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Relato de casos

Papilomatose confluente e reticulada de Gougerot e Carteaud: boa resposta à minociclina em dois casos

Fabiane Andrade Mulinari Brenner1; Lismary Aparecida de Forville Mesquita2; Jonathan Barbieri Hauschild3; Amanda Guiomar Simeão3

Data de recebimento: 19/01/2014
Data de aprovação: 05/09/2014
Suporte Financeiro: Nenhum
Conflito de Interesses: Nenhum

Abstract

A papilomatose confluente e reticulada de Gougerot e Carteaud é doença de etiologia incerta, tendo como principal diagnóstico diferencial a pitiríase versicolor. Descrevem-se dois casos da doença, um em paciente do sexo masculino e outro em paciente do sexo feminino, ambos com boa resposta terapêutica e sem recidiva após uso de minociclina.

Keywords: HIPERPIGMENTAÇÃO; CERATOSE; MINOCICLINA


INTRODUÇÃO

A papilomatose confluente e reticulada (PCR) foi descrita pelos dermatologistas franceses Gougerot e Carteaud, em 1927. Possui etiologia obscura. Entre as hipóteses para o desenvolvimento da PCR estão uma desordem da queratinização e/ou uma resposta anormal a microrganismos da biota cutânea. As leveduras lipofílicas do gênero Malassezia estão entre as principais suspeitas de envolvimento.1,2 A doença é mais comum entre mulheres na faixa dos 10 aos 35 anos, em fototipos altos (IV a VI).

Clinicamente, caracteriza-se por pápulas verrucosas, acastanhadas, de aproximadamente 5mm de diâmetro, confluentes no centro e com padrão reticulado periférico. Tronco, região intermamária, dorso e área epigástrica são os locais mais acometidos. Eventualmente as lesões se estendem para ombros, pescoço e região pubiana. As extremidades podem ser acometidas ocasionalmente. As regiões plantar e palmar e as mucosas são geralmente poupadas. Pode haver prurido, mas o maior desconforto é estético.3,4

Os três elementos diagnósticos da PCR incluem 1: Clínica - lesões papilomatosas de coloração marrom-clara, centro confluente e reticuladas na periferia; 2: Microbiologia - exame direto e biópsia sem evidências de elementos fúngicos; e 3: Histologia - hiperqueratose, papilomatose, acantose, ocasionalmente hipogranulose e escasso infiltrado superficial inflamatório perivascular.5 A histopatologia é inespecífica, e a biópsia de pele desnecessária na maioria dos casos. Os achados mais frequentes são: hiperceratose e papilomatose, adelgaçamento da granulose e acantose focal interpapilar. Ocasionalmente, os vasos da derme papilar podem apresentar ectasia e infiltrado inflamatório linfocitário perivascular. Pode ocorrer hiperpigmentação da camada basal sem alteração do número de melanócitos.6

O principal diagnóstico diferencial se faz com a pitiríase versicolor (PV), mais comum do que a PCR. A PCR talvez não seja tão rara quanto citada na literatura, mas sim subdiagnosticada. Até mesmo porque alguns casos podem responder à terapêutica habitual para PV. Entretanto a PCR deve ser suspeitada sempre que uma PV não obtiver melhora após uso de antifúngicos. Não há terapêutica-padrão. Diversos agentes foram utilizados com resultados variáveis.7 Peróxido de benzoíla, lactato de amônio, ureia, tretinoína, clindamicina, hiposulfito de sódio e análogos de vitamina D foram relatados com uso tópico. Entre os tratamentos sistêmicos, minociclina, etretinato e isotretinoína estão entre os mais utilizados.8 O uso de antimicóticos tópicos ou sistêmicos pode ser considerado, especialmente quando há dúvida no diagnóstico diferencial com ptiríase versicolor. Apesar de várias drogas terem sido utilizadas com sucesso relativo, não há um agente uniformemente efetivo por ser doença de etiologia ainda desconhecida. Entretanto, através desses dois relatos de caso, foi possível expor a eficácia do tratamento da PCR com o uso da minociclina, com resposta terapêutica prolongada, e ajudar pacientes que apresentem esse diagnóstico a ter opção de tratamento que possa novamente ser comprovada.

 

RELATO DOS CASOS

Caso 1: Paciente do sexo masculino, 24 anos, branco, natural e procedente de Curitiba-PR. Há quatro anos apresentando manchas hipo e hipercrômicas, discretamente descamativas em região abdominal, axilar e dorso (Figura 1). Foi submetido a diversos tratamentos tópicos e sistêmicos para pitiríase versicolor, com resposta parcial e recidiva das lesões.

