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Relato de casos

Síndrome de Favre-Racouchot: ótima resposta ao tratamento cirúrgico

Ana Luisa de Rezende Almeida1; Isis Muniz de Alencar Sampaio1; Ludmilla Cardoso Gomes1; Luisa Preisler1; Silvia Regina Martins1; Ed Wilson Tsuneo Rossoe2

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.201810311069

Data de recebimento: 13/08/2017

Data de aprovação: 21/08/2018


Trabalho realizado no Complexo Hospitalar Padre Bento de Guarulhos - Guarulhos (SP), Brasil

Suporte Financeiro: Nenhum

Conflito de Interesses: Nenhum


Abstract

A síndrome de Favre-Racouchot é caracterizada pela associação de cistos e comedões em pele cronicamente danificada pelo sol. Relatou-se caso de paciente do sexo masculino, 64 anos, com antecedentes de tabagismo e atividade laboral em lavoura; apresentava lesões nas regiões malar, zigomática e mandibular, bilateralmente, constituídas por cistos levemente eritematosos e comedões grandes em pele espessada e com sulcos profundos. Foi feito diagnóstico clínico de síndrome de Favre Racouchot e tratamento por meio de excisão cirúrgica. O objetivo deste trabalho é demonstrar uma exuberante apresentação da síndrome e seu tratamento por excisão cirúrgica.


Keywords: Dermatoses faciais; Envelhecimento da pele; Transtornos de fotossensibilidade


INTRODUÇÃO

A síndrome de Favre-Racouchot é caracterizada pela associação de cistos e comedões em pele cronicamente danificada pelo sol. Acredita-se que exista relação também com tabagismo e radioterapia.1,2 Ocorre principalmente em homens caucasianos, embora já tenha sido relatada em negros e índios.3,4

O diagnóstico é clínico, e raramente o exame histopatológico é necessário.5 Vários tratamentos já foram propostos, incluindo retinoides sistêmicos e tópicos, extração mecânica dos comedões, curetagem e cauterização, laser de CO2 e excisão cirúrgica.1,2 O caso relatado tem como objetivo demonstrar uma exuberante apresentação da síndrome e seu tratamento por excisão cirúrgica.

 

RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, 64 anos, com antecedentes de tabagismo e atividade laboral em lavoura, apresentava lesões nas regiões malar, zigomática e mandibular em ambos os lados da face, constituídas por cistos levemente eritematosos e comedões grandes em pele espessada e com sulcos profundos (figura 1). Relatava eritema, dor e saída de secreção esporadicamente nas lesões císticas. Foi feito diagnóstico clínico de síndrome de Favre Racochout. O tratamento realizado foi cirúrgico e consistiu na ressecção em elipse de grande parte das lesões (figura 2 A) seguida de sutura simples com náilon 5.0 (figura 2 B). No exame histológico foram evidenciados cistos epidérmicos e comedões múltiplos, alguns rotos, com inflamação crônica agudizada e reação gigantocelular de tipo “corpo estranho”, associada a elastose dérmica. O resultado do procedimento foi avaliado 45 dias após sua realização (figura 3).

 

DISCUSSÃO

A síndrome foi descrita pela primeira vez por Thin em 1888 e reafirmada por Favre em 1932. Em 1951, Favre e Racouchot nomearam a doença e incluíram como características a elastose solar e os cistos.1,6 A síndrome de Favre Racouchot tem prevalência estimada em 1,4% da população e incidência de 6% nos idosos maiores de 50 anos, ocorrendo principalmente em pessoas do sexo masculino com pele clara.1,7 Sua patogênese é desconhecida; a exposição crônica à radiação ultravioleta, o tabagismo e a radioterapia vêm, entretanto, sendo identificados como importantes desencadeantes, por promover atrofia cutânea, hiperqueratose folicular e formação de comedões.1,5,8 Aparentemente, a exposição solar exerce efeito agravante no desenvolvimento de cistos induzidos pelo tabagismo.9

A síndrome é caracterizada por comedões abertos e fechados, pápulas, nódulos e lesões císticas em associação com elastose solar acentuada da pele circundante, como visto no caso relatado.5 Sua localização mais frequente é a região periorbitária e temporal, podendo ter distribuição simétrica ou assimétrica, possivelmente pela exposição irregular à radiação.10-12 Além disso, pode afetar as eminências malares, região cervical, áreas retroauriculares, lóbulos da orelha e antebraços.4 Vale ressaltar que existem algumas condições relacionadas, como cutis romboidal da nuca, mixoma cutâneo, queratose actínica, carcinoma espinocelular, tricostase espinulosa, queratoacantoma e papiloma da pálpebra.4

O diagnóstico é clínico na maioria dos casos. Histologicamente, há elastose solar difusa, atrofia epidérmica, degeneração basofílica na derme superior e ausência ou diminuição do tamanho das glândulas sebáceas, que apresentam infundíbulo pilossebáceo repleto de queratina.1,8 Os principais diagnósticos diferencias incluem milio coloide, milia, siringoma e tricoepitelioma.13

