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Artigo Original

Ensaio clínico cego randomizado comparando MMP®, MMP® com 5-FU e injeção intradérmica de 5-FU para o tratamento da hipomelanose gutata idiopática: um estudo- piloto

Gilmayara Alves Abreu Maciel Pereira; Diego Leonardo Bet; Maria Victoria Suarez Restrepo; Vanessa Barreto Rocha; Leticia Arsie Contin

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20201222558

Data de recebimento: 27/03/2020
Data de aprovação: 29/05/2020


Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia do Hospital do Servidor Municipal de São Paulo, São Paulo (SP), Brasil


Abstract

INTRODUÇÃO: A hipomelanose gutata idiopática (IGH) é uma manifestação comum de fotoenvelhecimento, ainda sem tratamento padrão, apresentando resultados variados às intervenções. Atualmente, no Brasil, o uso de microagulhamento associado ao 5-fluorouracil (5-FU) tem sido proposto para o tratamento da IGH.
OBJETIVO: Comparar três tratamentos, quais sejam: o uso do MMP® (microinfusão de medicamentos na pele) com 5-FU, MMP® apenas para microagulhamento, e com o 5-FU intralesional injetado com seringa de insulina no tratamento da IGH.
MÉTODOS: Em um ensaio clínico randomizado e cego, comparamos o MMP® ao 5-FU com: microagulhamento isolado e com 5-FU intralesional por punção para o tratamento de 180 lesões de IGH no antebraço de nove pacientes.
RESULTADOS: Após duas sessões de tratamento, o 5-FU intralesional foi o tratamento mais efetivo, com significância estatística quando comparado ao uso de microagulhamento. A eficácia da MMP + 5-FU foi inferior a 5-FU injetável e superior ao microagulhamento isoladamente, embora sem significância estatística.
CONCLUSÕES: A aplicação intralesional do 5-FU foi mais eficaz no tratamento da leucodermia solar. O uso de menor quantidade de medicamentos é a grande vantagem da técnica MMP + 5-FU. São necessários mais estudos para padronizar estas técnicas.


Keywords: Envelhecimento da pele; Fluoruracila; Hipopigmentação; Sistemas de liberação de medicamentos


INTRODUÇÃO

A hipomelanose gutata idiopática (IGH) é uma manifestação comum do fotoenvelhecimento, que ocorre principalmente na superfície extensora dos antebraços e áreas pré-tibiais, que ainda não possui tratamento padronizado e apresenta resultados variados às intervenções.1 O uso de microagulhamento associado ao 5-fluorouracil (5-FU) foi proposto para o tratamento da IGH.2

O 5-FU é um análogo da pirimidina usado no tratamento de muitas doenças de pele. A infiltração intralesional deste medicamento, bem como o seu uso na área microagulhada, tem sido utilizada no tratamento do vitiligo.3,4

Arbache et al descreveram a repigmentação do IGH com administração de 5-FU por meio de uma máquina de tatuagem, através da técnica denominada MMP® (microinfusão de medicamentos na pele), com uso exclusivo para dermatologistas.2

Na busca por uma terapia eficaz para o tratamento da IGH, o presente estudo tem como objetivo avaliar a eficácia da MMP com 5-FU em comparação com a MMP sem medicação e o 5-FU intralesional com uma única punção no tratamento de leucodermias do antebraço.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Em um ensaio clínico randomizado e cego, comparamos a MMP® com 5-FU ao microagulhamento (MMP® sem drogas) e ao 5-FU intralesional por punção única com agulha de insulina para o tratamento de 180 lesões de IGH no antebraço em nove pacientes. Foram tratadas 10 lesões em cada antebraço, totalizando 180 lesões tratadas (Figura 1). A técnica de tratamento utilizada em cada antebraço foi escolhida por randomização, cada uma em seis antebraços, com um total de 60 lesões. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo (CAAE: 51923415.1.0000.5442).

O microagulhamento5 foi realizado utilizando-se uma máquina de tatuagem (Cheyenne, Alemanha, TRADERM®, SP, Brasil) aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). As agulhas (cartucho) utilizadas para este protocolo, modelo 7-liner-mt, foram imersas em 5-FU ou usadas apenas para microagulhamento (Figura 2). O microagulhamento foi realizado a partir da periferia em direção ao centro da área despigmentada (2mm ou 20 clicks da máquina), até ocorrer um leve orvalho sangrento, sinal de que a derme foi atingida. A dose máxima foi de 50mg/1ml/antebraço por sessão.

