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Relato de caso

Laser Q-Switched para o tratamento da melanose labial na síndrome de Peutz-Jeghers

Abdo Salomão Junior1; Constança Pithon Pereira2; Rodrigo Cesar Davanco3; Daniella Grande Curi3; Domingos Jordão Neto3

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20221400116

Fonte de financiamento: Nenhuma
Conflito de interesses: Nenhum


Data de submissão: 09/12/2021
Decisão Final: 30/03/2022
Como citar este artigo: Salomão Junior A, Pereira CP, Davanco RC, Curi DG, Jordão Neto D. Laser Q-Switched para o tratamento da melanose labial na síndrome de Peutz-Jeghers. Surg Cosmet Dermatol. 2022;14:e20220116
Agradecimentos: Agradecemos à colega Isabela Cidade França Ferracini pela contribuição no caso clínico apresentado


Abstract

A síndrome de Peutz-Jeghers (SPJ) é uma doença autossômica dominante, rara, em que há mutação no gene supressor tumoral, havendo maior predisposição para neoplasias, principalmente do trato gastrointestinal. As primeiras manifestações iniciam-se na infância com a presença de melanose mucocutânea e, posteriormente, surgem os pólipos hamartomatosos gastrointestinais. Apresentaremos o caso de uma paciente feminina, jovem, cujas manifestações iniciais da SPJ iniciaram-se na infância sob a forma de melanose cutânea. O tratamento dessas lesões foi realizado com três sessões com os lasers Nd:YAG Q-Switched 1064nm e KTP Q-Switched 532nm, evoluindo com excelente resposta terapêutica e sem recidiva.


Keywords: Lasers; Lentigo; Síndrome de Peutz-Jeghers


INTRODUÇÃO

A síndrome de Peutz-Jeghers (SPJ) é uma doença autossômica dominante expressa clinicamente por melanose mucocutânea e polipose intestinal. É doença rara, com dados estimados de 1:8.000 a 1:200.000 nascimentos. As lesões cutâneas são compostas por múltiplas máculas pigmentadas com distribuição perioral, vermelhão do lábio, mucosas bucal, palatina, língua, palmas, plantas e região perianal. Estas lesões podem se atenuar após a adolescência ou idade adulta. Diversas modalidades terapêuticas foram propostas para o tratamento das lesões cutâneas, porém sem efetividade, com exceção dos lasers Q-Switched que têm se mostrado efetivos, sem formação de cicatrizes ou recorrência das mesmas.

 

RELATO DO CASO

Paciente feminina, 27 anos de idade e queixa de manchas nos lábios. Referia que as manchas surgiram antes do primeiro ano de vida, sendo diagnosticada com a síndrome de Peutz-Jeghers aos dois anos de idade. Não apresentava outras doenças associadas e em uso apenas de anticoncepcional oral. Sem história em outros membros da família. Realizadas colonoscopia e endoscopia digestiva alta de controle, com necessidade de polipectomia durante estes procedimentos, e enterectomia em 2016.

Para o tratamento das melanoses foi proposto tratamento com os lasers Nd:YAG Q-Switched 1064nm e KTP Q-Switched 532nm (New Vektra, Plataforma Solon, LMG, Guaxupé, MG, Brasil), sendo a primeira sessão em junho de 2019 (Figura 1) e as demais com intervalos a cada 30 dias (Figuras 2 e 3). Os parâmetros estão expostos na tabela 1.

A paciente evoluiu bem, sem intercorrências, e não apresentou recidiva no seguimento após dois anos da última sessão.

 

DISCUSSÃO

A síndrome de Peutz-Jeghers (SPJ) é uma doença autossômica dominante associada à mutação no gene STK11, localizado no cromossomo 19p13.3, responsável pela supressão tumoral.1,2,3 Essa mutação tem sido documentada em 70-80% dos pacientes, e, em até 15%, há deleção parcial ou completa.1 Pacientes portadores dessa síndrome apresentam maior predisposição para neoplasias gastrointestinais e, mais raramente, em mama, testículos, útero e ovários.3,4,5

