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Artigo Original

Tratamento de rosácea com duas faixas de comprimento de onda de luz intensa pulsada num mesmo disparo

Raquel Zappa Silva Marques1; Daniela Kouvaleski Saviano Moran1; Carolina Speyer2; Luciana Cirillo Maluf Azevedo3; Simão Cohen4

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.201682826

Data de recebimento:17/05/2016
Data de aprovação: 13/06/2016
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

Introdução: A rosácea é doença crônica que geralmente se manifesta como flushing, eritema facial persistente, telangiectasias, pápulas e pústulas. A luz intensa pulsada é usada para tratamento de lesões vasculares de rosácea telangiectásica facial.
Objetivos: Avaliar a melhora clínica e dermatoscópica do eritema facial e rubor, e o clareamento dos vasos à dermatoscopia após o uso de luz intensa pulsada.
Métodos: Foram selecionados nove pacientes, com rosácea telangiectásica facial, com idade entre 36 e 59 anos, e fototipo I a III, sem qualquer tipo de tratamento nos últimos seis meses. O tratamento consiste em aplicações da luz intensa pulsada com dual-band, 535-680nm e 860-1200nm, no mesmo disparo. Por favorecer o alvo da hemoglobina, há maior proteção para a epiderme. Foram realizadas três sessões a intervalos de um mês.
Resultados: Após o tratamento, 87,5% dos pacientes notaram redução de flushing e telangiectasias, e os médicos avaliadores, grande (> 75%) melhora clínica em 50% dos pacientes e melhora moderada (51%-75%) em 28,6%. Os efeitos adversos foram mínimos e transitórios.
Conclusões: Até o momento nenhum tratamento mostrou-se completo para a rosácea telangiectásica. Este estudo demonstrou que o tratamento com luz intensa pulsada utilizando a tecnologia dual band é eficaz no tratamento da rosácea.


Keywords: ROSÁCEA; TERAPIA DE LUZ PULSADA INTENSA; TELANGIECTASIA; ERITEMA


INTRODUÇÃO

A rosácea é doença crônica que geralmente se manifesta como flushing, eritema facial persistente, telangiectasias, pápulas e pústulas. A luz intensa pulsada (LIP) é reportada para tratamento de lesões vasculares de rosácea telangiectásica facial.1

LIP é luz policromática, não coerente e de amplo espectro eletromagnético, capaz de emitir comprimentos de onda entre 390nm e 1200nm.2

Seu princípio básico consiste na absorção de fótons por cromóforos endógenos ou exógenos dentro da pele; essa transferência de energia para esses cromóforos-alvo gera calor e posterior destruição das estruturas específicas da pele por meio de um processo chamado de fototermólise seletiva. O comprimento de onda deve ser selecionado em dependência do pico de absorção do cromóforo-alvo e da duração do impulso, que deve ser inferior ao tempo de relaxamento térmico. Isso limita a difusão do calor e minimiza danos das estruturas circunjacentes.3

A combinação de comprimento de onda, duração de pulso, espaçamento entre os disparos e fluência permite a utilização de dispositivos de LIP no tratamento de várias condições dermatológicas, incluindo rosácea.2

Rosácea é dermatose crônica de etiologia desconhecida, caracterizada por eritema, telangiectasias, pápulas e pústulas.4,5

Foi utilizada a plataforma Omnimax ® (Sharp Light, Israel), que contém a ponteira de LIP com banda dupla de absorção para a hemoglobina (535-680 e 860-1200nm).

 

MÉTODOS

Foram selecionados nove voluntários, oito do sexo feminino e um do masculino, com idade entre 36 e 59 anos, e fototipos I-III de Fitzpatrick. E estabelecidos como critérios de inclusão: pacientes com rosácea telangiectásica (eritema, flushing, telangiectasias) sem tratamento dermatológico ambulatorial prévio nos últimos seis meses. Os critérios de exclusão foram imunossupressão, doenças neurológicas ou imunológicos, gravidez, qualquer sinal de infecção local ou doença inflamatória da pele, formação anterior de cicatrizes hipertróficas ou queloides, uso atual de aspirina ou anti-inflamatórios não esteroides, exposição à radiação UV nas últimas quatro semanas e procedimentos de rejuvenescimento facial nos últimos seis meses, como peelings, ácidos, lasers ou cirurgias. Os pacientes foram recrutados no Ambulatório de Dermatologia da Faculdade de Medicina do ABC, e todos assinaram termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética.

As fotografias foram tiradas no início de cada sessão e após 30 dias do término do tratamento, usando câmera digital Nikon/Coolpix L320 equipada com anel de flash montado na lente (Lens-shift VR/ 16,1 megapixels). Todas as fotografias foram tiradas em formato bruto em idênticas condições e configurações da câmera. Foram utilizadas vistas padronizadas (face em 90º e 45º oblíqua direita e esquerda).

