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Artigo Original

Eletrocirurgia de alta frequência em cicatrizes do tipo ice-picks: estudo comparativo prévio e posterior ao tratamento

Carlos Roberto Antonio1; Lívia Arroyo Trídico2; Cíntia Maria Garcia Marchi3; João Roberto Antonio4; Solange Corrêa Garcia Pires D'Ávila5

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.201792917

Data de recebimento: 17/10/2016
Data de aprovação: 02/06/2017
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

Introdução: Cicatrizes de acne são causa frequente de consulta ao dermatologista, ocorrendo como resultado do processo inflamatório da acne vulgar. As cicatrizes atróficas são as mais comuns, podendo apresentar-se como superficiais, médias ou profundas. Existem várias opções de tratamento para cicatrizes atróficas profundas, porém, geralmente, apresentam eficácia limitada, efeitos colaterais indesejáveis e custo elevado.
Objetivo: Avaliar o tratamento de cicatrizes atróficas profundas com eletrocirurgia de alta frequência.
Métodos: Dez pacientes com cicatrizes de acne atróficas profundas receberam três sessões de tratamento com eletrocirurgia de alta frequência com intervalos de um mês entre elas. Um mês após a última sessão foram avaliados: aspectos histológicos de cicatrizes selecionadas, antes e um mês após a última sessão; opinião dos pacientes classificando os resultados em piora, ausência de melhora ou melhora das lesões; e avaliação de fotografias padronizadas antes e um mês após a última sessão, por médico não vinculado à pesquisa que também classificou os resultados em piora, ausência de melhora ou melhora das lesões.
Resultados: Na análise histológica foi evidenciada redução de fibrose local; na opinião de todos os pacientes o resultado evidenciou melhora das lesões; todos também apresentaram melhora clínica das lesões avaliadas por dermatologista.
Conclusão: A eletrocirurgia de alta frequência é método simples, de baixo custo e eficaz no tratamento de cicatrizes de acne atróficas e profundas.


Keywords: CICATRIZ; ACNE VULGAR; ELETROCIRURGIA


INTRODUÇÃO

A acne é condição comum que afeta cerca de 80% dos adolescentes.1 Como resultado do processo inflamatório que ocorre na acne vulgar, podem surgir cicatrizes permanentes,2 que acometem até 95% dos pacientes com acne. Sua causa está associada tanto à severidade do quadro como à demora em iniciar tratamento.3 As cicatrizes atróficas deprimidas são classificadas em não distensíveis (superficiais, médias e profundas) e em distensíveis.4 Constituem o tipo mais comum e ocorrem devido à ação de mediadores inflamatórios e degradação enzimática das fibras de colágeno e da gordura do subcutâneo, resultando em lesões, muitas vezes com fundo esbranquiçado devido à fibrose profunda.5

De acordo com a profundidade do dano as cicatrizes atróficas não distensíveis podem ser superficiais, médias ou profundas sendo as últimas conhecidas como ice picks (até 1mm de diâmetro) ou distróficas (acima de 1mm). Comprometem toda a derme e atingem o subcutâneo.4 As diversas opções de tratamento para esse tipo de cicatriz incluem peeling químico, dermabrasão, lasers fracionados ablativos e não ablativos, excisão com punch, enxertos, subcisão e métodos combinados, porém geralmente estão associados a eficácia limitada, efeitos colaterais indesejáveis e custo elevado.1

A procura de tratamento para cicatrizes de acne é causa frequente de consulta ao dermatologista, uma vez que há impacto negativo na qualidade de vida dos pacientes acometidos.6 Sabe-se que as cicatrizes de acne estão associadas a frustração, tristeza, ansiedade, constituindo, até mesmo, fator de risco para suicídio.7

Diante disso, a fim de encontrar nova opção de tratamento para as cicatrizes de acne atróficas e profundas, avaliamos o uso da eletrocirurgia de alta frequência (Ecaf) aplicada com agulha pontualmente na cicatriz a fim de promover retração imediata e diminuição da fibrose local. O método é simples, de baixo custo, fácil aplicação e apresenta resultados positivos ao destruir a cicatriz, diminuir seu diâmetro e estimular a regeneração tecidual local.

