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Como eu faço ?

Padronização da aplicação corporal de hidroxiapatita de cálcio com a técnica de figuras vetorizadas

Gladstone Eustaquio de Lima Faria; Daniel Boro dos Santos; Adriane Tartare; Adriano Mesquita Bento; Ricardo Frota Boggio

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20201243771

Data de recebimento: 27/12/2020
Data de aprovação: 14/03/2021
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum
Trabalho realizado no Instituto Boggio, São Paulo (SP), Brasil


Abstract

INTRODUÇÃO: a hidroxiapatita de cálcio em gel carreador de carboximetilcelulose apresenta resultados inequívocos para a melhora cutânea facial, estimulando a produção de colágeno e elastina. Seu uso para tratamento corporal tornou-se on- label apenas recentemente, após comprovações científicas de seu benefício em maior diluição. O objetivo deste trabalho foi demonstrar uma padronização técnica para racionalização da aplicação corporal. Neste estudo foram idealizadas figuras vetorizadas para aplicação da hidroxiapatita de cálcio com diluição intermediária. Com a técnica proposta, é possível calcular, com exatidão, o volume de produto necessário para cada paciente em função do tamanho da unidade anatômica a ser tratada e das características topográficas da região. A racionalidade desta técnica permite ainda distribuição homogênea, minimização das complicações por acúmulo de produto, boa tolerabilidade pela paciente e otimização dos resultados.
CONCLUSÕES: a simplicidade técnica das figuras vetorizadas facilita a aplicação da hidroxiapatita de cálcio, e as customizações devem ser feitas com a maior experiência do injetor.


Keywords: Colágeno; Hidroxiapatitas; Técnicas Cosméticas


INTRODUÇÃO

O envelhecimento cutâneo é um processo complexo e multifatorial que cursa com afinamento progressivo da epiderme e da derme, além da atrofia do tecido celular subcutâneo. Histologicamente, há redução e desestruturação das fibras elásticas e de colágeno, o que invariavelmente leva à perda do tônus, da elasticidade e ao enrugamento da pele.1,2,3 Alguns fatores específicos aceleram estes fenômenos, como tabagismo e emagrecimento maciço.4 Os preenchedores de ácido hialurônico em muito contribuem para a restauração destas estruturas, porém eles têm uma diminuta propriedade bioestimuladora do colágeno e das fibras elásticas. Neste contexto de flacidez e de desorganização fibroelástica, há a necessidade de um produto que seja biocompatível, não alergênico, seguro e que, especificamente, atue estimulando estas estruturas.

O Radiesse® (Merz Pharmaceuticals, Alemanha) é um produto que preenche estes requisitos. Constituído por uma mistura de hidroxiapatita de cálcio a 30%, associada a 70% de gel de carboximetilcelulose, ele associa a capacidade bioestimuladora do primeiro componente com a capacidade preenchedora do segundo. Uma vez aplicado, este produto apresenta uma volumização inicial pela carboximetilcelulose que pode durar alguns poucos meses, sendo, então, substituído pela formação de colágeno e elastina. Apesar do seu amplo uso na face,6 é recente sua indicação como bioestimulador corporal, limitado principalmente pela falta de dados quanto a dose e diluição a serem utilizadas para se manterem os efeitos bioestimuladores.5,6

Em 2015, Cogorno documentou a melhora na flacidez e espessura da pele do abdômen, das coxas e dos braços com a aplicação do Radiesse distribuído com a técnica de vetorização.7 Inúmeros outros trabalhos científicos comprovaram esta eficácia mesmo com a diluição do produto. Histologicamente, foi confirmada a produção de colágeno e elastina e, por meio de ultrassonografia, comprovou-se também o aumento da espessura cutânea. Estes dados podem ser observados para braço8,9, abdômen9, mão10, pescoço e colo.11

Com base nestes estudos e na experiência de especialistas, em 2018 foi publicado o consenso global do uso do Radiesse hiperdiluído e, no ano seguinte, o consenso brasileiro.12,13 Por definição, Radiesse hiperdiluído é toda diluição maior que 1:1. A diluição corporal recomendada varia de 1:2 até 1:6, a depender da topografia anatômica, grau de flacidez, espessura da pele local e da experiência do injetor. De forma sucinta, quanto mais fina a pele do local a ser tratado, mais diluído deve ser o produto e, quanto mais diluído o produto, menor o seu efeito volumizador e menores as chances de formação de nódulos. O consenso também permite a utilização de cânulas ou agulhas. As regiões corporais a serem tratadas compreendem braços, coxas, abdômen, glúteos, pescoço, colo, joelhos e cotovelos.

Apesar de os estudos e os consensos facilitarem o uso do Radiesse corporal, muitas são as variáveis a serem analisadas, como topografia, dose final do produto e padrão de distribuição do produto, limitando seu uso principalmente para os menos experientes.

 

OBJETIVO

Padronizar uma forma de diluição intermediária do Radiesse para uso corporal e empregar figuras com vetores para facilitar o cálculo da quantidade final de produto diluído necessário para cada área.

