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Artigo Original

Diagnóstico e tratamento dos eventos adversos do ácido hialurônico: recomendações de consenso do painel de especialistas da América Latina

Ada Trindade de Almeida1; Raul Banegas2; Ricardo Boggio3; Bruna Bravo4; André Braz5; Gabriela Casabona6; Daniel Coimbra7; Silvia Espinosa8; Carolina Martinez9

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20179302

Data de submissão: 18/05/2017
Data de aprovação: 08/08/2017
Suporte Financeiro: A Allergan patrocinou a realização do Consenso e a elaboração do texto por empresa especializada, sem influenciar as decisões do painel de especialistas
Conflito de Interesses: Ada Almeida, Gabriela Casabona e Silvia Espinosa: palestrantes e membros do Advsory Board da Allergan e Merz; Raul Banegas, Ricardo Boggio, Bruna Bravo, André Braz e Carolina Martinez: palestrantes e membros do Advsory Board da Allergan

Abstract

Introdução: Na última década, o uso do preenchimento com ácido hialurônico para aprimoramento facial aumentou na América Latina. O preenchimento com ácido hialurônico é considerado seguro com baixa incidência de eventos adversos. Como eventos adversos são pouco observados na prática clínica ou têm sido possivelmente sub-relatados são necessárias mais orientações para diagnosticar e tratar eventos adversos relacionados ao ácido hialurônico. Objetivo: Compreender melhor os eventos adversos relacionados ao ácido hialurônico e propor recomendações para o diagnóstico e tratamento. Métodos: Reunião em painel de 25 especialistas médicos multidisciplinares da América Latina foi realizada em São Paulo, Brasil, para discutir o que se conhece sobre eventos adversos relacionados ao ácido hialurônico e fornecer conhecimentos baseados na experiência clínica. Por meio de consenso, foram desenvolvidos recomendações e algoritmos. Resultados: O painel categorizou eventos adversos relacionados ao ácido hialurônico baseado em três momentos de início (imediato, precoce e tardio) e propôs um novo termo para eventos adversos que apresentam edema tardio intermitente persistente ("Etip"). Foram criados algoritmos para diagnóstico e tratamento em cada momento. Conclusões: Novos algoritmos consensuais para diagnósticos e tratamentos associados ao momento de início dos eventos adversos relacionados ao ácido hialurônico orientarão melhores práticas no uso clínico do preenchimento com ácido hialurônico.


Keywords: TÉCNICAS COSMÉTICAS; AGENTES DE PREENCHIMENTO DÉRMICO; ÁCIDO HIALURÔNICO; INFLAMAÇÃO; INJEÇÕES SUBCUTÂNEAS


INTRODUÇÃO

O uso de procedimentos cosméticos minimamente invasivos está crescendo rapidamente na América Latina e ao redor do mundo. A injeção de ácido hialurônico (AH) está entre os procedimentos cosméticos mais populares para rejuvenescimento facial, restabelecimento de volume e melhora de volume facial estético.1 À medida que as indicações para esses produtos se expandem, o número de procedimentos aumenta e os paradigmas de tratamento evoluem (por exemplo, novos produtos, técnicas de estratificação e maiores volumes de injeção), há a necessidade de mais conscientização e compreensão a respeito dos eventos adversos (EAs) que podem surgir como consequência do seu uso.1,2

Os perfis de segurança dos preenchimentos com AH injetáveis geralmente são considerados favoráveis, com baixas incidências de EAs.1 Como tais EAs são raros, alguns clínicos podem não os encontrar frequentemente nas suas práticas e, portanto, não ter experiência em reconhecê-los, diagnosticá-los, administrá-los e tratá-los. Além disso, há relativamente pouca evidência clínica sobre a abordagem apropriada para EAs relacionados ao AH.1 Considerando essa falta de evidência clínica e a necessidade de claras estratégias de diagnóstico e tratamento, foi realizada uma reunião em painel de especialistas para discutir os EAs relacionados ao AH e desenvolver recomendações para profissionais que tratem pacientes com preenchimentos injetáveis de AH.

 

OBJETIVOS E METODOLOGIA DO CONSENSO

Em maio de 2016, em São Paulo, Brasil, um painel multidisciplinar latino-americano foi reunido visando discutir e desenvolver diretrizes para apropriadamente identificar e tratar EAs relacionados à injeção de AH na medicina estética. Compareceram à reunião 25 especialistas, incluindo dermatologistas, cirurgiões plásticos, radiologistas, um patologista e um imunologista, dos países Brasil, México, Argentina e Colômbia.

