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Artigo Original

Tolerância à dor e resultado estético da remoção de acrocórdons com crioterapia de contato em comparação à eletrocoagulação

Flávia Trevisan1; Gabriela Ferreira Kalkmann2; Isabela do Prado Nascimento2; Emerson Luis Batista Filho2

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20201233677

Data de recebimento: 09/07/2020
Data de aprovação: 07/09/2020

Suporte Financeiro: Nenhum.
Conflito de Interesses: Nenhum.
Agradecimentos: Aos residentes do Serviço de Dermatologia do Complexo do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná.

Trabalho realizado na Universidade Federal do Paraná, Curitiba (PR), Brasil


Abstract

INTRODUÇÃO: Podendo atingir quase 60% da população maior de 70 anos, os acrocórdons são muito prevalentes em consultórios dermatológicos. Entre as abordagens terapêuticas possíveis estão a crioterapia de contato e a eletrocirurgia.
OBJETIVOS: Comparar a tolerância à dor, o resultado estético e a preferência dos participantes entre as técnicas de eletrocoagulação e crioterapia de contato no tratamento de acrocórdons.
MÉTODOS: Dez participantes, com no mínimo quatro acrocórdons cada um, tiveram suas lesões divididas em dois grupos. Um grupo foi submetido à eletrocoagulação e o outro à crioterapia de contato. A tolerância à dor foi medida pela escala analógica de dor (EAD). O resultado estético foi avaliado por comparação visual entre os grupos de tratamento, em cada participante. A preferência foi avaliada com perguntas objetivas ao participante.
RESULTADOS: Todos os pontos avaliados tiveram significância estatística. Os participantes deram notas mais baixas na EAD às lesões submetidas à crioterapia de contato. O resultado estético avaliado após 30 dias foi superior nas lesões do grupo da eletrocoagulação. Todos os participantes preferiram a técnica de crioterapia de contato.
CONCLUSÕES: A crioterapia de contato é o método preferido e com melhor tolerância à dor no tratamento de acrocórdons, porém o resultado estético foi melhor com a eletrocoagulação.


Keywords: Criocirurgia; Crioterapia; Eletrocirurgia; Eletrocoagulação; Fibroma


INTRODUÇÃO

Acrocórdons (ou pólipos fibroepiteliais ou apêndices cutâneos) são neoplasias cutâneas benignas de fácil diagnóstico clínico (Figura 1), presentes em cerca de 0,9% a 1,2% das consultas dermatológicas na população adulta brasileira.1 Ocorrem em 46% das pessoas maiores de 40 anos, chegando a 59% naqueles com idade superior a 70 anos.2,3

Embora totalmente benignos, podem causar grande desconforto aos pacientes. As técnicas de tratamento incluem exérese tangencial, quimiocauterização, eletrocirurgia e crioterapia.3 Como a crioterapia em jato aberto pode causar hipocromia na pele ao redor devido à maior sensibilidade dos melanócitos ao congelamento, uma abordagem útil é a crioterapia de contato. Abordagem similar já foi descrita em duas publicações prévias.4,5

O objetivo desse estudo foi comparar a tolerância à dor, o resultado estético e a preferência do participante entre as técnicas de eletrocoagulação (ECG) e de crioterapia de contato (CC) no tratamento de acrocórdons.

 

MÉTODOS

Estudo intervencionista, prospectivo, com participantes adultos de ambos os sexos, selecionados no Ambulatório de Dermatologia do Complexo do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba (PR), Brasil, no período de agosto a dezembro de 2019, com diagnóstico clínico de, no mínimo, quatro acrocórdons de 2 a 5mm.

As lesões de cada participante foram distribuídas em randomização simples para dois grupos, sendo as do grupo 1 submetidas à eletrocoagulação e as do grupo 2, à crioterapia de contato.

Posterior à antissepsia com solução aquosa de digliconato de clorexidina a 1%, os acrocórdons do grupo 1 foram submetidos ao tratamento por eletrocoagulação com bisturi de alta frequência (Wavetronic 5000 Digital® Loktal, São Paulo, SP, Brasil, 60-100 Watts, modo coag, potência 7), pelo contato direto da ponta ativa na lesão seca, pelo período de quatro segundos.

Já as lesões distribuídas no grupo 2 foram submetidas à crioterapia de contato. Após imersão da pinça anatômica de 10cm durante 15 segundos no nitrogênio líquido, foi realizado pinçamento da lesão, minimizando ao máximo o contato com a pele circundante, durante 10 segundos, até branqueamento, com tempo de descongelamento igual ou superior ao de congelamento (Figura 2).

O grau da dor para cada método foi avaliado pela escala analógica da dor (0 a 10, sendo 0 ausência de dor e 10 a pior que o participante já sentiu). A comparação do resultado estético foi baseada em fotografias padronizadas, realizadas antes e 30 dias após o tratamento. As imagens foram apresentadas em tela de computador para análise de 14 dermatologistas experientes, sem conhecimento de qual grupo de tratamento cada lesão fazia parte, escolhendo-se qual teve resultado estético melhor.

O estudo teve liberação do comitê de ética sob o número CAAE 15233019.7.0000.0096. A análise estatística foi realizada por métodos paramétricos e comparação de médias na análise de tolerância à dor, e por métodos não paramétricos para o resultado estético e de preferência do participante (qui-quadrado).

 

RESULTADOS

Foram selecionados 30 participantes e, após aplicados os critérios de inclusão e exclusão, um n de 10 foi alcançado. Foram quatro homens e seis mulheres, com média de idade de 61,4 anos e número médio de lesões de 18,1. A região mais acometida foi a cervical.

