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Artigo Original

Estudo comparativo e randomizado do Plasma Rico em Plaquetas na Alopecia Androgenética Masculina

Camila Carneiro Marques1; Denise Steiner2; Gabriela Momente Miquelin1; Mariana Morais Tavares Colferai1; Eduardo Figueiredo Gatti1

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20168406

Data de recebimento: 14/10/2016
Data de aprovação: 04/12/2016
Suporte financeiro: Nenhum
Conflito de interesse: Nenhum

Abstract

Introdução: A alopecia androgenética masculina, tem grande prevalência e provoca grande desconforto nos portadores. O plasma rico em plaquetas gera um ambiente propício atuando de modo a criar um microambiente adequado para a reparação de tecidos e possivelmente prolonga a fase anágena dos folículos pilosos.
Objetivo: Avaliar a segurança, eficácia e viabilidade do uso do plasma rico em plaquetas para o tratamento da alopecia androgenética masculina.
Métodos: Foram selecionados 08 pacientes masculinos com alopecia androgenética. Os participantes tiveram o lado do couro cabeludo randomizado para receberem plasma rico em plaquetas ou placebo. Foram realizadas 3 aplicações mensais: de um lado do couro cabeludo com placebo e do outro com plasma rico em plaquetas.
Resultados: Os pacientes que receberam o tratamento perceberam algum grau de melhora principalmente no que se refere à queda. Os resultados foram obtidos através da análise dermatoscópica que foi avaliada pelo software "trichoscale". Observamos um incremento de fios anágenos, com redução de fios telógenos e de fios velus e aumento de fios terminais. Os resultados foram estatisticamente relevantes quanto à redução dos fios velus e aumento de fios terminais.
Conclusões: Neste estudo observamos uma melhora clínica observada por fotos além de resultados positivos documentados por análise com "trichoscale". Houve relevância estatística nos dados obtidos principalmente após o primeiro mês de tratamento.


Keywords: ALOPECIA; PLASMA RICO EM PLAQUETAS; HOMENS


INTRODUÇÃO

A alopecia androgenética masculina é a forma mais prevalente de alopecia, e mesmo sendo socialmente aceita, gera grande desconforto, baixa estima e problemas sociais em muitos indivíduos acometidos.

Nessa forma de alopecia observam-se: alteração no ciclo do cabelo, com miniaturização dos folículos, que se tornam mais finos e menos pigmentados como os pelos velus, fase anágena encurtada e mais folículos que permanecem na fase quenógena, quando o folículo se encontra vazio.

A etiopatogenia é multifatorial envolvendo fatores hormonais e genéticos. No homem o andrógeno de maior ação é a testosterona, que se transforma em di-hidrotestosterona, pela ação da 5-alfa-redutase do tipo II na papila dérmica, próxima ao folículo piloso. A di-hidrotestosterona apresenta afinidade maior pelos receptores androgênicos do que a testosterona. Homens com alopecia androgenética apresentam níveis mais altos de 5-alfa-redutase na região frontal em comparação com a occipital. A maioria dos acometidos apresentam níveis de andrógenos séricos normais, sendo que assim o mecanismo hormonal na alopecia androgenética pode ser explicado por um provável aumento da produção de andrógenos na unidade pilossebácea, ou uma superexpressão ou hiperreponsividade dos receptores de andrógenos.

A história familiar normalmente é positiva na alopecia androgenética masculina, ocorrendo também forte associação genética, provavelmente por herança poligênica.

As opções de tratamento para a alopecia androgenética são bastante limitadas e incluem aplicação tópica de minoxidil e finasterida oral (aprovado pela FDA), isoladamente ou em combinação. Porém existem vários efeitos colaterais secundários descritos tais como cefaleia e aumento em outros pelos do corpo com o minoxidil e perda de libido com a finasterida oral.

O plasma rico em plaquetas (PRP) é produzido a partir de sangue autólogo processado para que se obtenha um concentrado de plaquetas, sendo portanto um produto rico em fatores de crescimento liberados por plaquetas. O uso do PRP tem mostrado efeitos positivos nos campos da cirurgia plástica, ortopédica e cardíaca, devido seu potencial efeito de reparação tecidual.

