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Relato de casos

Abordagem cirúrgica do lentigo maligno facial pela técnica de Spaghetti

Raíssa Rigo Garbin; Giovana Binda; Fernando Eibs Cafrune

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20181041199

Data de recebimento: 20/05/2018
Data de aprovação: 08/12/18
Trabalho realizado na Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre - Porto Alegre (RS), Brasil
Suporte Financeiro: Nenhum

Conflito de Interesses: Nenhum


Abstract

A completa remoção cirúrgica do lentigo maligno é desafiadora devido à dificuldade em determinar margens, disseminação subclínica e frequente localização facial. Neste artigo, relata-se abordagem cirúrgica de extenso lentigo maligno facial pela técnica de spaghetti, com margens livres no terceiro estágio cirúrgico. Essa técnica consiste na ressecção de margem circular periférica aos limites clínicos do tumor com avaliação histológica, sem remoção da lesão. Novas etapas incluem ampliação das margens comprometidas até que todo o perímetro esteja livre, quando então a ressecção do tumor e a reconstrução do defeito cirúrgico são realizadas simultaneamente. Objetiva atingir margens livres preservando tecido em áreas estéticas e funcionais.


Keywords: Melanoma; Neoplasias cutâneas; Procedimentos médicos e cirúrgicos de sangue


INTRODUÇÃO

No espectro do melanoma in situ, o lentigo maligno (LM) representa lesões de crescimento lento nas áreas fotoexpostas de idosos, principalmente face. Clinicamente se manifesta como manchas pigmentadas irregulares e mal delimitadas. Corresponde à hiperplasia juncional de melanócitos atípicos e pode progredir para lesão invasiva. Seu tratamento cirúrgico costuma ser desafiador. Devido à predileção por áreas estéticas e funcionais, grandes dimensões e limites imprecisos, necessita de técnicas que alcancem margens livres poupando o máximo de tecido possível. Cirurgias com controle de margens mostram as melhores taxas de cura, mas costumam exigir longa curva de aprendizado e treinamento especializado, como a cirurgia micrográfica de Mohs. Uma opção tecnicamente mais simples é a técnica de spaghetti ou procedimento de perímetro por etapas.12 Objetiva-se relatar um caso de LM facial abordado cirurgicamente pela técnica de spaghetti.

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo feminino, 86 anos, apresentou-se à consulta com mancha acastanhada, irregular e assimétrica, de 3cm no maior diâmetro, na região malar direita há um ano. À dermatoscopia, evidenciavam-se, na porção superior, área de pigmentação acinzentada granular com estruturas rombodais perifoliculares e, inferiormente, área hipocrômica sem estruturas e fluorescente ao exame com lâmpada de Wood (Figura 1). Realizada a biópsia incisional, foi confirmada a suspeita diagnóstica de LM. Devido às grandes dimensões da lesão, sua proximidade com a pálpebra inferior, bem como a necessidade de margem de segurança livre de lesão, optou-se por realizar sua exérese segundo a técnica de spaghetti.

No primeiro estágio cirúrgico, foi excisada faixa de pele perilesional de 5mm sendo que a análise histológica identificou células tumorais em todo o segmento medial, inferior e lateral, com margem superior livre (Figura 2). No segundo estágio, observou-se acometimento de 2/3 da porção inferomedial da margem excisada (Figura 3). No terceiro estágio foi realizada exérese de toda a lesão incluindo nova faixa de pele de 5mm nas áreas que não estavam livres de tumor. A reconstrução do defeito foi realizada com enxerto de pele total proveniente da região clavicular direita (Figura 4). O exame anatomopatológico final mostrou margens livres de tumor. O período pós-operatório decorreu sem intercorrências e sem sinais de infecção da ferida operatória (Figura 5). O resultado estético e funcional foram favoráveis.