A graduação da dor no grupo 1 variou de 2 a 8, com média de 4,6 (DP = ± 2,41, var 5,82, moda 3) e no grupo 2, variou entre 0 e 1, com média de 0,4 (DP = ± 0,52, var = 0,63, com moda 0) (Tabela 1). Todos os participantes avaliaram a dor com menor nota no grupo 2. A melhor tolerância à dor no grupo 2 teve significância estatística, com p < 0,0001 (diferença -4,20, IC -5,84 a -2,56) (Figura 3).

Seis participantes retornaram após 30 dias. Na avaliação do resultado estético (Tabela 2), a média de porcentagem de preferência pela eletrocoagulação foi de 80,95% e de 19,05% pela crioterapia de contato (p = 0,0013, IC 25,04% – 79,91%).

Todos os participantes preferiram a técnica de crioterapia de contato. Nenhum participante teve complicações pós-operatórias em nenhum dos grupos.

 

DISCUSSÃO

A sensibilidade dolorosa é muito variável entre os participantes. Sua graduação pode ser bastante subjetiva e a EAD tenta tornar essa análise objetiva. Além da diferença interpessoal de tolerância à dor, o mesmo indivíduo pode experimentar a sensação dolorosa de forma diferente em momentos distintos e entre cada lado do corpo. Por isso, a comparação entre as duas técnicas foi feita no mesmo participante, no mesmo dia e com seleção aleatória das lesões.

A crioterapia de jato aberto é amplamente utilizada nos consultórios dermatológicos. Tem uma boa aplicabilidade e baixo custo operacional. Porém, o diâmetro da abertura pode influenciar o nível de dor, o halo de ação e o resultado estético, além de a pressão de saída do nitrogênio líquido poder causar apreensão e susto no paciente.

Como o jato de saída do nitrogênio líquido forma um cone, com maior abertura quanto mais distante do alvo, mais pele sã pode ser atingida. Isso gera maior risco de sequelas, como discromias, formação de bolhas, aumento do diâmetro e aprofundamento do halo de ação.4 Com a crioterapia de contato, esse risco é diminuído pela melhor precisão ao atingir o alvo, principalmente nos casos de lesões pedunculadas como os acrocórdons.4,5

A maioria dos participantes (6 de 10) deu nota 0 na EAD para o método de CC, que demonstrou superioridade na tolerância à dor com boa significância estatística (p < 0,0001). Essa menor sensibilidade dolorosa é extremamente útil no tratamento de acrocórdons próximos aos olhos, pois diminui o reflexo de fuga instintiva ou de fechamento dos olhos, muito frequente nos casos de ECG sem anestesia ou na crioterapia de jato aberto.

A menor sensibilidade dolorosa da CC também permite grande conforto ao paciente, possibilitando tratar um grande número de acrocórdons na mesma ocasião sem necessidade de anestesia infiltrativa, diminuindo a exposição aos seus riscos, como equimoses, dor ou, excepcionalmente, intoxicação, além de beneficiar pacientes com fobia de agulhas.

Não se negam a boa eficácia e a facilidade de tratamento de acrocórdons por eletrocoagulação, mas se somam como vantagens da crioterapia de contato o seu fácil acesso nos consultórios dermatológicos, aprendizado rápido, baixa complexidade da técnica, não interferência com dispositivos eletrônicos dos participantes (como marca-passo e aparelhos auditivos) e ausência de necessidade de instrumentais estéreis como a ponta ativa do bisturi eletrônico.

Para avaliar o resultado estético das duas técnicas, imagens fotográficas com iluminação e equipamentos padronizados diminuíram o viés de interpretação. Para os dermatologistas avaliadores, não foi mencionada a técnica utilizada em cada local. As lesões tratadas por ECG tiveram um resultado estético considerado melhor em relação às tratadas por CC, com significância estatística na comparação das porcentagens das preferências pelo método de qui-quadrado (Figuras 4 e 5).

Não foi foco desse estudo, mas foi percebido pelos autores, que no grupo 2 (submetido à crioterapia de contato) houve seis casos de lesões residuais. Na opinião de uma das autoras, os acrocórdons maiores tratados por crioterapia de contato necessitam de um tempo maior do que 10 segundos ou repetição dos ciclos de congelamento por duas ou até três vezes, até ser percebido leve eritema ou edema da lesão.

Quando questionados sobre a preferência do método, todos os pacientes elegeram a crioterapia de contato como melhor. Possíveis motivações para essa escolha sejam a menor dor do método, possibilidade de aplicação rápida em vários acrocórdons e sua enorme praticidade.

 

CONCLUSÕES

A remoção de acrocórdons por crioterapia de contato mostrou-se o método preferido entre os participantes, sendo menos doloroso em comparação com a ECG. O resultado estético após 30 dias foi superior para a eletrocoagulação.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Flávia Trevisan | 0000-0001-5855-3685
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Gabriela Ferreira Kalkmann | 0000-0003-0040-7591
Obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

Isabela do Prado Nascimento | 0000-0002-3436-9311
Obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

Emerson Luis Batista Filho: 0000-0002-2124-5715
Obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

 

REFERÊNCIAS

1. Sociedade Brasileira de Dermatologia. Perfil nosológico das consultas dermatológicas no Brasil. An Bras Dermatol. 2006;81(6):549-58.

2. Banik R, Lubach D. Skintags: localization and frequencies according to sex and age. Dermatologica. 1987;174(4):180-3

3. Belgam Syed SY, Lipoff JB, Chatterjee K. Acrochordon. [atualização em 24 de março de 2020]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2020. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK448169/

4. Goodheart HP. Surgical Pearl: a rapid technique for destroying small skin tags and filiform warts. Dermatol Online J. 2003;9(5):34.

5. Taylor JE, Osmun WE. Just a pinch: technique for skin tag removal in sensitive areas. Can Fam Physician. 2016;62(12):998-9.


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