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Relato de casos

Espiradenoma écrino gigante associado à síndrome de Brooke-Splieger

Taiane Medeiros Terra; Flavia Tandaya Grandi Miranda; Luiz Fernando Froes Fleury Junior

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20191111253

Data de recebimento: 17/09/2018

Data de aprovação: 17/03/2019


Trabalho realizado no Serviço de Dermatologia da Universidade Federal de Goiás, Goiânia (GO), Brasil

Suporte Financeiro: Nenhum

Conflito de Interesses: Nenhum


Abstract

A síndrome de Brooke-Spiegler é doença genética autossômica dominante rara, com predisposição a diversos tumores anexiais, dentre eles tricoepitelioma, cilindroma e espiradenoma. Os tumores surgem na segunda década de vida, aumentam progressivamente com a idade e sua prevalência é maior em mulheres. É causada por mutação no gene CYLD, localizado no cromossomo 16q12-q13. Relatamos caso exuberante de espiradenoma écrino gigante associado a essa síndrome.


Keywords: Neoplasias Cutâneas; Neoplasias de Anexos e de Apêndices Cutâneos; Procedimentos Médicos e Cirúrgicos de Sangue


INTRODUÇÃO

A síndrome de Brooke-Spiegler é afecção hereditária rara, de herança autossômica dominante, ocasionada por mutação no gene CYLD, localizado no cromossomo 16q12-q13.1 Clinicamente, apresenta-se com múltiplos tumores anexiais do tipo cilindroma, tricoepitelioma e espiradenoma.2

Relatamos caso raro de síndrome de Brooke-Spiegler associada a espiradenoma écrino gigante em fronte.

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 55 anos, previamente hígido, relata surgimento há oito anos de massa em fronte, de crescimento progressivo e lento. Além do prejuízo estético, o paciente queixava-se de diminuição do campo visual devido à lesão. Ao exame dermatológico, apresentava tumoração em fronte, de tamanho de 09x04x07cm, bem delimitada, fibroelástica, pedunculada, normocrômica-avermelhada e com vasos proeminentes na

superfície (Figuras 1 e 2). Apresentava múltiplos nódulos normocrômicos menores em face e couro cabeludo.

Havia casos semelhantes na família de múltiplas nodulações em face. Foram realizadas exérese da lesão (Figura 3) e retirada de excesso de pele para fechamento primário.

A figura 4 apresenta o pós-operatório imediato e a figura 5, dez dias depois da cirurgia. Paciente ficou extremamente satisfeito com o resultado cirúrgico.

O exame anatomopatológico demonstrou múltiplos focos de blocos basaloides justapostos e outros de células claras que ocupam derme reticular superficial e profunda, formando nódulos de limites precisos e lobulados, comprimindo o tecido subcutâneo adjacente e formando uma pseudocápsula. Há áreas de necrose com formação de estruturas císticas preenchidas por material fibrinoide e hemático. Observam-se ainda ductos em fundo cego (Figuras 6 e 7). Realizada imuno-histoquímica para BEREP4, com resultado negativo, e para Ki-67, que apresentou positividade em 15% das células neoplásicas. Tais achados sugerem diagnóstico de espiradenoma écrino.

 

DISCUSSÃO

A síndrome de Brooke-Spiegler é doença autossômica dominante rara, caracterizada pelo desenvolvimento de múltiplas neoplasias anexiais, dentre elas cilindroma, espiradenoma e tricoepitelioma.3 Foi relatada pela primeira vez em 1842 por Ancell.2 Apresenta prevalência maior em mulheres.4,5 O gene implicado na patogênese da doença é o CYLD, um gene supressor tumoral localizado no cromossomo 16q12-q13. Além da pele, neoplasias morfologicamente semelhantes podem surgir nas glândulas salivares e mamas, mas isto é extremamente raro.1

Os pacientes com a síndrome de Brooke-Spiegler apresentam múltiplos tumores localizados principalmente na região de cabeça e pescoço. A maioria dos nódulos tem de 0,5 a 3cm, mas lesões maiores também podem ser encontradas1, como no caso relatado.

A maioria dos tumores corresponde microscopicamente a espiradenoma, cilindroma ou tricoepitelioma. Eles são idênticos histologicamente aos casos esporádicos; entretanto, nos casos da síndrome, é mais frequente encontrar casos de multifocalidade de tipos tumorais em uma mesma lesão.

Os cilindromas ocorrem como numerosas pápulas, nódulos ou tumores distribuídos no couro cabeludo e, às vezes, no rosto e tronco.6 Uma apresentação clássica de múltiplas lesões confluentes no couro cabeludo é chamada de “tumor em turbante”.7 Histologicamente, caracterizam-se por lesão bem circunscrita, composta por ilhas tumorais e cordões de células basaloides organizadas em padrão de “quebra-cabeça”.8 A transformação maligna dos cilindromas é rara.

