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Artigo Original

Nova técnica cirúrgica para tratamento de onicocriptose

Rogério Nabor Kondo; Rubens Pontello Junior; Suellen Gonçalves dos Reis; Cássio Rafael Moreira

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20191141402

Data de recebimento: 16/05/2019
Data de aprovação: 10/11/2019

Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de interesse: Nenhum

Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia do Hospital Universitário do Norte do Paraná da Universidade Estadual de Londrina, Londrina (PR), Brasil


Abstract

INTRODUÇÃO: Unha encravada é a principal causa de cirurgia do aparelho ungueal. Técnicas têm sido descritas para melhor exposição da matriz ungueal no tratamento Grau III, como exérese em bloco da borda de pele hipertrófica e da lâmina subcutânea acometida, retirando-se uma cunha semielíptica e/ou incisão em L, na qual ambas preconizam fechamento suturando a pele e a lâmina. Autores descrevem a aplicação de técnica de incisão na intersecção da prega ungueal lateral com a proximal, para expor a matriz, e realização de uma cunha na hipertrofia cutânea.  A àrea cruenta do defeito resultante do local onde o fragmento da lâmina foi retirado é deixada cicatrizar segunda intenção.
OBJETIVO: Avaliar o conforto e a eficácia da nova técnica cirúrgica para onicocriptose.
MÉTODOS: Estudo observacional e retrospectivo por meio de análise de 29 pacientes com onicocriptose que foram submetidos à nova técnica.
RESULTADOS: Das 34 dobras ungueais (cinco pacientes tinham duas dobras acometidas) submetidas à cirurgia pela técnica, houve apenas uma recidiva em uma das dobras de uma paciente que passou por nova intervenção. Não se observaram queixas de desconforto ou complicações no pós-operatório.
CONCLUSÕES: A técnica aplicada mostrou-se satisfatória com baixo índice de recidiva, de fácil execução e sem queixas de desconforto pelos pacientes.


Keywords: Onicocriptose; Unha encravada; Tratamento cirúrgico; Técnica cirúrgica


INTRODUÇÃO

A onicocriptose subcutânea (OS), onicocriptose ou unha encravada (UE) é decorrente da penetração da lâmina ungueal no tecido mole subjacente.1,2 É prevalente em jovens e adultos do sexo masculino (3:1), pode apresentar elevada morbidade e provocar quadro incapacitante.2,3 A etiologia é multifatorial na qual se destacam: hereditariedade, convexidade exagerada da lâmina, desproporção entre a largura da placa e o leito ungueal, traumas crônicos, uso de sapatos de ponta fina ou excessivamente apertados e corte inadequado das unhas.1-3

A UE pode ser classificada conforme grau de severidade (Heifetz, 1937):2,3 1) Grau I, pela presença de sinais inflamatórios (eritema, edema leve e dor à compressão da dobra ungueal lateral; 2) Grau II, quando os sinais inflamatórios aumentam e surgem exsudato, infecção secundária e drenagem local; 3) Grau III, quando ocorre a formação de tecido de granulação e hipertrofia da dobra lateral da unha.1-3

A literatura cita diferentes manejos para OS, sendo conservadores ou cirúrgicos. No grau I, preconiza-se a técnica conservadora, como a utilização de órteses. Nos graus II e III, o tratamento cirúrgico oferece os melhores resultados. As técnicas utilizadas são a matricectomia, fenolização, exérese da lâmina ungueal,1-3 correção de hipertrofia em U,4 radioeletrocirurgia e criocirurgia.2

Na matricectomia cirúrgica para UE Grau III, a literatura cita a realização de abordagem em cunha em semifuso e incisão em L, nas quais são corrigidas as hipertrofias na mesma incisão.1 Essas técnicas permitem a visualização da matriz ungueal a ser retirada, mas recomendam suturas entre a pele e a lâmina ungueal preservada para fechamento da grande área cruenta.1,5

Os pontos (mononáilon) são preservados até serem retirados, em torno de duas semanas. Nesse período, os presentes autores notaram relatos de desconforto tanto na visualização de pontos envolvendo a lâmina ungueal quanto na retirada dos fios.

