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Relato de caso

Fasciite nodular na fronte: uma rara apresentação

Patrícia Pinheiro Montalvão1; Amanda Soares Teixeira1; Isadora Barreto Michels1; Ingrid Stresser Gioppo1; Anna Carolina Miola1,2

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20201241291

Suporte Financeiro: Nenhum.
Conflito de Interesses: Nenhum.
Trabalho realizado no Instituto Lauro de Souza Lima, Bauru (SP), Brasil.
Agradecimentos: Gostaríamos de agradecer ao Dr. Cleverson Teixeira Soares, médico patologista do Instituto Lauro de Souza Lima, por fornecer a documentação fotográfica da PAAF e do exame anatomopatológico.


Abstract

A fasciite nodular é um tumor benigno, decorrente da proliferação reativa de células fibroblásticas ou miofibroblásticas de rápido crescimento e rica celularidade. Em adultos, o acometimento das extremidades é mais frequente; entretanto, outras regiões podem ser acometidas. Neste relato, é apresentada paciente feminina de 40 anos, com lesão nodular na fronte, com diagnóstico de fasciite nodular confirmado à histopatologia. O caso relatado procura destacar sua rara localização e alertar o dermatologista clínico para a sua inclusão entre os diagnósticos diferenciais das lesões tumorais na face.


Keywords: Fasciite; Face; Testa


INTRODUÇÃO

Fasciite nodular (FN) é um tumor benigno derivado da proliferação de fibroblastos e miofibroblastos, que pode acometer hipoderme, músculo e fáscia. Foi descrita em 1955 por Konwaler, como fasciite pseudossarcomatosa ou fasciite infiltrativa, devido à sua grande semelhança com sarcoma.1 Sua etiologia é ainda incerta, porém existem relatos de trauma prévio em cerca de 10 a 15% dos casos.2 Clinicamente, a lesão apresenta-se como um nódulo solitário, de crescimento rápido, medindo até 5cm e acometendo mais frequentemente as extremidades dos membros superiores, porém de evolução indolente após o crescimento inicial. Algumas apresentações podem ser confundidas com sarcoma devido ao seu rápido crescimento, celularidade rica e alta atividade mitótica, sendo de fundamental importância a distinção entre esta afecção e as doenças neoplásicas malignas.

 

RELATO DO CASO

Paciente feminina, 40 anos, hipertensa, com história de surgimento de tumoração na fronte há quatro anos, com aumento lentamente progressivo e leve dor local. Ao exame físico, apresentava nódulo de 2cm de diâmetro, móvel, de consistência fibroelástica, bem delimitado e não aderido a planos profundos na fronte à esquerda (Figura 1). Com as hipóteses diagnósticas de schwannoma, lipoma e cisto epidermoide e na indisponibilidade de ultrassonografia (USG), foi realizada punção aspirativa por agulha fina (PAAF), que evidenciou lesão proliferativa mesenquimal fusocelular, sugestiva de FN (Figura 2). Optou-se pela realização de exérese cirúrgica, com a retirada de tumoração de 2cm de diâmetro, de cor amarelo-clara, bem delimitada e de consistência parenquimatosa (Figura 3). No exame histopatológico, notou-se a presença de proliferação mesenquimal fusocelular com atipias discretas (Figura 4). Não foram realizadas colorações para actina, vimentina e imuno-histoquímica. Entretanto, o exame anatomopatológico, associado a PAAF e apresentação clínica indolente, tornou compatível o diagnóstico de FN. Após um ano da exérese, paciente mantém-se em acompanhamento sem recidiva da lesão.

 

DISCUSSÃO

A FN é uma doença fibroproliferativa benigna, de etiologia desconhecida, que acomete homens e mulheres entre 20 e 40 anos. Relatos de remissão espontânea e localização frequente sobre proeminências ósseas sugerem a hipótese etiológica de trauma prévio no local de surgimento da lesão.2 Em adultos, o acometimento é mais frequente nas extremidades superiores (43%), seguidas do tronco (25%) e extremidades inferiores (22%), enquanto apenas 10% da FN acometem face e pescoço3,4, sendo que a maioria dos casos de FN em face e pescoço ocorre em crianças.5

Clinicamente, manifesta-se como lesão tumoral, bem delimitada, de cerca de 2 a 5cm de tamanho, com crescimento nodular subcutâneo rápido, porém autolimitado, podendo apresentar sensibilidade dolorosa no local. Os principais diagnósticos diferenciais incluem granuloma piogênico, cistos, lipoma, dermatofibroma, neurofibroma e sarcoma.6,7 Por ser pouco frequente, costuma ser entidade negligenciada na avaliação de lesões tumorais benignas, com outras hipóteses diagnósticas levantadas previamente à FN. Muitos casos costumam ser confirmados por meio do exame histopatológico.8