A presença de alguns leucócitos no PRP produz uma resistência natural aos processos infecciosos, reduzindo o risco de infecções no local a ser tratado. As plaquetas são os componentes primordiais desse preparado desde que são capazes de liberar fatores de crescimento importantes na modulação cicatricial dos tecidos. Os grânulos alfa das plaquetas liberam numerosos fatores de crescimento, os quais agem unindo-se a receptores celulares que transmitem o sinal para o interior das células. O fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) foi um dos primeiros fatores a ser identificado. O PDGF das plaquetas inicia o processo de reparo, estimulando a síntese de DNA, a quimiotaxia e a síntese de colágeno, processos fundamentais no reparo de feridas. Os fatores de crescimento de transformação beta (TGF-b) são um grupo de mediadores locais que regulam a proliferação e as funções da maioria das células do organismo. Os fatores de crescimento também ativam a fase proliferativa e a diferenciação das células ciliadas e da haste folicular para produzir novas unidades foliculares. Foi relatado que o PRP ativado estimula a proliferação de células da camada dermopapilar de humanos, aumentando a sobrevivência de células do folículo piloso através de seus efeitos anti-apoptóticos e possivelmente estimulando o crescimento capilar, prolongando a fase anágena.1,2,3

 

OBJETIVO

O objetivo deste estudo foi avaliar a segurança, eficácia e viabilidade do uso do PRP para o tratamento da alopecia androgenética masculina.

 

MÉTODO

Estudo ensaio clínico randomizado, com avaliador cego, controlado com placebo.

Foram selecionados 08 pacientes masculinos com alopecia androgenética. Todos preencheram os seguintes critérios de inclusão: homens de 18 a 45 anos, diagnóstico clínico de alopecia androgenética, sem tratamento, incluindo o uso de finasterida há pelo menos 3 meses.

Foram usados como critérios de exclusão os seguintes itens: portadores de doenças com alteração hormonal sistêmica, exemplo: hipotireoidismo, patologias hematológicas, diabetes melitus, câncer, hipertensão, pacientes em uso de medicamentos com ações hormonais e pacientes que apresentam níveis de plaquetas abaixo de 130.000.

Os participantes do estudo tiveram os lados do couro cabeludo do couro cabeludo randomizados para receberem PRP ou placebo. Utilizou-se um sistema computadorizado para realizar a randomização e para garantir o mascaramento dos lados sorteados. Tanto os pacientes assim como o avaliador foram cegados.

Foram realizadas 3 sessões, 1 por mês, por 3 meses consecutivos, com administração por via subcutânea sendo placebo de um lado do ouro cabeludo, e do outro PRP.

O PRP foi obtido de sangue autólogo, ou seja, do próprio paciente que recebeu a infusão em seu couro cabeludo. Uma amostra de 45 ml de sangue total foi coletada na presença de anticoagulante, cuja composição não danifica as plaquetas (heparina sódica). Esta amostra foi submetida a um processo de centrifugação duplo e contínuo, quando, a quantidade de 45 mL de sangue total foi inoculada em um único tubo com 50 ml de capacidade em sistema com ambiente totalmente fechado e isolado do ar ambiente. Os tubos foram centrifugados à temperatura ambiente, resultando em três componentes básicos: células vermelhas, plasma rico em plaquetas (PRP) e plasma pobre em plaquetas (PPP). O volume de cerca de 5mL de PRP foi coletado do lado interno do tubo duplo desenvolvido especificamente para esse fim e somado a 4ml de cloreto de cálcio a 10%. O material foi então infundido por via subcutânea no lado do couro cabeludo pré randomizado.

A avaliação do desfecho primário foi realizada através do software "trichoscale" da empresa Fotofinder®. O equipamento FotoFinder® é um sistema de dermatoscopia digital desenvolvido por uma empresa alemã em conjunto com a Universidade de Tubigen - Alemanha, que permite ampliar as lesões cutâneas de 20 a 70 vezes. O "trichoscale" é um software desenvolvido para realização de uma análise mais acurada do couro cabeludo, traçando um tricograma digital. É capaz de avaliar os seguintes parâmetros: densidade de cabelos (unidades de fios por centímetro quadrado), porcentagem de fios anágenos e de fios telógenos, densidade de fios velus e de fios terminais e mensuração de unidades foliculares. A avaliação através desse software foi realizada em área padrão previamente estabelecida: duas áreas circulares com diâmetro de 1,5cm localizadas na região parietal de cada lado do crânio a 14 cm do processo mastoideo do lado respectivo. Esse procedimento foi realizado em três tempos: 15 dias antes da primeira aplicação, 30 e 60 dias após o final do tratamento.

Os desfechos secundários foram determinados por avaliação clínica e fotográfica do couro cabeludo. Além disso, avaliamos a segurança contabilizando os eventos adversos que foram relatados em todas as visitas programadas no seguimento do estudo e durante o tratamento.

 

RESULTADOS

Dos 8 pacientes selecionados, houve a desistência de um e um não compareceu à última aplicação do PRP.