Os autores propõem técnica de incisão na intersecção da prega ungueal lateral com a proximal, para expor a matriz, e realização de uma cunha no meio da hipertrofia cutânea (sem retirá-la inteira), no mesmo tempo cirúrgico. No local em que o fragmento da lâmina é retirado, deixa-se cicatrização por segunda intenção, pois resulta em uma pequena faixa cruenta. A vantagem seria um tratamento um pouco menos invasivo, sem a sensação ruim de ver a lâmina suturada e o desconforto da retirada de pontos da unha (Figura 1).

 

MÉTODOS

Trata-se de um estudo retrospectivo observacional de pacientes maiores de 12 anos, de ambos os sexos, que procuraram espontaneamente o Ambulatório de Especialidades Clínicas (AHEC) da Universidade Estadual de Londrina (UEL), no setor de pequenas cirurgias de Dermatologia, nas terças-feiras à tarde, com onicocriptose graus II e III.  Em todos os casos, houve autorização de termo de consentimento informado e autorização de fotos dos pacientes (pelos pais ou seus responsáveis em casos de menores de 18 anos), fazendo parte do protocolo do Serviço.

Foram excluídos casos com hipertrofia bilateral e anterior no mesmo paciente (pela necessidade de correção em U), Diabetes Mellitus, insuficiência arterial periférica, gestação e distúrbios de coagulação.

Os dados foram analisados e processados pelo programa GraphPadInstat e Excel 2007. A significância estatística foi realizada pelo teste de qui-quadrado, considerando-se nível de significância 5% (p<0,05) e aplicado para comparar o sexo e as recidivas.

Foi utilizada uma amostra de conveniência (todos os pacientes com onicocriptose e que fizeram a cirurgia pela técnica no Serviço no prazo de 01 de janeiro de 2011 a 30 de novembro de 2018 foram acompanhados no período em questão).

Pacientes ficavam com curativo durante 24 horas. Eram receitados analgésicos comuns (paracetamol ou dipirona), azitromicina 500mg por três dias ou sulfametoxazol e trimetoprima 400/80mg, dois comprimidos de 12/12 horas por dez dias, conforme protocolo do Serviço.

Os pacientes eram reavaliados no 3º dia de pós-operatório e no 14º dia, quando os pontos eram retirados. Eram avaliados quanto à história de dores, desconfortos, incômodos dos pontos, sangramentos, secreções durante o pós-operatório e era realizada a avaliação clínica da ferida operatória na ocasião. Além de fotografar no pré-operatório, fotos eram documentadas no pós-operatório (3º dia, 14º dia, três meses e seis meses) e usadas para comparar a melhora após o procedimento.

Sequência e detalhamento da técnica (Figura 2):

1) Paciente em decúbito dorsal horizontal com flexão da perna sobre a coxa do lado do pododáctilo acometido;

2) Marcação com azul de metileno ou caneta cirúrgica;

3) Antissepsia com polivinil-iodina 10% tópico;

4) Colocação de campos cirúrgicos;

5) Bloqueio troncular com lidocaína 2% sem vasoconstritor;

6) Garroteamento da base do pododáctilo;

7) Incisão na bissetriz entre a prega ungueal lateral e a proximal (incisão diagonal) para melhor visualizar a matriz;

8) Exérese de tecido de granulação através de incisão linear, desde dobra ungueal proximal até borda anterior (cerca de 3mm de largura de lâmina);

9 Descolamento dessa placa ungueal, desde borda livre até a matriz;

10) Corte da placa ungueal, desde borda livre até o corno matricial lateral;

11) Retirada de placa ungueal;

12) Curetagem do leito ungueal lateral;

13) Sutura da incisão diagonal com mononáilon 4.0, pontos simples;

14) Incisão em cunha no centro da hipertrofia cutânea lateral, mantendo as bordas da hipertrofia;

15) Retirada da cunha hipertrófica;

16) Sutura da cunha com mononáilon 4.0, pontos simples;

17 Retirada de garrote;

18) Curativo oclusivo.

 

RESULTADOS

Foram incluídos 29 pacientes, com 34 dobras ungueais acometidas (cinco pacientes apresentavam dois locais acometidos). Dessas dobras, sete já haviam sido submetidas a algum tipo de tratamento prévio (os pacientes não sabiam referir que tipo de cirurgia havia sido realizada) que não apresentou melhora.

A distribuição por sexo foi de 17 homens (59%) e 12 mulheres (41%), mas sem diferença estatisticamente significativa (p=1,0). A idade variou de 12 a 65 anos, sendo a média de 31,86 anos.