Imagens dermatoscópicas foram retiradas antes de cada sessão, sem flash, usando lentes especiais do dermatoscópio (Dermlite Hybrid, California, USA), conectado à câmera digital Sony Cyber-Shot 14,1 megapixels, com lente Carl Zeiss, sendo padronizada a linha média pupilar esquerda, 4cm abaixo na pálpebra inferior, com zoom 3,3 e meia-luz[é nesse sentido? ou seria com metade da luz? neste último caso não haveria o hífen, mas seria melhor usar mesmo metade da luz em vez de meia luz] polarizada do dermatoscópio.

O aparelho utilizado foi o Omnimax® (SharpLight, Israel), com a LIP com dois filtros de corte no mesmo disparo, um de 535-680nm e outro de 860-1200nm. O espectro de ondas entre 535 e 680nm atinge principalmente as lesões vasculares, além de ser bem absorvido pela melanina, tornando-o eficiente também no tratamento das lesões pigmentadas. Já, o espectro entre 860 e 1200nm cobre valores intermediários de absorção pela melanina e hemoglobina, assim aumentando seu aquecimento. Como comprimentos de onda maiores penetram mais profundamente, essa faixa é mais eficaz no tratamento de lesões maiores e mais profundas. Na faixa de comprimento de onda de 680-860nm, o disparo não atua, aumentando a proteção epidérmica, pois nesse espectro a absorção de oxi-hemoglobina e deoxi-hemoglobina é relativamente fraca, ainda que a absorção de melanina seja significante.

Cada paciente foi informado da necessidade de realização de três sessões com intervalo de 30 dias. A LIP foi realizada com fluências que variaram de 10 a 20J/cm2, com duração de pulso entre 12 e 25mseg, e uma ou duas passadas, dependendo da intensidade do quadro clínico e da tolerância de cada paciente.

Não foi utilizado anestésico tópico prévio para que não provocasse a constrição dos vasos. Foi orientado o uso tópico, entre as sessões de LIP, de filtro solar FPS 60 e loção oleosa para proteção da pele.

Os potenciais efeitos adversos, tais como eritema, hipo e hiperpigmentações, bolhas, púrpura e cicatrizes, foram avaliados em cada sessão por meio de uma escala, indicando: nenhuma, leve, moderada ou grave alteração.

No final do estudo, foi aplicado um questionário para avaliar eficácia do tratamento, utilizando escala baseada no guideline do National Rosacea Society Expert Committe.6 Os sintomas avaliados foram flushing, eritema persistente, telangiectasias, sensação de queimação e melhora global da pele. As notas foram de zero a três (0- ausência, 1- leve, 2- moderada, 3- severa).

As imagens dermatoscópicas antes e após o tratamento foram analisadas por dois médicos e observou-se a evolução geral do quadro clínico dos pacientes de acordo com a seguinte escala: < 25%, 25 a 50%, 51 a 75% e acima de 75% de melhora dos sinais.

 

RESULTADOS

Os pacientes responderam ao questionário utilizando escala baseada no guideline do National Rosacea Society Expert Committe,6 no qual foi avaliada comparativamente a eficacácia do tratamento nas seguintes características: textura, sensação de queimação, telangiectasia, flushing e eritema.

Os sintomas com melhoras mais evidentes foram eritema e telangiectasia, em que sete dos pacientes referiram melhora importante. As opiniões quanto à textura de pele e flushing foram, em sua maioria, positivas, indicando leve, moderada ou grande melhora do quadro. A sensação de ardência ou queimação foi relatada por 50% dos pacientes (Gráfico 1).

Os resultados foram também avaliados por dois médicos individualmente por meio de fotografias antes e após o tratamento. Foi utilizada a seguinte escala < 25%, 25 a 50%, 51 a 75% e acima de 75% de melhora. Nessa análise, os resultados foram avaliados considerando o aspecto geral do paciente, sem diferenciação dos sinais.

Das evoluções analisadas, 50% foram classificadas com mais de 75% de melhora do quadro clínico geral, seguido pelo segundo maior escore de melhora, de 51 a 75% que foi alcançado por 28,6% dos pacientes submetidos ao tratamento com LIP. Apenas três das 14 fotografias analisadas tiveram seu escore inferior a 50% de melhora clínica (Figuras 1 a 4) (Gráfico 2).

Só foram analisados os resultados de oito pacientes, pois houve uma desistência após a seleção inicial, devido à dor e ao incômodo durante o procedimento.

 

DISCUSSÃO

Uma opção terapêutica comprovadamente eficaz e segura para a rosácea é o uso de tecnologias com luz.1 Este estudo teve como base a utilização de fototerapia com luz intensa pulsada utilizando duas faixas de banda de luz para rosácea facial num mesmo disparo.

