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Relato de casos

Tumor de células granulares multicêntrico: uma apresentação rara

Natália Ribeiro de Magalhães Alves1; Jeniffer Muñoz Trujillo2; Paula Mota Medeiros1; Carla Araújo Jourdan1; Paula Carolina Pessanha de Faria2; Maria de Fátima G. S. Alves3

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.201681474

Data de recebimento: 01/02/2015
Data de aprovação: 10/11/2015
Suporte financeiro: Nenhum
Conflito de interesse: Nenhum

Abstract

O tumor de células granulares, também conhecido como tumor de Abrikossoff, é neoplasia rara e de etiologia controversa, que se apresenta geralmente como lesão benigna solitária. Relata-se um caso de tumor de células granulares multicêntrico em paciente de 13 anos tratado com exérese cirúrgica.


Keywords: TUMOR DE CÉLULAS GRANULARES; NEOPLASIAS DE TECIDOS MOLES; PROTEÍNAS S100


INTRODUÇÃO

O tumor de células granulares (TCG) ou tumor de Abrikossoff foi descrito pela primeira vez em 1926 pelo patologista russo Alexei Ivanovich Abrikossoff. Alguns autores têm sugerido que esses tumores representam aproximadamente 0,5% de todos os tumores de partes moles, com prevalência de 0,019% a 0,03% das neoplasias.1 Geralmente apresenta-se como lesão nodular solitária, indolor, de crescimento lento, benigna, apesar de variantes multicêntricas (10-25%) e malignas (1-2%) também serem relatadas.2

Esses tumores acometem preferencialmente o segmento cervicofacial, particularmente a língua e o palato, mas podem acometer a pele e outros órgãos como esôfago, laringe, traqueia, tireoide, havendo poucos relatos de sua ocorrência nas extremidades.2,3

O tumor de células granulares é mais comumente encontrado em mulheres de meia-idade e da raça negra.2,4-7 Sua histogênese é controversa, e vários autores têm implicado diversos tipos celulares na sua origem, incluindo células musculares, histiócitos, fibroblastos, células da bainha neural e células mesenquimais não diferenciadas. A origem neuroectodérmica é geralmente considerada pela reatividade do TCG para os marcadores neurais, como S-100.1,3-5,7,8

 

RELATO DE CASO

Paciente do sexo feminino, 13 anos, parda, apresentando lesões nodulares no corpo, que surgiram há aproximadamente três anos. Acometiam o couro cabeludo (Figura 1), flanco direito, coxa direita, região palmar esquerda e plantar direita (Figura 2), sendo a última dolorosa à deambulação.

Ao exame dermatológico apresentava lesões nodulares, a maior com 1cm na face medial da coxa direita, com hiperpigmentação na pele sobrejacente. As demais lesões eram normocrômicas. Ao exame da cavidade oral foram observadas duas lesões nodulares, amareladas, na lateral esquerda da língua (Figura 3), medindo um e 0,5cm, indolores à palpação.

Realizou-se a exérese cirúrgica das lesões do flanco direito, palmar esquerda e coxa direita, todas com resultado histopatológico de tumor de células granulares. Foi observado corte histológico de pele mostrando intensa infiltração da derme por células poligonais, com citoplasma granuloso e eosinofílico, núcleos pequenos e escuros (Figura 4). A coloração do PAS mostrou positividade para os grânulos intracitoplasmáticos.

A paciente segue em acompanhamento clínico das demais lesões, sem recidiva das então excisadas.

 

DISCUSSÃO

O TCG é neoplasia rara, de etiologia e histogênese incertas, ocorrendo como uma lesão solitária, assintomática, de crescimento lento, normocrômica ou acastanhada. Esse tumor geralmente mede menos do que 3cm em seu maior diâmetro, mas pode atingir vários centímetros.3 Localiza-se principalmente nas regiões de cabeça e pescoço (50%), língua (35%) e vulva (5,3%).9 Apesar de na maioria dos casos a lesão ser solitária, cerca de 25% dos pacientes podem apresentar múltiplas lesões, como foi observado no caso em questão.2,5