Clinicamente, é caracterizada pela formação de pólipos hamartomatosos do trato gastrointestinal, principalmente no jejuno, e melanose mucocutânea,1,5 com surgimento na infância ou início da adolescência, enquanto as alterações gastrointestinais aparecem na adolescência ou idade adulta.1 A presença de múltiplas máculas pigmentadas na região labial e perioral sugere a SPJ, mas não é patognomônico, sendo também observada na síndrome de Laugier-Hunziker (SLH).1,3

Histologicamente, a análise dos lentigos mucocutâneos sugere aumento dos grânulos de melanina na epiderme, sem proliferação de melanócitos,2,3 sendo um excelente alvo para lasers pulsados que têm como cromóforo a melanina.2,3

Enquanto o protocolo para manejo dos pólipos intestinais, assim como o rastreio para neoplasias na SPJ, já está bem estabelecido, o mesmo não ocorre para os lentigos faciais, em que não existe um tratamento padrão.2,6 Diversas modalidades terapêuticas são utilizadas como dermoabrasão, criocirurgia, excisão cirúrgica, eletrodissecção ou ablação com laser de dióxido de carbono ou argônio, porém com remoção incompleta da lesão, formação de cicatrizes ou alteração na pigmentação da pele.2,4,5

Os lasers mais comumente utilizados para o tratamento de lesões pigmentadas são os com pulsos ultracurtos ou Q-switched (QS Alexandrita; QS rubi laser; QS Dye laser e QS Nd: YAG) provocando lesão nos cromóforos endógenos sem danificar o colágeno adjacente.4,7,8 Tendo em vista a histologia das lesões cutâneas associadas à SPJ, esses tipos de laser têm sido preferíveis como opção terapêutica, apresentando resolução das lesões, ausência de cicatrizes residuais e evitando a recorrência das lesões pigmentadas.1 Para indivíduos com fototipos III e IV, preferem-se os QS Alexandrita e QS Nd:YAG, em detrimento do QS rubi, pois este pode causar hiperpigmentação residual.1

Poucos dados na literatura estão disponíveis em relação à utilização de QS Nd:YAG para o tratamento das lesões lentiginosas nesta síndrome. Yiping Ge e colaboradores demonstraram por meio de estudo retrospectivo a efetividade deste laser no tratamento das lesões cutâneas associadas à SPJ, apresentando excelente resultado com remissão total das lesões com uma média de 2,9 sessões e sem recorrência das lesões após seguimento de 12 a 97 meses.1 Todos os pacientes foram tratados com o laser Q-switched Nd:YAG 532nm, fluências de 1,8-2,2J/cm2, spot de 3mm e pulso com amplitude de 5-20ns.1

Encontramos resultados semelhantes utilizando dois comprimentos de onda em uma mesma sessão para potencializar o resultado: 1064nm para lesões castanho-escuras e 532nm para as lesões castanho-claras.

Apresentamos este relato de caso para demonstrar que o laser Nd-YAG é eficaz e seguro no tratamento das lesões mucocutâneas na SPJ, podendo ser uma boa opção terapêutica.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Abdo Salomão Junior 0000-0002-5591-0293
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Constança Pithon Pereira 0000-0002-3751-8984
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Rodrigo Cesar Davanco 0000-0002-2254-8400
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Daniella Grande Curi 0000-0002-3179-0485
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Domingos Jordão Neto 0000-0001-7752-6789
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS:

1. Ge Y, Jia G, Lin T. Q-switched Nd:YAG laser treatment for labial lentigines associated with Peutz-Jeghers syndrome. J Dtsch Dermatol Ges. 2015;13(6):551-5.

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3. Xi Z, Hui Q, Zhong L. Q-switched alexandrite laser treatment of oral labial lentigines in Chinese subjects with Peutz-Jeghers syndrome. Dermatol Surg. 2009;35(7):1084-8.

4. Mansur C, Mansur J, Mansur L, Gamonal A C, Valverde R, Gonçalves R C; Sindrome de Peuts-Jeghers: tratamento da lentiginose oral com laser Alexandrita; An Bras Dermatol. 2003;78(4):501-5.

5. Remington BK, Remington TK. Treatment of facial lentigines in Peutz-Jeghers syndrome with an intense pulsed light source. Dermatol Surg. 2002;28(11):1079-81.

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