O exame micológico direto e a cultura para fungos, de material de raspado de tórax anterior, foram negativos. Suspeitou-se de PCR e foi iniciada minociclina 100mg ao dia, durante oito semanas. Ao final do tratamento, as lesões desapareceram (Figura 2) e permaneceram sem recidiva após 12 meses.

Caso 2: Paciente do sexo feminino, 20 anos, branca. Queixava-se de manchas descamativas e hipocrômicas em região abdominal e dorso há três anos (Figura 3). Utilizou lactato de amônio, com melhora e recidiva. Medicações para pitiríase versicolor também foram tentadas, sem melhora. Uma biópsia de pele foi realizada (Figura 4), e não foram observados fungos. Suspeitou-se de PCR, introduzindo-se minociclina 100mg, um comprimido ao dia, durante dez semanas. Ao final do tratamento, as lesões desapareceram sem recidiva ao longo de 36 meses (Figura 5).

 

DISCUSSÃO

O aparecimento da papilomatose confluente e reticulada (PCR) é geralmente mais frequente em adultos jovens, com a idade média de 21 anos.6 Nos dois casos relatados, a idade média de início da dermatose foi de 18,5 anos, o que se mostra de acordo com os dados da literatura. Ambos os pacientes possuíam pele seborreica, agravada por transpiração excessiva durante atividade física realizada com roupas sem capacidade de absorção, assim como em um caso já relatado,6 no qual a presença dos sintomas também teve relação com o suor.

A maioria dos casos já descritos é de PCR esporádica, mas há alguns relatos de ocorrência em dois ou mais membros da mesma família.3 Os dois pacientes cujos casos são aqui apresentados negaram lesões semelhantes na família, assim como a maioria dos casos constantes na literatura. Apesar de os registros sugerirem maior incidência de PCR em pessoas negras, os pacientes focalizados neste artigo eram brancos.

Com relação à terapêutica, no caso apresentado, houve resposta favorável à administração de minociclina 100mg/dia, durante período variável de oito a dez semanas, sem recidivas após 12 meses, permitindo constatar ser essa alternativa segura e eficaz, assim como apontaram outros relatos.7-10

 

Referências

1. Dias MFRG, Azulay RD. Ceratoses foliculares. In: Azulay RD, Azulay DR, editores. Dermatologia. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2004. p.452-5.

2. DiGiovana JJ. Ichthyosiform dermatoses. In: Freedberg IM, Eizen AZ, Wollf K, Austin KF, Goldsmith LA, Kats S, et al. Dermatology in General Medicine. 6 ed. New York: Mc Graw-Hill; 1999.p.481-505.

3. Schwartzberg JB, Schwartzberg HA. Response of Confluent and Reticulate Papillomatosis of Gougerot and Carteaud to Topical Tretinoin. Cutis 2000;66(4):291-3.

4. Berger CM. Clinical Pathologic Challenge: confluent and reticulated papillomatosis of Gougerot and Carteaud. Am J Dermatopathol. 2003;25(1):82-5.

5. Lee MW. Syringoma resembling confluent and reticulated papillomatosis of Gougerot & Carteaud. Cutis.1998;61(4):227-8.

6. Carneiro FAR, Dias LM, Silva ACMS. Papilomatose confluente e reticulada de Gougerot-Carteaud: relato de caso. Rev Paran Med. 2008;.22(1):63-8.

7. Orrego GV, Jaimes AFT, Bisso KEC, García CJ. Papilomatosis reticulada y confluente (síndrome de GougerotCarteaud): reporte de tres casos tratados con minociclina. Rev Soc Peruana de Dermatología. 2011;21(4):158-62.

8. Rodríguez-Carreón AA, Arenas-Guzmán R, Fonte-Avalos V, Gutiérrez-Mendoza D, Vega-Memije ME, Domínguez-Cherit J. Papilomatosis reticulada y confluente de Gougerot-Carteaud. Un caso con excelente respuesta a minociclina. Gac Méd Méx. 2008;144(1):67-70.

9. Tseng HW, Tseng HH, Wu CS. Confluent and reticulate papillomatosis treated with minocycline and tazarotene. Cutis. 2013;91(4):194-7.

10. Hudacek KD, Haque MS, Hochberg AL, Cusack CA, Lee Chung C. An Unusual Variant of Confluent and Reticulated Papillomatosis Masquerading as Tinea Versicolor. Arch Dermatol. 2012;148(4):505-8.

 

Trabalho realizado no Centro Especializado da Pele (Cepelle) - Curitiba (PR), Brasil.


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