 

MÉTODOS

Trabalho prospectivo, não randomizado em que foram selecionados para tratamento com Ecaf dez pacientes do Ambulatório de Cirurgia Dermatológica da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) diagnosticados clinicamente com cicatrizes de acne atróficas profundas (Figura 1). Os pacientes selecionados não apresentavam acne ativa ou, eventualmente, apresentavam apenas lesões de grau I. Foram excluídos da seleção portadores de lesões de acne de grau mais elevado. Os pacientes não estavam recebendo nenhum tipo de tratamento para cicatrizes; usavam protetor solar e, para controle de oleosidade facial, apenas sabonete.

Os pacientes selecionados receberam tratamento com Ecaf realizada através de ponteira fina, em formato de agulha. A aplicação foi feita com aparelho Wavetronic® (Loktal, São Paulo, Brasil) de forma que a ponteira em agulha ou uma agulha 30G (13 x 0,3mm) foi posicionada no centro da cicatriz atrófica, pressionando a pele, acionando-se a seguir a corrente com potência cicatrizes selecionadas para estudo anatomopatológico, antes e um mês após a última sessão; opinião dos pacientes avaliada de forma subjetiva, classificando-se os resultados em piora, ausência de melhora ou melhora das lesões; avaliação de fotografias padronizadas antes e um mês após a última sessão. As imagens de 5W, estando o aparelho no modo Blend/Low Blend (Figuras 2 e 3). Imediatamente após a descarga elétrica ocorreram retração, elevação e branqueamento da cicatriz (Figuras 4 e 5).

Foram realizadas três sessões em cada paciente com intervalos de um mês. Os métodos de avaliação foram: biópsias de foram avaliadas por médico não vinculado à pesquisa que também classificou os resultados em piora, ausência de melhora ou melhora das lesões.

 

RESULTADOS

A análise objetiva das fotografias realizada por dermatologista não vinculado à pesquisa classificou todos os pacientes com melhora das cicatrizes. Observaram-se redução da fibrose local e elevação da cicatriz após o procedimento (Figura 6).

Além disso, na pesquisa de opinião dos pacientes, todos classificaram o resultado final em melhora das lesões.

Após a sessão de eletrocirurgia, houve leve eritema local e posterior formação de discreta crosta na cicatriz que se resolveu no intervalo de sete a nove dias após o procedimento. Os pacientes foram orientados a não manipular as crostas e utilizar filtro solar no local.

No estudo anatomopatológico das biópsias realizadas antes do procedimento, observaram-se fibrose e infiltrado inflamatório linfocitário perivascular e perianexial na derme superior e média (Figura 7). Na biópsia realizada um mês após a última sessão de tratamento observamos apenas atrofia epidérmica, sendo que a derme se manteve sem alterações com ausência de fibrose e de infiltrado inflamatório (Figura 8).

 

DISCUSSÃO

A Ecaf é procedimento simples e antigo que faz parte da rotina da maioria dos dermatologistas, uma vez que é utilizada para tratar diversas patologias cutâneas há mais de 50 anos. Funciona por meio de onda eletromagnética de alta frequência que ao ser levada ao tecido transforma-se em calor devido à resistência local, resultando em ebulição da água intracelular que provoca o rompimento da célula por aumento de pressão interna, o que, por sua vez, gera corte e coagulação no tecido.4,8,9

Dessa maneira, quando se aplica a Ecaf na cicatriz de acne atrófica e profunda o que ocorre é a destruição da fibrose local e consequente remodelamento tecidual, o que pode ser constatado nas biópsias realizadas após o procedimento.

