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Cartas

Carta ao editor - Enxerto por raspagem epidérmica no vitiligo estável: uma opção terapêutica

Gerson Dellatorre

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.20168303

Data de recebimento: 10/07/2016
Data de aprovação: 12/08/2016
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de interesse: Nenhum

Caros Senhores,

Nos últimos anos o tratamento cirúrgico do vitiligo tem sido uma área de grande interesse acadêmico de nossa parte. Vimos com entusiamo a recente publicação intitulada Enxerto por raspagem epidérmica no vitiligo estável: uma opção terapêutica (DOI: http://dx.doi.org/10.5935/scd1984-8773.201682760),1 pelo fato de abordar uma modalidade terapêutica ainda pouco utilizada em nosso país: o transplante de melanócitos. Entretanto, observamos algumas colocações no texto que podem ser mal interpratadas pelos leitores na revisão de literatura realizada pelos autores, as quais gostaria de pontuar de forma crítica e construtiva.

Os autores colocam em seu resumo e introdução que o tratamento cirúrgico do vitiligo é preferido em detrimento ao tratamento clínico em casos de estabilidade de doença. Entretanto, a ideia de que devemos reservar o tratamento cirúrgico para casos recalcitrantes ao tratamento clínico (além de estáveis e sem fenômeno de Köebner) ainda predomina na prática e na literatura, como podemos observar em artigos seminais sobre o tema.2-4 Baseado no exposto, considero que, em virtude dos riscos inerentes a quaisquer procedimentos cirúrgicos (ainda que mínimos nesse contexto), o tratamento clínico ainda deva ser tentado em primeira instância, mesmo nos casos de vitiligo estável e sem fenômeno de Koebner.

No parágrafo "A principal vantagem desse método, quando comparado à técnica original de microenxertos por punch, é que não apresenta aspecto em paralelepípedo ou pedra de calçamento na área tratada, discromias das áreas doadora e receptora(...)".

Consideramos difícil afirmar de forma tão categórica que a técnica não possa deixar discromias nas áreas receptoras e doadoras. A princípio, qualquer técnica cirúrgica para transplante de melanócitos pode causá-las. No próprio resultado cirúrgico do relato apresentado é demonstrada a presença de discromia (hipercromia tanto na área doadora quanto receptora). Apesar de muitas vezes serem temporárias, as discromias podem permanecer indefinidamente, independentemente da técnica utilizada. Saliento que mesmo técnicas mais "conservadoras" de obtenção de tecido, como a enxertia epidérmica por bolhas de sucção (Suction Blister Epidermal Grafts – SBEG), podem deixar hipercromia residual em cerca de 40% dos casos, como apontado por estudo recente.5

Com relação à afirmação "Áreas acrais e sobre articulações, assim como em pacientes muito jovens, devem ser evitadas devido às dificuldades de execução e ao risco de insucesso terapêutico":

Desde que respeitadas as indicações primordiais do tratamento cirúrgico do vitiligo (doença estável, ausência de fenômeno de Köebner e refratariedade ao tratamento clínico), estas áreas podem ser tratadas com técnica cirúrgica. Apesar de as taxas de repigmentação serem menores que as fornecidas pelo tratamento cirúrgico em oturas áreas (como faciais, por exemplo), a técnica ainda consegue bons resultados em mais de 50% dos casos, como já demonstrado na literatura.6 Como exemplo recente, tratamos com sucesso um paciente jovem com vitiligo acometendo circunferencialmente a região do tornozelo, utilizando a técnica de suspensão de células epidérmicas não cultivadas (Figura 1).

A técnica também não é contraindicada para lábios e pálpebras como exposto no Quadro 1 do artigo em questão.1 Pelo contrário, é frequentemente utilizada para tal fim.4

Ainda, consideramos a contraindicação para pacientes jovens apenas subjetiva. Na verdade ela depende do entendimento e colabaração dos pacientes no ato operatório e durante o período pós-operatório (período de permanência do curativo). Estudos já mostram a segurança do método nessa faixa etária com bons resultados terapêuticos.7

Por fim, ao contrário do que foi informado no quadro 1 do artigo em questão, os resultados cirúrgicos com suspensão de melanócitos cultivados já se encontram bem reportados na literatura, sendo que apenas no estudo de Zhang et al. o número de casos tratados foi maior que 400.8

 

Referências

1. Elias BLF, Ferreira FR, Lima EMA, Amarante CF, Mandelbaum SH. Enxerto por raspagem epidérmica no vitiligo estável: uma opção terapêutica. Surg Cosmet Dermatol. 2016;8(2):173-7.

2. Parsad D, Gupta S, Force IDT. Standard guidelines of care for vitiligo surgery. Indian journal of dermatology, venereology and leprology. 2008;74 (Suppl):S37-45.

3. Falabella R. Surgical treatment of vitiligo: why, when and how. Journal of the European Academy of Dermatology and Venereology: J Eur Acad Dermatol Venereol. 2003;17(5):518-20.

4. Paul M. Autologous Non-cultured Basal Cell-Enriched Epidermal Cell Suspension Transplantation in Vitiligo: Indian Experience. J Cutan Aesthet Surg. 2011;4(1):23-8.

5. Ashique KT, Kaliyadan F. Long-Term Follow-up and Donor Site Changes Evaluation in Suction Blister Epidermal Grafting Done for Stable Vitiligo: A Retrospective Study. Indian J Dermatol. 2015;60(4):369-72.

6. Mulekar SV, Al Issa A, Al Eisa A. Treatment of vitiligo on difficult-to-treat sites using autologous noncultured cellular grafting. Dermatol Surg. 2009;35(1):66-71.

7. Sahni K, Parsad D, Kanwar AJ. Noncultured epidermal suspension transplantation for the treatment of stable vitiligo in children and adolescents. Clin Exp Dermatol. 2011;36(6):607-12.

8. Zhang DM, Hong WS, Fu LF, Wei XD, Xu AE. A randomized controlled study of the effects of different modalities of narrow-band ultraviolet B therapy on the outcome of cultured autologous melanocytes transplantation in treating vitiligo. Dermatol Surg. 2014;40(4):420-6.

 

Trabalho realizado no consultório particular do autor – Curitiba (PR), Brasil.


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