epstein-Barr (EBV). Possui prognóstico ruim e resposta pobre aos tratamentos. Trata-se de uma paciente feminina, 91 anos, com história de lesão em região nasal há três meses. Estudo histológico evidenciou infiltração difusa da derme por células linfoides pequenas e atípicas e imuno-histoquímica positiva para Ki-67, CD30 e CD3 (citoplasmático). Devido ao rápido crescimento da lesão e à alta morbidade da neoplasia, a paciente foi encaminhada para internação para medidas de suporte, mas evoluiu para óbito antes do início do tratamento.


Keywords: Infecções por Vírus Epstein-Barr; Linfócitos; Oncologia; Linfoma Extranodal de Células T-NK; Granuloma Letal da Linha Média


INTRODUÇÃO

O linfoma de células NK/T é um tumor não Hodgkin, comumente descrito na Ásia e na América Latina. É raro (cerca de 1% dos linfomas cutâneos de células T), muito agressivo e intimamente relacionado ao vírus Epstein-Barr1,2,3,4 (a infecção pode ser antes ou simultaneamente à gênese do tumor2). A célula precursora é da linhagem linfoide, sendo que, em 95% dos casos, advém da célula NK (função citolítica).2

Constitui o grupo dos linfomas cutâneos não micose fungoide/não Síndrome de Sézary (10% dos casos)4, apresentando uma evolução rápida, mutilante e altamente letal (sobrevida < 5% em cinco anos).1

Divide-se nos subtipos não nasal e nasal (antigo granuloma letal da linha média2,3,4,5). Em 80% dos casos,2,4 ocorre acometimento de região nasal ou nasofaríngea, mas também pode acometer trato aerodigestivo,4 testículos,5 músculos e útero ou evoluir por contiguidade para órbita, glândulas salivares e seios paranasais. Acredita-se que muitos dos casos não nasais provavelmente tiveram seu início subclínico no nariz (sítio primário).2

Possui prognóstico ruim e resposta pobre aos tratamentos.

 

RELATO DO CASO

Paciente feminina, 91 anos, branca, hipertensa, com história de lesão nasal há três meses e emagrecimento (5kg em 30 dias). Ao exame dermatológico, lesão eritematosa e edematosa em região nasal esquerda, com ulceração local e área de necrose. Inicialmente pelo quadro clínico, foram aventadas as hipóteses de carcinoma espinocelular (CEC), linfoma de células NK/T, leishmaniose tegumentar (LTA) e mucormicose. Após uma semana da avaliação inicial, houve aumento do tamanho e piora do aspecto geral da lesão, sendo então introduzida antibioticoterapia. Aos exames laboratoriais, observou-se anemia hipocrômica e microcítica, leucocitose, plaquetose e aumento de VHS e PCR (28 e 138, respectivamente). Na tomografia de crânio, área de ulceração dérmica da região nasal/malar esquerda até os limites ósseos adjacentes, sem sinais de invasão ou osteomielite crônica e sem coleções organizadas. Estudo anatomopatológico (Figuras 3 e 4) mostrou infiltração difusa da derme por células linfoides pequenas e atípicas, e imuno-histoquímica (Figuras 5 e 6) positiva para Ki-67 (estimado em 80%), CD30 e CD3 (citoplasmático), confirmando diagnóstico de linfoma T (CD3e+) de alto grau (CD30+) ou linfoma NK/T tipo nasal.

Devido à rápida evolução da neoplasia (Figuras 1 e 2) e à piora clínica, com queda do estado geral, adinamia e dificuldade para se alimentar a paciente foi encaminhada para internação, para medidas de suporte e cuidados paliativos, sob acompanhamento das equipes de Dermatologia, Onco-hematologia Clínica e Cirurgia de Cabeça e Pescoço (CCP), tendo evoluido a óbito no quinto dia de sua internação.

