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Relato de casos

Emprego do retalho de avanço em ilha (V-Y) na reconstrução labial após cirurgia micrográfica de Mohs: relato de três casos

Heloísa Del Castanhel Ubaldo1; Marcos Noronha Frey1; Gerson Dellatorre2

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20191131220

Data de recebimento: 19/12/2018
Data de aprovação: 10/04/2019
Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia, Hospital Santa Casa de Curitiba - Curitiba (PR), Brasil
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum


Abstract

A reconstrução labial após exérese de tumores é desafiadora, pois os resultados devem ser funcionais e cosméticos. Neste contexto, a cirurgia micrográfica de Mohs (CMM) é importante ao garantir máxima preservação tecidual, com menores taxas de recorrência e possibilidade de reconstruções menos complexas. Relatamos três casos de tumores labiais tratados com cirurgia de Mohs, cuja reconstrução foi realizada com retalhos de avanço em ilha (V-Y). Discute-se a relevância do correto manejo deste tipo de tumor, destacando-se o emprego da cirurgia de Mohs e do retalho de avanço em V-Y, que proporcionam resultados estéticos e funcionais satisfatórios.


Keywords: Neoplasias labiais; Cirurgia de Mohs; Retalhos cirúrgicos


INTRODUÇÃO

A reconstrução labial de defeitos cirúrgicos acometendo a pele e o vermelhão é desafiadora, considerando-se o impacto que pode ser causado por resultados funcionais e cosméticos desfavoráveis.1,2,3 O controle de margens cirúrgicas, obtido por meio de cirurgia micrográfica de Mohs (CMM), auxilia no alcance de melhores resultados, propiciando máxima preservação tecidual aliada a menores taxas de recorrência e à possibilidade de reconstruções cirúrgicas de menor complexidade.1,3

Relatamos três casos de neoplasias malignas labiais, cujo tratamento cirúrgico foi realizado com CMM e a reconstrução, por meio de retalho de avanço em ilha (V-Y).

 

RELATO DOS CASOS

Caso 1: Paciente feminina, com carcinoma basocelular (CBC) nodular no centro do lábio superior, com 0,5cm de diâmetro, envolvendo o filtro e o vermelhão (Figura 1A). O reparo foi realizado por subunidades anatômicas com duplo retalho de avanço em V-Y (Figuras 1B e 2A). O seguimento clínico de três meses demonstra a manutenção das características anatômicas e funcionais (Figura 2B).

Caso 2: Paciente feminina, com CBC nodular e ulcerado na porção esquerda do lábio superior, com 0,8cm em sua maior extensão, acometendo filtro e vermelhão (Figura 3A). Após margens livres no segundo estágio da CMM (Figura 3B), o reparo foi realizado com duplo retalho de avanço em V-Y, cutâneo e de mucosa (Figura 4). O seguimento clínico de quatro meses (Figura 5) demonstra a preservação das características anatômicas e funcionais.

Caso 3: Paciente masculino, apresentando carcinoma espinocelular (CEC) invasor bem diferenciado em região central do lábio inferior, com 1cm de diâmetro e acometimento exclusivo do vermelhão (Figura 6A). Após a CMM (Figura 6B), o reparo foi realizado com retalho de avanço em V-Y de mucosa labial (Figura 7A). No seguimento clínico de nove meses (Figura 7B), eviden-B ciam-se resultados cosméticos e funcionais satisfatórios.

 

DISCUSSÃO

A reconstrução de defeitos cirúrgicos que envolvem a região labial, sobretudo aqueles que incluem o vermelhão, é tecnicamente complexa.4,5 Devido ao limitado tecido de reserva da região, há uma potencial distorção da simetria facial e prejuízos nas funções de fala, de alimentação e de expressões faciais,1,3,4 o que deve ser considerado pelo cirurgião no planejamento deste tipo de intervenção.

O emprego da CMM nestes casos assume papel importante. O controle de margens cirúrgicas propiciado pela técnica minimiza o sacrifício de tecidos saudáveis adjacentes ao tumor e permite a disponibilização de mais tecido para as reconstruções.3 A CMM também garante excelentes taxas de cura a longo prazo,3 o que evita reabordagens nesta área crítica.