Os objetivos da reunião de consenso eram:

Analisar a evolução da compreensão, incidência e descrição dos EAs relacionados ao AH;

Fornecer uma classificação que permita a imediata identificação dos EAs relacionados ao AH;

Fornecer conhecimento sobre o diagnóstico e o tratamento de EA relacionados ao AH com base na experiência clínica;

Alcançar consenso e recomendar algoritmos sobre o diagnóstico e o tratamento de EAs relacionados ao AH.

A metodologia de consenso incluiu questionários circulados entre os especialistas e, em seguida, apresentações e discussões no painel. Foram discutidos exemplos da literatura recente sobre EAs associados com preenchimentos com AH e seu tratamento. Todos os participantes foram envolvidos na criação de algoritmos e tabelas. A votação foi conduzida pelo moderador, e o consenso foi alcançado quando pelo menos dois terços dos participantes concordaram.

As recomendações específicas apresentadas neste artigo representam o parecer do painel de especialistas com base na sua experiência coletiva.

Visão geral dos EAs relacionados ao AH

A literatura disponível sobre os EAs relacionados ao AH consiste de estudos retrospectivos, relatórios de casos e pareceres de especialistas.

 

EVOLUÇÃO

A compreensão dos EAs relacionados ao AH evoluiu durante os últimos 15 anos. Em 2002, EAs relacionados ao AH eram tidos como decorrentes de impurezas de fermentação bacteriana.3 Percebeu-se, em 2005, que o mesmo EA clínico poderia ter dois tipos de padrão histológico via um processo inflamatório granulomatoso ou não granulomatoso.4 Isso levantou uma dúvida sobre diferentes etiologias quando a mesma manifestação clínica era observada. Em 2009, sugeriu-se a classificação dos nódulos (não dolorosos/dolorosos ou inflamatórios/não inflamatórios).5 Em 2010, o importante papel dos biofilmes nas complicações dos agentes de preenchimento começou a receber atenção.6 De 2009 a 2015, alguns autores publicaram revisões sobre o tratamento de EAs relacionados ao AH com hialuronidase.7-9 Durante esse período (2014), cegueira10 e complicações vasculares 11 foram relatadas como EAs relacionados ao AH.

 

INCIDÊNCIA

Em artigo de Friedman et al., a incidência de EAs relacionados ao AH foi estimada em 0,15% em 1999 e 0,06% em 2000.3 Essa diminuição aparente pode ter sido causada pela disponibilidade de matéria-prima de AH mais purificada. Em 2015, a incidência de EAs foi estimada em 0,5% em análise gráfica retrospectiva de 4.702 pacientes.12 Um membro do painel apontou que o artigo de Friedman3 continha dados pós-comercialização enquanto outros relatórios poderiam vir da experiência dos médicos que realizam as injeções e representar os aumentos mais recentes das indicações de AH.

 

DESCRIÇÃO

As complicações do AH são descritas frequentemente com diferentes terminologias que mudaram ao longo dos anos. Alguns dos EAs mais comuns relatados no início dos anos 2000 eram hipersensibilidade, edema não relacionado à hipersensibilidade, infecções, hematomas e equimose, eritema persistente, alterações na pigmentação, sobrecorreção, necrose (isquemia) e lesões papulopustulosas.13 À medida que mais pacientes receberam tratamentos de preenchimento com AH, respostas no local da injeção, localização inapropriada, sensibilidade ao produto, infecções e necrose também foram observadas.14 No final da década (2009), expressões como sobrecorreção, visibilidade do implante, comprometimento vascular, nódulos, angioedema, eritema e telangiectasia foram usados para descrever EAs.15 Como a percepção de EAs evoluiu, descrições adicionais ganharam proeminência, incluindo localização inadequada, reações locais tardias imunomediadas, reações de hipersensibilidade, infecção local e EAs sistêmicos.16 Outras expressões foram usadas para descrever EAs, incluindo manchas roxas, edema, descoloração da pele, infecção, massas nodulares, parestesia e comprometimento vascular.2

De acordo com Alijotas-Reig et al.,17 EAs frequentemente iniciam-se como reações teciduais alérgicas granulomatosas que progridem para abscessos, reações granulomatosas localizadas, nódulos semelhantes a abscessos, reações granulomatosas tardias, abscessos estéreis, nódulos de corpo estranho ou reações de início tardio. Um dos membros do painel destacou que diferentes descrições de EA são provavelmente relacionadas à mesma condição médica/clínica e, portanto, é necessária uma terminologia consistente.