Os 6 pacientes que receberam o tratamento perceberam algum grau de melhora principalmente no que se refere à queda. A avaliação fotográfica pode ser visualizada nas Figuras 1 e 2

Após análise estatística dos dados obtidos por "trichoscale", apresentam-se os resultados obtidos na tabela 1 com a média comparativa entre os lados tratados com PRP e o outro tratado com placebo. A tabela das médias obtida de resultados foi realizada a partir do teste T student.

Através da análise da tabela 1 pode-se inferir que houve um aumento da porcentagem de fios anágenos e redução de fios telógenos em ambos os lados tratados, porém a melhora foi mais significativa do lado PRP. Tanto o incremento de fios anágenos quanto a diminuição de fios telógenos foram mantidos no segundo mês após o tratamento.

Além disso, houve uma redução de fios velus, com significância estatística (p= 0,035), do lado do PRP após o primeiro mês de tratamento, porém essa redução não foi mantida no segundo mês.

Em relação aos fios terminais houve um aumento importante do lado do PRP, com significância estatística (p = 0,035), após o primeiro mês de tratamento, o resultado não foi mantido no segundo mês.

No que se refere aos efeitos adversos, o único sintoma referido pelos pacientes foi de dor durante a aplicação; 4 dos pacientes referiram dor após algumas horas da aplicação. Os pacientes classificaram a dor como suportável, e não houve necessidade de administração de analgesia mesmo naqueles que se queixaram de dor após o procedimento. Não foram observados sinais de eritema, edema ou calor no local da aplicação.

 

DISCUSSÃO

O PRP contém fatores de crescimento com efeitos na maturação celular e no processo de reparação de feridas. Seu uso na reparação de feridas e em cirurgias ortopédicas e cardiológicas vem crescendo cada vez mais. No tratamento de alopecia androgenética, o PRP vem sendo estudado com boas perspectivas para se estabelecer como um tratamento eficaz e seguro.

Um estudo feito por Gentile et al com uma amostra de 23 pacientes analisou a injeção de PRP de um lado versus placebo do outro lado para tratamento de alopecia androgénetica. Após 3 ciclos de tratamento mensais, os pacientes apresentaram melhora clínica na média do número de pêlos por área analisada. Houve uma avaliação microscópica mostrando um aumento da espessura da epiderme e do número de folículos de cabelo. Observou-se também um aumento de Ki67 (um marcador de proliferação celular), de queratinócitos na epiderme e das células do bulge folicular.4

Outro trabalho realizado por Singhal el al. testou a infusão de PRP no couro cabeludo de 8 pacientes com diagnóstico de alopecia androgenética, sendo que um grupo controle recebeu outra terapia medicamentosa. No grupo que recebeu PRP houve crescimento dos cabelos após 12 semanas do tratamento e uma redução em 65% no teste de tração dos cabelos. O grupo controle não teve os mesmos resultados.5

Um estudo de prospectivo de coorte com 20 pacientes com aplicação do PRP a cada 21 dias e um reforço após seis meses mostrou uma redução da perda de cabelos, que após 3 meses atingiu níveis normais. Além disso, notou-se um aumento da densidade capilar comparada com o valor basal.6

Outro estudo conduzido por Schiavone et al com sessenta e quatro pacientes masculinos e femininos com alopecia androgenética analisou a aplicação duas injecções de plasma leucocitário rico em plaquetas (L-PRP) com a adição de proteínas plasmáticas concentradas. Dois avaliadores independentes avaliaram fotografias tiradas no início e após 6 meses. Alguma melhora foi observada em todos os pacientes por 1 avaliador e em 62 pelo outro. Neste estudo pode-se observar que o tratamento proposto pode induzir algum grau de vantagem clínica para a calvície masculina e feminina. 7

O grande potencial do PRP está ligado à concentração de fatores de crescimento contidos nas plaquetas. Muitos deles estão envolvidos na regulação da morfogênese e crescimento do cabelo e na transformação cíclica do folículo piloso, funcionando como interruptores biológicos que são ligados e desligados durante as diferentes fases.5,8 Os principais fatores de crescimento envolvidos no crescimento do folículo de cabelo são: fator de crescimento de endotélio vascular (VEGF), fator de crescimento epidérmico (EGF), fator de crescimento semelhante à insulina (IGF) e fator de crescimento de fibroblastos (FGF). As plaquetas liberam grandes quantidades de fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), EGF e VEGF.5

