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Relato de casos

Microagulhamento no tratamento de cicatrizes atróficas de acne: série de casos

Cândida Naira Lima e Lima Santana1; Daniele do Nascimento Pereira1; Jaqueline Barbeito de Vasconcellos1; Vanessa de Carvalho Lacerda1; Barbara Nader Vasconcelos2

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.2016831860

Conflito de Interesses: Nenhum
Suporte financeiro: Nenhum
Data de recebimento: 12/07/2016
Data de aprovação:22/09/2016

Abstract

Cicatrizes de acne presentes ao fim da fase inflamatória da acne vulgar vêm sendo tratadas com procedimentos que estimulam a produção de colágeno, como o microagulhamento. Foram selecionados seis pacientes que apresentavam cicatrizes de acne. O microagulhamento foi realizado com agulhas de 2,5mm. Observou-se melhora subjetiva em todos os pacientes. Na técnica de indução percutânea de colágeno há liberação de citocinas, fatores de crescimento e angiogênese, com produção final de colágeno tipo I, tornando o microagulhamento excelente opção para o tratamento das cicatrizes de acne, tanto por seu custo/benefício quanto por não afastar o paciente de suas atividades diárias.


Keywords: ACNE VULGAR; CICATRIZ; RESULTADO DE TRATAMENTO


INTRODUÇÃO

A acne vulgar é uma das doenças de pele mais comuns. Após o término da fase inflamatória ativa, grande parte dos pacientes apresenta cicatrizes atróficas.1 Estudos confirmaram seu impacto psicossocial demonstrando maior incidência de transtornos como personalidade introvertida e depressão nos pacientes com cicatrizes de acne grave,2 sendo, assim, um problema estético e psicológico. Procedimentos ablativos objetivando estímulo e remodelamento do colágeno são preconizados pela dermatologia há muito tempo. Na atualidade existe uma tendência a procedimentos menos invasivos, objetivando reduzir as complicações e promover o retorno rápido do paciente às atividades diárias. O microagulhamento tem sido descrito como técnica praticamente indolor, simples e de tecnologia minimamente invasiva.3 Apresenta-se nesse contexto como boa opção e tem como princípio o estímulo na produção de colágeno, sem provocar a desepitelização total observada em algumas técnicas ablativas.

 

SÉRIE DE CASOS

O procedimento foi realizado em seis pacientes (cinco do sexo feminino e um do sexo masculino). A idade variou de 21 a 33 anos, com média de 26,6 anos. O fototipo (classificação de Fitzpatrick) em quatro pacientes foi o IV, e em dois foi o III (Tabela 1). Quatro dos seis pacientes fizeram uso de isotretinoína oral antes do procedimento, com dose-alvo entre 120 e 150mg/kg. Eles foram submetidos ao microagulhamento seis meses, no mínimo, após o término da medicação. Nenhum dos pacientes apresentava comorbidades ou fazia uso de medicação sistêmica. Ao exame físico, apresentavam cicatrizes de acne distensíveis e não distensíveis distribuídas, principalmente, nas regiões malar e temporal, incluindo algumas cicatrizes tipo icepicks. Sem lesões inflamatórias no momento do procedimento.

Inicialmente, foi realizada marcação das áreas com maior concentração de cicatrizes. Em seguida, antissepsia com solução alcoólica de clorexidina a 2%. Os pacientes foram, então, submetidos a anestesia tumescente (lidocaína a 2% 20ml, água destilada 20ml, adrenalina 1mg/ml 0,4ml, bicarbonato de sódio 8,4% 4ml). Foi utilizado aparelho com agulhas de 2,5mm, em movimentos multidirecionais até observação do orvalho sanguíneo. O curativo oclusivo foi feito com associação de clobetasol e neomicina, com troca inicial após 24 horas (Figura 1). Reavaliações foram realizadas após sete, 30 e 60 dias.

Todos os pacientes relataram melhora subjetiva das lesões, também observada pela equipe médica. Em uma escala visual de 1 a 10, sendo 1 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, todos indicaram índice superior a 5. O melhor resultado foi observado para cicatrizes distensíveis, com pouca diferença no aspecto das cicatrizes tipo icepicks Figura 2). Nenhum paciente evoluiu com intercorrências infecciosas. A única complicação foi a hipercromia pós-inflamatória, presente em dois pacientes (Tabela 1). Foram utilizados cremes clareadores com associação de hidroquinona, corticoide e ácido retinoico, com melhora progressiva.

 

DISCUSSÃO

Cicatrizes de acne podem ser resultantes de aumento da proliferação tecidual ou da perda tecidual. Cicatrizes atróficas em geral são causadas por perda de colágeno após processo inflamatório da acne. Elas podem ser classificadas em icepick, rolling e boxcar. Não há terapêutica-padrão.4 Existe uma gama de opções, como peelings, técnicas com punch, subcisão, dermabrasão, preenchedores,4 menos resolutivas, e lasers ablativos, mais efetivos, porém com alto custo e maior tempo de recuperação.

