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Como eu faço ?

Anestesia tumescente: técnica auxiliar para excisões extensas em cirurgia dermatológica

Jerry D. Brewer1, Randall K. Roenigk1

Recebido em: 27/04/2010
Aprovado em: 21/05/2010
Trabalho realizado no Departamento de
Dermatologia. Divisão de Cirurgia de
Dermatológica. Clínica Mayo, Rochester –
(MN) – USA.
Conflitos de interesse: Nenhum
Suporte financeiro: Nenhum

Abstract

Introdução: A anestesia local é a forma mais comum de anestesia utilizada em cirurgias cutâneas.Alguns pacientes possuem comorbidades que os colocam no grupo de risco para anestesia geral. A anestesia tumescente é uma técnica que consiste na injeção de uma grande quantidade de anestesia diluída local no plano subcutâneo.A anestesia tumescente pode minimizar o desconforto, auxiliar na hemostasia e contribuir para a facilidade do fechamento de grandes defeitos cirúrgicos que, do contrário, apresentariam dificuldade significativamente maior. Objetivo: O nosso objetivo é discutir os prós e contras da anestesia tumescente na âmbito da cirurgia dermatológica. Conclusão: A anestesia tumescente é uma opção viável que pode ajudar na cirurgia cutânea reconstrutiva, especialmente na remoção de tecido no plano subcutâneo profundo ou em fáscias. A anestesia tumescente também é associada a bons resultados e poucas reações adversas.

Keywords: ANESTESIA, CÂNCER DA PELE, CIRURGIA DE MOHS


INTRODUÇÃO

A anestesia local tem sido uma das bases da cirurgia cutânea. Porém, a anestesia local tradicional tem certas desvantagens. Por exemplo, a reconstrução de defeitos maiores e mais complexos pode ter limitações devido à dosagem segura de lidocaína; isto é de 3 a 5 mg/kg de lidocaína sem epinefrina e de 5 a 7 mg/kg de lidocaína com epinefrina.1 Além disso, pacientes idosos podem apresentar comorbidades que limitam a possibilidade de serem submetidos à anestesia geral, portanto restringindo as opções em cirurgias reconstrutivas complexas.

A Técnica Anestésica Tumescente (TAT) consiste em injetar grandes quantidades de lidocaína diluída no plano subcutâneo. 2-9 Há várias formulações, porém o consenso de fórmula padrão para a anestesia tumescente é 1.000 ml de soro fisiológico, 50 a 100 ml de 1% lidocaína, 1 ml de epinefrina 1:1.000, e 12,5 ml de bicarbonato de sódio.10 Devido à natureza diluída do anestésico, grandes quantidades podem ser injetadas seguramente sem risco de intoxicação por lidocaína (35 a 55 mg/kg).2,7 A TAT é uma prática estabelecida em cirurgia estética cutânea, também utilizada na reconstrução de tecido dérmico e como parte da cirurgia micrográfica de Mohs.11,12

A TÉCNICA ANESTÉSICA TUMESCENTE

A TAT consiste na infiltração subcutânea de grandes quantidades de lidocaína e epinefrina diluídas que provocam edema da área cirúrgica, deixando-a firme e tumescente, e resultando na anestesia local extensa da pele e do tecido subcutâneo.5,13 O Dr. Jeffrey Klein descreveu extensivamente esta técnica no âmbito de cirurgias em pacientes ambulatoriais, demonstrando que o provável limite superior seguro da dose de lidocaína usado na TAT é aproximadamente 35 mg/kg, enquanto outros estudos demonstram que tal limite pode alcançar até 55 mg/kg em casos da lipoaspiração.2,7

Dependendo do quadro clínico, a solução tumescente pode conter qualquer diluição (de 5 a 20 vezes) do padrão comercialmente disponível (1% lidocaína), misturada com epinefrina (1:100.000) e bicarbonato de sódio (10 mEq/L) em soro fisiológico. 5 Esta solução proporciona uma anestesia local segura que permanece por até 10 horas após o procedimento.5

Ao injetar a anestesia tumescente, um ponto de entrada é determinado. A cânula é então introduzida com a mão nãodominante, no plano subcutâneo, enquanto a mão dominante é colocada sobre a pele para guiar a localização da extremidade da cânula durante a injeção do anestésico (Figura 1).