Outros aspectos dos EAs relacionados ao AH

Achados anatômicos, patológicos, histológicos, imunológicos e radiológicos podem ajudar a informar o diagnóstico e o tratamento de EAs relacionados ao AH. A partir de perspectivas anatômicas e patológicas, agentes de preenchimento absorvíveis, como o AH, estão associados com EAs em um de três diferentes padrões de inflamação: (1) supurativa, (2) reação de hipersensibilidade e (3) granuloma de corpo estranho. Os principais achados histológicos relevantes para o AH incluem: ferro coloidal, que pode ser usado como uma coloração específica para AH; eosinofilia, que é um padrão típico com a avaliação histopatológica de EAs relacionados ao AH, mas normalmente não ocorre com outros agentes de preenchimento (observe que o AH não pode ser observado nesse achado histológico); e AH encapsulado, que pode ser observado em achados histopatológicos de granulomas de corpo estranho com células gigantes multinucleadas.

A partir de uma perspectiva imunológica, há a ausência de evidências de alto nível para examinar os efeitos dos preenchimentos com AH. Uma exceção foi um estudo de 2007 realizado por Hamilton et al.18 em 433 participantes que confirmou que o AH não animal estabilizado não foi imunogênico considerando a resposta imune humoral, pois não houve ativação de anticorpos IgG e IgE após a injeção de AH. Contaminação bacteriana e imunodeficiência foram observadas como fatores que poderiam contribuir para a inflamação nas condições de injeção de preenchimento com AH.

A partir de uma perspectiva radiológica, o ultrassom é método confiável para exames dermatológicos, incluindo a investigação de EAs resultantes dos agentes de preenchimento.19 O ultrassom pode ajudar a identificar agentes de preenchimento cosméticos, caracterizar o EA e atuar como um guia para a injeção de hialuronidase. Os agentes de preenchimento são sonograficamente distintos, e o AH aparece como um pseudocisto anecoico redondo ou oval. Wortsman et al.20 descreveram métodos padronizados para o uso de ultrassom em dermatologia.

Classificação dos EAs do AH: Retrospecto

Há algumas classificações de EAs relacionados ao AH descritas na literatura, as quais normalmente se relacionam ao tempo. A definição ou corte temporal deve ser bem demarcada para diagnósticos e tratamentos precisos dos EAs. Um membro do painel forneceu exemplos de classificações relacionadas ao tempo a partir da literatura publicada. Em 2009, Narins et al. descreveram as classificações de EAs relacionadas ao tempo, como início imediato, início intermediário (duas semanas a um ano) e início tardio (depois de um ano).5 Também em 2009, Sclafani et al. utilizaram um esquema de classificação alternativo: imediato (0-2 dias), precoce (3-14 dias) e tardio (>14 dias).15 Em 2010, Rohrich et al.6 propuseram uma estratégia de classificação que envolvia intervalos de tempo maiores (≥14 dias): precoce (<14 dias), tardio (14 dias-1 ano) e retardado (>1 ano). Cassuto e Sundaram (2013)21 descreveram uma classificação de EA subdividida em escala de tempo similar à de Scalfani et al.: aguda (48 horas), subaguda (≤2 semanas) e tardia (>2 semanas). Funt e Pavicic propuseram um esquema de classificação mais generalizado: eventos precoces (em até alguns dias) e tardios (de semanas a anos).2 É evidente a necessidade de um esquema de classificação baseado em tempo consistente. Em 2014, Signorini e colegas reuniram um painel que propôs um esquema de classificação mais generalizado: reações precoces e reações tardias.1 O intervalo de tempo dessas classificações não foi especificado.

Diagnóstico e tratamento: Histórico

Tratamento dos EAs relacionados ao AH

O painel considerou que o tratamento dos EAs mudou ao longo dos anos - anteriormente, a imunomodulação era considerada o tratamento primário, pois os EAs relacionados ao AH eram predominantemente reações de hipersensibilidade;3 também reconheceu que a biópsia desempenha função importante no diagnóstico e no tratamento de EAs relacionados ao AH;4 concluiu, entretanto, que pacientes buscando tratamento estético podem não consentir a biópsia a menos que seja absolutamente necessária e que um processo médico judicial é sempre justificado.