O diagnóstico clínico do TCG é difícil, uma vez que as lesões geralmente são inespecíficas, e em geral sua identificação ocorre apenas por meio de exame histopatológico.3 O diagnóstico diferencial clínico inclui dermatofibroma, tumores de anexos, nevos melanocíticos compostos, prurigo nodular, cisto dermoide e ceratoses seborreicas.7

Histologicamente a derme contém um nódulo mal circunscrito composto por células poligonais, de coloração pálida, que podem infiltrar na derme adjacente. As células têm citoplasma abundante, com granulação PAS-positivo, ligeiramente eosinofílico, com núcleos redondos e escuros.3,7 TCGs maduros (a forma usual), presumindo-se sua origem schwaniana, são descritos como positivos para a proteína S-100 e enolase neuroespecífica.3

Tumores malignos de células granulares são talvez os mais raros de todos os tumores de tecidos moles, representando percentual que varia de um a 2% dos casos, e há relatos de ocorrências em várias localizações.2,3 As características clínicas que sugerem malignidade incluem grande tamanho (> 4cm), áreas necróticas e hemorrágicas, crescimento rápido e invasão de órgãos adjacentes.9 É comum essa forma metastatizar para linfonodos e pulmões, sendo altamente agressiva; não responsiva a tratamento e, finalmente, fatal.3

Um terceiro tipo de tumor de células granulares apresenta características patológicas benignas, mas de comportamento clínico maligno. Tumores malignos de células granulosas com aparência histológica benigna são geralmente identificados apenas depois da difusão metastática e linfonodal. Independente da aparência histológica, o potencial biológico do TCG é incerto.3

O tratamento de escolha é a excisão cirúrgica completa.1-9 Se incompletamente retirado, esse tumor tem alta taxa de recorrência local.2-5,7,9 O uso de radioterapia e quimioterapia é recomendável no tratamento das formas malignas desse tumor.4,6

O caso relatado apresenta um quadro clínico em paciente jovem, fora da faixa etária mais acometida e com lesões múltiplas, algumas em extremidades distais; apresentação incomum desse tumor raro.

 

Referências

1. Barbieri M, Musizzano Y, Boggio M, Carcuscia C. Granular cell tumour of the tongue in a 14-year-old boy. Acta Otorhinolaryngol Ital. 2011;31(3):186-9.

2. Dell'Horto AG, Pinto JM, Diniz MS. Case for diagnosis. An Bras Dermatol. 2013;88 (3):469-71.

3. Brandão M, Domenech J, Noya M, Sampaio C, Almeida MVC, Guimarães NS, et al. Tumor de células granulares no pé (tumor de Abrikossoff): localização infrequente de tumor relativamente raro. An Bras Dermatol.2001;76(2): 215-22.

4. Curtis BV, Calcaterra TC, Coulson WS. Multiple Granular Cell Tumor. New York: Head & Neck October; 1997. p. 634-7.

5. Torrijos-Aguilar A, Alegre-de Miquel V, Pitarch-Bort G, Mercader-García P, Fortea-Baixauli JM. Cutaneous Granular Cell Tumor: A Clinical and Pathologic Analysis of 34 Cases. Actas Dermosifiliogr. 2009; 100(2):126-32. Fragulidis GP, Chondrogiannis KD, Lykoudis PM, Karakatsanis A, Georgiou CA , et al. Subcutaneous granular cell tumour of the lumbar region. J Cutan Aesthet Surg. 2011;4(2):132-4..

6. Fragulidis GP, Chondrogiannis KD, Lykoudis PM, Karakatsanis A, Georgiou CA , et al. Subcutaneous granular cell tumour of the lumbar region. J Cutan Aesthet Surg. 2011;4(2):132-4..

7. Bolognia JL, Jorizzo JL, Rapini RP. Dermatologia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2011. p.1804.

8. Fumagalli I, Penel N, Wacrenier A, ElBedoui S, Adenis A. Advanced Abrikossoff tumour: A metastatic or a multifocal malignancy? Acta Oncol. 2012;51(1):133-5.

9. Lopez V, Santoja N, Jorda E. Granular cell tumor on the sole of a child: a case report. Ped Dermatol. 2011;28(4):473-4.

 

Trabalho realizado no Hospital Universitário Pedro Ernesto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.


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