A USG pode ser realizada e evidenciar lesões nodulares dérmicas bem delimitadas, hipoecoicas, com presença ou não de centro heterogêneo hiperecoico, podendo, portanto, fazer diagnóstico diferencial com lesões nodulares malignas. Consequentemente, o exame anatomopatológico faz-se necessário nesses casos.9

A histopatologia demonstra um nódulo subcutâneo bem circunscrito, fascial ou intramuscular, com aparência estrelada. É vista uma proliferação de fibroblastos estrelados e fusiformes arredondados e miofibroblastos de núcleo oval, com cromatina fina e nucleolo proeminente. Nas lesões de início recente, as células são arranjadas frouxamente em um estroma edematoso e mixomatoso, enquanto as lesões mais antigas demonstram feixes de colágeno hialinizados.10 Os fibroblastos e miofibroblastos reagem positivamente para vimentina e actina muscular específica, e algumas células são positivas para CD68 na imuno-histoquímica, podendo auxiliar no diagnóstico quando tais exames são disponíveis.11 O diagnóstico diferencial histológico inclui fibrossarcoma e histiocitoma fibroso maligno.

O tratamento consiste na exérese cirúrgica completa da lesão, com taxa de recorrência variável de acordo com a literatura, provavelmente devido à excisão incompleta da mesma. Outros tipos de tratamento podem ser considerados de acordo com a localização da lesão, como laser ablativo de CO2 e infiltração intralesional com triancinolona.12

O objetivo principal deste trabalho foi destacar a localização incomum do caso, alertando o dermatologista para o diagnóstico e a inclusão da FN como diagnóstico diferencial de outros tumores faciais, a fim de definir a melhor abordagem terapêutica da lesão, evitando-se erros diagnósticos e possíveis recorrências locais.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Patrícia Pinheiro Montalvão | 0000-0001-6067-0426
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Isadora Barreto Michels | 0000-0002-9393-9724
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.

Amanda Soares Teixeira | 0000-0002-9072-8913
Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Ingrid Stresser Gioppo | 0000-0001-9520-7888
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura.

Anna Carolina Miola | 0000-0001-8926-734X
Contribuição no artigo: Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS

1. Konwaler BE, Keasbey L, Kaplan L. Subcutaneous pseudosarcomatous ¿bromatosis (fasciitis). Am J Clin Pathol. 1955;25(3):241-52.

2. Botton A, Bière A, Galakhoff C. Rôle inducteur du piercing dans une fasciite nodulaire faciale. Presse Med. 2006;35(2 Pt 1):237-8.

3. Shibata Y, Yanaba K, Ito K, Nishimura R, Miyawaki T, Nakagawa H. Nodular fasciitis on the face. J Dermatol. 2016;43(10):1235-6.

4. Gelfand JM, Mirza N, Kantor J. Nodular fasciitis. Arch Dermatol. 2001;137:719-721.

5. Morales DV, Cabrales ES. Nodular fasciitis present in facial area in children. Rev Cuba Estomatol. 2009;46:78-87.

6. Chemmanam JJ. Nodular fasciitis in the tongue- a mimicker of malignancy: case report and review of literature. Indian J Surg Oncol. 2017;8:214-6.

7. Almeida F, Picón M, Pezzi M, Sánchez-Jaúregui E, Carrillo R, Martínez-Lage JL. Nodular fascitis of the maxillofacial region. Two case reports and a review of the literature. Rev Esp Cir Oral y Maxilofac. 2007;29:43-7.

8. Luna A, Molinari L, Bollea Garlatti LA, Ferrario D, Volonteri V, Roitman P, et al. Nodular fasciitis, a forgotten entity. Int J Dermatol. 2019;58(2):190-3.

9. Fujioka K, Fujioka A, Oishi M, Eto H, Tajima S, Nakayama T. Ultrasonography findings of intradermal nodular fasciitis: a rare case report and review of the literature. Clin Experiment Dermatol 2017;42(3):335-6.

10. Weinreb I, Shaw AJ, Perez-Ordoñez B, Goldblum JR, Rubin BP. Nodular fasciitis of the head and neck region: a clinicopathologic description in a series of 30 cases. J Cutan Pathol. 2009;36:1168-73.

11. Souza IS, Vieira BB, Rochael MC, Vieira JST, Farias RE, Schimidt NC. Nodular fasciitis on the zygomatic region: a rare presentation. An Bras Dermatol. 2013;88(6):89-92.

12. Oh BH, Kim J, Zheng Z, Roh MR, Chung KY. Treatment of nodular fasciitis occurring on the face. Ann Dermatol. 2015;27:694-701.


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