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Diagnóstico por Imagem

Correlação clínica e dermatoscópica da colagenose perfurante reativa

Gabriela Horn1; Mariana de Jesus Oliva Siebel2; Yana Lya de Almeida Leda1; Daniela Sanchez Facci1; Diego Leonardo Bet3

DOI: https://doi.org/10.5935/scd1984-8773.201681746

Data de recebimento: 02/12/2016
Data de aprovação: 20/03/2016
Suporte financeiro: Nenhum
Conflito de interesse: Nenhum

Abstract

A dermatose perfurante adquirida é formada por um grupo de dermatoses que tem por característica a eliminação transepitelial de material dérmico alterado. Clinicamente se apresenta como pápulas ou nódulos crateriformes, com tampão queratótico central, o que pode sugerir algum tipo de eliminação transepitelial; porém o diagnóstico final é histopatológico. A realização da dermatoscopia é ferramenta útil, ajudando a afastar outras dermatoses similares, como o prurigo nodular e o líquen plano hipertrófico. Discute-se neste artigo a correlação clínica e dermatoscópica dessa dermatose.


Keywords: DERMOSCOPIA; PRURIGO; DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL


INTRODUÇÃO

A dermatose perfurante adquirida (DPA) é formada por um grupo de dermatoses caracterizadas pela eliminação transepitelial de material dérmico alterado (colágeno, fibras elásticas e/ou folículo).1-3 Surge na idade adulta e comumente se relaciona com diabetes mellitus e doença renal crônica (até 10% dos dialíticos). É encontrada também em associação com insuficiência hepática, hipotireoidismo, hiperparatireoidismo, fibrose pulmonar, HIV/Aids, escabiose e neoplasias malignas.4

Clinicamente surgem pápulas ou nódulos crateriformes, com tampão queratótico central, podendo apresentar padrão folicular. Os locais mais afetados são a superfície extensora dos membros e o tronco. O prurido é comum, sendo frequentes escoriações e crostas. Novas lesões podem surgir através do fenômeno de Koebner.2

A DPA é classificada conforme achados histológicos em: colagenose perfurante reativa, elastose perfurante serpiginosa, foliculite perfurante e doença de Kyrle. Em um mesmo paciente pode haver superposição de mais de um tipo, sendo mais comum a coexistência em pacientes dialíticos. Dessa forma, a realização de mais de uma biópsia é recomendada.1

Não há um tratamento-padrão estabelecido, sendo citados: corticoide tópico/intralesional, retinoide, alopurinol e fototerapia. Nos casos em que há uma doença de base, seu controle pode levar à melhora. O prurido pode ser controlado com anti-histamínicos. A seguir, descrevemos dois casos de DPA, correlacionando aspectos clínicos e dermatoscópicos.

 

RELATO DOS CASOS

Caso 1: Paciente do sexo masculino, 63 anos, com surgimento abrupto de lesões no dorso, intensamente pruriginosas, que rapidamente progrediram para região cervical e proximal de membros em duas semanas. Ao exame dermatológico: múltiplas pápulas e nódulos umbilicados, acastanhados de tamanhos variados, alguns de padrão folicular, exibindo tampão queratótico central (Figura. 1). Comorbidades: hipertensão, diabetes mellitus, cardiopatia isquêmica, doença vascular periférica e insuficiência renal crônica dialítica. À dermatoscopia, com luz polarizada, observou-se área amorfa castanho-acinzentada na periferia com centro branco queratótico, de aspecto deprimido e presença de área amarelada (Figuras 2 e 3). A análise histopatológica de espécime, obtida através de fuso no dorso, evidenciou solução de continuidade na derme papilar, recoberta por espessa crosta necrótica contendo debris celulares, neutrófilos, fibras colágenas verticalizadas com eliminação transepitelial, caracterizando colagenose perfurante reativa (CPR) (Figura 4). O paciente foi tratado com dipropionato de betametasona 0,05% e ácido salicílico a 3% tópico, além de mirtazapina 15mg/dia para controle do prurido. Evoluiu com melhora em 30 dias.