 

DISCUSSÃO

Clinicamente, o linfoma NK/T tipo nasal pode se apresentar com epistaxe, tumoração nasal com edema perilesional, perfuração de palato duro (provocando comunicação entre as cavidades nasal e oral), e o paciente pode se queixar de obstrução e/ou secreção nasais.4 No caso relatado, houve manifestação semelhante aos casos descritos na literatura, com enfoque para a extensa área de necrose local.

O estudo anatomopatológico revela uma infiltração de células linfoides atípicas, neutrófilos e eosinófilos, caracterizando a chamada reticulose polimórfica.2,5 Outra característica histopatológica desse tumor é sua íntima relação com vasos sanguíneos (invasão da parede e oclusão vasculares).2,3

A imuno-histoquímica é geralmente positiva para CD3 (superfície: negativo; cadeia épsilon citoplasmática: positiva), CD56, CD2 e moléculas citotóxicas (granzima B, perforina e TIA1).2,3,5,6,7 O Ki-67 positivo indica alto índice de proliferação celular.

Outras técnicas utilizadas são a quantificação de EBV-DNA no plasma sanguíneo (indicador de prognóstico) e a hibridização in situ para avaliar invasão medular do tumor por meio da detecção do material genético do vírus.2,3,5

Em relação aos exames de imagem, além da tomografia computadorizada, consideram-se o Pet-scan (PET-CT)5,7,8 e a ressonância nuclear magnética (RNM) de partes moles, principalmente para avaliar extensão e complicações. Em casos não nasais, o PET-CT é especialmente importante, pois a ausência de áreas hipermetabólicas (a célula linfoide tumoral tem alta avidez pelo 18-fluordesoxiglicose) na região nasal/nasofaríngea exclui a possibilidade de o sítio primário ser a face.2

Quanto ao tratamento,2,5,6,8,9 a combinação de radioterapia mais quimioterapia ainda é considerada o padrão-ouro, mas novos protocolos e novas terapias (terapia-alvo, transplante de células-tronco, imunoterapia com alvo no EBV, entre outros) vêm sendo discutidos.6,9 No caso descrito, assim como em muitos outros casos desse linfoma, não houve tempo para tratamento, apenas medidas de conforto.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Laura Nunes Lopes 0000-0001-5268-0624
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Roberta Akeme de Oliveira Sato 0000-0001-6449-8870
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Clóvis Antônio Lopes Pinto 0000-0003-1711-0081
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Juliana Arêas de Souza Lima Beltrame Ferreira 0000-0001-7338-3442
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Célia Antônia Xavier de Moraes Alves 0000-0002-8421-8837
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. Bolognia JL, Jorizzo JL, Rapini RP, editors. Dermatology. 2ª ed. St. Louis: Mosby Elsevier; 2008.

2. Tse E, Kwong YL. Diagnosis and management of extranodal NK/T cell lymphoma nasal type. Expert Rev Hematol. 2016;9(9):861-71.

3. Haverkos BM, Pan Z, Gru AA, Freud AG, Rabinovitch R, Xu-Welliver M, et al. Extranodal NK/T Cell Lymphoma, Nasal Type (ENKTL-NT): an update on epidemiology, clinical presentation, and natural history in North American and European cases. Curr Hematol Malig Rep. 2016;11(6):514-27.

4. Moreno L, Ramos-Valencia L, Parra-Charris J, Ángel-Obando R. Accurate diagnose and management of advanced nasal type extranodal NK/T cell lymphoma. A case report. Case Reports. 2017;3(1):42-8.

5. Tse E, Kwong YL. NK/T-cell lymphomas. Best Pract Res Clin Haematol. 2019;32(3):253-61.

6. Chiattone CS. Linfoma extranodal de células NK/T tipo Nasal. Rev Bras Hematol Hemoter. 2009;31(Suppl. 2):26-9

7. Jhuang JY, Chang ST, Weng SF, Pan ST, Chu PY, Hsieh PP, et al. Extranodal natural killer/T-cell lymphoma, nasal type in Taiwan: a relatively higher frequency of T-cell lineage and poor survival for extranasal tumors. Hum Pathol. 2015;46(2):313-21.

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