 

METODOLOGIA

Diluição

Uma seringa de Radiesse® contendo 1,5ml de produto será inserida em 6ml de diluente perfazendo um volume final de 7,5ml. A solução de diluente será composta de 4,5ml de solução fisiológica e 1,5ml de lidocaína (com ou sem vasoconstritor) (Figura 1).

Em uma seringa de 10ml com luerlock serão colocados a lidocaína (1,5ml), o soro fisiológico (4,5ml) e, com uso do three-way, esta solução receberá o Radiesse® (1,5ml). Para homogeneização utiliza-se outra seringa de 10ml (reservar a seringa original do Radiesse® para o momento da aplicação). O número de passadas entre as duas seringas de 10ml é variável, o suficiente para observar todo o material homogêneo, o que, em média, leva de 10 a 20 movimentos de vai e vem.

No momento da aplicação, será utilizada a seringa original do produto. Com esta diluição, teremos cinco seringas do produto diluído para uso.

Figuras vetorizadas

Esta técnica consiste em empregar figuras pré-padronizadas em formato de vetores (asterisco e sete pontas) (Figura 2). Preconiza-se a aplicação com microcânula de 5cm de comprimento e calibre de 22 Gauge. Cada vetor deverá ser desenhado com comprimento de 5cm, que nada mais é do que o comprimento da microcânula a ser utilizada. A técnica de aplicação é retroinjeção linear, no plano justadérmico, sendo que, em cada retroinjeção, haverá a deposição de 0,2ml do produto diluído. O círculo vermelho é o orifício de entrada da microcânula e não está em vermelho por acaso, pois deve ser dada atenção ao final de cada retroinjeção para se evitar sobredeposição do produto nesta área.

Portanto, em média, cada uma destas figuras acima utilizaria 1,5ml do Radiesse® hiperdiluído, ou seja, com esta diluição padronizada podemos trabalhar com cinco figuras vetorizadas na região corporal a ser tratada. A escolha entre um e outro desenho deve ser baseada no conforto da mão para aplicação, de forma a evitar anteparos ósseos ou contatos indesejáveis com a maca, por exemplo. No submento e pescoço, por exemplo, desenhos de sete pontas costumam ser mais confortáveis, enquanto abdômen e glúteo são confortáveis com ambos, como veremos a seguir.

Tendo-se em mente o tamanho dos desenhos e a dose empregada em cada um deles, realiza-se a marcação com a caneta na região a ser tratada, estimando-se com total segurança a quantidade final de produto para o tratamento proposto. É muito importante a distribuição homogênea do produto em toda a região a ser tratada, não deixando áreas descobertas de aplicação. Seguindo-se este protocolo, as chances de erro do cálculo do número de seringas necessárias ao tratamento reduzem-se drasticamente.

Neste trabalho, nossa modelo é do sexo feminino e tem porte físico médio para os padrões brasileiros, com 1,68 m de altura e 65kg de peso corporal (IMC=23 kg/m2).

Recomendações pós-procedimento

Ao final da aplicação, realiza-se a massagem e recomenda-se mantê-la em casa por sete dias, duas vezes ao dia. A massagem auxilia no espalhamento do produto e previne complicações como nódulos. Os nódulos são raros nesta diluição, a menos que haja sobredeposição de produto em algum ponto por erro técnico, sendo mais comum no orifício de entrada.

Em média, recomendam-se três sessões com intervalos de 30 a 60 dias.

 

RESULTADOS

Ao realizar a aplicação nesta modelo, foram observados:

1 – Abdômen

O tratamento global do abdômen exige em torno de nove a dez figuras vetorizadas, ou seja, duas seringas de Radiesse nesta diluição (Figura 3). Vale ressaltar, como observado na figura, que, em determinadas situações clínicas, pode ser tratado apenas o abdômen superior ou inferior, requerendo, nesta situação, apenas uma seringa de produto (cinco figuras vetorizadas).

2- Glúteos

Para a bioestimulação global da região glútea são necessárias cinco figuras vetorizadas em cada glúteo, requerendo duas seringas para o tratamento bilateral (Figura 4).

3- Coxas

A flacidez cutânea crural é bastante variável entre as pacientes, mas geralmente ela compromete primariamente a raiz da coxa e, em seguida, a região central interna, conforme podemos observar na figura 5. Com esta marcação, utilizamos cinco figuras vetorizadas (uma seringa de produto) por face da coxa. Estas figuras podem ser transpostas para todas as faces da coxa da paciente conforme a necessidade clínica.

4- Braços

A flacidez braquial, tal qual a crural, é muito variável. Grande parcela das pacientes queixa-se predominantemente de sua face interna. Quando esta realidade se apresenta são necessárias duas a três figuras vetorizadas por lado, ou seja, nesta situação, uma seringa poderia tratar ambas as faces internas dos braços (Figura 6). Devido à heterogeneidade da apresentação clínica de flacidez e à dimensão desta região, muitas vezes, há demanda de uma seringa (cinco figuras) por lado.

5- Cervical

A região cervical costuma ser muito confortavelmente tratada com figuras de sete pontas, sendo em média demarcadas cinco figuras vetorizadas, conforme podemos observar na figura 7. Cada sessão cervical exige, portanto, nesta técnica, uma seringa de Radiesse.