A respeito do uso de hialuronidase para nódulos inflamatórios, questionou-se se a hialuronidase deve ser utilizada apenas na dissolução do AH (conforme descrito abaixo)22 ou se ela pode ser usada para a quebra da matriz do biofilme. A primeira evidência publicada de biofilmes relacionados aos agentes de preenchimento baseou-se na recuperação de bactérias a partir de lâminas histológicas.23 O painel considerou se cultura bacteriana seria um método eficaz para diagnosticar a presença de bactéria. Embora relatos de cultura bacteriana negativa sejam encontrados comumente na prática clínica, novas evidências indicam que um método mais sofisticado (por exemplo, reação em cadeia da polimerase, fluorescência com hibridização in situ) pode identificar bactérias nos casos em que os resultados da cultura bacteriana forem negativos.24,25 Historicamente, tem havido inconsistência na literatura sobre o antibiótico utilizado e a duração do tratamento para biofilmes relacionados ao uso de preenchedores com AH. Um membro do painel propôs que a antibioticoterapia para biofilmes devesse continuar durante pelo menos três meses.16 Estudos pré-clínicos demonstram que a antibioticoterapia pode ser utilizada como medida preventiva contra a formação de biofilmes,26 e alguns estudos sugerem antibióticos profiláticos para prevenir biofilmes.6,25

Hialuronidase

A hialuronidase degrada enzimaticamente o AH por meio de clivagem específica entre o C1 da porção glucosamina e o C4 do ácido glicurônico.27,28 A maioria dos países da América Latina não tem hialuronidase com aprovação regulatória disponível para o uso injetável. Mesmo nos países em que o produto está disponível, ele não está aprovado especificamente para uso na condição de preenchimento com AH. A hialuronidase é rapidamente inativada quando administrada por via intravenosa.29 Quando a hialuronidase é administrada por via subcutânea, leva de 24 a 48 horas para que ocorra o restabelecimento da barreira dérmica removida pelo composto.28

A hialuronidase utilizada na América Latina é mais comumente obtida a partir de farmácias de manipulação e não está aprovada pelas agências regulatórias. No Brasil, por exemplo, a mais frequentemente utilizada é a Hialuronidase 2.000U-Biometil (origem: testicular bovina purificada). As hialuronidases a seguir apresentam aprovação regulatória especificamente para injeção oftalmológica nos países listados: Vitrase® (Bausch + Lomb; origem: testicular ovina purificada; aprovada nos EUA e no Canadá); Hylenex® (Halozyme Therapeutics; origem: humana recombinante produzida em células de ovário de hamster chinês; aprovada nos EUA e no Canadá); Hyalase® (Sanofi-Aventis; origem: testicular bovina purificada; aprovada nos EUA, Canadá e Europa); e Reductonidasa® (Advanced Cosmeceuticals; origem: testicular bovina purificada; disponível para uso na Europa).28,30,31

Um membro do painel informou o grupo sobre usos conhecidos da hialuronidase fora da indicação aprovada para EAs relacionados ao AH de acordo com o tempo transcorrido para o início da reação: 1) para EAs de início precoce (um corte de 15 dias foi proposto com base na experiência clínica), a hialuronidase tem uso conhecido no tratamento de sobrecorreção/deslocamento, oclusão vascular, hipersensibilidade (reação de hipersensibilidade tipo IV) e angioedema (reação de hipersensibilidade tipo I); 2) para EAs de início tardio (ocorrência depois de 15 dias) a hialuronidase tem uso conhecido no tratamento de nódulos não relacionados ao AH (o uso de hialuronidase é eficaz mesmo quando o agente de preenchimento não é o AH, mas o mecanismo é desconhecido) ou nódulos relacionados ao AH, migração do implante (mesmo para agentes de preenchimento que não sejam o AH), efeito Tyndall, infecção crônica por biofilme (mesmo para agentes de preenchimento não relacionados ao AH), e reação granulomatosa (mesmo para agentes de preenchimento não relacionados ao AH). Na literatura publicada, a dose e o intervalo de repetição da administração da hialuronidase diferem entre as publicações e não há protocolo padronizado. Um dos usos mais comuns para hialuronidase descritos na literatura é para o tratamento de sobrecorreção.9,32