O PRP ativado parece promover a diferenciação de células-tronco foliculares de cabelo através da estimulação da atividade de transcrição de β-catenina. Além disso, ele induz a proliferação, in vitro, de células de papila dérmica, aumentando o crescimento de células através da ativação de sinalização extracelular dependente de kinase (ERK). O PRP também parece prolongar a fase anágena do ciclo de crescimento do cabelo através do aumento da expressão de fator de crescimento de fibroblastos 7 (FGF-7) e aumenta a sobrevivência celular através da inibição da apoptose.1 Outro mecanismo de ação é através do aumento dos níveis de (VEGF) e de fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) que estimulam a angiogênese no plexo vascular perifolicular.3,5

Os resultados obtidos neste presente estudo foram através da análise dermatoscópica que foi avaliada por "trichoscale". Observou-se um incremento de fios anágenos, com redução de fios telógenos e dos fios velus e aumento de fios terminais. Os resultados foram estatisticamente relevantes quanto à redução dos fios velus e aumento de fios terminais. A avaliação também incluiu um seguimento de 2 meses após o tratamento. A não manutenção dos bons resultados nesse seguimento pode estar relacionada aos estímulos hormonais androgênicos que atuam na progressão da doença. Esse fato contribui com a hipótese de que a terapia com PRP teria uma indicação de tratamento adjuvante na alopecia androgenética. Houve ainda uma melhora do lado tratado com placebo, o que poderia ser explicado pela ação à distância do PRP.

A vantagem deste estudo foi que o material de PRP utilizado para a administração foi preparado de forma protocolada, como descrita na metodologia deste trabalho. Para avaliação dos resultados, utilizamos o recurso de imagens dermatoscópicas que foram analisadas por "trichoscale", um método de avaliação mais objetiva do que apenas análise fotográfica.

As desvantagens deste trabalho foi o número pequeno de pacientes que participaram e o fato dos resultados não serem analisados em um seguimento mais prolongado.

 

CONCLUSÃO

A alopecia androgenética é uma queixa frequente nos consultórios de dermatologia. Existem vários tratamentos consagrados, porém a obtenção de um tratamento eficaz ainda é um desafio.

No presente estudo observou-se uma melhora clínica evidenciada por fotos além de resultados positivos documentados por análise com "trichoscale". Houve relevância estatística nos dados obtidos principalmente após o primeiro mês de tratamento.

Diante dos resultados obtidos e do grande potencial terapêutico do plasma rico em plaquetas, acreditamos que esse novo recurso terapêutico venha, de forma segura, agregar o arsenal terapêutico da alopecia androgenética.

Mais estudos devem ser realizados para evidenciar cientificamente sua real eficácia.

 

Referências

1. Li ZJ, Choi HI, Choi DK, Sohn KC, Im M, Seo YJ, et al. Autologous platelet-rich plasma: A potential therapeutic tool for promoting hair growth. Dermatol Surg. 2012;38:1040-6.

2. Maria-Angeliki G, Alexandros-Efstratios K, Dimitris R, Konstantinos K. Platelet-rich plasma as a potential treatment for noncicatricial alopecias. Int J Trichol 2015;7:54-63

3. Arshdeep, Kumaran MS. Platelet-rich plasma in dermatology: Boon or a bane? Indian J Dermatol Venereol Leprol. 2014;80:5-14.

4. Gentile P, Garcovich S, Bielli A, Scioli MG, Orlandi A, Cervelli V. The Effect of Platelet-Rich Plasma in Hair Regrowth: A Randomized Placebo-Controlled Trial. Stem Cells Transl Med. 2015;4(11): 1317-23

5. Singhal P, Agarwal S, Dhot PS, Sayal SK. Efficacy of platelet-rich plasma in treatment of androgenic alopecia. Asian Journal of Transfusion Science. 2015; 9 (2):159-62.

6. Gkini MA, Kouskoukis AE, Tripsianis G, Rigopoulos D, Kouskoukis K. Study of platelet-rich plasma injections in the treatment of androgenetic alopecia through a one-year period. J Cutan Aesthet Surg. 2014;7:215-21

7. Schiavone G, Raskovic D, Greco J, Abeni D. Platelet-Rich Plasma for Androgenetic Alopecia: A Pilot Study. Dermatol Surg. 2014 (40): 1010-19

8. Lin WH, Xiang LJ, Shi HX, Zhang J, Jiang LP, Cai PT et al. Fibroblast Growth Factors Stimulate Hair Growth throughβ-Catenin and Shh Expression in C57BL/6 Mice. Biomed Res Int. 2015;2015: 9p.

 

Trabalho realizado na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) - São Paulo (SP), Brasil.


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