Nesse contexto, o microagulhamento se revela como técnica com bom custo/benefício por ser economicamente mais viável, apresentar boa resposta e não levar o paciente ao afastamento de suas atividades diárias. É procedimento seguro que pode ser executado no consultório sem complicações.5

O dermaroller é cilindro com 192 microagulhas - que variam de 0,25 a 3mm de comprimento e têm 0,1mm de diâmetro - utilizado uma só vez, em vai e vem, sendo firmemente pressionado.2,6 As agulhas penetram o estrato córneo e criam microcondutos que se estendem até a derme, provocando mínimo dano à epiderme, que se recupera rapidamente.5,6

O procedimento pode ser feito com anestesia tópica aplicada cerca de 45 minutos antes, e o dermaroller deve ser friccionado de 15 a 20 vezes na direção horizontal, vertical e oblíqua, sob pressão vertical média calculada em torno de 6N.7 Com um dispositivo aplicado aproximadamente 15 vezes na área, consegue-se cerca de 250 orifícios/cm2. O sangramento que ocorre é facilmente controlado. São necessárias três ou quatro sessões, com intervalos que variam de duas a seis semanas.6 Pode ocorrer eritema durante até dois dias.2 Os resultados mais evidentes começam a ser observados entre quatro e seis semanas, mas a deposição do novo colágeno é lenta e contínua, podendo haver melhoria da textura da pele ao longo de até 12 meses subsequentes.8

O mecanismo de ação dessa técnica consiste em gerar múltiplas pequenas lesões na derme papilar, desencadeando a cascata de fatores de crescimento e liberação de citocinas, predominantemente a interleucina 1α, 8 e 6, fator de necrose tumoral α e fator estimulante de colônias de granulócitos e macrófagos, resultando em vasodilatação dérmica, migração de queratinócitos, neocolagênese e neoangiogênese.9

Três fases do processo de cicatrização, seguindo o trauma com as agulhas, podem ser delineados. Na primeira, a de injúria, ocorre liberação de plaquetas e neutrófilos responsáveis pela liberação de fatores de crescimento com ação sobre os queratinócitos e os fibroblastos como os fatores de crescimento de transformação α e β (TGF-α e TGF-β), o fator de crescimento derivado das plaquetas, a proteína III ativadora do tecido conjuntivo e o fator de crescimento do tecido conjuntivo.7 Na segunda fase, a de cicatrização, os neutrófilos são substituídos por monócitos e ocorre angiogênese, epitelização e proliferação de fibroblastos, seguidas da produção de colágeno tipo III, elastina, glicosaminoglicanos e proteoglicanos. Paralelamente, o fator de crescimento dos fibroblastos, o TGF-α e o TGF-β são secretados pelos monócitos. Aproximadamente cinco dias depois da injúria a matriz de fibronectina está formada, possibilitando o depósito de colágeno logo abaixo da camada basal da epiderme. Na terceira fase ou de maturação, o colágeno tipo III que é predominante na fase inicial do processo de cicatrização e que vai sendo lentamente substituído pelo colágeno tipo I, mais duradouro, persistindo por prazo que varia de cinco a sete anos.7

O microagulhamento apresenta ainda a vantagem de associar a entrega transdérmica de ativos selecionados (drug delivery), otimizando os resultados desejados.3,5 Chawla et al. realizaram estudo de microagulhamento com plasma rico em plaquetas (PRP) e com vitamina C, com superioridade do PRP.5 Fabbrocini et al. também associaram PRP ao microagulhamento com boa resposta.8

Garg e Baveja apresentaram estudo que associou o uso de subcisão, dermaroller e peeling de TCA 15%, com uso de tretinoína tópica, com bons resultados até para os graus 3 e 4 de cicatriz de acne.4 Pode-se ainda realizar a entrega de energia para derme, como é feito pela associação com radiofrequência, com bons resultados, servindo para tratar cicatrizes, hiperidrose e rítides.10

 

CONCLUSÃO

O microagulhamento vem-se tornando excelente opção para o tratamento das cicatrizes de acne, com melhora global da textura da pele e atenuação das cicatrizes atróficas, apresentando bons resultados clínicos, sem nenhuma complicação grave após o procedimento, além da satisfação pessoal de cada paciente.

 

Referências

1. Liebl H, Kloth LC. Skin cell proliferation stimulated by microneedles. J Am Coll Wound Spec. 2012;4(1):2-6.

2. Majid I. Microneeddling therapy in atrophic facial scars: an objective assessment. J Cutan Aesthet Surg. 2009;21(1):26-30.

3. Kalil CLPV, Frainer RH, Dexheimer LS, Tonoli RE, Boff AL. Estudo comparativo, randomizado e duplo-cego do microagulhamento associado ao drug delivery para rejuvenescimento da pele da região anterior do tórax. Surg Cosmet Dermatol. 2015;7(3):211-6.

4. Garg S, Baveja S. Combination Therapy in the Management of Atrophic Acne Scars. Journal of Cutaneous and Aesthetic Surgery. 2014; 7(1):18-23.

5. Chawla S. Split face comparative study of microneedling with PRP versus microneedling with vitamin C in treating atrophic post acne scars. J Cutan Aesthet Surg. 2014;7:209-12.

6. El-Domyati M, Barakat M, Awad S, Medhat W, El-Fakahan H, Farag H. Microneedling Therapy for Atrophic Acne Scars - An Objective Evaluation. J Clin Aesthet Dermatol. 2015;8(7):36-42.

7. Lima, EVA, Lima, MA, Takano, D. Microagulhamento: estudo experimental e classificação da injúria provocada. Surg Cosmet Dermatol. 2013;5(2):110-4.

8. Fabbrocini G, Annunziata MC, D´Arco V, De Vita V, et al. Acne Scars: pathogenesis, classification and treatment. Dermatol Res Pract. 2010; 2010:893080.

9. Bal SM, Caussian J, Pavel S, Bouwstra J A. In vivo assessment of safety of microneedle arrays in human skin. Eur J Pharm Sci. 2008;35(3):193-202.

10. Kim ST, Lee KH, Sim HJ, Suh KS, Jang MS. Treatment of acne vulgaris with fractional radiofrequency microneedling. J Dermatol. 2014;41(7): 586-91.

 

Trabalho realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.


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