As medidas para tentar barrar a progressão da doença incluem a utilização de protetores solares de amplo espectro, associada à interrupção do tabagismo. Não há consenso no tratamento da síndrome, permanecendo um desafio para o dermatologista.14

Por suas propriedades exfoliativas e de remodelação do colágeno, os retinoides tópicos (tretinoína e retinaldeído) e sistêmicos (isotretinoína oral) são citados como importantes tratamentos. Essa forma de terapia pode melhorar os comedões e facilitar sua extração.15 Uma série de casos a partir do tratamento de três pacientes com tazaroteno 0,05% gel evidenciou boa resposta, e seu principal efeito colateral foi irritação da pele no início do uso.2 Outro estudo com uso de isotretinoína oral diária (0,05-0,1mg/kg/dia) em conjunto com a tretinoína tópica também se mostrou eficaz.4

Rai et al. descreveram terapia com sucesso a partir da utilização de laser de CO2, associada à expressão manual de comedões sob anestesia local infiltrativa. Nessa série de casos, os pacientes foram seguidos durante período que variou de oito meses a três anos; dois deles necessitaram de novo tratamento no período entre dois e três anos a partir do inicial, e a recaída foi observada em mais de um ano após o tratamento primário.1 Outro estudo, incluindo 50 pacientes, realizou laser de CO2 superpulsado seguido de extração de material cístico e comedônico usando pressão suave com um par de fórceps, sem anestésicos tópicos ou intralesionais, e evidenciou resultado cosmético satisfatório.16

As opções cirúrgicas incluem dermoabrasão, curetagem ou excisão cirúrgica dos comedões e cistos.2 No caso relatado, optou-se pela excisão cirúrgica de parte das lesões devido à importante extensão do quadro, queixa de inflamação esporádica dos cistos e ao “excesso de pele”, com obtenção de excelente resultado e relevante satisfação do paciente. Existem, portanto, várias opções de tratamento com a finalidade de melhora estética e da qualidade de vida dos pacientes com síndrome de Favre Racouchot, e cabe ao dermatologista escolher a forma que mais se adeque a seu paciente.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES:

Ana Luisa De Rezende Almeida | ORCID 0000-0002-2459-6852
Revisão bibliográfica e elaboração do artigo.

Isis Muniz De Alencar Sampaio | ORCID 0000-0002-0005-9649
Revisão bibliográfica e elaboração do artigo.

Ludmilla Cardoso Gomes | ORCID 0000-0002-8165-5345
Fotografias e revisão crítica do manuscrito.

Luisa Preisler | ORCID 0000-0002-1600-9953
Fotografias e revisão crítica do manuscrito.

Silvia Regina Martins | ORCID 0000-0002-5588-0303
Revisão crítica final do manuscrito.

Ed Wilson Tsuneo Rossoe | ORCID 0000-0003-2833-8532
Participação intelectual em conduta propedêutica do caso e aprovação da versão final do artigo.

 

REFERÊNCIAS

1. Rai S, Madan V, August PJ, Ferguson JE. Favre-Racouchot syndrome: a novel two-step treatment approach using the carbon dioxide laser. Br J Dermatol. 2014;170(3):657-60.

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3. Kulkarni V. Favre-racouchot syndrome. Indian J Dermatol Venereol Leprol. 1991;57(5):244-5.

4. Patterson WM, Fox MD, Schwartz RA. Favre-Racouchot disease. Int J Dermatol 2004;43(3):167-9.

5. Sonthalia S, Arora R, Chhabra N, Khopkar U. Favre-Racouchot syndrome. Indian Dermatol Online J. 2014;5(Supl 2):S128-9.

6. Favre M, Racouchot J. Nodular cutaneous elasteidosis with cysts and comedones. Ann Dermatol Syphiligr (Paris). 1951;78(6):681-702.

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8. Lin SH, Yang YC, Chen W, Wu WM. Facial epidermal inclusion cysts are associated with smoking in men: a hospital-based case-control study. Dermatol Surg. 2010;36(6):894-8.

9. Mavilia L, Rossi R, Cannarozzo G, Massi D, Cappugi P, Campolmi P. Unilateral nodular elastosis with cysts and comedones (FavreRacouchot syndrome): report of two cases treated with a new combined therapeutic approach. Dermatology. 2002;204(3):251.

10. Moulin G, Thomas L, Vigneau M, Fiere A. Un cas unilateral d'élastose avec kystes et comédons de Favre et Racouchot. Ann Dermatol Venereol. 1994;121:721-3.

11. Stefanidou M, Ioannidou D, Tosca A. Unilateral nodular elastosis with cysts and comedones (Favre-Racouchot syndrome). Dermatology. 2001;202(3):270-1.

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13. Zhang R, Zhu W. Favre-Racouchot syndrome associated with eyelid papilloma: A case report. J Biomed Res. 2012;26(6):474-7.

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15. Mavilia L, Campolmi P, Santoro G, Lotti T. Combined treatment of Favre-Racouchot syndrome with a superpulsed carbon dioxide laser: report of 50 cases. Dermatol Ther. 2010;23(Supl 1):S4-6.

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