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Relato de casos

Carcinoma ductal de glândulas sudoríparas écrinas - desafio diagnóstico

Glaysson Tassara Tavares1; Carolina De Magalhães Ledsham2; Isabella Vieira De Oliveira2; Vanessa Martins Barcelos1

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20191141316

Data de recebimento: 24/01/2019
Data de aprovação: 14/11/2019

Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte (MG), Brasil


Abstract

É apresentado um caso de carcinoma ductal écrino cutâneo primário na região parietal do couro cabeludo em paciente de 77 anos. A biópsia mostrou carcinoma de padrão ductal, infiltrante, sugestivo de neoplasia metastática. Foi identificada infiltração por adenocarcinoma de padrão tubular écrino. O paciente foi encaminhado ao Mastologista e Oncologista, que não detectaram lesões primárias em outros órgãos. Diante da clínica e análise imuno-histoquímica, o diagnóstico foi de carcinoma écrino primário da pele. Para tratamento, realizou-se cirurgia micrográfica de Mohs, em três fases para obter margem livre. O tumor apresentava infiltração profunda da tela subcutânea e gálea aponeurótica.


Keywords: Carcinoma ductal; Glândulas écrinas; Cirurgia de Mohs


INTRODUÇÃO

Os carcinomas de glândulas sudoríparas (CGS) são tumores raros, correspondendo a cerca de 0,05% de todas as neoplasias cutâneas1, sendo divididos em apócrinos e écrinos (mais comuns).2 O adenocarcinoma ductal écrino acomete ambos os sexos de forma semelhante, entre 50 e 80 anos de idade.2 Geralmente, é descrito como lesão assintomática, de evolução lenta. Apresenta grande variabilidade clínica e localiza-se, principalmente, no couro cabeludo e na região cervical. Apresenta metástases em cerca de 57% dos casos3 para linfonodos regionais, pele, pulmão e ossos.2 Para o tratamento, é descrita a exérese com margem ampla. Apresenta prognóstico limitado, com taxas de recorrência de 70%3, enquanto a sobrevida em 10 anos é de 9 e 56% (se linfonodo é positivo ou negativo, respectivamente)4.

O adenocarcinoma ductal écrino apresenta importância clínica devido aos achados histológicos e imuno-histoquímicos semelhantes aos das metástases cutâneas secundárias, em especial ao carcinoma ductal invasor das mamas, além de outros adenocarcinomas, cujo tratamento e prognóstico diferem de forma importante. Apresentam como diagnósticos diferenciais os carcinomas espinocelular, basocelular e de Merkel.5,6

Este trabalho objetiva relatar um caso de carcinoma ductal écrino para o qual o diagnóstico diferencial com metástase cutânea foi desafiador. A confirmação somente foi possível com a associação de dados clínicos, histológicos e imuno-histoquímicos. Objetiva, ainda, demonstrar a importância da cirurgia micrográfica de Mohs (CMM) neste contexto, uma vez que esta neoplasia apresentou limites imprecisos, fator que dificulta a obtenção de margem livre se tratado com a cirurgia convencional.

 

RELATO DE CASO

Homem, 77 anos, apresentava história de lesão no couro cabeludo percebida há 15 dias, assintomática. Ao exame, apresentava nódulo subcutâneo, sem alterações da pele suprajacente, com cerca de 1,2 x 0,9cm de diâmetro, localizado na região parietal direita do couro cabeludo (Figura 1). Foi realizada biópsia incisional, que evidenciou proliferação de células poliédricas atípicas, com núcleos hipercromáticos/pleomórficos e nucléolos evidentes, formando ninhos, cordões e arranjos tubulares em meio a estroma desmoplásico (Figuras 2, 3 e 4), sugestivo de carcinoma de padrão ductal, infiltrante - possível neoplasia metastática.

A imuno-histoquímica demonstrou CK7 positivo, EMA positivo, RE (receptor de estrogênio) positivo difusamente, CK20 negativo e WT1 negativo, cujo laudo foi de carcinoma invasor com origem mamária. O paciente foi encaminhado para Mastologia e Oncologia, que não encontraram neoplasia maligna nem mamária nem em outros órgãos.