Todos os dedos acometidos foram os háluxes (34/34), estatisticamente significativo quando comparado aos outros pododáctilos (0/34), p=0,0001. Foram 15 dobras em hálux direito e 19 em hálux esquerdo, não estatisticamente significativa (p=0,88).

Os pontos foram retirados em duas semanas de pós-operatório, período em que os pacientes ficavam afastados de atividades diárias de trabalho ou escolar. Não houve relatos em prontuários de sinais de infecções locais, sangramentos, dores de forte intensidade durante o pós-operatório, grande incômodo dos pontos durante o período ou dor relevante na retirada de pontos. Os sítios operatórios estavam descritos como em bons aspectos, mas havia fotos dos pós-operatórios também.

Embora não tenhamos tido conhecimentos das técnicas usadas anteriormente, os pacientes das sete cirurgias prévias (onicocriptoses recidivadas) relataram menor incômodo com a técnica aplicada no presente estudo. 

O seguimento preconizado inicial era de 12 meses, porém pacientes deixaram de seguir após seis meses, por motivos desconhecidos, fato que não levou à exclusão do estudo, tendo em vista que estavam clinicamente bem até aquele momento.

Uma paciente, que tinha duas dobras acometidas do hálux esquerdo, teve que ser submetida a novo procedimento na dobra medial por recidiva (1/34 dobras ou 2,9% de recidivas), três meses após a primeira cirurgia no Serviço.

 

DISCUSSÃO

A UE é um transtorno doloroso com certa morbidade, sendo ainda causa frequente de afastamento de trabalho.2 Para grau I, o tratamento conservador ainda é preconizado, como uso de órteses, orientações quanto a lixamento de bordas laterais e uso de sapatos confortáveis. Mas os graus II e III têm melhores resultados com tratamento cirúrgico.2,3

A dor e inflamação resultam da penetração da lâmina ungueal no tecido mole adjacente, causando uma reação de corpo estranho. Remoção parcial ou total dessa lâmina é necessária. 2

A literatura também cita a realização da matricectomia (cirúrgica ou química), em conjunto com a remoção parcial da lâmina ungueal, para evitar as recidivas.1,6,7,8-10 Para melhor visualização do corno matricial, as incisões em cunha e em L são utilizadas. Porém, o defeito cruento é grande e há necessidade de fechamento com sutura entre a pele e lâmina remanescente. Isso pode trazer certo desconforto ao paciente, inclusive na hora da retirada dos pontos.

O presente estudo mostrou que o sexo masculino foi o prevalente e que a unha do hálux foi a mais acometida, estando de acordo com a literatura.2,3As dores de pós-operatório foram bem toleradas com analgésicos comuns, assim como em outras técnicas,2,3,7 mas com resultados satisfatórios (sem infecções ou sangramentos, por exemplo) e um baixo índice de recidiva (2,9%), embora seja uma amostragem pequena.

Apesar de várias técnicas de sutura da ferida operatória terem sido descritas,3,5,8-10 a nova técnica proposta apresenta as seguintes vantagens:

a) simples execução;

b) para melhor visualizar a matriz, se faz uma incisão na bissetriz entre a prega ungueal lateral e a proximal (incisão diagonal), na qual a área cruenta é menor;

c) apenas uma fina largura da lâmina ungueal (cerca de 3mm) é retirada em uma das suas dobras;

d) poupa-se tecido adjacente, pois se retira uma cunha no meio da área hipertrófica, sem retirar tudo, o que também deixa menos área cruenta;

e) não suturar a lâmina daria menos sensação de mal-estar ao paciente, tanto no pós-operatório quanto na retirada de pontos.

 

CONCLUSÃO

Embora o número de pacientes seja pequeno, os resultados mostraram que a técnica é de fácil execução, baixo custo, bem tolerada pelos pacientes e com bons resultados cosméticos (Figuras 3, 4 e 5).

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Rogério Nabor Kondo | 0000-0003-1848-3314
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Rubens Pontello Junior | 0000-0002-2101-9080
Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Suellen Gonçalves dos Reis | 0000-0001-9307-4065
Elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Cássio Rafael Moreira | 0000-0002-8781-1505
Elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS

1. Di Chiacchio N. Manejo da Onicocriptose (Unha Encravada) e Ablação da Unha. In: Gadelha AR, Costa IMC, editors. Cirurgia Dermatológica em Consultório. São Paulo: Atheneu; 2002. p.223-34.

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