A injeção intradérmica de 5-FU a 5% foi de 0,1ml em cada lesão de IGH com seringas BD® montadas com agulha de 0,3ml, máximo de 50mg/1ml/antebraço por sessão (Figura 3).

Todos os tratamentos foram realizados em duas sessões com intervalo de 30 dias. A avaliação final foi realizada com 120dias.

A melhora foi avaliada por meio das imagens de cada lesão (fotos clínicas padronizadas) que foram classificadas por um observador cego usando a escala de repigmentação (Figura 4). Os resultados foram comparados usando-se o teste qui-quadrado (proporções k) ou ANOVA, seguido pelo teste de comparação múltipla LSD. Foi considerado nível de significância de 5%.

 

RESULTADOS

A idade média foi de 61 anos (variação de 49 a 70 anos), oito pacientes eram do sexo feminino (89%), dois eram do fototipo II, quatro eram III e três, fototipo IV.

Das 180 lesões, seis apresentaram hiperpigmentação como efeito adverso e foram excluídas da análise. Das 174 lesões, todas apresentaram repigmentação, 162 (93,1%) com repigmentação total com normocromia e 12 (6,9%) com repigmentação parcial. A grande maioria das lesões teve repigmentação total com normocromia para todos os tratamentos, com 57/57=100% para 5-FU, 50/58=86,2% para MMP e 55/59=93,2% para MMP + 5-FU (Figura 5).

Oito antebraços não passaram por uma segunda sessão por diferentes razões, a saber: quatro atingiram a meta de tratamento (repigmentação total e normocromia), dois dos quais usando MMP e dois, MMP + 5-FU; três por eritema nos locais das lesões (um usou MMP e dois MMP + 5-FU); e uma devido à hiperpigmentação de todas as lesões após a primeira sessão de 5-FU apenas.

Foram encontradas diferenças significativas nas proporções das lesões com repigmentação total com normocromia entre os grupos tratados com 5-FU e tratados com MMP (teste de proporções k; p=0,014). A proporção foi menor nas lesões tratadas com MMP quando comparadas às lesões tratadas com 5-FU, sugerindo maior eficácia com o tratamento de 5-FU injetado.

Das lesões repigmentadas, 162 (93,1%) apresentaram repigmentação total com normocromia para todos os tratamentos, o que foi o melhor resultado entre os cinco possíveis na escala de repigmentação (Figura 4).

O tratamento com MMP + 5-FU foi o segundo tratamento mais eficaz, embora sem significância estatística. A menor eficácia foi com microagulhamento, o que pode ser devido à falta de uso de 5-FU; os tratamentos com MMP + 5-FU e 5-FU isoladamente apresentaram melhor resposta clínica e estatística.

A dor foi avaliada subjetivamente pelos pacientes e não foram encontradas diferenças significativas entre os três tratamentos. No entanto, a dor do tratamento com MMP + 5-FU foi considerada mais intensa do que a dos outros tratamentos.

Em relação aos efeitos adversos - sensação de queimação, prurido e dor, não houve diferenças estatísticas entre os tratamentos.

No dia 30, um paciente apresentou hiperpigmentação em 10 lesões, com o uso de 5-FU intralesional. Entretanto, no dia 120, todas estavam normocrômicas.

Ainda ao fim do estudo, seis lesões apresentaram hiperpigmentação, das quais, uma havia sido tratada com MMP+5-FU, duas com MMP e 3 tratadas com 5-FU

 

DISCUSSÃO

Abd El-Samad e Shaamad, em 2012, foram os primeiros a usar 5-FU intralesionalmente para tratar o vitiligo. Em 60 pacientes, houve uma repigmentação global maior no lado em que o 5-FU foi injetado quando comparado aos controles (p<0,001).3

Attwa, Khashaba e Ezzat, em 2019, compararam agulhamento e agulhamento seguido por 5-FU tópico para tratar vitiligo localizado estável em 27 pacientes. O microagulhamento seguido da aplicação tópica de 5-FU mostrou melhor resposta do que o microagulhamento isolado, com efeitos adversos mínimos.4

Arbache S. et al2 trataram oito pacientes com lesões de IGH com MMP + 5-FU versus MMP com placebo. A repigmentação da lesão com MMP + 5-FU foi estatisticamente superior à MMP com placebo (repigmentação com 5-FU=75,3% versus repigmentação com placebo 33,8%, p<0,001).

