Débora Bergami Rosa Soares1; Fernanda Cabral1; Monisa Martins Nóbrega1; Daniel Lago Obadia1; Roberto Souto da Silva1,2
Data de recebimento: 09/08/2016
Data de aprovação: 14/08/2018
Trabalho realizado no Hospital Universitário Pedro Ernesto, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) - Rio de Janeiro (RJ), Brasil
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum
O nevo sebáceo de Jadassohn é uma neoplasia benigna geralmente presente ao nascimento. Costuma apresentar-se como pequena placa amarelada e oval no couro cabeludo e face, sendo incomum o encontro de lesões de grandes dimensões. Diante disso, os autores relatam um caso de nevo sebáceo de Jadassohn de apresentação exuberante e atípica, localizado na região fronto-parieto-occipital de uma criança do sexo masculino, associado a alopecia
Keywords: Glândulas sebáceas; Hamartoma; Nevo sebáceo de Jadassohn; Neoplasias cutâneas
O nevo sebáceo, também conhecido como nevo organóide, é um hamartoma congênito descrito em 1895 por Jadassohn, e denominado como nevo sebáceo de Jadassohn por Robinson em 1932.1 Ocorre em cerca de 0,3% dos recém-nascidos, apresentando alterações proliferativas das glândulas sebáceas, sudoríparas e folículos pilosos. Geralmente se apresenta como lesão circunscrita, de tonalidade amarelo-alaranjada com pequenas dimensões, no couro cabeludo e face.1,2 Há poucos relatos de casos demonstrando lesões múltiplas ou extensivas, sendo esta forma de apresentação incomum.2 Diante disso, relata-se um caso de paciente portador nevo sebáceo de Jadassohn com apresentação linear extensa no couro cabeludo.
Paciente masculino, branco, 6 anos, apresentou-se à consulta com placa de alopecia no couro cabeludo desde o nascimento. Negava prurido, dor ou qualquer outro sintoma. Ao exame dermatológico apresentava extensa faixa de alopecia com fios finos e claros na região têmporo-parieto-occipital direita (Figuras 1 e 2); além de placa linear estreita de superfície finamente rugosa, amarelo-alaranjada, na região temporal (Figura 3). Foi realizada biópsia por punch e no histopatológico observou-se hiperceratose, acantose regular, papilomatose, diminuição do tamanho e quantidade de folículos pilosos e glândulas sebáceas (Figuras 4 e 5). Com o diagnóstico de nevo sebáceo, os pais foram orientados quanto a benignidade da lesão, e sobre o baixo risco de malignização relatado na literatura por alguns autores. Por motivos estéticos e preocupação com exclusão social da criança, os pais solicitaram encaminhamento para a clínica de Cirurgia Plástica, que indicou correção cirúrgica através do uso de expansores, sendo esta opção terapêutica, postergada para análise futura.
A etiologia do nevo sebáceo ainda é desconhecida, porém estudos demonstram uma provável associação de comutações genéticas, especialmente relacionadas aos genes HRAS e KRAS.3 A forma de apresentação inicial típica é redonda, oval ou linear, de tamanho pequeno, em placas amarelo-alaranjadas, na região cervical, cabeça e couro cabeludo, onde causa alopecia.3 Embora a localização e morfologia das lesões do paciente pudessem chamar a atenção para este diagnóstico, as dimensões da lesão são incomuns, sendo uma forma rara de apresentação nesta faixa etária. Na puberdade, sob influência hormonal, é comum haver crescimento da lesão, tornando-a mais evidente e com superfície mais verrucosa.3,4 Os folículos pilosos são pequenos e rudimentares.4 O diagnóstico geralmente é clínico, porém a biópsia pode ser necessária, principalmente nos quadros atípicos como o do paciente em relato. O histopatológico pode variar de acordo com o tempo da lesão. Nas lesões iniciais encontram-se glândulas sebáceas subdesenvolvidas e em menor número, bem como folículos pilosos imaturos, sendo este último achado muito importante para o diagnóstico.4 Durante a puberdade, espera-se encontrar hiperplasia da epiderme e papilomatose, glândulas sebáceas dispostas superficialmente e abundantes, bem como glândulas apócrinas ectópicas.4,5 As alterações histopatológicas encontradas no caso corroboram o diagnóstico em questão ao encontrar achados clássicos, como papilomatose, diminuição no tamanho e quantidade de glândulas sebáceas e folículos pilosos. Dependendo da localização, o nevo sebáceo pode trazer apenas conseqüências inestéticas, embora na vida adulta até 15% dos casos possam estar relacionados a neoplasias benignas e malignas, sendo esta a complicação mais