 

DISCUSSÃO

A técnica de spaghetti representa alternativa no tratamento cirúrgico do LM, possibilitando análise completa das margens cirúrgicas e preservação de tecido saudável. Após estabelecidos os limites clínicos da lesão, com auxílio da dermatoscopia e lâmpada de Wood, uma faixa de pele de três a 5mm é ressecada no perímetro do tumor. A ilha central contendo o tumor macroscópico é mantida intacta, e o defeito marginal é suturado. Apesar da possibilidade teórica de implante tumoral nos tecidos adjacentes, não há evidências que sustentem esse risco. A amostra excisada é marcada em pontos cardinais e encaminhada para análise histológica. Nas áreas que mantêm positividade de células neoplásicas, nova faixa de pele é excisada e analisada subsequentemente, até que todas as margens avaliadas sejam livres de tumor. Na etapa final, a lesão é removida por completo, e o defeito cirúrgico é reconstruído, com retalho cutâneo, enxerto ou fechamento primário.1-4

Estudo realizado na França1 revisou 16 casos de LM e cinco casos de melanoma lentiginoso acral tratados pela técnica de spaghetti com média de 1,55 estágio (1-4) e taxa de controle local de 95,24% em dois anos.

Trabalho realizado em Ontário2 com 11 pacientes operados por LM encontrou média de 1,9 estágio, com ausência de recidiva após cinco meses de seguimento.

Outro estudo francês3 associou avaliação das margens por microscopia confocal de reflectância in vivo em 33 pacientes com LM submetidos à exérese segundo a técnica de spaghetti. A média de estágios foi de 1,2, com 28 casos livres de tumor já no primeiro estágio. Não foram identificadas recidivas nos dez meses de acompanhamento pós-operatório.

 

CONCLUSÃO

A técnica de spaghetti é opção confiável para tratamento do LM. Apesar de necessitar de várias sessões operacionais para concluir o procedimento, é tecnicamente mais simples do que outras modalidades cirúrgicas com controle de margens, não exigindo treinamento específico como na cirurgia de Mohs, e mantendo taxas de cura semelhantes.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Raíssa Rigo Garbin | ORCID 0000-0002-9771-1209
Aprovação da versão final do manuscrito; Concepção e planejamento do estudo; Elaboração e redação do manuscrito; Revisão crítica da literatura; Revisão crítica do manuscrito; Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Giovana Binda | ORCID 0000-0002-9127-6736
Aprovação da versão final do manuscrito; Elaboração e redação do manuscrito; Revisão crítica do manuscrito.

Fernando Eibs Cafrune | ORCID 0000-0002-6645-0122
Aprovação da versão final do manuscrito; Concepção e planejamento do estudo; Participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; Participação efetiva na orientação da pesquisa; Elaboração e redação do manuscrito; Revisão crítica da literatura; Revisão crítica do manuscrito.

 

REFERÊNCIAS

1. Gaudy-Marqueste C, Perchenet AS, Taséi AM, Magalon G, Richard MA. The "spaghetti technique": an alternative to Mohs surgery or staged surgery for problematic lentiginous melanoma (lentigo maligna and acral lentiginous melanoma). J Am Acad Dermatol. 2011;64(1):113-8.

2. Mahoney M-H, Joseph M, Temple CLF. The Perimeter Technique for Lentigo Maligna: an Alternative to Mohs Micrographic Surgery. J Surg Oncol. 2005;91(2):120-5.

3. Champin J, Perror J-L, Cinotti E, Labeille B, Douchet C, Parrau G, et al. In Vivo Reflectance Confocal Microscopy to Optimize the Spaghetti Technique for Defining Surgical Margins of Lentigo Maligna. Dermatol Surg. 2014;40(3):247-56.

4. Stonecipher MR, Leshin B, Patrick J, White WL. Management of lentigo maligna and lentigo maligna melanoma with paraffin-embedded tangential sections: utility of immunoperoxidase staining and supplemental vertical sections. J Am Acad Dermatol. 1993;29(4):589-94.


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