Em nosso protocolo, todas as 174 (96,7%) lesões apresentaram repigmentação, e nenhuma permaneceu acrômica após os procedimentos, o que indica melhora clínica com os três tratamentos utilizados. Não foram observadas diferenças estatísticas entre as três técnicas. Quando comparados dois a dois, no entanto, a proporção foi estatisticamente menor (teste de proporções k; p=0,014) para lesões tratadas com MMP para microagulhamento (50/58 = 86,2%) em comparação com lesões tratadas com 5FU (57/57=100%) , sugerindo melhor eficácia para o tratamento com 5-FU.

Após duas sessões de tratamento, o 5-FU intralesional foi o tratamento mais efetivo, com significância estatística, quando comparado ao uso de microagulhamento. A eficácia do MMP + 5-FU foi inferior ao 5-FU intralesional e superior ao microagulhamento isoladamente, embora sem significância estatística. O uso de menor quantidade de 5-FU (1,175µg/cm2 ou cerca de 0,00116ml para cada 10 lesões), segundo a técnica descrita por Arbache2 e a rapidez e facilidade da técnica são as grandes vantagens da técnica MMP + 5-FU em relação à técnica de injeção com agulha de insulina, que utilizou cerca de 50mg (1ml) de medicação por sessão. Os efeitos adversos do 5-FU incluem dor, prurido, hiperpigmentação e queimação no local da aplicação.3,4

Outras reações locais menos frequentes incluem dermatite alérgica de contato, cicatrizes, dor, sensibilidade, supuração, descamação e edema.

Em nosso protocolo, não houve diferenças significativas entre os tratamentos em relação à dor.

 

CONCLUSÕES

A infiltração intralesional do 5-FU foi mais efetiva no tratamento da leucodermia solar. O uso de menor quantidade de medicamentos e a rapidez e facilidade da técnica são as grandes vantagens da técnica MMP + 5-FU. Mais estudos que investiguem a manutenção do nível de melhora das lesões com essas três técnicas são necessários.l

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Gilmayara Alves Abreu Maciel Pereira | 0000-0002-0850-0427
Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Diego Leonardo Bet | 0000-0002-7548-4797
Concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Maria Victoria Suarez Restrepo | 0000-0002-2614-6011
Análise estatística; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Vanessa Barreto Rocha | 0000-0001-6795-398X
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Leticia Arsie Contin | 0000-0002-4783-9909
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo, elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS

1. Juntongjin P, Laosakul K. Idiopathic guttate hypomelanosis: a review of its etiology, pathogenesis, findings, and treatments. Am J Clin Dermatol. 2016;17(4):403-11.

2. Arbache S, Roth D, Steiner D, Breunig J, Michalany NS, Arbache ST, et al. Activation of melanocytes in idiopathic guttate hypomelanosis after 5-fluorouracil infusion using a tattoo machine: Preliminary analysis of a randomized, split-body, single blinded, placebo controlled clinical trial. J Am Acad Dermatol. 2017;78(1):212-5.

3. Abd El-Samad Z, Shaaban D. Treatment of localized non-segmental vitiligo with intradermal 5-flurouracil injection combined with narrow-band ultraviolet B: a preliminary study. J Dermatolog Treat. 2012;23(6):443-8.

4. Attwa EM, Khashaba SA, Ezzat NA. Evaluation of the additional effect of topical 5-fluorouracil to needling in the treatment of localized vitiligo. J Cosmet Dermatol. 2020;19(6):1473-8.

5. Arbache S, Mattos EC, Diniz MF, Paiva PYA, Roth D, Arbache ST, et al. How much medication is delivered in a novel drug delivery technique that uses a tattoo machine? Int J Dermatol. 2019;58(6):750-5.


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