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Relato de caso

Tumor triquilemal proliferante exuberante em jovem

Mabel Duarte Alves Gomides1; Alceu Luiz Camargo Villela Berbert2

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20201241454

Data de recebimento: 07/09/2019
Data de aprovação: 02/11/2020

Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia (MG), Brasil.
Suporte Financeiro: Nenhum.
Conflito de Interesses: Nenhum.
Agradecimentos: Às residentes Nayara Fayad Souza Dib e Núbia Carvalho Pena de Oliveira Praeiro Alves, que participaram do relato de caso com orientação do médico- assistente Dr. José Joaquim Rodrigues.


Abstract

Tumor triquilemal proliferante (TTP) é uma neoplasia benigna incomum que acomete, habitualmente, mulheres adultas acima de 60 anos, preferencialmente como nódulo solitário no couro cabeludo. Relata-se um caso de TTP em mulher jovem, apresentando exuberantes tumorações assintomáticas no couro cabeludo, há sete anos, que recorreram após exéreses cirúrgicas. O histopatológico confirmou o diagnóstico, tendo sido realizadas retiradas cirúrgicas e acompanhamento clínico. O TTP parece originar-se da parede dos cistos triquilemais, provenientes do istmo da bainha radicular externa do folículo piloso. Geralmente, apresenta potencial biológico benigno, com baixo risco de malignização e elevada recorrência. A terapia de escolha é a cirurgia.


Keywords: Cistos; Couro Cabeludo; Neoplasias


INTRODUÇÃO

Tumor triquilemal proliferante (TTP) é uma neoplasia anexial epidérmica, formada por vários cistos, contendo epitélio escamoso com queratinização triquilemal, ou seja, transição abrupta de células epiteliais nucleadas para anucleadas na ausência de camada granular.1-3 Em geral, surge como nódulo dérmico ou subcutâneo solitário no couro cabeludo de mulheres idosas.1,3-13 Foi descrito primeiramente por Wilson-Jones em 1966, que o nomearam como cisto epidermoide proliferante devido à sua semelhança clínica e histológica com o carcinoma de células escamosas.1,3,5,9-13 Desde então, recebeu várias outras denominações, tais como: tumor pilar do couro cabeludo, cisto triquilemal proliferante, tumor pilar triquilêmico, pilomatrixoma invasivo, cisto queratinoso hidatiforme, tricoclamidocarcinoma, tumor gigante da matriz capilar, tumor da matriz pilosa do couro cabeludo, entre outros.1,3,6 Exibe como característica a capacidade de crescer rapidamente em um determinado período de sua evolução e/ou, incomumente, sofrer transformação para o TTP maligno.5,7,11,12 Por isso, apresenta comportamentos histológicos heterogêneos: - benigno, - crescimento localmente agressivo com chance de causar invasões nas camadas teciduais subjacentes, e - potencial metastático com recidiva local e metástases em linfonodos regionais.3,10,11,12 Trata-se de um tumor raro, correspondendo a 0,1% dos tumores cutâneos benignos, podendo formar-se a partir de um cisto triquilemal preexistente ou concomitante a esse como lesão isolada.5,11,12

 

RELATO DO CASO

Relata-se a história de uma paciente do sexo feminino, de 24 anos de idade, natural e procedente de Uberlândia (MG), atendida no Serviço de Dermatologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, queixando-se de nódulos indolores, no couro cabeludo, há sete anos. Referia crescimento progressivo nos últimos meses seguido de ulceração com saída de secreção sanguinolenta. Relata recorrência de lesões previamente excisadas do couro cabeludo. Nega ter sofrido qualquer tipo de trauma.

Ao exame dermatológico, apresentava tumor exofítico, indolor, ulcerado, com exsudação sanguinolenta, medindo 10x5cm de tamanho, na região parietal esquerda (Figura 1), e vários outros tumores de superfície lisa, consistência macia, medindo de 1 a 3cm de diâmetro, distribuídos no couro cabeludo, sendo alguns circundados por alopecia (Figura 2). Não havia adenomegalia palpável na região cervical e no couro cabeludo. Foi realizada a exérese de duas lesões (Figura 3), cujo exame anatomopatológico evidenciou proliferação de células escamosas na derme com formação de tumores multilobulares irregulares, de tamanhos variados, diferenciando-se em grandes queratinócitos com discretas atipias, queratinização abrupta com focos de calcificação e ausência de invasão dos tecidos adjacentes (Figura 4).