Fatores que influenciam o início de EAs relacionados ao AH

O painel discutiu alguns fatores importantes a respeito do início do EA. Em termos de técnica de injeção, uso de agulha em leque, injeção rápida, taxas de fluxo rápidas e volumes mais altos podem aumentar a incidência de EAs relacionados ao AH.33 O uso de agulhas de maior calibre pode minimizar o trauma e, portanto, reduzir a taxa de complicações. A importância dos agentes antissépticos para prevenir contaminação bacteriana e formação de biofilme foi discutida na literatura.6 Há evidências sobre a eficácia de agentes antissépticos na prevenção de contaminação bacteriana, embora os antissépticos ainda sejam subutilizados. Além disso, os médicos ainda não concordam em relação ao melhor agente antisséptico (por exemplo, clorexidina) a ser utilizado antes da injeção. A posição anatômica dos agentes de preenchimento (por exemplo, subcutânea versus supraperiosteal)34 também foi discutida como um possível fator que poderia influenciar a taxa de ocorrência de EAs relacionados ao AH.

 

RESULTADOS

Classificação de EAs: recomendações do painel

O primeiro objetivo abordado pelo painel de especialistas foi construir uma classificação para organizar o diagnóstico e o tratamento de EAs relacionados ao AH. O painel concordou que a classificação deve ser relacionada ao tempo, pois o tempo para o surgimento do EA foi considerado a informação mais importante que um paciente pode fornecer ao clínico. O painel definiu o início do aparecimento do EA em três intervalos de tempo: início imediato (início em até 24 horas), início precoce (início de 24 horas até 30 dias) e início tardio (início depois de 30 dias). Definiu também os sinais e sintomas mais comumente observados em cada intervalo de tempo. A respeito dos EAs relacionados ao AH de início tardio, o painel propôs também o uso da expressão "edema tardio intermitente persistente" (Etip), definido como um edema ou inchaço que ocorre na localização do agente de preenchimento ou adjacências. Foi observado que gatilhos tais como vacinação, infecção ou trauma local são normalmente observados e são causas frequentes de edema.

A classificação recomendada do painel e uma listagem de possíveis sinais e sintomas estão apresentadas na tabela 1. Os possíveis diagnósticos estão apresentados na tabela 2.

Diagnóstico e tratamento: Recomendações do painel e algoritmos

Uma vez estabelecidos os possíveis diagnósticos para cada intervalo, o painel discutiu tratamento e exames necessários para diagnóstico e acompanhamento individuais com base na literatura publicada e experiência pessoal. Esta seção resume as recomendações de consenso do grupo, as opiniões de especialistas e os algoritmos considerados pelo painel para representar as melhores práticas de tratamento para cada diagnóstico. Esses algoritmos foram construídos levando-se em conta os diagnósticos listados na tabela 2 para cada classificação relacionada ao momento de início da reação: início imediato (início em até 24 horas), início precoce (início em 24 horas a 30 dias) e início tardio (início após 30 dias).

EAs de início imediato

O algoritmo para diagnóstico e tratamento de EAs relacionados ao AH de início imediato está mostrado na figura 1. O painel enfatizou a importância do diagnóstico clínico para alterações vasculares. Se alterações vasculares forem clinicamente identificadas, é obrigatório o tratamento imediato conforme delineado na figura 1. Recomendações de exames de acompanhamento para as alterações vasculares de início imediato incluem a consideração de ultrassom e avaliação oftalmológica e/ou neurológica se aplicáveis. O painel também observou que reações alérgicas graves (por exemplo, suspeita de anafilaxia) precisam de tratamento imediato com adrenalina. Fez também recomendações de tratamento para outras reações de início imediato menos graves, mas não chegou a consenso sobre o tratamento da equimose.

EAs de início precoce

O algoritmo para o diagnóstico e tratamento de EAs relacionados ao AH de início precoce está exposto na figura 2 e para a formação de nódulos relacionada a AH de início precoce, na figura 3. Os exames diagnósticos incluem: avaliação de alterações sistêmicas, exames de hemograma, proteína-C reativa e velocidade de hemossedimentação (VHS); ultrassom, cultura (aspirados) e biópsia (o tecido deve também ser enviado para cultura) são recomendados para ocorrências de nodulação. Sempre que possível, uma biópsia deve ser realizada antes que a terapia antibiótica seja iniciada. O painel também observou que, se uma biópsia for realizada, o tecido também deverá ser enviado para cultura, pois a sensibilidade do patógeno é maior no tecido do que nos aspirados. Dependendo do tipo de teste necessário, deve ser considerada uma técnica de coloração específica para cada biópsia. Essas técnicas de coloração incluem: hematoxilina e eosina, ferro coloidal (para identificar AH), coloração Ziehl-Neelsen (para micobactérias), metenamina de prata, ácido periódico-Schiff (periodic acid–Schiff, PAS) e Grocott metenamina de prata (para fungos). Ultrassom também foi recomendado como técnica para o diagnóstico diferencial de reações de corpos estranhos não inflamatórias, acúmulo de produto e para a detecção de EAs vasculares. As recomendações de tratamento incluem o uso de antibióticos, agentes anti-inflamatórios não esteroides, corticoesteroides ou hialuronidase.