Realizou-se a exérese da lesão através da CMM. Na primeira fase, a margem inicial foi de 5mm, sendo necessários outros dois estágios para a obtenção de margem livre (Figura 5). A histologia evidenciou carcinoma de padrão ductal écrino, moderadamente diferenciado, com infiltração profunda da tela subcutânea e gálea aponeurótica, poupando a epiderme e derme superficial.

 

DISCUSSÃO

O adenocarcinoma ductal écrino apresenta histologia e imuno-histoquímica bastante semelhantes às metástases cutâneas de adenocarcinomas, principalmente de mama, o que torna o diagnóstico diferencial entre eles desafiador.5,6

A clínica entre essas duas entidades é distinta: o adenocarcinoma ductal écrino se apresenta como lesão única enquanto a metástase de mama apresenta comumente lesões múltiplas e associação com história de câncer mamário, previamente ao achado cutâneo. A imuno-histoquímica é o foco de atenção de estudos recentes para a distinção entre CGS e metástases cutâneas de neoplasias de mama.5,7

O diagnóstico deste caso foi possível após descartar foco neoplásico extracutâneo, pela presença da lesão isolada no couro cabeludo, associado ao estudo imuno-histoquímico. Os achados dos dois estudos imuno-histoquímicos mostraram CK7+, P63+, CK18+, CEA+. Ainda não existe um padrão para a imuno-histoquímica baseado em evidências, tendo em vista a raridade do tumor. Contudo, nos trabalhos existentes, a presença dos marcadores acima é favorável a tumor primário de glândula écrina e menos frequente no câncer de mama, conforme a tabela abaixo (Tabela 1).

Outros marcadores descritos na literatura como potenciais para essa distinção são GCDFP-15, EGFR e podoplanina.8

O tratamento com a CMM mostrou-se fundamental, devido à localização da neoplasia na derme profunda e no subcutâneo, aos limites imprecisos e à ausência de alterações na epiderme e derme superficial. Ao final da CMM, a margem necessária para a obtenção de margem livre foi de 9mm (três estágios). Diante da extensão subclínica e tratando-se de neoplasia com alta taxa de recidiva e de metástase, mostrou-se importante a abordagem com cirurgia de Mohs para o controle de margem, reduzindo-se o risco de excisão incompleta.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Glaysson Tassara Tavares | 0000-0002-1688-2955
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Carolina De Magalhães Ledsham | 0000-0003-4269-0049
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Isabella Vieira De Oliveira | 0000-0002-0245-4941
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Vanessa Martins Barcelos | 0000-0002-0087-271X
Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

 

REFERÊNCIAS

1. Rollins-Raval M, Chivukula M, Tseng GC, Jukic D, Dabbs DJ. An immunohistochemical panel to differentiate metastatic breast carcinoma to skin from primary sweat gland carcinomas with a review of the literature. Arch Pathol Lab Med. 2011;135(8):975-83.

2. Leonhardt FD, Zanoni A, Ponce F, Haddad L, Scapulatempo Neto C, Cervantes O, Abrahao M. Carcinoma de glândula sudorípara écrino. Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;73(2):286-7.

3. Matos D, Goulao J, Barreiros H, Bártolo E, Oliveira A, Sanches F, et al. Carcinoma Ductal Écrino. Rev Soc Portuguesa Dermatol Venereol. 2014;72(4):599-604.

4. McLean SR, Shousha S, Francis N, Lim A, Eccles S, Nathan M, et al. Metastatic ductal eccrine adenocarcinoma masquerading as an invasive ductal carcinoma of the male breast. J Cutan Pathol. 2007;34(12):934-8.

5. Wick MR, Ockner DM, Mills SE, Ritter JH, Swanson PE. Homologous carcinomas of the breasts, skin, and salivary glands. A histologic and immunohistochemical comparison of ductal mammary carcinoma, ductal sweat gland carcinoma, and salivary duct carcinoma. Am J Clin Pathol. 1998;109(1):75-84.

6. Brichkov I, Daskalakis T, Rankin L, Divino C. Sweat gland carcinoma. Am Surg. 2004;70(1):63-6.

7. Zehr KJ, Rubin M, Ratner L. Apocrine adenocarcinoma presenting as a large ulcerated axillary mass. Dermatol Surg. 1997;23(7):585-7.

8. DeVita Jr VT, Hellman S, Rosenberg SA. Cancer - Principles & Practice of Oncology. 7th Ed. Lippincott: Williams & Wilkins; 2000.


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