A suspeita clínica foi de tumor triquilemal, pilomatrixoma ou dermatofibrossarcoma protuberante, mas a correlação entre os achados clínicos e histopatológicos confirmou o diagnóstico de TTP.

Foram feitas exéreses de algumas lesões com margens amplas e sutura simples interrompida com bons resultados. Devido à natureza recidivante das lesões mantêm-se o acompanhamento clínico ambulatorial e a programação de exéreses de outras lesões.

 

DISCUSSÃO

Os cistos triquilemais correspondem a 20% dos cistos cutâneos e são originários do triquilema ou bainha radicular externa do folículo piloso.1,11 O TTP parece ocorrer supostamente após inflamações ou traumas, devido ao fato de apresentarem áreas com características benignas e outras com características malignas.1,5-12 Difere do cisto triquilemal por ser incomum, maior e histologicamente mais atípico, e do tumor triquilemal proliferativo maligno por ser menos agressivo.9 Ocorre mais frequentemente em mulheres (79,5-87% dos casos) com faixa etária variando de 21 a 88 anos, média de 62,4 anos, apesar de haver relatos em menores de 18 anos.1,3,5,10-12 As lesões geralmente são nódulos solitários, menores do que 1 até 12cm (média de 3,3cm), embora haja citações de múltiplos nódulos, ulcerados e/ou maiores que 25cm.3,10-13 Apresenta, frequentemente, história de crescimento lento e progressivo de meses a anos, seguido por fase de crescimento rápido e aparência exofítica.2,10,12 A localização preferencial é a do couro cabeludo (85,4-90% dos casos) e, às vezes, apresenta alopecia.1,3,5,10-13 Os restantes estão, em sua maioria, no dorso e mais raramente em outros sítios, como: região frontal, nariz, pálpebras, lábios, cavidade oral, pescoço, tronco, área genital, glúteos, membros superiores e inferiores e base do crânio.1,3,5,10-12 O caso relatado manifestou características incomuns, como o início do TTP aos 17 anos, presença de múltiplos nódulos e algumas lesões ulceradas. Em sua maioria, o TTP apresenta comportamento biológico benigno, mas com chance de recorrência, num período de seis meses a mais de dez anos após a cirurgia, principalmente nos casos de excisões conservadoras, e, em raríssimos casos, pode ter potencial biológico maligno.3,5,10-12 As taxas de recidiva local (3,7%) e metástase linfonodal (1,2%) são baixas, mas quando ocorrem podem causar invasões em planos teciduais profundos por continuidade, contiguidade ou disseminação, resultando em elevados índices de morbidade e até mortalidade.3,5,10-12 Alguns estudos têm demonstrado a importância da pesquisa da imunoexpressão de Ki-67, proteína responsável pela proliferação celular, pelo fato de o índice de expressão correlacionar-se ao grau de malignidade do tumor.7,8 O diagnóstico diferencial do TTP inclui o carcinoma de células escamosas, carcinoma basocelular, queratoacantoma, pilomatrixoma, tumor de glândulas sudoríparas, dermatofibrossarcoma protuberante, cilindroma, cisto epidermoide, TTP maligno e angiossarcoma.1,4,11 O exame histopatológico confirma o diagnóstico do TTP demonstrando lóbulos de epitélio escamoso, células com citoplasma eosinofílico abundante com queratinização abrupta, atipias citológicas variáveis e ausência de infiltração no estroma adjacente.1,4,12,13 Os TTPs são recorrentes e potencialmente invasivos, portanto a terapêutica de escolha são as cirurgias com margens de 0,5 a 1cm.5,7,9-12 Entre as técnicas cirúrgicas, a cirurgia micrográfica de Mohs tem boa indicação, porque suas margens podem ultrapassar os limites clínicos visíveis e com isso reduzir o risco de recidivas e metástases.5,9,11 Outros tratamentos, como esvaziamento dos linfonodos, radioterapia e quimioterapia, podem ser requeridos em casos de disseminação metastática ou transformação para o TTP maligno.5,11 Portanto, o acompanhamento por tempo prolongado torna-se imprescindível.7,10-12

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Mabel Duarte Alves Gomides | 0000-0003-1253-9428
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Alceu Luiz Camargo Villela Berbert | 0000-0001-8441-7388
Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

 

REFERÊNCIAS

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