comum. O tumor maligno mais associado é o carcinoma basocelular, com uma incidência abaixo de 2%.5 Suspeita-se de uma possível transformação maligna nos casos de rápido crescimento, ulceração, alterações da superfície e sangramentos. No caso relatado, apesar da extensão da lesão, não se observou nenhum sinal indicativo de malignidade. As lesões benignas mais frequentemente associadas são o siringoadenoma papilífero e o tricoblastoma.5,6 O tratamento preferencial das lesões clássicas é a excisão cirúrgica de espessura total, com margens de 2 a 3 mm. A cirurgia profilática em crianças é amplamente discutível, sendo defendido por alguns autores o acompanhamento clínico e intervenção apenas em casos de modificações que sugiram malignidade.7 A cirurgia pode ser justificada por razões estéticas, já que a localização facial e no couro cabeludo com alopecia pode causar um efeito significativo sobre a aparência física; ou mesmo para evitar a formação de tumores, porém sem consenso ainda na literatura.7,8 Esta escolha irá depender da localização da lesão, idade da criança, risco cirúrgico, entre outros fatores, necessitando também de discussão cuidadosa. Quando as lesões são extensas, como no caso em relato, o uso de expansores e posterior cirurgia seria uma opção.9 Ainda discute-se no caso apresentado qual a conduta a ser tomada, visto que há perspectiva de aumento da lesão na puberdade. Outras alternativas como retalhos por rotação, cirurgia de Mohs e ablação com dióxido de carbono são relatadas como terapias alternativas em lesões pequenas.10 Deve-se estar atento, no entanto, que os tratamentos ablativos normalmente limitam-se a melhorar o aspecto superficial da lesão, sem tratar a alopecia comumente associada e sem excluir a necessidade de monitoramento quanto à malignidades a longo prazo.10 No momento da escolha terapêutica, recomenda-se avaliar não apenas o risco de malignização, mas também os prejuízos estéticos, psicossociais e funcionais que uma lesão extensiva de nevo de Jadassohn possa proporcionar em sua evolução natural.10 Atentamos para a ocorrência frequente do nevo sebáceo em crianças e adolescentes, bem como destacamos que seu diagnóstico deve ser lembrado mesmo em casos atípicos e extensos. Há poucos relatos na literatura de manifestações exuberantes do nevo organóide, sendo rara esta forma de apresentação. Ressaltamos, ainda, o importante papel da cirurgia dermatológica em casos como o relatado, onde a reconstrução estética e funcional exerce impacto positivo na qualidade de vida dos pacientes.
Débora Bergami Rosa Soares | ORCID 0000-0001-7425-9128
Planejamento, elaboração, redação e discussão do manuscrito
Fernanda Cabral | ORCID 0000-0002-0073-9310
Acompanhamento clínico do paciente. Revisão do manuscrito
Monisa Martins Nóbrega | ORCID 0000-0003-3805-5034
Acompanhamento clínico do paciente. Revisão do manuscrito
Daniel Lago Obadia | ORCID 0000-0001-9536-1615
Correlação clínica- anatomopatológica e análise diagnóstica
Roberto Souto da Silva | ORCID 0000-0001-7136-6008
Supervisão, orientação, discussão e correção do manuscrito.
1. Chi SG, Kim JY, Kim HY, Lee SJ, Kim DW, Lee WJ. Multiple Nevus Sebaceous Occurring on the Scalp and on the Contralateral Side of the Face. Ann Dermatol. 2011;23(3):389-91.
2. Aguayo R, Pallares J, Casanova JM, Barad M, Sanmartín V, Moreno S, et al. Squamous Cell Carcinoma Developing in Jadassohn's Sebaceous Nevus: Case Report and Review of the Literature. Dermatol Surg. 2010;36(11):1763-8.
3. Mahajan R, Dogra S. Extensive cerebriform nevus sebaceus: An unusual PResentation. Dermatology Online Journal. 2012;18(5):9.
4. Muñoz-Pérez MA, García-Hernandez MJ, Ríos JJ, Camacho F. Sebaceus naevi: a clinicopathologic study. Journal of the European Academy of Dermatology and Venereology. 2002;16(4):319-24.
5. Kovich O, Hale EK. Nevus Sebaceus. Dermatology Online Journal. 2005;11(4):16.
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7. Wei hsieh C, Wu YH, Lin SP, Peng CC, Ho CS. Sebaceous nevus syndrome, central Nervous system malformations, Aplasia cutis congenita, limbal dermoid, and pigmented nevus syndrome. Pediatric Dermatology. 2012;29(3):365-86.
8. Levinsohn JL, Tian LC, Boydean LM, McNiff JM, Narayan D, Loring ES, et al. Whole exome sequencing reveals somatic mutations in HRAS and KRAS which cause nevus sebaceous. J Invest Dermatol. 2013;133(3):827-30.
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