6- Colo

A área do colo habitualmente tratada não costuma ser grande, correspondendo à área mais fotoexposta em decotes, por exemplo. Diante disso, não mais que uma seringa é necessária nesta técnica. Na figura 8, três figuras vetorizadas foram suficientes para cobrir a área.

 

DISCUSSÃO

O Radiesse® hoje deve ser categorizado como um bioestimulador. Seu consagrado e seguro uso na face foi fator estimulador para seu emprego no tratamento corporal. A grande preocupação seria a dose necessária para se atingirem os resultados de bioestímulo sem lançar mão de muitas seringas de produto, inviabilizando financeiramente a indicação. Uma vez que os estudos demonstraram que mesmo hiperdiluído ele mantinha a capacidade de espessamento da pele e consequente melhora da flacidez, seu uso com esta finalidade passou a ser encorajado.8,9,10,11

As inúmeras diluições possíveis e as variadas técnicas de aplicação tornam confuso o uso para iniciantes, principalmente no cálculo do número de seringas para determinada área bem como a forma de distribuição dos pontos de aplicação. Não é raro ouvir histórias de injetores referindo aplicação de forma assimétrica ou que o produto não tenha sido suficiente para toda a área almejada, demonstrando que planejamento adequado é fundamental para o sucesso de qualquer aplicação.

Diante desta necessidade médica de padronização ainda não atendida na literatura, foi realizado um protocolo de diluição corporal que atendesse às mais variadas topografias anatômicas e às mais variadas qualidades de pele local. Nesta diluição mediana (1:4), os estudos demonstram a capacidade bioestimuladora e mínimas ou ausentes complicações relacionadas à formação de nódulos.

Apesar de os estudos indicarem que uma seringa de produto é capaz de tratar uma área cutânea entre 100 a 300cm2, esta informação se torna confusa na prática. Em contrapartida, esta nova técnica de padronização com figuras vetorizadas facilita a marcação prévia ao procedimento e o cálculo final da quantidade exata de produto necessária especificamente para aquela paciente.

De forma interessante, estes dados corroboram as informações do consenso brasileiro e mundial quanto à dose total por sessão para cada unidade anatômica. Segundo os consensos, seria necessária, em média, uma seringa de produto por hemiabdome. Uma seringa também seria suficiente para tratar cada face da coxa, cada glúteo e a região cervical, o que foi condizente com nossos resultados. Apesar de os consensos observarem a necessidade de uma seringa para o colo e para cada braço, nesta técnica, nossos resultados observaram uma relativa economia de produto.

A grande colaboração nesta forma de aplicação é a capacidade de se presumir com relativa segurança a dose final de produto necessária para aquela paciente em específico, com base na marcação pré-procedimento das figuras vetorizadas, lembrando que cada seringa de 1,5ml de Radiesse®, nesta técnica, nos permitirá fazer até cinco figuras.

Além destes benefícios de racionalização da quantidade de produto, a técnica de figuras vetorizadas permite uma distribuição homogênea do produto, evitando que as áreas tratadas recebam doses diferentes de hidroxiapatita e, consequentemente, evitando que sejam bioestimuladas de forma desigual.

Apesar de o consenso internacional e brasileiro permitirem o uso de agulhas ou microcânulas para o tratamento corporal12,13, nesta técnica é preconizada a indicação do segundo dispositivo. Além de maior segurança14, a retroinjeção justadérmica com microcânula é bastante confortável ao paciente e acredita-se que, devido à racionalidade da técnica de figuras vetorizadas, o número de punturas seja menor, não requerendo bloqueio anestésico dos acessos; consequentemente, a tolerância álgica ao tratamento se torna ainda maior.

Toda padronização procura trazer simplicidade e segurança técnica, não necessariamente sendo uma regra. Com a maior experiência profissional, podem ser eleitas diferentes formas de diluição e aplicação, baseadas na topografia anatômica e espessura cutânea local.

 

CONCLUSÃO

A técnica de aplicação de Radiesse® corporal com figuras vetorizadas se adequa às diversas regiões corporais, oferecendo facilidade na execução, segurança e simplicidade no cálculo da dose final utilizada do produto.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Gladstone Eustaquio de Lima Faria | 0000-0002-0754-2019
Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual no manejo propedêutico e/ou terapêutico dos casos estudados; revisão crítica do manuscrito; preparação e redação do manuscrito; concepção do estudo e planejamento.

Daniel Boro dos Santos | 0000-0002-2837-2354
Revisão crítica do manuscrito.

Adriane Tartare | 0000-0003-0650-9345
Revisão crítica do manuscrito.

Adriano Mesquita Bento | 0000-0002-3615-6897
Revisão crítica do manuscrito.

Ricardo Frota Boggio | 0000-0002-5139-0243
Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual no manejo propedêutico e/ou terapêutico dos casos estudados; revisão crítica do manuscrito; preparação e redação do manuscrito; concepção do estudo e planejamento.

 

REFERÊNCIAS

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