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Relato de casos

Preenchimento com PMMA em membros inferiores em paciente com lipodistrofia por antirretrovirais

Carlos Roberto Antonio1; João Roberto Antonio2; Guilherme Bueno de Oliveira3; Fernanda Tomé Alves4

Data de recebimento: 14/09/2013
Data de aprovação: 03/12/2013
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

A terapia antirretroviral promoveu melhor qualidade de vida para pacientes portadores de HIV. Entretanto, alterações metabólicas nos pacientes, como a síndrome lipodistrófica do HIV, podem ocorrer com seu uso. Assim, é necessário adotar estratégias para prevenir e tratar a lipodistrofia e outros possíveis efeitos colaterais dessa terapêutica. Relata-se o caso de paciente do sexo feminino, com uso de terapia antirretroviral e diminuição do diâmetro dos membros inferiores bilateralmente, principalmente em joelhos e terço distal das pernas. Os locais com evidências de lipoatrofia foram preenchidos com polimetilmetacrilato, com resultado satisfatório e adesão da Tarv pela paciente.

Keywords: POLIMETIL METACRILATO; SÍNDROME DE IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA MURINA; SÍNDROME DE LIPODISTROFIA ASSOCIADA AO HIV.


INTRODUÇÃO

A síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids) foi descrita nos Estados Unidos em 1981, e, mais de três décadas depois de seu descobrimento, estima-se que 33,4 milhões de pessoas apresentem o vírus HIV e que tenham ocorrido, aproximadamente, dois milhões de mortes associadas ao vírus.1 O advento da Highly Active Antiretroviral Therapy (Haart), terapia que combina três drogas da classe dos inibidores da protease (IP), possibilitou importante e sustentada supressão na replicação viral, promovendo aumento significativo da sobrevida e da qualidade de vida dos pacientes soropositivos.2

No entanto, a terapia antirretroviral (Tarv) pode causar alterações metabólicas nos pacientes, como a síndrome lipodistrófica do HIV (SLHIV), caracterizada pelo aumento de colesterol e de triglicérides nos níveis séricos, resistência à insulina e mudança na distribuição da gordura corporal.3 Os pacientes portadores dessa síndrome podem apresentar hipertrofia de tecido adiposo com distribuição centrípeta, ocorrendo acúmulo de gordura no abdômen, na região peitoral e nas vísceras, surgimento de curvatura cervical denominada "corcova de búfalo" e perda de tecido adiposo na face, nas nádegas, nos membros inferiores e nos superiores.4

Essas mudanças corporais podem acarretar problemas psicossociais nos pacientes, uma vez que alguns portadores dessa síndrome a consideram marcador visível dos portadores do vírus HIV, percebida como a "face da Aids". O paciente, ao se sentir estigmatizado, pode apresentar problemas nas relações pessoais e familiares que, em alguns casos, engatilham distúrbios nas relações sociais, levando até ao total isolamento dos pacientes. O mais preocupante é que, a fim de evitar os efeitos psicossociais, os pacientes acabam desistindo do tratamento.5,6

Uma vez que, atualmente, não existe cura para a infecção pelo vírus HIV e que o tratamento com a Haart é essencial para a sobrevida do paciente infectado, é necessário adotar estratégias para prevenir e tratar a lipodistrofia e outros possíveis efeitos colaterais da terapia antirretroviral.7 Dos tratamentos disponíveis, os preenchedores injetáveis são considerados, atualmente, ferramentas não invasivas importantes na terapêutica da lipoatrofia facial (LF) associada ao HIV/Aids. O preenchedor polimetilmetacrilato (PMMA) é disponibilizado pelo Ministério da Saúde para o tratamento da LF em pacientes do SUS portadores do HIV.8 O PMMA apresenta excelente compatibilidade tissular, facilidade de manipulação nas cirurgias, resistência e radioluscência, baixa condutância térmica e elétrica, além de ser produto leve, quimicamente inerte, de fácil acesso e hipoalergênico.9

Diante do exposto, este trabalho tem como objetivo demonstrar a eficácia do uso de preenchimento com polimetilmetacrilato (PMMA) em membros inferiores de um paciente com lipodistrofia por antirretrovirais.