Além das lesões de couro cabeludo, os pacientes com o fenótipo clássico da síndrome de Brooke-Spiegler apresentam pequenas pápulas discretas e/ou confluentes normocrômicas, de 0,2 a 1cm, localizadas nas pregas nasolabiais, correspondendo histopatologicamente a tricoepiteliomas. São agregados de células basaloides com formação de paliçada periférica, relativamente monomórficas na derme, envoltas por estroma fibroso. Neste tumor, artefato de retração e estroma mucinoso estão ausentes.8

No nosso caso, o paciente apresentava espiradenoma écrino gigante. Esse tumor é caracterizado histologicamente por lóbulos celulares frequentemente encapsulados e circunscritos de células basaloides, preenchendo a derme. Pequenos lúmens ductais podem ser vistos nos centros dos lóbulos. Não há pleomorfismo celular, e a atividade mitótica é esparsa ou ausente. Pode haver infiltração linfocitária no tumor.8

Os tumores aparecem principalmente na segunda década de vida e seu número aumenta progressivamente com a idade. Apresentam crescimento lento e progressivo. O aumento rápido associado à ulceração e sangramento deve levantar a suspeita de transformação maligna.4,5 Os tumores malignos surgem em associação com neoplasias cutâneas benignas preexistentes em cerca de 5 a 10% dos pacientes.1,6

A síndrome de Brooke-Spiegler, o tricoepitelioma familiar múltiplo e a cilindromatose familiar compartilham achados clínicos sobrepostos. Enquanto pacientes com a síndrome de Brooke-Spiegler estão predispostos a múltiplos tumores anexiais, pacientes com cilindromatose familiar apresentam apenas cilindromas2 e aqueles com tricoepitelioma familiar múltiplo, apenas tricoepiteliomas.1

Os diferentes métodos de tratamento sugeridos para os tumores anexiais incluem excisão, dermoabrasão, crioterapia e laser de CO2. Para o espiradenoma écrino e cilindroma, a cirurgia é o tratamento de escolha.3 No caso relatado, optamos pelo tratamento cirúrgico devido à extensão da lesão e ao comprometimento estético. O tratamento cirúrgico do espiradenoma écrino é curativo.

 

CONCLUSÃO

A síndrome de Brooke-Spiegler é doença genética rara com predisposição a tumores cutâneos anexiais. Relatamos caso exuberante de espiradenoma écrino gigante associado a essa síndrome, com ótimo resultado cirúrgico.

 

AGRADECIMENTOS

A todos do Serviço de Dermatologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Taiane Medeiros Terra | ORCID 0000-0002-6479-8686
Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Flavia Tandaya Grandi Miranda | ORCID 0000-0002-4323-2499
Médica residente em Dermatologia, Serviço de Dermatologia da Universidade Federal de Goiás, Goiânia (GO), Brasil.

Luiz Fernando Froes Fleury Junior | ORCID 0000-0002-1202-6211
Mestre em Dermatologia, preceptor de Cirurgia Dermatológica do Serviço de Dermatologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás.

 

REFERÊNCIAS

1. Kazakov DV. Brooke-Spiegler Syndrome and Phenotypic Variants: An Update. Head Neck Pathol. 2016;10(2):125-30.

2. Rathi M, Awasthi S, Budania SK. Ahmad F, Dutta S, Kumar A. Brooke-Spiegler Syndrome: A Rare Entity. Case Rep Pathol. 2014;2014:231895.

3. Chen M, Liu H, Fu X, Yu Y, Yu G, Tian H, et al. Brooke-Spiegler syndrome associated with cylindroma, trichoepithelioma and eccrine spiradenoma. Int J Dermatol. 2013;52(12):1602-4.

4. Parente JNT, Schettini APM, Massone C, Parente RT, Schettini RA. Do you know this syndrome? An Bras Dermatol. 2009;84(5):547-9.

5. Kaline P, El-Azhary R. Brooke-Spiegler Syndrome with Multiple Scalp Cylindromas and Bilateral Parotid Gland Adenomas. Case Rep Radiol. 2012;2012:249583.

6. Manchanda K, Bansal M, Bhayana AA, Pandey SS. Brooke-Spiegler Syndrome: A Rare Entity. Int J Trichology. 2012;4(1):29-31.

7. Patra S, Sethuraman G, Kumar R. Turban Tumor: A Classical Presentation of Brooke-Spiegler Syndrome. Indian Dermatol Online J. 2018;9(4):284-5.

8. Brinster NK. Liu V, Diwan AH, McKee PH. Espiradenoma Ècrino. In: Brinster NK. Liu V, Diwan AH, McKee PH, editors .Dermatopatologia. Elsevier: Rio de Janeiro; 2011. p. 422.


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