Para tratar as cicatrizes atróficas existem outras opções, mais simples e de menor custo que a laserterapia, porém podem estar associadas a alguns efeitos colaterais indesejáveis. A técnica Cross (chemical reconstruction of skin scars) consiste na aplicação de ácido tricloroacético pontuado nas cicatrizes atróficas a fim de estimular a neocolagênese; devido às altas concentrações do ácido utilizadas, entretanto, essa técnica pode estar associada a eventos adversos, tais como hipopigmentação, hiperpigmentação e formação de cicatrizes residuais na pele normal ao redor da cicatriz inicial.10,11

A técnica com microenxertos de pele total realizados com minipunchs consiste na excisão das cicatrizes atróficas por meio de punchs e implantação de microenxertos no local da excisão. A cicatriz é descartada e substituída por um enxerto de pele ligeiramente maior, em geral retirado da área retroauricular. Alguns enxertos se adaptarão ao nível da superfície da pele, outros permanecerão elevados, sendo muitas vezes necessária nova intervenção terapêutica para sua nivelação.12

A aplicação de Ecaf com a ponteira em agulha permite que a ação da eletrocirurgia seja restrita ao local da fibrose, evitando possíveis complicações secundárias à aplicação em pele sã ao redor da lesão e mostrando-se segura também em fototipos mais elevados. Sendo assim, foi possível observar em nosso estudo, por meio de método de fácil aplicação e baixo custo, uma nova opção de tratamento eficaz para uma das maiores causas de consultas em dermatologia: cicatrizes de acne.

 

CONCLUSÃO

Com base nos casos relatados, podemos concluir que a Ecaf se mostrou eficaz e segura no tratamento de cicatrizes de acne atróficas e profundas. Dessa forma, constitui uma opção de tratamento mais acessível tanto para pacientes quanto para médicos, pois é tecnologia amplamente utilizada pelos dermatologistas em consultório e pode contribuir no tratamento de uma queixa importante e com considerável impacto psicossocial.

 

DECLARAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO:

Carlos Roberto Antonio:

Orientação do trabalho
Idealizador da técnica utilizada

Lívia Arroyo Trídico:

Acompanhamento dos pacientes
Redação do artigo

Cíntia Maria Garcia Marchi:

Realização do procedimento nos pacientes selecionados

João Roberto Antonio:

Chefe do ambulatório de Dermatologia em que foi realizado o trabalho

Solange Corrêa Garcia Pires D'Ávila:

Análise histopatologica das biópsias realizadas antes e após o procedimento

 

Referências

1. Gozali MV, Zhou B. Effective treatments of atrophic acne scars. J Clin Aesthet Dermatol. 2015;8(5):33-40.

2. Fabbrocini G, Annunziata MC, D'Arco V, De Vita V, Lodi G, Mauriello MC, Pastore F, Monfrecola G. Acne scars: pathogenesis, classification and treatment. Dermatol Res Pract. 2010;2010:893080.

3. Goodman GJ. Postacne scarring: a review of its pathophysiology and treatment. Dermatol Surg. 2000;26(9):857-71.

4. Palermo EC. Eletrocirurgia de Alta Freqüência (ECAF). Ipele Dermatologia livro online. São José do Rio Preto: Ipele Network; 2002 [cited 2016 Oct 10]. Available from: https://www.ipele.com.br/livro/

5. Fife D. Practical evaluation and management of atrophic acne scars: tips for the general dermatologist. J Clin Aesthet Dermatol. 2011;4(8):50-7.

6. Dréno B, Tan J, Kang S, Rueda MJ, Torres Lozada V, Bettoli V, et al. How people with facial acne scars are perceived in society: an online survey. Dermatol Ther (Heidelb). 2016;6(2):207-18.

7. Cotterill JA, Cunliffe WJ. Suicide in dermatological patients. Br J Dermatol. 1997;137(2):246–50.

8. Hainer BL. Fundamentals Of Electrosurgery. J Am Board Farm Pract. 1991;4(6):419-26.

9. Massarweh NN, Cosgriff N, Slakey DP. Electrosurgery: history, principles, and current and future uses. J Am Coll Surg. 2006;202(3):520-30.

10. Rose AE. Therapeutic update on acne scarring. J Drugs Dermatol. 2014;13(6):651-4.

11. Khunger N, Bhardwaj D, Khunger M. Evaluation of CROSS technique with 100% TCA in the management of ice pick acne scars in darker skin types. J Cosmet Dermatol. 2011;10(1):51-7.

12. Gozali MV, Zhou B. Effective treatments of atrophic acne scars. J Clin Aesthet Dermatol. 2015;8(5):33-40.

 

Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de São José Do Rio Preto (Famerp) - São José do Rio Preto (SP), Brasil.


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