A LIP é tecnologia criada para tratar lesões vasculares e pigmentadas, além de outras aplicações, como remoção de pelos e fotorrejuvenescimento. Ao produzir pulsos sincronizados simples ou múltiplos e com a possibilidade de variar a duração desses disparos, torna-se uma ferramenta bastante versátil.5

Na literatura, Mark et al.7 demonstraram redução de 29% das telangiectasias e 21% dos eritemas após cinco sessões de LIP, usando filtro de 515nm e pulso único de duração de 3ms. De modo semelhante ao que foi realizado em nosso estudo, Taub et al. conduziram experimento com aproximadamente 500 pacientes, submetendo-os a sessões de LIP ou laser associado a radiofrequência bipolar. Um mês após três sessões, os pacientes tiveram sua avaliação médica quanto ao eritema reduzida de 2.38 para 1.21 e quanto às telangiectasias de 1.64 para 0.86, sendo 3 o escore máximo. Além disso, obtiveram evidente melhora na textura de pele.8 Comparativamente a esse trabalho, houve semelhança nos resultados com melhora expressiva dos sintomas de eritema, telangiectasias e textura de pele após as sessões.

Com amostra menor, de 34 pacientes, outro artigo comprovou a eficácia do tratamento com LIP. Após quatro sessões, os escores do eritema e de severidade e avaliação fotográfica melhoraram significativamente, e esses resultados foram mantidos em reavaliação após seis meses, com mínimos e transitórios efeitos colaterais.5

Ao analisar 60 pacientes com telangiectasias associadas a rosácea tratados com LIP, com amplo espectro de ondas variando de 515 a 1200nm com diferentes filtros (515, 550, 570 e 590nm) durante aproximadamente dois anos, pôde-se observar melhora de 77,8% das lesões.9

 

CONCLUSÕES

A presente avaliação demonstrou que o tratamento LIP é eficaz na obtenção de intensa (> 75%) melhora do aspecto clínico em 50% dos pacientes e moderada (51 a 75%) em 28,6%, com mínimos e transitórios efeitos colaterais.

O tratamento com LIP aumenta o conteúdo de colágeno superficial e fibras elásticas na derme. Isso se deve à absorção seletiva da luz pela água dos tecidos, aumentando a condução de calor ao redor do colágeno e assim aumentando sua produção. Além disso, há também aumento da produção de fibroblastos pelo efeito fototérmico. Esse mecanismo explica os melhores resultados apresentados por pacientes com idade inferior a 40 anos evidenciado por Lim et al.1

Ao utilizar esse tipo de laser, ocasiona-se destruição dos vasos sanguíneos anômalos, redução da inflamação e do número de glândulas sebáceas ativas, além do bloqueio de processos alterados de queratinização. Todos esses efeitos contribuem para melhora global do quadro clínico da rosácea.8

 

Referências

1. Lim HS, Lee S-C, Won YH, Lee J-B. The Efficacy of Intense Pulsed Light for Treating Erythematotelangiectatic Rosacea Is Related to Severity and Age. Ann Dermatol. 2014; 26(4): 491-45.

2. Ciocon DH, Boker A, Goldberg DJ. Intense pulsed light: what works, what's new, what's next. Facial Plast Surg. 2009; 25(5): 290-300.

3. Piccolo D, Di Marcantonio D, Crisman G, Cannarozzo G, Sannino M, Chiricozzi A, et al. Unconventional Use of Intense Pulsed Light. Biomed Res Int. 2014;2014:618206.

4. Babilas P, Schreml S, Szeimies R, Landthaler M. Intense pulsed light (IPL): a review. Lasers Surg Med. 2010; 42(2): 93-104.

5. Papageorgiou P, Clayton W, Norwood S, Chopra S, Rustin M. Treatment of rosacea with intense pulsed light: significant improvement and long-lasting results. Br J Dermatol. 2008;159(3):628-32.

6. Wilkin J, Dahl M, Detmar M, Drake L, Feinstein A, Odom R, et al. Standard classification of rosacea: Report of the National Rosacea Society Expert Committee on the Classification and Staging of Rosacea. J Am Acad Dermatol. 2002;46(4):584-7.

7. Mark KA, Sparacio RM, Voigt A, Marenus K, Sarnoff DS. Objective and quantitative improvement of rosacea-associated erythema after intense pulsed light treatment. Dermatol Surg. 2003;29(6):600-4.

8. Taub AF. Treatment of rosacea with intense pulsed light. J Drugs Dermatol. 2003;2(3):254-9.

9. Schroeter CA, Haaf-von Below S, Neumann HAM. Effective treatment of rosacea using intense pulsed light systems. Dermatol Surg. 2005;31(10):1285-9.

 

Trabalho realizado na Faculdade de Medicina do ABC (FMABC) - Santo André (SP), Brasil.


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