Dispõe-se de algumas opções de fechamento para defeitos cirúrgicos da região labial. A sutura primária linear pode ser considerada quando a ferida operatória for particularmente pequena, ou, no caso do filtro, quando corresponder a menos da metade da largura deste.3,4 Os retalhos de rotação também contemplam feridas operatórias pequenas, devido a potenciais alterações anatômicas nesta área tão limitada.3 Enxertos de espessura total podem ser utilizados, estando indicados para tratamento de grandes defeitos, com melhores resultados quando posicionados de forma a ocupar toda uma subunidade cosmética.3 Até mesmo o fechamento por segunda intenção pode ser considerado na área côncava do filtro, mas a contração cicatricial de grandes feridas nesta área pode evoluir com quadro de eclábio.3 Como, de modo geral, os defeitos cirúrgicos labiais costumam apresentar um tamanho intermediário entre os citados, a correção por meio destas técnicas pode resultar em microstomia, miniaturização do vermelhão e potencial alteração do contorno natural do lábio.4

O retalho de avanço em V-Y é uma excelente opção para tratamento de defeitos cirúrgicos labiais, uma vez que recruta tecidos de características como textura, espessura, coloração e inclusive fotodano muito semelhantes,2,4 mantendo também

o padrão de subunidades cosméticas faciais. Particularmente, a possibilidade de correção de defeitos do lábio superior que envolvem o filtro, considerados ainda mais complexos devido às características de contorno do arco do cupido,6 evidencia a aplicabilidade desta técnica, como observado no primeiro caso. Também destacamos a manutenção do contorno labial, esteticamente relevante, observada nos três casos.

No caso 1, a área a ser corrigida incluiu a porção central do lábio superior e também o filtro; foram realizados dois retalhos de avanço em ilha projetados de forma perpendicular ao bordo labial – um contendo pele e o outro, mucosa. No caso 2, o defeito na porção esquerda do lábio superior também incluiu pele e mucosa; sua correção necessitou de dois retalhos de avanço em V-Y: o primeiro, cutâneo, lateral ao lábio; o segundo, de mucosa labial, que foi projetada de forma perpendicular e ascendente a fim de manter a linha anatômica do bordo do vermelhão. No caso 3, em que somente o vermelhão foi acometido, foi realizado avanço único de mucosa. Em todos os casos, o seguimento clínico evidenciou resultados cosméticos e funcionais satisfatórios.

 

CONCLUSÃO

O retalho de avanço em V-Y deve ser lembrado no planejamento de reparos cirúrgicos que acometem a região labial, destacando-se a importância da associação deste à CMM, que proporciona segurança pelo controle de margens, além dos resultados estéticos e funcionais satisfatórios.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Heloísa Del Castanhel Ubaldo | ORCID 000-0001-5828-4948
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Marcos Noronha Frey | ORCID 0000-0003-3914-2586
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Gerson Dellatorre | ORCID 0000-0002-9657-0002
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS

1. Huilgol SC, Ma JHY, Hills RJ. Double island pedicle or V-Y flap repair for partial-thickness combined defects of the cutaneous and mucosal lip. J Am Acad Dermatol. 2014;71(6):1198-203.

2. Griffin GR, Weber S, Baker SR. Outcomes following V-Y advancement flap reconstruction of large upper lip defects. Arch Facial Plast Surg. 2012;14(3):193-7.

3. Kaufman AJ, Grekin RC. Repair of central upper lip (philtral) surgical defects with island pedicle flaps. Dermatol Surg. 1996;22(12):1003-7.

4. Zeitouni NC, Ang JM, Weyer CW, Krunic AL. Horizontally Opposed V-Y Advancement Flaps for Surgical Reconstruction of Central Upper Lip Defects. J Craniofac Surg. 2017;28(2):578-9.

5. Pepper JP, Baker SR. Local flaps: Cheek and lip reconstruction. JAMA Facial Plast Surg. 2013;15(5):374-82.

6. Paniker PU, Mellette JR. A simple technique for repair of Cupid's bow. Dermatol Surg. 2003; 29(6):636-40.


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