EAs de início tardio

O algoritmo para diagnóstico e tratamento de EAs relacionados ao AH de início tardio consta da figura 4. Deve ser observado que o algoritmo para o tratamento desses EAs não foi discutido explicitamente durante a reunião, mas os membros do painel concordaram em utilizar uma abordagem similar ao algoritmo para EA de início precoce. O painel discutiu a formação de nódulos de início tardio (Figura 5). E observou que um tratamento similar deve ser realizado para infecção supurativa (abcesso) e não supurativa (biofilme) e também para reações de corpo estranho não infeccioso inflamatórias no caso de EAs de início tardio, pois as manifestações clínicas são similares.

Considerações para prevenção de EAs

Com base na literatura e na experiência clínica, o painel recomendou clorexidina com base de álcool para antissepsia, que, entretanto,deve ser utilizada cuidadosamente na região periocular em decorrência do risco de irritação/lesão ocular. Clorexidina em solução aquosa pode ser considerada.

Zonas de alto risco para agentes de preenchimento foram apontadas como as áreas irrigadas pelos ramos internos da artéria carótida (por exemplo, supraorbital e supratroclear), áreas com extensas anastomoses vasculares (por exemplo, artéria temporal superficial com artéria supraorbital e artéria supraocular; artéria infraorbitária com artéria angular) e áreas nas quais as artérias emergem do forame craniano (supraorbital, supratroclear e região mentoniana). Essas zonas de alto risco são o sulco nasolabial, região glabelar e dorso nasal. As recomendações sobre a injeção de AH para zonas de alto risco estão apresentadas na tabela 3.

 

CONCLUSÃO

Esta reunião de um painel de consenso de especialistas da América Latina gerou conhecimento sobre o diagnóstico e tratamento de EAs relacionados ao AH. O AH é considerado opção de tratamento estético geralmente segura e com baixa incidência de EAs. O painel criou recomendações baseadas em algoritmos para diagnóstico e tratamento em relação ao momento de início da reação: início imediato (em até 24 horas), início precoce (de 24 horas a 30 dias) e início tardio (após 30 dias). Foram definidos os sinais e sintomas observados mais frequentemente e possíveis diagnósticos em cada intervalo de tempo. O painel também propôs Etip como nova designação para um EA de "edema tardio intermitente persistente" ocorrendo na localização do agente de preenchimento ou em suas adjacências. Exames para diagnóstico e acompanhamento também foram definidos, e foram feitas recomendações para etapas com a finalidade de prevenir os EAs relacionados ao AH de ocorrência mais comum.

Os recentes aumentos do uso e das indicações para o AH enfatizam a importância dos conhecimentos gerados pelo Painel de Especialistas da América Latina. Suas recomendações de consenso fornecem suporte para clínicos que utilizam preenchimento com AH e podem servir para minimizar a ocorrência e facilitar o tratamento de EAs relacionados ao AH.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam seus agradecimentos aos outros membros do Painel de Especialistas de Eventos Adversos do Ácido Hialurônico: Dra. Bertha Tamura, Roseli Andrade: palestrantes da Merz; Christine Guarnieri, Meire Parada, Rodrigo Ferraz: palestrantes da Galderma; Eliandre Palermo, palestrante da Galderma e da Merz. Maria Helena Sandoval, Fernanda Cavallieri, Márcio Bouer, Eduardo Finger e Gregório Pereira: sem conflitos de interesse.

 

DECLARAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO:

Ada Trindade de Almeida:
Participacao intelectual organização e revisão

Raul Banegas:
Participacao intelectual, debates

Ricardo Boggio:
Participacao intelectual, debates

Bruna Bravo:
Participacao intelectual, debates

André Braz:
Participacao intelectual, debates e apresentações

Gabriela Casabona:
Participacao intelectual, debates e apresentações

Daniel Coimbra:
Participacao intelectual, debates

Silvia Espinosa:
Participacao intelectual, debates

Carolina Martinez:
Participacao intelectual, debates

O texto foi escrito por empresa especializada e revisado por todos os autores.

 

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