Caso 2: Paciente do sexo masculino, 46 anos, relatava surgimento de lesões pruriginosas em membros superiores há seis meses. Ao exame dermatológico: múltiplas pápulas acastanhadas, com tampão queratótico central (Figura 5). Antecedentes: hipertensão arterial, diabetes, insuficiência renal crônica dialítica. À dermatoscopia, com luz polarizada, foi verificada área amorfa eritêmato-acinzentada na periferia, com centro branco queratótico, de aspecto deprimido e pequena porção apresentando área amarelo-acastanhada. Realizado exame histopatológico, que mostrou achados semelhantes aos do caso anterior. O paciente foi tratado com valerato de betametasona, duas vezes ao dia, apresentando melhora do quadro e ausência de novas lesões.

 

DISCUSSÃO

A colagenose perfurante reativa é caracterizada pela eliminação transepidérmica de colágeno. Pode ser primária, possível herança autossômica recessiva, ou secundária (adquirida), associada a doenças sistêmicas.3 No presente relato, os achados clínico-epidemiológicos foram condizentes com os da literatura. Paciente adulto, diabético e dialítico renal, com múltiplas pápulas queratóticas, umbilicadas, pruriginosas predominantes em tronco.

A patogenia não é conhecida, alterações nos feixes fibroelásticos, podem ser parcialmente explicadas pelo diabetes. Além disso, o trauma seria outro fator contribuinte, uma vez que se observa o fenômeno de Koebner nos locais de escoriação, de picadas de insetos, cicatrizes de herpes-zóster e de acne.3

O diagnóstico final é confirmado pela histologia, quando observamos depressão cupuliforme preenchida por material basofílico degenerado, focos de ulceração e fibras colágenas verticalmente orientadas, atravessando a junção dermoepidérmica, mais bem visualizadas pela coloração do tricômico de Masson (cora o colágeno em azul). Além da biópsia, a realização da dermatoscopia é ferramenta útil, ajudando a afastar outras dermatoses similares, como o prurigo nodular e o líquen plano hipertrófico. Segundo Errichete e cols., o padrão branco de explosão de estrelas (linhas brancas dispostas radialmente) sobre fundo eritêmato-acastanhado, é visto no prurigo nodular, e a presença de linhas esbranquiçadas cruzadas (estrias de Wickham), no líquen plano hipertrófico.5 Em nossa análise dermatoscópica, observamos uma área branca central, plugues amarelados de queratina com tamanho variável, correspondentes possivelmente à área de fibrose e extrusão de material dérmico, colarete queratótico, com área amorfa castanho-acinzentada ou eritematosa ao redor, devido possivelmente à reação inflamatória. A ausência dos outros padrões descritos nos auxiliou a afastar tais dermatoses.

Ressaltamos com esses casos a apresentação clínica peculiar das dermatoses perfurantes e a importância da dermatoscopia como método auxiliar no diagnóstico.

 

Referências

1. Ramirez-Fort MK, Khan F, Rosendahl CO, Mercer SE, Shim-Chang H, Levitt JO. Acquired perforating dermatosis: a clinical and dermatoscopic correlation. Dermatol Online J. 2013;19(7):18958.

2. Akoglu G, Emre S, Sungu N, Kurtoglu G, Metin A. Clinicopathological features of 25 patients with acquired perforating dermatosis. Eur J Dermatol EJD. 2013;23(6):864-71.

3. Castro LGM, Nogueira MF, Valente NYS. Colagenose reativa perfurante adquirida associada a insuficiência cardíaca congestiva. Bras Dermatol. 2001;76(4):437-9.

4. Tilz H, Becker JC, Legat F, Schettini APM, Inzinger M, Massone C, et al. Allopurinol in the treatment of acquired reactive perforating collagenosis*. An Bras Dermatol. 2013;88(1):94-7.

5. Errichetti E, Piccirillo A, Stinco G. Dermoscopy of prurigo nodularis. J Dermatol. 2015;42(6):632-4.

 

Trabalho realizado no Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo - São Paulo (SP), Brasil.


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