AS VANTAGENS DA ANESTESIA TUMESCENTE EM CIRURGIA DERMATOLÓGICA

O grande volume de epinefrina diluída que é infiltrado principalmente no tecido adiposo causa uma vasoconstrição generalizada e prolongada.4,5,14 Ao executar uma excisão local extensa, a substância proporciona uma quantidade significativamente menor de hemorragia intra-operatória, reduzindo a excessiva necessidade de cauterização.Também foi demonstrado que a anestesia tumescente possui efeito antibacteriano que pode atuar no desenvolvimento de infecções na ferida pós-operatórias.15

Além disso, a distensão da pele causada pelo grande volume de solução tumescente injetada na área da cirurgia pode causar uma expansão aguda de tecido durante a cirurgia, facilitando a aproximação das bordas da ferida em defeitos cirúrgicos relativamente extensos (Figuras 2 e 3). A capacidade de expansão tecidual da TAT pode ser tão grande, que muitas vezes torna desnecessário o descolamento do tecido, o que resulta em menor trauma cirúrgico do tecido circunvizinho viável.

Finalmente, como previamente mencionado, a TAT produz uma anestesia local extensa, alcançando a área cirúrgica em lateralidade e profundidade simultaneamente. Dessa forma, excisões locais extensas que necessitam se aprofundar até a fáscia, como por exemplo nos casos de re-excisões de melanomas malignos, podem ser eficazmente anestesiadas nas suas partes mais profundas, resultando em menos desconforto aos pacientes que, do contrário, receberiam apenas anestesia superficial.

OS CONTRAS DA ANESTESIA TUMENESCENTE EM CIRURGIA DERMATOLÓGICA

Ao usar a TAT nas extremidades distais superiores ou inferiores, deve-se atentar para não injetar anestesia demais, causando uma síndrome de compartimento. Além disso, a expansão tecidual que ocorre durante a TAT em cirurgias de extremidades, pode levar à formação de feridas de maior dificuldade de fechamento devido à tensão causada pela expansão do tecido que pode acontecer ao redor da circunferência do membro. Devido a estas implicações, a TAT provavelmente não deve ser aplicada nos dedos.

Adicionalmente, embora o limite superior de segurança da lidocaína seja consideravelmente alto no caso da anestesia tumescente, há relato de uma fatalidade devida a níveis tóxicos de anestésicos em uma mulher de 38 anos de idade que foi submetida a um processo de lipoaspiração ambulatorial.16

CONCLUSÕES

Foi demonstrado que a TAT é uma ferramenta eficaz e segura no domínio da cirurgia cutânea.4,6,8,9,11,12,14,17-24 A TAT não apenas é benéfica quando utilizada em grandes e simples excisões locais, mas também pode ser uma ferramenta importante em outras formas de cirurgias oncológicas cutâneas, como a cirurgia micrográfica de Mohs.17,18 Pode ser particularmente benéfica no tratamento cirúrgico de cânceres de pele extensos que deixam defeitos relativamente grandes no couro cabeludo e na face, exigindo fechamentos complexos.11,17,20,21 A TAT também foi utilizada em lipoaspirações, dermoabrasões e mesmo em biópsias do linfonodo sentinela.3,4,6,8,12,14,25,26 Outros casos em que foi descrita a utilização da TAT incluem o tratamento de um schwanoma cutâneo e, fora do domínio da cirurgia cutânea, como técnica auxiliar em mastectomias totais e outras cirurgias de mama.22,27-29

No caso de uma extensa excisão local em cirurgia dermatológica e oncológica cutânea, a TAT pode proporcionar excelente hemostasia, excepcional anestesia regional (simultaneamente em lateralidade e profundidade na área cirúrgica), como também auxiliar na expansão do tecido e no fechamento de defeitos com maiores áreas e graus de dificuldade. Embora o uso da TAT em cirurgia cutânea traga muitos benefícios, deve-se ter cautela com o objetivo de evitar a possibilidade de uma síndrome de compartimento ao conduzir uma cirurgia em uma extremidade.Apesar da existência de descrições de fatalidades devido à anestesia tumescente, um estudo que analisou mais de 15.000 pacientes demonstrou que a anestesia tumescente é uma técnica eficaz, com riscos mínimos ou insignificantes quando executada corretamente.30

Em resumo, a TAT é um método seguro e eficaz para se obter uma anestesia regional excelente, no âmbito de uma cirurgia dermatológica, com ótimos resultados e mínimas complicações.

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