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Cartas

“Estamos esfolados...” – Frase de uma médica que atua na linha de frente no combate à pandemia do coronavírus

Marcia Mayko Kobayashi

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2020122205

Data de recebimento: 10/05/2020
Data de aprovação: 30/05/2020


Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Trabalho realizado em Clínica particular, Campinas (SP), Brasil


As equipes multidisciplinares que prestam atendimento na linha de frente das unidades de combate à Covid-19, e mesmo aqueles que atuam um pouco mais distantes na comunidade, como os trabalhadores da limpeza, da segurança pública e de assistência à saúde, entre outros, compõem um segmento em que os equipamentos de proteção individual (EPIs) são utilizados de maneira constante e por tempo prolongado. Esse uso, acrescido à higienização frequente das mãos, tem feito com que surjam quadros de dermatite irritativa devido à quebra da integridade cutânea.

Na face, por pressão da máscara, pode ocorrer a formação de sulcos que demoram dias para desaparecer, escoriações da pele por atrito constante, áreas eritematosas que evoluem com hiperpigmentação pós-inflamatória e edemas palpebrais adjacentes ou subjacentes às áreas de apoio dos EPIs.

Nas mãos, desde o aspecto macerado e unhas fragilizadas até o apagamento das digitais pelo eczema grave têm sido observados.

Diante das demandas tão graves desse novo panorama, muitos desses profissionais toleram esses incômodos e sofrem (só mais um pouco) calados em sua resiliência, sem saber como aliviar mais esse desconforto.

Algumas condutas dermatológicas, incluídas na rotina diária, podem contribuir para minimizar os sinais e sintomas.(Figura 1)

a) Cremes contendo ácido retinoico ou derivados, alfa-hidroxiácidos, vitamina C e esfoliantes devem ser temporariamente suspensos para evitar o afinamento e o ressecamento da pele da face. A substituição dos mesmos pode ser feita por produtos com ativos hidratantes e calmantes, disponíveis no mercado em forma de sérum, loção ou creme, de acordo com cada tipo de pele.

b) A limpeza da face, ao retornar do trabalho, deve obedecer ao critério da higienização com sabões, visto que esse processo é essencial para eliminação do vírus. Recomenda-se o uso dos sabonetes com pH próximo a 5,0 durante o banho (que não deve ser muito quente) e a aplicação de hidratantes na pele em seguida.

c) A lavagem dos cabelos deve ser feita com xampus com surfactantes do grupo sulfato na fórmula como, por exemplo, lauril éter sulfato de sódio e lauril sulfato de sódio, pois são mais potentes. Atenção: as técnicas no poo, em que se lava o cabelo sem utilização de xampu, só com água, e low poo, em que se usam xampus sem sulfato para limpar os fios, podem não ser suficientes para eliminar o vírus adequadamente.

d) Nessa rotina pós-banho, é importantíssima a utilização de hidratantes corporais para reposição do manto lipídico com a pele ainda úmida.

e) Quando já houver ressecamento ou rompimento da integridade da pele da face ou das mãos, usar hidratantes em creme. Os melhores serão os que tiverem o sensorial mais oleoso, pois na pele lesionada eles não causarão ardor.

f) Na face, aplicar camada generosa sobre a área mais atingida; aplicar o produto em movimentos leves e delicados de pressão com a ponta dos dedos até total absorção. Produtos direcionados à restauração cutânea contendo dexpantenol, cobre, nicotinamida, zinco e outros ativos calmantes e regeneradores podem ser usados imediatamente por cima do hidratante.

g) Massagens drenantes nas peles mais íntegras podem ser orientadas utilizando-se um dos cremes acima ou óleos simples, de fácil aquisição (amêndoas, rosa mosqueta, coco). Além de diminuírem o edema, terão o benefício de ofertar um tempo de cuidado a si mesmo, atenuando a sensação de abandono com a própria imagem e autoestima.

h) A higiene da face na manhã seguinte pode ser feita com o uso de dermolimpantes “soup free” ou syndets (isentos de sabões), tendo em vista que não houve risco de contaminação da pele pelo vírus em casa.

i) Alguns curativos podem ser colocados na área de apoio dos óculos e máscara, servindo de anteparo ou reforço, protegendo a pele durante a utilização dos mesmos. Estão disponíveis fitas de seda, de silicone, películas adesivas de poliuretano, hidrogéis. As fitas microporosas podem agredir mais na hora da sua remoção.

j) Nas mãos, hidratação enluvada por cerca de 10-15 minutos usando-se o mesmo hidratante facial em creme (oleoso), diariamente. Em casos de eczemas, associar corticoides tópicos durante esse procedimento ou logo após.

l) Durante o dia, sempre que possível, utilizar hidratantes mais leves com toque mais seco e absorção mais rápida. Esperamos, com estas breves orientações, ter contribuído para ajudar na prevenção e no tratamento destas lesões tão frequentes na prática diária daqueles que estão no enfrentamento à pandemia.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Marcia Mayko Kobayashi | 0000-002-7681-7354
Elaboração do texto baseado no manejo e observação clínica na prática diária de consultório dermatológico.

 

REFERÊNCIAS

1. Sociedade Brasileira de Dermatologia. Equipamentos de proteção individual (EPIs). Orientação da Sociedade Brasileira de Dermatologia aos profissionais de saúde. [Internet]. Rio de Janeiro; 2020. [cited 25 Maio 2020]. Available from: https://www.sbd.org.br/mm/cms/2020/05/17/cartilhaepiaprovacaov6.pdf

2. American Academy of Dermatology. Everyday health and preparedness steps in clinic. [Internet]. Illinois; 2020. [cited 2020 May 28]. Available from: https://assets.ctfassets.net/1ny4yoiyrqia/4LNCNjucOonbQx7aC970x/b56b540957ddad94dcc61949b8e3acc9/COVID-19_Preparedness_30Apr2020.pdf


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