 

RELATO DO CASO

WBCG, do sexo feminino, 44 anos, solteira. Paciente portadora de HIV/Aids há sete anos, que faz uso de Tarv há cinco anos. Desde o início do tratamento, faz uso de Efavirenz, Lamivudina e Zidovudina. Refere há um ano diminuição da circunferência dos membros inferiores bilateralmente, sobretudo na região dos joelhos e do terço distal das pernas. Ao exame físico, apresentou lipoatrofia nos locais referidos (Figura 1). Optou-se pela realização de preenchimento com PMMA, tendo sendo injetados com cânula (40x0, 8mm) 2,5ml em cada um dos locais: terço distal de pernas e joelhos, bilateralmente. Após a aplicação, o resultado foi satisfatório (Figura 2).

 

DISCUSSÃO

Pacientes portadores do vírus HIV, em uso de Tarv, podem apresentar perda de tecido adiposo em face, nádegas, membros inferiores e superiores, caracterizando os sinais clínicos relacionados à lipodistrofia. Essas modificações corporais, além do desconforto físico, podem desencadear alterações psicossociais no paciente. Em trabalho revisado por Fernandes e colaboradores, em 2007,10 diversas alterações, como as de humor, problemas nas relações sexuais, redução da autoestima e depressão foram associadas com a lipodistrofia. Com o uso de técnicas de cirurgia dermatológica como o preenchimento com PMMA, podem-se minimizar esses efeitos adversos da medicação.

Neste trabalho, a paciente apresentava desejo de interromper o uso das medicações para diminuir a distribuição de gordura corpórea. Após ser realizado o preenchimento em membros inferiores com resultados satisfatórios, a paciente decidiu continuar o uso da Tarv. Esse dado é importante, pois os pacientes portadores da lipodistrofia tendem a interromper o tratamento antirretroviral a fim de evitar os efeitos psicossociais. Além disso, uma vez que, até o momento, o preenchimento com PMMA da região de joelhos e terço distal das pernas é inédito na literatura, acreditamos que este trabalho possa estimular o uso desses preenchedores nos pacientes portadores do vírus HIV com lipodistrofia.

 

Referências

1. World Health Organization (WHO) [Internet]. Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). AIDS epidemic update. Geneva, 2009. [cited 2010 Sep 7]. Available from: http://data.unaids.org/pub/Report/2009/JC1700_Epi_Update_2009_en.pdf

2. Palle Jr FJ, Delaney KM, Moorman AC, Loveless MO, Fuhrer J, Satten GA, et al. Declining morbidity and mortality among patients with advanced human immunodeficiency virus infection. HIV Outpatient Study Investigators. N Engl J Med. 1998;338(13):853-60.

3. Viraben R, Aquilina C. Indinavir-associated lipodystrophy. AIDS. 1998;12(6):F37-9.

4. Carr A, Samaras K, Chisholm DJ, Cooper DA. Abnormal fat distribution and use of protease inhibitors. Lancet. 1998;351(9117):1736.

5. Oette M, Juretzko P, Kroidl A, Sagir A, Wettstein M, Siegrist J, et al. Lypodystrophy syndrome and self-assessment of well-being and physical appearance in HIV-positive patients. AIDS Patient Care and STDs. 2002;16:413-7.

6. Power R, Tate HL, McGill SM, Taylor C. A qualitative study of the psychosocial implications of lipodystrophy syndrome on HIV positive individuals. Sexually Transmitted Infections. 2003;79:137-41.

7. Segatto AFM, Junior IFF, Santos VRS, Alves KCP, Barbosa DA, Filho AMP, et al. Lipodystrophy in HIV/AIDS patients with different levels of physical activity while on antiretroviral therapy. Rev Soc Bras Med Trop. 2011;44(4):420-24.

8. Soares FMG, Costa IMC. HIV-Associated facial lipoatrophy: from the advent to current knowledge. An Bras Dermatol. 2011;86(5):843-64.

9. Frazer RQ, Byron RT, Osborne PB, West KP. PMMA: an Essential Material in Medicine and Dentistry. J Long Term Eff Med Implants. 2005;15:629-39.

10. Fernandes APM, Sanches RS, Mill J, Lucy D, Palha PF, Dalri MCB. Síndrome da lipodistrofia associada com a terapia anti-retroviral em portadores do HIV: considerações para os aspectos psicossociais. Rev Latino-am Enfermagem. 2007;15(5):1-5.

 

Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto - FAMERP - São José do Rio Preto (SP), Brasil.


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